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Universidade Federal do Rio de Janeiro Instituto de Estudos em

1. As rela es de trabalho 56 A boa m e o papel materno 59 Divis o sexual de trabalho 60 As quest es de g nero e rela es conjugais 61 Conflitos interparentais e geracionais 62 4 2 5 As conclus es finalizando as experi ncias nos grupos 63 4 3 As entrevistas 64 4 3 1 O perfil das entrevistadas 64 4 3 2 Com o p na estrada 70 4 3 3 A an lise dos dados o grande desafio de navegar no mar de dados 12 4 3 3 1 A constru o da escolha 12 4 3 3 1 1 O processo da escolha 12 4 3 3 1 2 Certezas e d vidas os movimentos dial ticos relacionados escolha 17 Os mitos e os medos 79 A dor do parto 80 Interfer ncia na sexualidade 85 Uma vez ces rea sempre ces rea 86 Falta de vagas no setor privado 88 A escolha do parto e a viol ncia no Rio de Janeiro 91 A pegadinha do cord o 93 4 3 3 1 3 A ideologia de g nero e o parto 95 4 3 3 2 O parto vaginal as dificuldades para manter e escolha 101 4 3 3 2 1 O obstetra e o pr natal 101 A escolha do obstetra pela mulher 101 A intera o entre a mulher e seu obstetra durante o pr natal 109 4 3 3 2 2 A mercantiliza o do parto a ind stria da ces rea 115 4 3 3 2 3 A aproxima o do parto as press es vividas pela mulher 122 Rela es de poder entre o m dico e a mulher 123 As press es do companheiro conflitos entre
2. ele indicou a cesariana porque a placenta estava muito madura e o meu beb poderia correr risco de n o receber mais oxig nio e alimentos disse que se eu insistisse em ter parto normal meu filho poderia entrar em sofrimento n o quis arriscar n o sou m dica Grupo Tijuca ces rea com 38 semanas 12 06 2007 As conversas entre as participantes deixavam entrever que essas indica es cir rgicas muitas vezes n o eram claras o suficiente para justificar a necessidade da interven o Nessa 52 problem tica parece existir um discurso m dico de forte conte do ideol gico que naturaliza a cesariana a introjeta como um padr o de normalidade e uma forma segura e valorizada de parir As mulheres que conseguiram realizar seu desejo e puderam vivenciar o parto normal com m dicos e em maternidades privadas falaram o quanto importante conversar com o obstetra durante o pr natal e tirar todas as d vidas ter confian a nessa rela o e que caso isso n o acontecesse as mulheres deveriam procurar outro m dico Elas demonstravam e declaravam estarem felizes por concretizar sua vontade Muitas elogiaram seus obstetras Uma participante de um dos grupos declarou que apesar de falarem em geral mal do parto normal pela dor sofrimento pelos riscos a viv ncia para ela foi muito boa e refletia orgulho pelo feito j que nos dias de hoje segundo ela a cesariana a forma de fazer nascer mais
3. A minha cunhada teve uma ces rea que ela marcou porque o cord o tava enrolado e eu sabia que o cord o pode ser desenrolado na hora do parto eu j tinha tido contato com pessoas que sabiam disso sabe que o cord o n o uma coisa t o grave assim Marta a Quando o cord o umbilical est enrolado no pesco o do beb 95 O depoimento de uma entrevistada sobre a quest o da circular de cord o merece registro pois a atitude m dica diante do fato foi na contra m o do que se tem percebido relacionado ao comportamento da maioria dos obstetras Apesar de ser uma preocupa o o beb estar com o cord o enrolado ela foi incentivada pela m dica a tentar o PV que alegou que isso n o configurava um impedimento n o usando este fato pra pressionar a mulher Ela a m dica falou Mesmo estando com o cord o n o tem problema mesmo dessa forma a gente pode fazer normal Ela me trangiiilizou o tempo todo Ent o ela perfeita Luisa Como vimos toda regra tem exce o Mesmo com estudos cient ficos que desconstr em esses mitos e com muita informa o acess vel na literatura especializada ou pela Internet percebemos que ainda existem id ias distorcidas que deixam inseguras a maioria das mulheres Esse mito e outros tantos poderiam estar contribuindo para escamotear as principais causas da realiza o das cesarianas desnecess rias E importante ressaltar que mesmo num grupo onde muitas mulheres se m
4. Apesar dos encontros estarem relacionados amamenta o os depoimentos permeavam e perpassavam as quest es que envolviam o cotidiano dessas mulheres Surgiam 46 quest es relacionais geracionais parentais sociais econ micas pol ticas de g nero e de classe que iam se entrela ando aos momentos vividos desde a inf ncia at a experi ncia da maternidade Esse turbilh o de emo es aflorava entre elas e resgatava os la os das quest es femininas que apesar de fazerem parte do dia a dia das mulheres ficavam esquecidos na celeridade do mundo atual onde n o se tem tempo de olhar e observar como estamos sendo levados a viver Certamente as participantes desses encontros coletivamente se permitiam reflex es muito mais amplas do que apenas solucionar os seus problemas na amamenta o O grupo apesar de n o ter um car ter educativo trabalhava a educa o em sa de no modelo preconizado pelo PAISM onde se respeita o saber popular e se valoriza as experi ncias anteriores adquiridas no crescimento ou desenvolvimento pessoal de cada indiv duo Essas experi ncias trazidas para o espa o coletivo possibilitam as trocas dessas viv ncias na intera o de cada participante Esses desdobramentos ampliam reverberam e consolidam os la os principalmente afetivos criados no Grupo Vejo o trabalho das AP tal como preconizado por Paulo Freire onde se aprende ensinando j que todo encontro baseado nas trocas das p
5. Regina Como vimos o relato tamb m revela o quanto a situa o se mostra limitante pois muitos planos de sa de t m restri es e ou oferecem poucas op es de maternidades As pr prias maternidades refor am essa quest o da falta de vagas Isso porque o PV desorganiza a l gica fordista de produ o O PV imprevis vel no sentido de n o ter hora marcada para acontecer de n o se poder agendar Ent o o agendamento das ces reas passaria a ser uma estrat gia para equacionar o problema de acesso na rede privada Tentando entender essa l gica supomos que quando a mulher est em trabalho de parto tamb m necess rio reservar uma sala para cirurgia no caso de o PV n o evoluir e ter que se recorrer cesariana Isso certamente transformar se ia num transtorno para a maternidade porque a rela o custo benef cio passa a ser desfavor vel no que se refere ao PV A superlota o no agendamento com as cesarianas marcadas em bloco acaba por revelar o modo mercantilista mecanicista e anti natural do processo de parturi o na rede privada Portanto isso sugere na verdade que n o existem poucas vagas mas sim muitas cirurgias A falta de vagas nas maternidades privadas envolve quest es que encampam outros interesses que v o al m das dificuldades de interna o pelas parturientes Uma delas pode ser o comodismo para o m dico que pode organizar a sua agenda sem prejudicar o hor rio do consult
6. por entendermos que elas est o dialeticamente entrela adas e influenciando se mutuamente 40 3 3 3 Considera es sobre as t cnicas de pesquisa A entrevista A entrevista foi a t cnica escolhida por considerarmos o instrumento mais apropriado ao prop sito do estudo pois permite ao sujeito estudado a oportunidade de se pronunciar de forma aberta e confidencial sobre a tem tica em quest o Minayo 1996 Nesse sentido cabe ressaltar que a entrevista caracteriza se como instrumento de investiga o cient fica importante por possibilitar a produ o de conte dos fornecidos diretamente pelos sujeitos envolvidos no processo O entrevistador com esse instrumento pretende elucidar as informa es pertinentes a seu objeto Minayo 1996 O pesquisador deve fazer se s vezes de parteiro assistindo e ou ajudando o pesquisado a dar seu depoimento deixando o livre para expressar sua verdade A entrevista um exerc cio espiritual onde o pesquisador acolhe os problemas do pesquisado como se fossem seus olhar o outro e se colocar no seu lugar Bourdieu 1999 E preciso lembrar que geralmente os pesquisados aproveitam o momento da entrevista para se fazer ouvir levar para os outros a sua experi ncia Muitas vezes ela se torna uma ocasi o para eles verbalizarem e se explicarem desabafarem e constru rem seu pr prio ponto de vista sobre eles mesmos e sobre o mundo Enfrentamos muitas vezes durante os depoi
7. Diante de tantos relatos e viv ncias fervilhava uma enorme vontade de falar sobre as minhas experi ncias em rela o assist ncia ao parto e compartilhar com elas essas hist rias Procurei me manter presente na din mica do grupo sem que no entanto a minha participa o influenciasse as mulheres que poderiam se tornar futuramente minhas informantes A conviv ncia nos grupos me oportunizou o exerc cio do distanciamento necess rio para realizar a etapa das entrevistas que n s sab amos ser um grande desafio 4 3 As entrevistas 4 3 1 O perfil das entrevistadas A partir de minhas inser es nas reuni es das AP pude captar minhas informantes em v rios encontros realizados em quatro bairros da cidade Botafogo Tijuca Catete e G vea Durante os encontros as coordenadoras dos grupos solicitavam que eu me apresentasse e expusesse o motivo da minha presen a Esses encontros possibilitaram nos diversos grupos o desenvolvimento de conversas informais sobre assuntos variados que permeavam o objeto da pesquisa Esses momentos constru dos durante as reuni es geravam empatia sobre o tema da pesquisa propiciando um ambiente favor vel para a capta o das futuras informantes Segundo Velho 1978 o envolvimento inevit vel com o objeto de estudo n o constitui defeito ou imperfei o dos m todos utilizados Sendo o pesquisador um membro da sociedade necess rio o cuidado e a capacidade de relativizar o seu pr p
8. Grupo Catete 16 03 2007 a vida virando de cabe a pra baixo nesses primeiros momentos muito dif cil conciliar a vida que se vive atualmente N o tenho tempo pra mim vivo chorando angustiada por n o dar conta mais da minha vida Grupo Catete 16 03 2007 Uma gestante que desejava ter parto normal falou da expectativa do parto dos medos das ang stias relacionadas vida atual dos problemas no trabalho e mesmo assim ter que dar conta de tudo Segundo ela estar gr vida e ter um filho a aventura mais radical que eu vou experimentar na vida Grupo Catete 19 01 2007 Presenciei situa es inusitadas com essas fant sticas mulheres Num determinado dia quando uma das m es chegou procurando o local em que acontecia a reuni o se dirigiu ao grupo perguntando Aqui o encontro das m es piradas Grupo Catete 19 01 2007 O in cio do exerc cio da maternidade representa bem o simbolismo que a palavra piradas quer dizer para a maioria das mulheres As adapta es e demandas geradas pelos cuidados com o filho e a amamenta o representam uma mudan a radical na vida da mulher O n vel de exig ncias emocionais e f sicas geralmente maior do que podem suportar e naturalmente surgem os conflitos e as cobran as para o desempenho do papel feminino de boa m e O isolamento social motivado pelo cuidado integral que dedicam aos seus filhos conduz as mulheres tamb m a uma g
9. apoiar e proteger 128 Os c rculos interferentes figuras femininas no processo do parto 132 4 3 3 3 A disson ncia entre a escolha e o desfecho do parto 138 4 3 3 3 1 O caminho desviante O processo de mudan a 139 4 3 3 3 2 A medicaliza o e as interven es no parto 144 4 3 3 3 3 O desencontro entre o desejo e o realizado a concretiza o da cesariana 148 Os sentimentos relacionados a experi ncia do parto 149 Tentar de novo 154 Querer poder O direito de escolha das mulheres 155 4 3 3 3 4 A escolha do obstetra em um pr ximo parto 157 4 3 3 4 A maternidade e a contradi o entre as esferas produtiva e reprodutiva das 159 mulheres das camadas m dias 4 3 3 4 1 Novas responsabilidades e a volta ao trabalho conflitos 160 4 3 3 4 2 Ser m e para as mulheres de camadas m dias padecer no para so 164 CAP TULO V CONSIDERA ES FINAIS REFERENCIAS BIBLIOGR FICAS ANEXOS 167 173 181 Pe o te o prazer leg timo E o movimento preciso Tempo tempo tempo tempo Quando o tempo for prop cio Tempo tempo tempo tempo De modo que o meu esp rito Ganhe um brilho definido Tempo tempo tempo tempo E eu espalhe benef cios Tempo tempo tempo tempo Caetano Veloso CAP TULO I O OBJETO DA PESQUISA 1 INTRODU O 1 1 Apresenta o Este estudo tem como prop sito evidenciar como as mulheres das camadas m dias vivenciaram o processo de disson ncia entre o d
10. es leis vis o de mundo s o provis rios e passageiros est o em constante dinamismo e potencialmente tudo pode ser transformado p 20 Os processos de subjetiva o relacionados problem tica do alto ndice de cesarianas em mulheres de camadas m dias constituem o campo tem tico de nossa investiga o Levamos em considera o tamb m a rela o intr nseca com o jogo de interesse da l gica mercantil do processo de elabora o do parto durante o pr natal do ponto de vista da rela o gestante obstetra Contextualizamos esse momento na vida das mulheres em interface com suas rela es sociais que incluem as rela es familiares e as rela es de trabalho j que grande parte delas est inserida no mercado de trabalho e portanto convivem com uma diversidade de situa es que interferem tanto objetiva como subjetivamente no percurso da gesta o influenciando o processo gestacional e o parto 3 3 2 Pela tica do materialismo hist rico e dial tico Para entender melhor as contradi es que essas mulheres est o vivendo por escolherem terem seus filhos pelo parto vaginal e n o conseguirem concretizar esse desejo na medida em que a maioria tem como desfecho uma ces rea buscamos na dial tica o caminho metodol gico para compreender esses processos Esse referencial te rico procura evidenciar as contradi es da realidade social entendidas no curso do desenvolvimento hist rico 37 Para Her cl
11. vendido como potencialmente complicador perigoso enfim de risco para a mulher e seu beb As falas abaixo s o ilustrativas dessa situa o Quase todas as mulheres que eu conhe o tiveram cesariana mas sei que muitas tamb m queriam ter parto normal mas n o conseguiram Algumas falaram que escolheram a ces rea desde a gravidez mas s o poucas Sabe hoje n o t f cil fazer parto normal nem pra quem quer Rita grifo nosso Todo mundo achou bacana a minha escolha pelo parto normal a minha sogra todo mundo da fam lia todo mundo falava a que bom que voc vai tentar mas a fulana n o conseguiu por isso fulana n o conseguiu por aquilo todo mundo tem uma hist ria pra dizer que n o conseguiu por alguma raz o porque n o teve dilata o Dora Esta ltima informante resumiu o cen rio da assist ncia ao parto no setor privado suplementar A dificuldade das mulheres conseguirem realizar o PV se configura nos resultados divulgados pela pr pria ANS 2004 que apresentou ndices de quase 80 de ces reas neste setor Essa preocupante situa o produzida por um sistema que ap ia o abuso das interven es e que se move impulsionado por poderosos interesses econ micos Esse cen rio descortina os problemas que se agregam a outras condi es internas e externas que v o constituindo um risco sa de da mulher al m de usurpar o direito inalien vel de escolha salvo as exce e
12. Para Bernhardt 2001 o grupo de mulheres com poder aquisitivo que solicita ces reas e consegue seu objetivo refor a os valores atribu dos superioridade da utiliza o da tecnologia como forma de poder e status Isto reflete diretamente nas mulheres com n vel econ mico mais baixo que consideram a seguran a e a possibilidade de n o sentirem as dores do trabalho de parto atrav s da cesariana como algo inacess vel Passam a considerar os partos vaginais demorados dif ceis sofridos perigosos e discriminat rios Este panorama da assist ncia obst trica mobilizou o Minist rio da Sa de MS em 1997 a promover em parceria com o Conselho Federal de Medicina CFM uma campanha de esclarecimento sobre os riscos da cesariana desnecess ria A campanha que tinha como slogan Natural o Parto Normal foi uma tentativa de evitar a prolifera o da id ia que passou a fazer parte da cultura nacional A Sociedade Brasileira de Pediatria ONGs profissionais isolados e outros grupos se envolveram no trabalho que tinha como objetivo transmutar essa realidade Apesar da falta de integra o de for as que promovessem resultados eficientes existiu uma mobiliza o Bernhardt 2001 No servi o p blico tamb m se observa um aumento das taxas de cesariana inclusive em maternidades cujo perfil n o de atendimento a parturientes de alto risco Dias 2001 Uma situa o que envolve tamb m essa quest o a procura das p
13. bom pra mim e pra ela Nesse momento eu quero ficar com minha filha Mas eu ando me sentindo pressionada Tem uma press o da sociedade da fam lia dos amigos As pessoas te olham e parecem que dizem P xa Voc estudou fez mestrado n o vai trabalhar Vai ficar cuidando de filho e de casa Se voc n o t na linha de produ o voc desvalorizada voc quase discriminada Regina 163 Minha m e de uma gera o que sempre trabalhou construiu uma carreira buscou uma realiza o pessoal Mas eu me vi assim n o querendo fazer isso N o acho que aquilo o fato da m e ter voltado a trabalhar quando ela era ainda beb era saud vel enfim ela me botou pilha quando ele o beb tava com dois meses e meio Voc tem que voltar a trabalhar Precisa voltar a trabalhar Ent o ela veio me cutucar pra voltar n o aceitava bem que eu ficasse parada apenas cuidando do meu filho Marta Os relatos revelaram o quanto se sentiram pressionadas pelo que socialmente esperado que trabalhem que produzam que gerem renda Pareceu nos que ter apenas o desejo de cuidar dos filhos e ser m e tempo em integral tornou se politicamente incorreto Essa situa o supomos passa a ser condenada socialmente o que consideramos contradit rio Ao mesmo tempo isso reflete o paradoxo atual onde as mulheres conquistam o mercado de trabalho mas se ressentem de n o poderem estar com os filhos mais proxim
14. no Brasil e no mundo Por ano cerca de 530 mil mulheres no mundo s o vitimadas por causa de complica es relacionadas gravidez ou ao parto segundo os dados presentes no relat rio Sa de Mundial 2005 fa a valer cada mulher e crian a rec m lan ado pela Organiza o Mundial da Sa de OMS no Dia Mundial da Sa de Todas as an lises relativas a esses dados apontam que a imensa maioria desses bitos decorrente de causas evit veis OPAS OMS 2005 No Brasil as taxas de morbidade e mortalidade maternas s o t o altas que o bito materno acaba sendo naturalizado A morte das mulheres durante a gesta o ou no parto ainda vista como prov vel ou aceit vel e acaba sendo introjetada como uma possibilidade de vir a ocorrer fazendo parte da viv ncia ou do risco da maternidade Oliveira 2006 Esta situa o oculta a dimens o da mortalidade materna no Brasil Num estudo feito pela pesquisadora Anna Volosko em 1992 usando uma nova metodologia com um fator de corre o mais adequado para an lise estat stica verificou entre mulheres de 10 a 49 anos de idade residentes numa rea do munic pio de S o Paulo dotada de hospitais e com uma A mortalidade materna definida como sendo o bito de uma mulher durante a gesta o ou dentro de um per odo de 42 dias ap s o seu t rmino independentemente da dura o ou da localiza o da gravidez devido a qualquer causa relacionada ou agravada pela condi o
15. o de cesarianas e que taxas superiores s o medicamente injustific veis WHO 1985 Mesmo assim o aumento da incid ncia de cesarianas nas ltimas d cadas tem alcan ado n meros assustadores sendo este tipo de parto utilizado de forma abusiva e indiscriminadamente Belizan et al 1999 O mito de que existe uma cultura feminina de prefer ncia pela cesariana no Brasil contestado num estudo realizado por Potter et al 2001 mostrando que de 70 a 80 das gestantes antes do parto tanto do servi o privado como do p blico desejam o parto vaginal Em contrapartida Voloshko 1996 mostra que os m dicos justificam os altos ndices de ces reas responsabilizando as pr prias mulheres Segundo eles as mulheres solicitariam a cesariana por temerem vivenciar o processo do parto as dores associadas s contra es do trabalho de parto os poss veis riscos e seq elas problemas com a sexualidade etc desestimulando assim os obstetras a tentarem o parto vaginal Um estudo feito por Hopkins 2000 evidenciou a participa o dos m dicos obstetras como promotores de uma cultura intervencionista Esse estudo destacou a forma como o profissional m dico promove na parturiente os medos associados ao parto e superestima a seguran a da cesariana em fun o dos seus interesses Assim as indica es das cesarianas v o sendo constru das fundamentadas no senso comum das representa es e imagin rio dos pr prios obstetras c
16. o no p s parto por sugest o dos m dicos Os resultados de um outro estudo realizado por Osis 1991 tamb m em S o Paulo mostram que a esteriliza o entre as mulheres hospitalizadas para a assist ncia obst trica depende de seu status s cio econ mico que aumenta de acordo com a instru o idade e condi es de pagamento para servi os Diante desses fatores podemos observar que as caracter sticas e especificidades da trajet ria existente na prefer ncia por um determinado tipo de parto s o socialmente estruturadas e contribuem para influenciar determinados padr es de escolha mesmo que a prefer ncia seja efetivada em car ter individual Loyola 1984 Para Giffin 2003 o tempo de interna o e a interna o precoce com pouca dilata o aumentam as chances de as mulheres solicitarem a cesariana Isso confirmado no estudo realizado por Marqu s 2005 que aponta que as taxas de ces rea na interna o das mulheres com o trabalho de parto pouco desenvolvido no sistema privado de sa de alcan aram o percentual de 95 A forma de assist ncia durante o trabalho de parto parece segundo Giffin 2003 influenciar no pedido da mulher para conseguir o parto cir rgico O procedimento cir rgico para viabilizar o nascimento quando da impossibilidade do parto vaginal n o isento de riscos No Brasil este procedimento est associado maior 15 morbimortalidade materna e infantil quando relac
17. 141 Nos dois primeiros depoimentos observamos que os m dicos nesse momento j demonstravam uma conduta direcionada interven o realiza o da cesariana No primeiro caso percebemos que a negativa para a realiza o de mais uma ultrassonografia poderia ser uma tentativa de evitar a surpresa de o cord o ter desenrolado e portanto a justificativa para a ces rea n o estaria mais indicada No terceiro depoimento percebemos a sutileza m dica de colocar em repouso uma mulher que estava bem saud vel com atitude de confian a e determina o e que preferiu seguir seus pr prios conhecimentos n o casualmente ela enfermeira para tentar estimular seu trabalho de parto Mas essas atitudes de oposi o certamente t m um limite No momento do parto fica muito dif cil para as mulheres terem e expressarem qualquer discord ncia sobre uma decis o m dica especialmente se a raz o alegada a seguran a do beb Assim os m dicos continuam a reproduzir o modelo hegem nico e unilateral de comunica o E isso que parece acontecer mesmo quando existe uma suposta comunica o anterior entre a mulher e o obstetra sendo provavelmente segundo Giffin 2005 apenas uma forma para manipular sutilmente a mulher Chachan 2006 aponta que nos segmentos m dios isso mais percept vel j que existe uma identifica o de classes e o reconhecimento do saber poder m dico Isso dificulta a percep o ou aceit
18. 15 Carla 12 n o 5 semanas n o 41 sim A maioria das entrevistadas iniciou seu pr natal entre 4 e 5 semanas de gesta o e realizou mais de 12 consultas at o parto o que sugere que as mulheres usu rias de planos de sa de privados come am precocemente o acompanhamento da gravidez Mais da metade relatou ter entrado em trabalho de parto sendo que algumas afirmaram n o terem tido dilata o cinco passaram por indu o por ocitocina evidenciando a medicaliza o do parto nos marcos deste modelo biom dico 70 Todas as entrevistadas autorizaram a grava o da entrevista assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido e preencheram uma ficha com dados pessoais antes de a entrevista ser gravada De in cio realizamos 2 entrevistas piloto para testar o roteiro Nestas foram entrevistadas duas mulheres provenientes do grupo das AP de bairros diferentes Utilizamos o roteiro elaborado durante a estrutura o do projeto onde foram elencados blocos de quest es referentes ao objeto de pesquisa incorporando ainda algumas sugest es propostas pela banca quando da qualifica o da pesquisa Elaboramos o roteiro de forma que as quest es abordadas se vinculassem ao universo de vida da mulher como um todo e n o apenas focando a gravidez e o parto Pretend amos com isso que nossa pesquisa orientada pelo referencial te rico do materialismo hist rico e dial tico revelasse a histori
19. Esses fatos v m estabelecendo um crescente status opera o cesariana Notzon et al 1987 Zheng et al 1996 Pelos estudos j realizados vimos o quanto necess rio ampliar a discuss o em torno da excessiva utiliza o da cesariana como via de nascimento principalmente nas mulheres de camadas m dias dando voz a esses sujeitos para que possamos entender a diverg ncia entre o desejo escolha manifestado e o que elas obt m realmente na pr tica preciso refletir como e onde anda a tica pois se a mulher deseja ter seu filho de parto vaginal e pode ter esse tipo de parto n o tendo nenhuma contra indica o que o impe a e mesmo assim o m dico indica uma cesariana h um profundo desrespeito ao direito da mulher que deve ser abertamente discutido pois n o deve se fazer uma cirurgia desnecessariamente Ou seja ces rea por conveni ncia m dica ou por conveni ncia do sistema privado de sa de uma transgress o tica 16 2 2 A assist ncia ao parto 2 2 1 Pegadas hist ricas das parteiras obstetr cia A historicidade da assist ncia ao parto tem in cio a partir do momento em que as pr prias mulheres se auxiliam e iniciam um processo de acumula o do saber sobre a parturi o Melo 1983 As mulheres ajudavam uma as outras nos servi os que o parto requeria antes da oficializa o da obstetr cia como pr tica m dica Por um longo per odo partejar foi uma tradi o exclusivament
20. Eu ficava muito chateada mas ainda firme em ter o parto normal N o me abalava tanto n o Dizia N o quer assistir porque vai ser parto normal mesmo lamento No final da gravidez o beb ficou muito grande e a meu marido ficou na minha cabe a Viu melhor ces rea A eu me senti muito pressionada nesse momento e ele o companheiro louco que nascesse louco pra ser pai pra ver o filho essa press o toda a m dica dizendo que n o era bom esperar dizendo que tava muito pesado ele o marido acabou me influenciando que podia acontecer alguma coisa com o beb pois n o tinha nada de sinal de parto estava fazendo 39 semanas que acabei aceitando marcar Eu fiquei muito triste e chateada dele o beb n o vir quando quisesse Eu acabei estipulando o dia que ele viria Joana 131 Um depoimento merece ser ressaltado pelo que demonstrou a entrevistada sobre o comportamento do companheiro no momento do trabalho de parto e as pr prias contradi es que vivenciou em rela o a essa participa o como querer ajuda e ao mesmo tempo querer ficar sozinha Podemos refletir o quanto os homens s o exclu dos da participa o do processo de parturi o inclusive pela exclus o de informa es e da falta de orienta o dos profissionais de sa de para que ambos homens e mulheres possam interagir durante o parto Os companheiros acabam por n o compreender o significado que as mulheres vivem f sica
21. SAGE Publications 1998 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94 95 96 177 MELO V H Evolu o hist rica da obstetr cia a marginalidade social das parteiras e da mulher Belo Horizonte MG 1983 Mestrado em Enfermagem Universidade Federal de Minas Gerais MENDES A C SILVA J V DALLARI S G Bio tica e Direito Dispon vel em URL www portalmedico org br revista biol v2 biodireit html acesso 19 11 2006 MENEZES DCS LEITE IC SCHRAMM JMA LEAL MC Avalia o da peregrina o anteparto numa amostra de pu rperas no Munic pio do Rio de Janeiro Brasil 1999 a 2001 Cad de Sa de P blica Rio de Janeiro 22 3 553 559 mar 2006 MINAYO M C S O Desafio do Conhecimento Pesquisa Qualitativa em Sa de Rio de Janeiro Ed HUCITEC ABRASCO 1992 MINAYO M C S Ci ncia t cnica e arte O desafio da pesquisa social In Pesquisa social Teoria M todo e Criatividade M C S Minayo orgs pp 9 29 Petr polis Rio de Janeiro Vozes 1996 MINAYO M C S O conceito de Representa es Sociais dentro da sociologia cl ssica In Textos em Representa es Sociais Guareschi P A amp JOVCHELOVITCH S orgs Petr polis RJ Vozes 1995 MINAYO M C S amp DESLANDES S F orgs Caminhos do pensamento epistemologia e m todo Rio de Janeiro Editora FIOCRUZ 2002 MINIST RIO DA SA DE Secretaria de Vigil ncia em Sa de Dispon vel em URL
22. a es articuladas e integrais tanto no que diz respeito assist ncia ao ciclo grav dico puerperal quanto aos problemas de sa de das mulheres inclusive aqueles n o relacionados esfera reprodutiva P 6 Em 28 de maio de 2004 o Minist rio da Sa de lan ou a Pol tica Nacional de Aten o Integral Sa de da Mulher Princ pios e Diretrizes com objetivo de consolidar avan os e reconhecer analisar os retrocessos no campo dos direitos sexuais e reprodutivos Foi constru da a partir do diagnostico epidemiol gico da situa o da sa de da mulher no Brasil respeitando as caracter sticas da nova pol tica de sa de Quest es como a humaniza o e a qualidade do atendimento est o inseridas nas diretrizes da aten o sa de das mulheres MS 2004 A nova pol tica um desafio para sua implanta o Segundo Pedrosa 2005 A mudan a de modelo de assist ncia n o depende somente da constru o de planos e programas Faz se necess ria a incorpora o dos princ pios propostos na pr tica cotidiana dos servi os que devem contar com suficientes recursos financeiros e com recursos humanos capacitados a executar esse novo modelo P 79 Neste contexto assistimos a uma fonte inesgot vel de medidas que reduzem os gastos p blicos em sa de incentivam a crescente privatiza o deste setor atrav s de um mercado voraz altamente lucrativo das pol ticas neoliberais dentro de um sistema capitalista que tr
23. dico deveria ent o promover o empoderamento feminino entendido como caminho da autonomia e do direito de escolha A raz o e a sensibilidade deveriam nortear as atitudes a serem tomadas sem quebra de confian a e do compromisso assumido pelo profissional para a realiza o dessa escolha Para tanto h necessidade de profundas mudan as na conduta m dica e tamb m na forma o dos futuros obstetras e profissionais que atuam na assist ncia gesta o e ao parto 172 Portanto como aponta Giffin 2003 devemos continuar a desmistificar os conceitos associados ao PV e desconstruir a id ia cristalizada sobre os preju zos e perigos que circundam a forma natural de nascer Proporcionar caminhos que ap iem as mulheres no percurso da gravidez e no parto para que elas se sintam capazes de vivenciar esse processo de maneira plena e integral conhecendo melhor os processos que est o ocorrendo no corpo e na alma f sica e emocionalmente at a concretude do momento do nascimento Ao aumentar seu poder decis rio resgatar se o como protagonistas do parto e efetivamente poder o fazer valer os seus direitos e suas escolhas Esperamos que essa pesquisa que pretende se desdobrar em outros estudos mesmo com o pouco tempo dispon vel para mergulhar na complexidade do tema possa ter contribu do para um olhar mais profundo sobre as mulheres desse segmento social e as problem ticas que permeiam o momento atual do processo de parir Prob
24. e acho que faz parte Joana Se eu tivesse que fazer uma op o hoje com certeza eu faria a op o de ser m e s de ficar com meu filho de ver ele crescer acompanhar todos os momentos dele cada passo Mas eu sei que isso vai passar Ele vai crescer e se eu n o der continuidade minha vida profissional minha vida como mulher n o s como m e mas como companheira o meu momento vai passar tamb m Eu tenho que dar continuidade a isso Vou ver ele crescer de uma outra forma mas tenho que continuar trabalhando N o posso deixar meu lado profissional pra tr s Temos que aprender a viver e superar esses conflitos Mas se eu tivesse que fazer uma op o com certeza seria ser s m e T nia Pudemos perceber que para a grande maioria muito dif cil compor os m ltiplos pap is mulher esposa profissional m e que aumentam a demanda da vida casa fam lia e trabalho Querem a maternidade mas n o abrem m o do trabalho das conquistas e do crescimento pessoal Esses sentimentos ambivalentes as fazem n o querer estar nessa situa o Segundo Anyon 1990 espera se que as mulheres sejam femininas desempenhem bem seus pap is dom sticos maternos e que alcancem sucesso no mundo do trabalho Os relatos nos revelam como est o percebendo essa situa o complicado Eu vou continuar sendo cobrada no trabalho na vida no dia a dia e agora vou ser cobrada como m e Se o filho fica doente cu
25. es que nos parecem estar imbricadas no profissional m dico na categoria m dica em ltima an lise nos interesses econ micos e pol ticos do sistema social em que vivemos Assim essas quest es n o s o individuais mas uma quest o de mercado que envolve uma classe profissional que se articula como classe para defender os privil gios os ganhos financeiros de uma medicina de consumo inserida na ind stria da sa de A fala abaixo ilustra essa quest o Vi isso com algumas amigas que t m obstetra que nem marca hora que pra atender mais gente ent o ruim por causa disso Voc fica horas esperando uma consulta Flora Outras entrevistadas comentaram sobre o tempo de espera nas consultas sendo que a maioria daquelas que verbalizaram esse problema n o se referiu ao tempo em si da consulta individual e sim de consult rios cheios De outro modo podemos dizer que a praticidade da cesariana eletiva e a rapidez t cnica de sua execu o a colocam em destaque na linha de produ o que se tornou o mercado de partos no Brasil assim como no mundo onde continua a crescer como j citado Dias 2007 aponta que quando a tecnologia n o respeita a fisiologia a ci ncia usada sem indica o com objetivo de ganhar tempo Sem esquecer a ind stria farmac utica que produz os medicamentos necess rios de ltima gera o para garantir uma interven o cir rgica sem complica o infec o como alerta
26. explorando se a exist ncia ou n o de alguma poss vel obje o da equipe m dica para atender um parto no hor rio noturno Fizemos essa pergunta baseando nos na possibilidade do trabalho de parto e parto ocorrerem noite ou de madrugada e os poss veis questionamentos que poderiam ser gerados pela equipe m dica por ter que se deslocar para a maternidade nesses hor rios Ampliamos essa quest o para colhermos a posi o pessoal e familiar para esse poss vel risco a ser enfrentado no caso de um PV Como os depoimentos abaixo ilustram essa uma preocupa o real inclusive para as mulheres A nica coisa que eu pensei em rela o viol ncia foi combinar com meu marido que se eu entrasse em trabalho de parto noite o caminho que n s far amos para a maternidade para evitar qualquer imprevisto T nia Cheguei a pensar sim na viol ncia Chegou um momento quando eu j estava com oito meses e eu pensei Se entrasse em trabalho de parto de madrugada Fiquei preocupada que falei pro meu marido se tiv ssemos que sair pra maternidade nesse hor rio como ia ser Falei pra ele Ser que n o melhor a gente marcar a ces rea mesmo Ele n o me pressionava me deixava vontade deixava que eu decidisse pra n o me influenciar Lu sa Encontramos nos depoimentos que essa situa o era de fato uma preocupa o mais para uns m dicos do que para outros Diante das coloca es fomos problematiz
27. gestacional ou ainda por medidas relativas a esta por m n o devida a causas acidentais ou incidentais OMS Classifica o Estat stica Internacional de Doen as e Problemas Relacionados Sa de 10 Revis o CBCD S o Paulo 1995 25 popula o basicamente de classe m dia ou pequena classe m dia um registro de 142 mortes para cada 100 mil nascidos vivos quando o coeficiente oficial era 3 5 vezes menor Mendes et al 2006 Dentro dessas estat sticas de mortalidade materna e ces rea tamb m encontramos mulheres com curso superior e que teoricamente t m mais acesso informa o e est o inseridas numa classe com maiores oportunidades Isso nos revela que os dados existentes t m obscurecido a realidade dessa trag dia Mendes et al 2006 No IV Encontro Internacional Mulher e Sa de em 1984 na Holanda com participa o de representantes brasileiras o dia 28 de maio foi institu do Dia Internacional de A o pela Sa de da Mulher Em 1988 foi lan ada neste mesmo dia 28 de maio a Campanha de Preven o da Mortalidade Materna coordenada pela Rede Mundial de Mulheres pelos Direitos Reprodutivos e pela Rede de Sa de das Mulheres Latino Americanas e Caribenhas com envolvimento tamb m da Rede Feminista de Sa de do Brasil Cunhary 2004 A luta dos movimentos feministas e de profissionais de sa de comprometidos em garantir os direitos humanos das mulheres trouxe o problema da mortalidade materna para ser
28. o com o profissional A acomoda o e resist ncia n o as liberta das armadilhas que as enredam porque n o podem remover as causas estruturais das contradi es As a es individuais ficam fragmentadas e isoladas enfraquecidas politicamente As transforma es que venham assegurar s mulheres o direito de escolha s vir o como resultado de movimentos coletivos No cen rio que aqui apresentamos que percorreu dos caminhos iniciais do parto at o momento em que puderam refletir sobre essa experi ncia nos deparamos com uma realidade que n o nica e nem acabada mas m ltipla e complexa A trajet ria do parto precisa ser melhor compreendida para que as mulheres possam exercer suas escolhas livremente a partir do reconhecimento dos direitos reprodutivos e assim recuperarem seu protagonismo no parto No pr ximo t pico apresentaremos brevemente como as mulheres das camadas m dias est o vivendo e se relacionando com o momento da maternidade e os aspectos ambivalentes e contradit rios que perpassam essa experi ncia 4 3 3 4 A maternidade e a contradi o entre as esferas produtiva e reprodutiva das mulheres das camadas m dias De acordo com o referencial adotado importante analisar a trajet ria percorrida da gravidez at o parto relacionando dialeticamente as interfaces que a ela est o interligadas Os dados nos revelaram que com exce o de uma todas as informantes planejaram sua gravidez e porta
29. pio que empreende uma a o contra a Banaliza o das Cesarianas no Brasil que as mulheres fizeram em 2006 uma den ncia ao Minist rio P blico sobre a ind stria de partos acusando os m dicos de corporativismo e a ANS de inefici ncia na regulamenta o e fiscaliza o do sistema de atendimento ao parto no setor de sa de suplementar Outros aspectos da ci ncia e da tecnologia est o tamb m envolvidos no com rcio do parto Como enfatiza Berman 1997 o conhecimento gera condi es de poder utilizando a ci ncia e a tecnologia como ferramenta para domina o controle e manuten o desse poder Essa quest o pode ser claramente visualizada atrav s do uso abusivo do diagn stico por imagem a ultra sonografia no per odo da gesta o O exame representado como uma condi o de seguran a e portanto muitas vezes solicitado pelas pr prias mulheres abre caminho para o controle m dico sobre os corpos gr vidos e pode terminar sendo usado como recurso para as interven es medicaliza es e mesmo para justificar e promover as ces reas O conhecimento dessa tecnologia est sob dom nio m dico que pode para sua conveni ncia decidir sobre os procedimentos sem levar em considera o a tica e sem entrar no m rito econ mico mercantil da quest o Esses mecanismos de domina o que ditam regras e controlam contribuem para a preserva o das normas e dos comportamentos dos sujeitos de uma soci
30. rio Outra seria a melhor organiza o empresarial que resulta do controle sobre as marca es pr vias das cesarianas Tudo regido pela l gica da produtividade onde mais partos em menor tempo significam maior lucro e mais comodidade Essa condi o atual desfavorece o interesse das mulheres que desejam ter seus filhos de PV Consegiientemente torna se muito dif cil processar os mecanismos para desconstru o dessa l gica no que se tornou hoje o mercado das ces reas Essa situa o torna se muito angustiante para as mulheres que t m uma expectativa sobre a escolha do parto e da maternidade e que muitas vezes n o conseguem realiz la Apesar da falta de estudos que investiguem a falta de vagas nas maternidades do setor de sa de suplementar podemos dizer que estamos diante de uma situa o em que o poder aquisitivo nem sempre corresponde a um bom atendimento Assim sendo poss vel supor que nem nas melhores maternidades 21 i P gi Se soi o o fordismo se caracteriza por ser um m todo de produ o em s rie Refere se a atividades automatizadas maquinais trabalho coisificante repetitivo 91 privadas assegurada a muitas mulheres uma experi ncia satisfat ria segura e tranquila no momento do parto A escolha do parto e a viol ncia do Rio de Janeiro A quest o da viol ncia no Rio de Janeiro e sua poss vel influ ncia sobre a escolha do parto foi problematizada com nossas informantes
31. serviram para desmotiv la a prosseguir com a sua expectativa Mesmo com as mulheres das camadas m dias o m dico parece reafirmar as diferen as de conhecimento que existe entre eles destituindo as de qualquer poder nesse contexto Segundo Boltanski 1989 mesmo que essa rela o seja uma rela o intraclasse as rela es de poder n o mudam Jaggar 1997 nos mostra que isso acontece porque ele carrega o saber da medicina o poder biom dico legitimado que leva as mulheres a aceitarem ou n o mesmo quando est o repletas de d vidas sobre sua conduta Como vemos no relato a seguir Eu sabia que o m dico que eu escolhi n o nenhum ideologista do parto normal faz at parto normal mas n o desses que tem bandeiras a favor Eu o escolhi tamb m por saber que qual fosse o tipo de parto ele faria bem ele traria meu nen m com sa de era isso que eu me preocupava Eu o escolhi porque confio nele como profissional o que ele o obstetra decidisse eu apoiaria Eu decidi que n o o pressionaria at por achar que isso causa uma animosidade nessa fase final da gravidez fica uma coisa meio esquisita e dependendo do m dico pode ser preocupante ent o n o legal Elis Pedimos a esta informante que nos explicitasse o significado de dependendo do m dico poderia ser preocupante Sua fala abaixo explicita claramente o quanto ela acata e respeita o saber poder m dico que assume ent o o papel de de
32. 1987 Chizzoti 1995 Essa metodologia representa uma colabora o potencial para as a es desenvolvidas na rea da sa de reprodutiva porque favorece a an lise dos significados e valores socialmente constru dos e de valores presentes relacionados s experi ncias das pr prias mulheres Promove assim a compreens o do imagin rio que alicer a tais comportamentos e pr ticas no universo da sa de da mulher proporcionando uma vis o ampla de todos os processos impl citos 36 Neste sentido esta pesquisa procurou desvendar o controvertido caminho entre o desejo de ter um parto vaginal expresso pelas mulheres ao longo da gesta o e o resultado do parto em uma cesariana Para tanto a metodologia qualitativa foi o alicerce para a interpreta o das representa es contidas neste paradoxo atual da assist ncia ao parto Do ponto de vista metodol gico a abordagem qualitativa que trabalha com a dimens o subjetiva tem como universo investigativo os significados os motivos as aspira es as cren as os valores e atitudes expressos atrav s da fala Minayo 1995 a compreens o e explica o da din mica das rela es sociais o que move portanto o processo de conhecimento no campo das Ci ncias Humanas tendo como pressuposto de acordo com Minayo 1996 que as Sociedades humanas existem num determinado espa o num determinado tempo que os grupos sociais que as constituem s o mut veis e que tudo institui
33. 1994 Onde e como se construiu o discurso de que a mulher deseja solicita e quer que o parto seja cir rgico Isso j uma ideologia introjetada Ou uma negocia o desigual entre mulheres e m dicos Ou de ambos Ser o elas as respons veis por essas mudan as na assist ncia ao parto que transformam ndices aceit veis de 15 pela OMS em taxas t o elevadas a ponto de serem caracterizados pela Sa de P blica como uma situa o epid mica Como parar essa engrenagem perversa que tem um c rculo vicioso que subtrai da mulher o direito de viver a experi ncia do nascimento pelo parto vaginal pondo em risco a sa de materna e fetal e sobrecarregando os recursos destinados ao sistema p blico de assist ncia sa de al m do aumento dos custos dos que pagam pelo sistema privado Esse complexo universo que envolve a mulher e a viv ncia da maternidade ainda abarca quest es tais como a rela o de confiabilidade entre a mulher e o obstetra na decis o pelo tipo de parto que ela deseja O profissional deveria respeitar a escolha da gestante salvo em situa es de risco gestacional A realiza o da cesariana passa a ser a justificativa do m dico para aliviar o sofrimento vivido pela parturiente durante o processo do parto Promove se ent o a interven o para encurtar esse caminho Souza 1994 Voloshko 1996 Dias 2001 A falta de estudos sobre a quest o das cesarianas nas camadas m dias n o poss
34. A an lise dos dados o grande desafio de navegar no mar de dados A an lise qualitativa dos dados de uma pesquisa um processo din mico que permite um aprofundamento da quest o pesquisada permitindo uma reflex o centrada no objeto de estudo No entanto apesar do m todo qualitativo fornecer dados muitos significativos e densos a an lise dos dados um processo complexo Cardoso 1986 Becker 1997 Brand o 2000 O desenho da pesquisa gerou uma grande quantidade de dados captados nas falas durante os depoimentos das mulheres protagonistas desse processo Essa etapa foi sem d vida a de maior dificuldade em todo o desenvolvimento da pesquisa Priorizamos para construir o arcabou o dessa an lise a estrutura o dos dados que tiveram mais relev ncia dentro do contexto da pesquisa Constru mos o elenco de id ias chaves que d o par metro an lise e discuss o dos depoimentos agrupando os em 4 n cleos centrais A constru o da escolha O parto vaginal as dificuldades para manter a escolha A disson ncia entre a escolha e o desfecho do parto e A maternidade e a contradi o entre as esferas produtiva e reprodutiva das mulheres das camadas m dias Cada um desses n cleos centrais foi desdobrado e aprofundado em diversos subtemas de acordo com sua relev ncia para a compreens o das quest es investigadas 4 3 3 1 A constru o da escolha do parto Neste tema buscamos explor
35. Ah Eu me senti na hora a pior das mulheres Eu trabalhava na minha cabe a da 8 a 40 semana que seria por parto normal Minha decep o toda era que eu queria parto normal Quando eu penso fico triste eu pensava na hora eu me senti uma pessoa in til C lia Me sinto envergonhada em primeiro lugar frustrada e com certeza de que n o quero repetir isso fazer outra ces rea desnecess ria E que eu posso e sempre fiz o que eu quis da minha vida e nesse momento que eu considero o mais importante da minha vida eu n o consegui dominar Ent o foi minha culpa Em primeiro lugar de n o ter batido o p naquela hora Eu fiquei o tempo todo igual a uma idiota N o consegui ter for as pra negociar foi imposta a decis o dela da m dica uma situa o desigual Eu n o vi minha filha saindo de dentro de mim Regina Para mim foi uma frustra o n o ter sido atendida na minha vontade o mesmo que querer fazer alguma coisa e ser tolhida daquilo Ter que aceitar ser atendida apenas em uma pr xima oportunidade Mas se n o houver essa pr xima oportunidade Foi uma frustra o muito grande pois eu queria muito o parto normal bvio que eu n o vou deixar de amar meu filho por isso mas pra mim mulher foi muito frustrante Na hora bateu aquela tristeza de saber que a minha vontade n o iria se concretizar Nat lia N o poss vel n o d n o justo Porque que eu me achava menos mulhe
36. Catete 16 03 2007 Essa busca pelo parto normal tem levado as mulheres das camadas m dias da popula o ao extremo de buscar no atendimento particular provavelmente a um alto custo financeiro a garantia da realiza o dessa escolha e de atender assim essa expectativa mesmo possuindo plano de sa de privado Durante a pesquisa observamos em visitas aos sites e comunidades de parto humanizado e tamb m em conversas com enfermeiras parteiras que Mg arg o m dico do obstetra que faz parto normal 56 existe um aumento na procura por partos mais naturais e com menos interven o poss vel pelas mulheres das camadas m dia e alta E esse mercado naturalista tem seu pre o Pelo que pudemos colher de informa es a esse respeito advinda de profissionais que atuam nesse campo e de gestantes que tamb m procuram por esses profissionais pouqu ssimos m dicos que seguem essa linha humanizada de assist ncia ao parto atendem pelos planos privados de sa de Ou seja isso s acess vel para as mulheres que possuem um poder aquisitivo consider vel e que podem ter ent o seu desejo atendido Procurei um obstetra vaginalista e tou pagando tudo particular j que a m dica n o tem plano nenhum s as despesas da maternidade que t o cobertas pelo meu plano Grupo G vea 27 02 2007 No Grupo Catete tamb m pude ouvir relatos interessantes de mulheres que tiveram experi ncias positivas nos seus partos A maioria delas
37. E et al Qualidade da aten o ao parto em maternidades do Rio de Janeiro Rev Sa de P blica vol 39 no 4 S o Paulo Aug 2005 113 OSAVA R H MAMEDE M V A assist ncia ao parto ontem e hoje a representa o social do parto Jornal Brasileiro de Ginecologia Rio de Janeiro v 105 n 1 2 p 3 9 1995 114 OSAVA R H Estudo das representa es sociais do parto entre enfermeiras de maternidade do munic pio paulista Ribeir o Preto Universidade de S o Paulo Escola de Enfermagem de Ribeir o Preto 1990 113 f 115 OSIS MJ D et al A laqueadura tub ria nos servi os de sa de do Estado de S o Paulo Revista de Ginecologia e Obstetricia de S o Paulo 1991 1 195 204 116 OSIS M J D Laqueadura e Representa es Acerca da Sexualidade e do Papel Reprodutivo Tese de Doutorado S o Paulo Faculdade de Sa de P blica Universidade de S o Paulo 2001 179 117 PAM H H S 1998 Marcas no corpo Gravidez e maternidade em grupos populares In Doen a Sofrimento Perturba o Perspectivas Etnogr ficas L F D Duarte amp O F Leal org pp 31 47 Rio de Janeiro Editora Fiocruz 118 PEDROSA M Aten o integral sa de da mulher desafios para implementa o na pr tica assistencial Rev Bras Med Fam e Com Rio de Janeiro v 1 n 3 out dez 2005 119 PINOTTI J A FA NDES A As distor es da cesariana Revista Paulista de Medicina 1988 4 5 6 79 84 120 POTTER J E et al Unwanted caesar
38. E provavelmente essas mulheres deixaram de realizar o seu desejo por uma poss vel inabilidade dos obstetras de esperar o acontecimento natural Segundo Hopkins 2000 a mudan a do tipo de parto eleito pelas mulheres parece estar moldada pela conduta intervencionista do m dico portanto mesmo que a mulher deseje o PV as chances dela n o conseguir s o grandes Em um dos relatos foi percept vel o passo a passo da transforma o do processo natural do trabalho de parto num processo patol gico a partir da medicaliza o A decep o e a insatisfa o com essa experi ncia ficaram ressaltadas e marcadas em seu discurso que destacamos abaixo X geralmente acontece pelo mau posicionamento do beb 147 Eu tava sentindo uma contra o muito leve n o do a Quando ele o obstetra chegou viu que estava ainda com 1 cm de dilata o que em duas horas n o tinha evolu do nada Eu tava me sentindo tima eu tava muito feliz tava muito trangiiila Ele disse Bom acho melhor botar voc no soro pra poder ser mais r pido estimular um soro bem fraquinho Eu sabia que era a tal da ocitocina mas eu achei bom n o tava rolando nada ent o eu tava precisando de um est mulo e a eu aceitei aquilo como um est mulo maior Fui pra sala de pr parto e as pessoas vinham e come avam A que horas vai ser a opera o N o vai ter opera o nenhuma Tavam me tratando como uma doente e eu n o tava me sentindo uma doent
39. Ele fant stico Karina Eu sempre perguntava ao obstetra se estava tudo bem se tava caminhando bem se o nen m tava virado na posi o cef lica entrando na posi o Fiz uma ultra sonografia e o cord o umbilical n o tava enrolado no pesco o n o tava nada A a gente foi assim falando tirando as d vidas vamos continuar esperando Eu achei meu pr natal muito bom ele o obstetra me deu seguran a foi afetivo Em nenhum momento do pr natal eu achei que ele o obstetra n o fosse cumprir n o tive esse receio eu achei que se eu pudesse mesmo fazer o parto normal ele o obstetra ia fazer tinha confian a nele o obstetra Vit ria m dicos encontramos relatos que demonstraram uma total confian a no obstetra e na decis o Nossas entrevistadas pertencendo aos segmentos m dios da popula o supostamente teriam mais condi es de escolher mudar de m dico buscar outras op es nos seus planos de sa de quando comparadas s mulheres das camadas populares para as quais o direito a 2 escolha nem considerado Mas como j discutido anteriormente essa possibilidade de S a posi o do beb mais favor vel para o parto vaginal onde a apresenta o da cabe a do beb se insinua no canal de parto primeiro 115 buscar nos conv nios refer ncias seguras que possam garantir a realiza o do seu desejo est muito aqu m dos seus anseios e possibilidades Mesmo aquelas informantes qu
40. P s gradua o agronomia do lar por op o no momento 6 Vit ria P s gradua o administra o com rcio exterior 7 Dora P s gradua o direito advogada 8 Nat lia 3 grau incompleto contabilidade assistente administrativa 9 Rita 3 grau completo medicina m dica 10 Lu sa P s gradua o direito advogada 11 Karina P s gradua o direito advogada 12 T nia P s gradua o enfermagem obst trica auditora hospitalar 13 Joana P s gradua o pedagogia professora 14 Elis P s gradua o comunica o social comerciaria 15 Carla 3 grau completo comunica o social produ o de TV Todas as entrevistadas tinham 68 n vel universit rio e a maioria p s gradua o caracter sticos das camadas m dias que valorizam e buscam no aperfei oamento profissional maiores chances para competir no mercado de trabalho O quadro acima mostra o que j se verificou em outras pesquisas BEMFAM 1996 MS ANS 2004 quanto maior o n vel de escolaridade da mulher maior chance do desfecho da gesta o ser uma cesariana Apenas uma das entrevistadas exercia atividade profissional diferente da sua rea de forma o Aquelas que por op o n o estavam trabalhando demonstraram a ambival ncia entre poder estar curtindo o momento da maternidade sem ter que dividi lo com as responsabilidades do trabalho e a frustra o de n o estar produzindo j que haviam estudado e se preparado para i
41. Rattner 1996 sobre a exist ncia de uma cultura medicalizada da sa de da mulher no Brasil O depoimento expressa uma vis o cr tica dessa situa o 121 Para o m dico que est acostumado a fazer cirurgias mais complexas o que uma ces rea Corta no local retira o nen m costura de novo Uma cirurgia que ao todo leva uns 40 minutos s o 10 minutos pra retirar o beb e 30 minutos pra costurar a mulher Eles d o uma overdose de antibi ticos e anti inflamat rios uma bomba que n o sei como isso n o faz mal pro nen m j que vai pro leite Elis Outra situa o inusitada foi pontuada por uma das entrevistadas e merece ser relatada Ela aborda a forma naturalizada e introjetada que os funcion rios das maternidades privadas se relacionam com a cesariana como revelado a seguir Chegamos l na maternidade e fomos preencher a ficha de interna o Aquilo parece um hotel voc se instala num quarto igual a um hotel a entram as pessoas Que horas vai ser a cirurgia Ai o M companheiro respondeu N o vai ser cirurgia vai ser um parto E a de novo Que horas vai ser a cirurgia Vai ser partoooo Marta necess rio potencializar essa discuss o numa perspectiva mais cr tica para entender o papel das institui es de sa de do sistema suplementar no que se refere aos direitos reprodutivos das mulheres atendidas nesse setor Nos parece que atualmente importante man
42. UNICAMP Pelos ricos ensinamentos Secretaria Municipal de Sa de do Rio de Janeiro SMS que desde 1998 possibilitou o desenvolvimento do meu trabalho com gestantes parturientes e pu rperas da rede Ao Dr Marcos Augusto Bastos Dias por ter aberto as portas da Maternidade Leila Diniz em 1998 para a realiza o da minha pesquisa o que possibilitou o come o de inesquec veis experi ncias que enriqueceram de forma inigual vel minha trajet ria profissional Pelo apoio incentivo e reconhecimento do meu trabalho que sem os quais n o teria alcan ado tantas conquistas N o tenho palavras suficientes de agradecimento em especial por ser o respons vel pela primeira oportunidade de integra o aos quadros da SMS querida amiga Rosa Maria Rosinha Domingues pelo privil gio de poder compartilhar de sua amizade pela conviv ncia em momentos t o especiais como as gesta es da Gabi e do Rafa e principalmente pelo apoio em momentos dif ceis profissionais e pessoais E acima de tudo por ser incentivadora das minhas potencialidades e por ter sempre divulgado com boas propagandas o meu trabalho minha eterna gratid o e admira o Maternidade Leila Diniz e todos com que tive o prazer e o privil gio de compartilhar e conviver que me receberam de abra os abertos para integrar a equipe profissional sem que eu professora de Educa o F sica me sentisse uma estranha no ninho pelo apoio ao meu trabalho N o
43. accomplished Through the data we could observe how the gender aspects are interlinked to the prenatal assistance to the birth and to the outcome in a caesarean section The results show that the private health care users are dangerously accepting the medicalization in the birth process an existence of a interference by the obstetrician over the woman which could induce her to change her delivery s choice the unbalance between what women really desire and what in fact happens a caesarean section In a critique review it seems to us that many women are unable to escape from the traps of the biomedical model legitimized by society Therefore this study proposes a reflection about the importance of the women s autonomy and protagonism in the birth event Our research explored a field which was very few studied before and thus we intended to collaborate with initiatives that encourage the feminine participation in the decisive processes that concern the reproductive health Moreover it defends the preservation of the birth s experience as a undeniable women s right as well as her partners and family s Key words woman gender reproductive rights pregnancy birth caesarean section SUM RIO RESUMO CAP TULO I O OBJETO DA PESQUISA l Introdu o 2 1 1 Apresenta o 2 12 O problema da pesquis
44. adeptos ao PV que n o est o credenciados aos planos poderiam ter maiores chances para a realiza o do seu desejo Sei que tem m dicos que privilegiam essa pr tica do parto normal de um parto mais humanizado que respeitam o tempo essas coisas como no parto em casa por exemplo Mas j ouvi falar que muito caro ter esse tipo de parto porque ele muito valorizado Carla se voc puder escolher um desses m dicos que seja mais para o parto normal que segue essa linha super que realmente gosta de fazer eu sei que tem m dicos que s o mais voltados ao parto normal a gente ela e o marido assistiu uma palestra com um m dico que voc via que dificilmente voc teria uma ces rea Dora Diante da inviabilidade desse caminho para a realiza o de um PV particular elas procuraram por obstetras dos conv nios que se declararam a favor do parto vaginal e que se comprometeram j na primeira consulta a realiz lo Mas ao longo da gravidez algumas de nossas informantes perceberam que n o bastava apenas o compromisso assumido era necess rio um envolvimento do obstetra com esse desejo acreditando que era importante para 105 a mulher realiz lo Uma delas percebeu que um ponto sens vel para a conquista do PV era a motiva o do obstetra como expressou a seguir Para uma mulher ter um parto normal o m dico tamb m tem que querer isso muito importante o m dico tem
45. ao pr natal do Hospital Universit rio Pedro Emesto HUPE Todas essas experi ncias enriqueceram me pessoal e profissionalmente Permaneci tr s anos como volunt ria na MLD A partir de ent o aconteceram outros desdobramentos da minha atua o dentro da SMS o que representou para mim o reconhecimento do meu trabalho 1 Srana EEA En de ERR O conceito de humaniza o do parto segundo o Minist rio da Sa de pode ser bastante diversificado envolvendo n o s o conhecimento cient fico mas pr ticas e atitudes que proporcionem gestante parturiente procedimentos comprovadamente ben ficos evitando interven es desnecess rias e preservando sua autonomia e privacidade valorizando a mulher como protagonista MS 2001 Ao longo dessa trajet ria houve o despertar do meu interesse em produzir trabalhos cient ficos em v rias reas relacionadas participa o feminina no processo da gravidez parto e puerp rio Toda esta produ o contribuiu significativamente para a divulga o do meu trabalho e para ampliar o olhar cr tico sobre a problem tica proveniente de um controvertido modelo de assist ncia perinatal praticado at os dias de hoje Desde 2001 estou vinculada SMS multiplicando o meu trabalho em diversas unidades junto s gestantes parturientes e pu rperas e na capacita o e atualiza o dos profissionais da rede Todo esse caminho percorrido com as mulheres foi um aprendizado inquestion v
46. argumentou que ficou decepcionada com a radicalidade do m dico sobre o PV logo no primeiro encontro O que fez com que ela refletisse sobre o que aconteceu com a amiga que o indicou que tentou tamb m o PV e n o conseguiu terminando numa ces rea Segundo nossa entrevistada Ele devia ser mesmo cesarista interessante observar que ela n o demonstrou nenhuma indigna o com essa situa o o que reflete uma bem sucedida naturaliza o da ces rea 107 Indagada sobre essa experi ncia ela relatou que realmente foi desagrad vel mas assim ele n o alimentou minha esperan a Neste caso a franqueza mesmo que dura bem vinda Diante desse depoimento tentamos olhar criticamente o comportamento desses profissionais ao descartarem para as gestantes a possibilidade de um PV pelo fato de n o quererem faz lo e ao mesmo tempo refletir sobre uma cirurgia sem uma real indica o pautada na conveni ncia e n o na necessidade m dica No mundo dos absurdos nos perguntamos n o iludir a mulher seria menos agravante do que prometer e n o cumprir Na quest o de uma poss vel mudan a de obstetra caso n o houvesse identifica o ou mesmo uma suspeita de que o desejo pelo PV n o seria respeitado percebemos nos depoimentos que n o era um processo t o f cil mesmo quando havia consci ncia de que era um direito da mulher procurar pelo profissional que lhe inspirasse confian a Como foi identificado na
47. claro nas necessidades normais mamar cuidar dele dar banho essas coisas que m e tem que fazer mas quando eu voltar a trabalhar e juntar tudo sei que a cobran a e a press o v o ser muito grande J espero por isso Nat lia O que os dados nos mostraram que apesar de toda a fachada das conquistas dos direitos das mulheres elas continuam aprisionadas nas ideologias de g nero que n o 167 permitem que as mulheres tenham espa o de liberdade para serem o que quiserem ser Inclusive alternarem seus pap is em alguns momentos da vida quando se deseja ser produtiva profissional e em outros ser m e e se dedicar aos filhos E ainda poderem quando desejam retornar ao mercado de trabalho retomar a profiss o investir na carreira De uma certa forma as mulheres parecem estar ainda presas s demandas da esfera familiar expressando uma liberdade muito relativa por m acreditando que j se libertaram CAP TULO V Considera es Finais Esta pesquisa que se prop s investigar um campo ainda pouco explorado cumpriu a nosso ver seu objetivo fundamental qual seja expor visibilizar as percep es experi ncias e a an lise cr tica de mulheres de camadas m dias sobre a quest o do parto e identificar novos problemas de pesquisa que podem e devem ser investigados posteriormente Conhecer o universo de vida deste segmento social t o pouco pesquisado se mostrou uma escolha acertada
48. comecei a descobrir que os partos particulares eram R 7 000 00 um parto se voc for pagar esse pre o e eu n o queria pagar tinha um plano s que a cobertura n o era boa At que eu fiz um plano um ano antes exatamente porque eu pensava que em algum momento pr ximo eu ia ter filho ent o e eu nunca tinha usado meu plano a primeira vez foi no exame de gravidez essa coisa plano de sa de meio chantagista que a gente tem que ter Hoje ter um filho n o barato mesmo com um plano de sa de e mesmo tendo uma fam lia que ajuda Marta Essa preocupa o nos parece ser inerente s camadas m dias que provavelmente s o a maior clientela consumidora da sa de suplementar A corrida para a aquisi o de um plano de sa de est certamente relacionada percep o da crise dos servi os p blicos de sa de tornando se necess rio para quem pode pagar possuir um plano de sa de privado Essa situa o refor a a condi o atual desse setor que se aproveita da fal ncia do sistema p blico pelo qual o Movimento Sanit rio tanto lutou Pode se ainda perceber no depoimento acima que existe uma consci ncia por parte da entrevistada que um filho representa uma demanda financeira que tem impacto no or amento e organiza o familiares Assim sendo pode se dizer que a medicina se mercantilizou utilizando entre outras estrat gias da naturaliza o ideol gica de determinadas quest es
49. como acontece hoje com a ces rea Segundo Castro 1992 os pr conceitos est o t o introjetados na sociedade que n o s o mais questionados s o aceitos simplesmente porque a ci ncia sabe o que melhor Como vemos na fala a seguir Minha prima que faz medicina mesmo disse que a ci ncia evoluiu pra voc n o sofrer muito Ela disse Pra qu voc vai sofrer podendo n o sofrer Faz cesariana Flora 26 Cf Costa e Aquino 2000 e Sim es Barbosa 2001 117 Como percebemos esse pr conceito est inserido de forma muito contundente n o s social e culturalmente mas tamb m na pr pria forma o m dica que prepara os profissionais que estar o atuando no mercado futuro com a id ia distorcida que uma cirurgia melhor do que o processo fisiol gico Os depoimentos abaixo retratam os caminhos da assist ncia obst trica no setor privado Com certeza o cord o umbilical enrolado no pesco o foi uma justificativa que facilitou muito Ele o obstetra queria muito que fosse ces rea foi o que eu percebi inclusive pelo hor rio Ele disse Vamos marcar essa ces rea ter a ou quarta feira noite depois do hor rio do meu consult rio Nat lia A que ponto chegamos Eu tenho uma amiga que eu pensei com certeza que ela ia querer o parto normal Liguei pra ela e fui falar do parto e ela me responde Ah Dora n o o meu m dico ele foi sincero comigo ele falou desde o
50. como um poderoso argumento m dico para a marca o da cirurgia antes que as mulheres entrassem em trabalho de parto usado como justificativa da garantia de vaga Como revelado a press o era trabalhada sobre o medo de n o terem onde parir Outro ponto relevante que apontamos foi a preocupa o com a viol ncia na cidade e a possibilidade do parto ocorrer em hor rios noturnos reconhecidamente os mais perigosos tanto pelos m dicos como pelas informantes No entanto nossas entrevistadas afirmaram que apesar das preocupa es n o se deixaram influenciar negativamente pela argumenta o m dica a ponto de mudarem a sua escolha Notamos que algumas entrevistadas expressaram preocupa o e d vidas sobre se a ces rea realizada definiria uma nova indica o cir rgica para um pr ximo parto Os relatos mostraram que essa necessidade foi confirmada por alguns dos m dicos como uma conduta obst trica vulnerabilizando assim as chances futuras de escolha da mulher Por sua vez outras relataram que atrav s de informa es tinham desconstru do o mito de uma vez ces rea sempre ces rea demonstrando conhecimento de que uma ces rea pr via nem sempre ser um impedimento para um PV 169 O medo da dor n o foi um ponto sens vel apontado nos relatos nem uma refer ncia impeditiva para o PV As informantes eram conscientes de que teriam que passar pela dor j que desejavam o PV No entanto mostraram que apesa
51. de cesarianas e dar visibilidade s quest es sobre a sa de reprodutiva na perspectiva das mulheres obscurecidas por conceitos pr estabelecidos do modelo atual de assist ncia ao parto Esta pesquisa pretende ainda oportunizar uma reflex o sobre a necessidade de mudan as na assist ncia ao parto e a desconstru o do mito de que as mulheres desejam cesariana que envolve a escolha das mulheres de camadas m dias sobre o tipo de parto 10 CAP TULO II CONTEXTUALIZA O 2 O PREOCUPANTE CEN RIO DA CESARIANA 2 1 Uma revis o bibliogr fica sobre a quest o ces rea Segundo alguns estudos melhores condi es s cio econ micas est o associadas determinada preval ncia na escolha do tipo de parto Barros et al 1991 Jonas et al 1992 Segundo Osava 1990 as representa es do parto s o estruturadas pelos sujeitos de acordo com a classe social das mulheres Para as mulheres das classes populares o parto estaria mais relacionado a um ato instintivo enquanto para as mulheres das classes mais elevadas a um ato cultural O parto vaginal estaria fortemente associado id ia de imprevisibilidade re significado como um processo fisiologicamente perigoso A cesariana ao contr rio estaria associada predominantemente id ia de seguran a simbolizada pelo avan o cient fico e pela evolu o das t cnicas cir rgicas Na d cada de 70 as taxas de cesariana come aram a apresentar uma acelera o progressiv
52. de culpa por n o terem conseguido experienciar o processo da parturi o tal como haviam desejado planejado A sensa o de impot ncia para enfrentar as rela es desiguais com seus obstetras especialmente em um momento t o delicado e as incertezas de n o terem sido corajosas o suficiente de n o terem batido o p como disse uma delas contra a decis o comunicada mexem com a auto estima e confian a em si pr prias o que nos parece pode deixar marcas por muito tempo Sobre os desvios entre o que era desejado para o efetivamente realizado Tornquist 2002 que nos fala da dimens o simb lica do parto na experi ncia feminina tamb m nos alerta sobre o momento vivido pelas mulheres na parturi o pontuando que Embora essa mulher moderna seja vista agora como sujeito de suas escolhas inclusive a maternidade ela novamente se v diante de prescri es ditadas por saberes cient ficos que a far o escolher o que o melhor para o beb e de uma celebra o do parto ideal este n o raro muito distante do campo de escolha e de possibilidade de boa parte das mulheres que d o luz p 490 Por m nem todas as mulheres reagem da mesma forma a esta situa o Uma outra parte do grupo entrevistado seis relatou ter absorvido satisfatoriamente a n o realiza o do PV Esses depoimentos desvelaram que o mais importante para elas foi poder confiar na decis o do m dico e dessa forma por terem
53. de problemas para os beb s caso esperassem mais No entanto deixamos aqui registrado que apesar das justificativas para a cesariana estarem pautadas na necessidade de evitar riscos para os beb s os dois casos puderam esperar 48 horas para o procedimento 100 sendo que um deles foi marcado na v spera de um feriado Ou seja eram ces reas de emerg ncia que puderam aguardar dois dias para serem realizadas Al m da conveni ncia m dica de usar a v spera de um feriado como relatou com naturalidade a informante Ah ele o obstetra resolveu marcar noite na v spera do feriado porque era melhor pra todo mundo No dia seguinte n o tinha trabalho e ele podia me dar alta com trangiiilidade sem ter a correria do consult rio Dava at pra acordar mais tarde risos Inclusive ele ia fazer outra ces rea nesse dia antes da minha Alice Segundo Farganis 1997 a forma dissociada como observamos os fen menos naturais e sociais nos leva a uma vis o fragmentada que favorece n o s a perda do senso cr tico como a nossa aliena o Ou seja para as informantes o fato isolado da indica o da cesariana no momento que ocorreu estava associado apenas necessidade de garantir uma finaliza o satisfat ria do parto para o beb A situa o do feriado e as outras quest es que estavam circundantes ao momento n o foram avaliadas por elas Como percebemos para algumas o questionamento permanece para outras a d vid
54. decidir que seria melhor a ces rea devido ao cord o Nat lia No relato percebemos que ela conseguia identificar os primeiros sinais corporais do in cio do trabalho de parto como a contra o sentindo o movimento da barriga dura e solta que indica que estaria chegando a hora do nascimento E o corpo sinalizando o in cio do processo sendo que esta mulher foi capaz de captar e compreender a mensagem Estimulamos ent o a prosseguir no seu discurso sobre seu conceito dessas rela es de poder problematizando essa negocia o desigual Ela ent o prosseguiu Na maternidade quando eu tava esperando o parto eu s pensei nele beb n o passou mais pela minha cabe a querer prosseguir ou n o em fazer parto normal Acho que foi o nico momento em que n o pensei no parto normal pesa muito voc pensa ele t na profiss o durante anos faz isso o tempo todo do que ele vive e eu O que eu tenho de experi ncia s leitura s depoimentos e se esses depoimentos n o forem verdadeiros a experi ncia dele o fato dele saber tudo isso pesa Nat lia Sua fala nos exp e as rela es de poder desiguais entre a mulher e seu obstetra Na falta do conhecimento necess rio para contestar a necessidade da indica o da cirurgia s lhe restou aceitar a decis o acreditando estar fazendo o melhor para seu filho A ces rea pelo que mostraram os diversos estudos j apresentados p
55. do movimento de mulheres elaborou o Programa de Assist ncia Integral Sa de da Mulher PAISM marcando sobretudo uma ruptura conceitual com os princ pios norteadores da pol tica materno infantil que ainda orientava a assist ncia sa de das mulheres e os crit rios para elei o de prioridades neste campo MS 1983 20 A cria o do PAISM em 1983 como pol tica nacional no contexto da Reforma Sanit ria teve participa o do Movimento Feminista Brasileiro O movimento de mulheres esteve presente na elabora o das diretrizes do PAISM incorporando concep es de a es educativas atrav s do processo participativo e dial gico que trabalhasse as quest es do corpo e da sexualidade nas dimens es sociais culturais e ideol gicas Costa e Aquino 2000 Sim es Barbosa 2001 Esse programa voltado para as mulheres em todo seu ciclo vital foi considerado um marco hist rico nas pol ticas p blicas O PAISM considerado um dos programas mais abrangentes e conceitualmente avan ados do mundo Costa e Aquino 2000 Sim es Barbosa 2001 A problem tica da assist ncia ao parto apesar do PAISM ainda era um n na rea da sa de da mulher Essa quest o mobilizou o Minist rio da Sa de a implantar um conjunto de a es que constitu ram o Programa de Humaniza o no Pr natal e N ascimento PHPN As caracter sticas principais do programa s o a integralidade da assist ncia obst trica e a afirma o
56. e emocionalmente durante o trabalho de parto como vemos a seguir no fundo eu tava lutando contra a vontade que no fundo eu senti que o M companheiro tinha uma vontade de ter uma cesariana porque n o tava gostando de me ver sofrer ele n o tava preparado praquilo e ele n o tinha como me ajudar e ele se sentiu impotente Ele ficou no canto jogando joguinho de celular hist rico tipo sabe muito tenso no canto ent o eu n o olhava pra ele muito mas ele n o me ajudava em nada quando ele vinha me encostar na hora das contra es eu falava Sai por favor me deixa quieta Marta Apreendemos desses relatos que os mitos sobre o PV n o fazem parte apenas do universo feminino A cristaliza o social e cultural da cesariana parece afetar os homens que demonstram ter os mesmos medos que as mulheres O medo da dor do sofrimento a imprevisibilidade e os poss veis perigos a que estariam expostas fez com que usassem das armas a press o para faz las desistir tendo tamb m introjetado os mesmos conceitos valorativos sobre a ces rea Durante a gesta o a press o exercida pelos companheiros configurou de certa forma uma influ ncia desfavor vel para suas companheiras Em ambas as situa es os companheiros estiveram presentes no momento da ces rea sendo que a grande maioria acompanhou o pr natal de suas mulheres com raras exce es que envolviam concilia o de hor rios de t
57. engravidassem outra vez Como nos relatos a seguir Se eu tiver outro filho eu quero ter com o Dr L e com a mesma equipe Mas eu acho que terei mais trangiiilidade para conversar com ele Quando chegar na 40 eu posso falar Dr L ser que n o d para esperar mais uns dias A n s j nos conhecemos e vai ser mais f cil negociar Eu escolhi o meu m dico porque eu sabia que qualquer que fosse o parto ele faria bem feito Na verdade voc planeja mas s depois voc saber o que vai ser Elis Ah eu quero com certeza permanecer com o mesmo obstetra Eu gosto muito dele ele atendeu todas as minhas expectativas embora se mostrasse muito favor vel ao parto ces reo mas em momento algum ele disse Olhe eu n o quero o parto normal porque eu n o fa o Ele nunca me abandonou s porque eu insistia em querer ter o parto normal Nat lia A informante acima manifesta uma atitude de acomoda o pois mesmo reconhecendo que o m dico tendia mais para a ces rea e mesmo desejando novamente tentar o PV prefere mant lo como obstetra Problematizamos com ela se a perman ncia do mesmo obstetra numa nova gravidez aumentariam as chances de mais uma ces rea ao que ela respondeu Correr o risco de uma nova ces rea com certeza eu vou correr Eu tenho plena consci ncia de que para o pr prio obstetra mais c modo fazer ces rea mas para voc colocar uma crian a no mundo voc tem que ter um profissio
58. ent o eu voltava a conversar Na hora da contra o ele mostrava que estava ali comigo Quando ela a obstetra disse que n o ia dar mais ia ser ces rea eu fiquei desesperada ele desceu comigo para o centro cir rgico e ele disse Olhe mulher voc est de parab ns voc foi uma guerreira s que n o deu C lia Nas falas acima observamos que os companheiros que apoiaram desde o in cio suas mulheres constitu ram uma influ ncia positiva para elas em todos os momentos Segundo elas quando seus parceiros souberam que o parto seria por ces rea apesar da preocupa o com o procedimento cir rgico pareciam enfrentar o inesperado significando a ces rea como seguran a da mulher e do filho Para aquelas que chegaram a entrar em trabalho de parto os companheiros se mostraram presentes e participaram como lhes foi permitido tentando ajud las a passarem da melhor maneira poss vel pelos desconfortos das contra es No caso em que as mulheres chegaram a ter uma evolu o significativa da dilata o chegando perto da realiza o do PV sem d vida a presen a do companheiro foi 130 fundamental segundo os depoimentos Num desses casos o companheiro foi alijado do processo final sendo impedido de entrar na sala de parto separando se da mulher num momento important ssimo para a experi ncia conjugal com a justificativa de n o agiientaria e ficaria nervoso com a cirurgia No nosso entendimento esse ges
59. entre a recupera o mais f cil e r pida ap s o nascimento facilitando os cuidados com o rec m nato at a percep o do PV como um evento ligado natureza sendo portanto uma importante experi ncia feminina a ser vivida Em contrapartida a essa naturalidade constatou se uma preocupante aceita o da medicaliza o e das interven es realizadas percebidas pelas informantes como necess rias ou inevit veis Como os dados revelaram as consultas de pr natal foram um espa o de constru o de uma rela o de confian a com o m dico o que paradoxalmente foi determinante para a aceita o da indica o da ces rea Mesmo assim surgiram em alguns discursos algumas incertezas sobre a conduta profissional em rela o ao modo de realiza o do parto Outro aspecto importante que emergiu da pesquisa foi a utiliza o do mito da circular de cord o para justificar a indica o da cesariana Os medos maternos Souza 1994 e 2002 trabalhados no sentido de evidenciar uma probabilidade de risco para o beb parecem representar ainda uma forma coercitiva para pressionar as mulheres a aceitarem a mudan a do tipo de parto Vale ressaltar que na sociedade contempor nea t m surgido novas situa es que se agregam aos antigos mitos usados como justificativas para as mulheres desistirem do PV Um deles a falta de vagas nas maternidades privadas Essa quest o foi detectada em quase todos os discursos
60. essa bola toda Eu acho que por conta da superlota o Lu sa 20 hi PEE Usaremos para as maternidades citadas letras como c digos no sentido de preservar a identidade das mesmas 89 Portanto percebemos a relev ncia da dificuldade de acesso s maternidades privadas para as mulheres das camadas m dias e que possuem um plano de sa de podendo esse fato estar interferindo na escolha do tipo de parto eleito por elas O contra senso dessa quest o que assistimos no setor privado o mesmo dilema que tanto aflige as mulheres das camadas populares e que dependem do servi o p blico para terem seus filhos Isso uma ironia para quem paga muito por um plano de sa de justamente para ter a garantia de um bom atendimento Menezes et al 2006 Isso se transforma no que foi chamado de parto viajado como referencia peregrina o porque passam as mulheres das classes menos favorecidas em busca de uma vaga para terem seus filhos em maternidades p blicas Nesse sentido os depoimentos nos mostraram que elas s conseguem agendar uma vaga nas maternidades privadas se forem fazer uma ces rea Por m para quem deseja ter PV n o existe essa possibilidade de agendamento Essa perspectiva da falta de vaga de n o terem certeza se no momento do trabalho de parto conseguir o a interna o as deixa muito inseguras Esse fato passou a ser uma preocupa o a mais durante a gravidez Eu sei que na X tem um pro
61. favorecer ao obstetra a justificativa para a cirurgia e sem complica es no transcorrer do trabalho de parto 5 assistidas no parto pelo obstetra que acompanhou o pr natal para se poder avaliar a rela o entre a mulher e o obstetra 6 que tenham sido assistidas por obstetras e maternidades do setor privado de sa de O recorte de tempo entre a ces rea e a entrevista foi por n s considerada uma quest o metodologicamente importante Segundo Donati et al 2003 a avalia o sobre a motiva o que as mulheres manifestaram durante a gravidez comparada ao momento do puerp rio pode apresentar distor es o que impediria uma an lise adequada dos resultados Essas avalia es estariam sujeitas s influ ncias do parto efetivamente realizado e n o ao parto escolhido Sobre essa quest o tamb m nos alerta Cury e Menezes 2006 O intervalo interpartal pode influenciar esse tipo de registro Quanto mais longo o intervalo maior o risco de classifica o incorreta do evento p 229 Apesar de muitas que frequentavam as reuni es das AP terem vivenciado a cesariana como via de parto a maioria n o se encaixava no perfil definido Isso ocorria porque as indica es das cirurgias estavam relacionadas a justificativas m dicas de complica o obst trica ou de risco para o beb Portanto pelos crit rios estabelecidos para participa o as mulheres que apresentassem algum tipo de problema anterior ou n o gesta
62. fazem ces rea e voc se engana e acredita neles mas no final n o tem parto normal nenhum Descobri mais tarde que tem muita gente obstetras assim Marta Portanto assim que souberam da gravidez nossas informantes come aram a procurar um obstetra adepto ao PV sendo esse crit rio adotado conscientemente Isso representava para elas uma certeza maior de que suas escolhas seriam respeitadas Cheguei pra minha m dica e falei Bete a obstetra voc faz parto normal ou ces rea Porque o hist rico de particulares que os m dicos s fazem ces rea n o Mas ela respondeu Fa o normal Ent o eu senti que o meu desejo ia se realizar C lia Algumas entrevistadas seis decidiram manter seus pr prios ginecologistas como obstetras A alega o para essa escolha foi o fato de j conhecerem sua pr tica m dica pela rela o de confian a estabelecida nos anos de conviv ncia com esse profissional e al m de tudo serem credenciados pelo plano de sa de Mesmo assim confirmada a gravidez buscaram dialogar com seus ginecologistas sobre sua escolha pelo PV Para essas mulheres apesar do v nculo anterior era necess ria a certeza reiterada de que eles concordariam em fazer esse tipo de parto Apenas uma n o permaneceu com o ginecologista por ele n o atuar mais como obstetra A seguir na fala de nossas informantes o caminho em busca da certeza que procuravam e a eu j tava com ela a gi
63. filho isso me d um grande sentimento de culpa por estar abandonando ele Grupo Tijuca 09 01 2007 O enorme sentimento de culpa impregnava essas mulheres diante de rituais coercitivos relacionados a mercantiliza o da pr pria vida onde as preocupa es em produzir n o perder o emprego e a competi o sufoca as rela es humanas principalmente no mbito familiar Esse afastamento precoce dos filhos gera um dilema entre querer ficar e querer voltar ao mercado de trabalho seja pela necessidade de sobreviv ncia ou mesmo por interesse pessoal em manter conquistas profissionais A fala inesgot vel nessa quest o muito dif cil conciliar e negociar esse momento disse uma das mulheres Durante os encontros muitas relataram que se sentiam pressionadas a voltarem mais cedo ao trabalho sendo que durante a licen a maternidade chegavam a receber liga es para que solucionassem algum problema pendente no trabalho Os relatos mostraram muito sofrimento tanto para as mulheres quanto para os companheiros Toda essa ang stia traduzida por elas quando falam das interfer ncias que repercutem nas rela es intrafamiliares Fico o dia todo com meu filho e agora j vou ter que voltar a trabalhar antes de terminar a licen a de repente ter que me afastar dele n o est sendo f cil pra mim Grupo Botafogo 08 01 2007 Eram sempre mencionadas as dificuldades para que a licen a maternidade fosse realmente res
64. http portal saude gov br portal svs acesso 22 08 2006 e 14 10 2006 MINIST RIO DA SA DE Sa de da Crian a Pol tica Nacional de Aleitamento Materno Dispon vel em URL http portal saude gov br portal saude cidadao acesso 08 10 2007 MINIST RIO DA SA DE Ag ncia Nacional de Sa de Suplementar Dispon vel em URL http www ans gov br portal site acesso 25 08 2006 MINIST RIO DA SA DE Ag ncia Nacional de Sa de Suplementar Dispon vel em URL http www ans gov br upload home humaniza ao parto pdf acesso 18 11 2006 MINIST RIO DA SA DE Semin rio Nacional de assist ncia Obst trica no Brasil Desafios e Estrt gias para A o Bras lia Secretaria de Pol ticas de Sa de 1999 MINIST RIO DA SA DE Assist ncia Pr natal Manual T cnico equipe de elabora o Janine Schirmer et al 3a ed Bras lia Secretaria de Pol ticas de Sa de SSP Minist rio da Sa de 2000 MINIST RIO DA SA DE Secretaria de Aten o a Sa de Departamento de A es Program ticas Estrat gicas Pol tica Nacional de Aten o Integral Sa de da Mulher Plano de A o 2004 2007 Bras lia MS 2004 http saude gov br bvs publicacoes politica nac atencao mulher2 pdf acesso 08 04 2008 MINIST RIO DA SA DE Pr natal e Puerp rio Aten o Qualificada e Humanizada 3a ed Bras lia Secretaria de Aten o Sa de Departamento da A es Program ticas Minist rio da Sa de 2006 MINIST RIO DA SA DE Portar
65. in cio que s fazia ces rea Ent o deixa assim Eu fiquei t o impressionada porque ela falou que ele o obstetra marca s quartas no hospital pra n o atrapalhar o consult rio Ent o temos o dia das ces reas Me impressionou o jeito que ela falou que o m dico t acostumado que isso normal melhor e mais seguro a ces rea n aceitou assim trangiiilamente ela falou que o beb tava certinho encaixadinho Eu falei Gente isso demais entendeu acho que assim um absurdo vai pra uma cirurgia desnecessariamente absolutamente desnecess ria e programada desde o primeiro dia da gravidez Oh Descobriu que t gr vida ent o vai nascer numa quarta porque melhor pro m dico surreal uma proposta dessa Dora A indigna o da entrevistada remete se n o s ao desrespeito do processo fisiol gico do nascimento mas tamb m ao comodismo da pr pria mulher em aceitar a situa o sem nenhuma indigna o j que no in cio da gravidez poderia ter procurado outro obstetra Isso sugere o quanto n o h mais muita estranheza quanto a esse tipo de procedimento Como observamos na fala de mais uma entrevistada Eu acho que isso a aceita o da ces rea acontece porque as mulheres n o decidem sobre esse momento na vida o parto delas Elas as mulheres deixam algu m decidir e esse algu m o m dico entendeu Elas deixam o m dico optar Eu n o sei porque para o m dico melhor fazer c
66. incid ncia de cesarianas nesse grupo encontramos m es de informantes quatro que tiveram apenas partos vaginais Nesse cen rio das rela es parentais entendemos que seria importante conhecer as experi ncias pr ximas das entrevistadas e que poderiam ter ou n o influ ncia em suas escolhas No entanto observamos que nem todas as informantes tiveram com suas m es uma intera o significativa que as fizessem conhecer um pouco melhor essas experi ncias Sem pretens o de aprofundamentos agrupamos as experi ncias desses c rculos interferentes em parto vaginal e ces rea na vis o das entrevistadas Para um breve relato nelas est o inclu das as viv ncias das m es irm s e tias Parto vaginal As boas hist rias Apesar das hist rias que circundam o imagin rio feminino sobre o parto vaginal dos mitos que j foram discutidos anteriormente neste estudo encontramos tamb m relatos de experi ncias consideradas por elas positivas a respeito desse modo de parir Algumas informantes trouxeram baila a hist ria das mulheres da fam lia e percebemos que essa mem ria foi importante na elabora o da escolha do seu parto Apresentamos os relatos que sintonizam essas lembran as e revelam o quanto a experi ncia familiar importante para a atribui o de significados Minha m e fez parto normal as irm s dela tamb m e vi isso na minha adolesc ncia presenciei beb s nascendo meus primos quatro minha
67. institucionalizado gradativamente per odo no qual normas e rotinas passaram a serem ditadas para o tratamento e comportamento da mulher Novos conhecimentos e habilidades de diferentes campos da ci ncia foram incorporados medicina diminuindo de forma significativa os riscos hospitalares Todos esses fatos ampliaram as possibilidades de interven o resultando tamb m num aumento progressivo de opera es cesarianas Tanaka 1995 2 2 3 As mudan as no Brasil No Brasil no in cio dos anos 80 surgiu durante o processo de redemocratiza o do pa s um amplo movimento pelo direito sa de que tinha como norte uma Reforma Sanit ria Esse movimento tendo como matriz te rico conceitual o campo da sa de coletiva reconhecia a natureza social da sa de e da doen a O Movimento Sanit rio como foi chamado agregava em sua luta pesquisadores docentes profissionais de sa de estudantes sindicalistas moradores organizados e grupos de mulheres atrav s do movimento feminista Costa e Aquino 2000 O movimento feminista j lutava pela sa de das mulheres na quest o dos direitos reprodutivos questionando o saber e o poder m dico Fazia cr ticas situa o dos servi os de sa de e exigia do Estado efic cia no funcionamento desses servi os buscando incluir na agenda pol tica a discuss o de temas como reprodu o vila 1993 apud Sim es Barbosa 2001 O Minist rio da Sa de atendendo as reivindica es
68. interesse e motiva o pr vios da popula o alvo Portanto nesta pesquisa trata se mais de ades o livre e esclarecida que de consentimento e o convite ser feito a mulheres que participam de encontros realizados mensalmente pelo grupo de apoio amamenta o Amigas do Peito captadas em diversos bairros da cidade do Rio de Janeiro onde se realizam esses encontros e ser o obedecidos os princ pios de confidencialidade e anonimato dos informantes al m da garantia de sigilo e riscos e benef cios do projeto ser o observados no decorrer do processo do trabalho onde nos comprometemos a buscar o m ximo de benef cios e o m nimo de danos ou riscos e ainda garantindo que danos previs veis sejam evitados e com o objetivo de contribuir para a melhoria das condi es de vida e sa de da popula o os resultados desta pesquisa ser o amplamente divulgados atrav s de peri dicos especializados da rea em eventos cient ficos e meios de comunica o de massa respeitando se os princ pios de confidencialidade e privacidade dos informantes da pesquisa 182 TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO Eu 5 aceito participar voluntariamente da pesquisa O desencontro entre o desejo e a realidade a escolha pelo parto vaginal e a realiza o da cesariana entre mulheres de camadas m dias Esta pesquisa pretende compreender o desejo das mulheres de classe m dia em vivenciar o parto vaginal em contraposi o pr
69. interrompido sem nenhuma justificativa apenas sendo informada da decis o m dica Mesmo reconhecendo a enorme possibilidade de ser submetida a uma ces rea desnecess ria n o viu caminhos poss veis a serem tomados em t o curto espa o de tempo A cesariana ent o se transforma numa op o quase inescap vel quase inexor vel A armadilha qual se referiu foi revelada como uma conveni ncia da m dica que por motivos particulares como cansa o e comodismo tomou a decis o de interromper o trabalho de parto que sinalizava come ar 144 E importante destacar que todas as informantes ao serem questionadas durante a entrevista se haviam pensado em mudar o PV para a cesariana declararam que mesmo com alguma d vida com as inseguran as surgidas ou medo do desconhecido n o pensaram em desistir Como expressado nas falas a seguir N o n o n o apesar de alguns momentos estar com medo eu falei vou tentar n o pensei em desistir nunca Dora N o em nenhum momento Eu queria at o ltimo minuto que fosse parto normal Nat lia N o N o pensei em mudar Cesariana nunca Eu tinha certeza do que eu queria C lia Como vimos o caminho desviante para a realiza o da ces rea para algumas come ou a ser sinalizado ainda no pr natal com a lenta e sutil introdu o de discursos direcionados para uma poss vel mudan a de parto Para outras o desvio se deu com a proximida
70. literature Bristh 2000 27 4 256 63 GILBERT ACB CARDOSO MHCA WUILLAME SM M dicos residentes e suas rela es com e no mundo da sa de e doen a um estudo de caso institucional com residentes em obstetr cia e ginecologia INTERFACE jan jun v 10 n 19 p 103 16 2006 GIFFIN K Nosso corpo nos pertence a dial tica do biol gico e do social Cadernos de Sa de P blica Rio de Janeiro v 7 n 2 p 150 173 abr jun 1991 GIFFIN K Esfera da reprodu o em uma vis o masculina considera es sobre a articula o da produ o e da reprodu o de classe e de g nero PHYSIS Revista de Sa de Coletiva vol 4 1 1994 GIFFIN K COSTA S H Quest es de Sa de Reprodutiva Rio de Janeiro Editora Fiocruz 1999 GIFFIN K Pobreza desigualdade e equidade em sa de considera es a partir de uma perspectiva de g nero transversal Cadernos de Sa de P blica Rio de Janeiro 18 Suplemento 103 112 2002 GIFFIN K Barbosa G P Tuesta A A Gama A S Chor D D Orsi E Reis A C G V Parto ces reo quem o deseja Em quais circunst ncia Cad de Sa de P blica Rio de Janeiro 19 6 1611 1620 nov dez 2003 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 176 GIFFIN K Barbosa G P Tuesta A A Gama A S Chor D D Orsi E Reis A C G V Hartz Z Qualidade da aten o ao em maternidades do Rio de Janeir
71. m dica em sua diversidade para desvendar como atuam a medicaliza o e ou a naturaliza o do processo reprodutivo na constru o de ideologias p 242 145 Segundo Diniz 1996 acaba sendo improv vel que se consiga provar o uso inadequado da medicaliza o e interven o no parto o que deixa as mulheres vulner veis e sujeitas ao seu uso indiscriminado sem que muito se possa fazer para evit los Em nossos depoimentos o processo de medicaliza o com as interven es na hora do parto foram explicitados por algumas entrevistadas que entraram em trabalho de parto tentando ainda chegar a um PV Possivelmente a tentativa de acelerar o parto acabou interferindo sobre o processo fisiol gico em andamento Segundo Fa ndes 2004 o excesso de interven es no transcorrer do trabalho de parto tal como a utiliza o de ocitocina poderia transformar a evolu o natural em uma iatrogenia Como reproduzido nas falas a seguir A eu cheguei no hospital e ela me examinou e falou Voc est com 6 cm de dilata o Vamos l que eu vou estourar sua bolsa amni tica e te colocar no soro ocitocina para virem mais contra es na sala de pr parto fui a 8 cm de dilata o E eu no soro sentindo muitas dores fazendo for a estava bem encaixada mas o beb n o descia a m dica mexia na barriga colocava mais soro pra aumentar a dor esperava mais 15 minutos saia da sala me deixa
72. m muitas mulheres pareciam encarar a decis o m dica sem questionar ou ter em pelo menos no discurso grupal sentimentos conflitivos sobre a real necessidade da cirurgia Aceitavam a indica o baseada na rela o de confian a que depositavam nos seus obstetras i eu queria parto normal mas a m dica achou melhor fazer ces rea mais seguro porque poderia ter alguma complica o ela m dica e sabe o que melhor pra mim Grupo Botafogo ces rea realizada com 38 semanas de gesta o 02 04 2007 Outras diferentemente declaravam se indignadas exatamente por se sentirem tra das nessa rela o de confian a A m dica est for ando agora a ces rea dizendo que o beb grande que n o tem sinal do parto que ele pode sofrer N o quero que s por ser pr tico pra m dica ela fa a ces rea Grupo Tijuca gestante com 36 semanas 10 04 2007 Pude observar que essa situa o era freq ente em todos os grupos que tinham gestantes presentes Os relatos que as mulheres faziam indicavam uma mudan a na postura do obstetra em rela o ao parto normal durante o pr natal Ent o aquelas que declararam desde o in cio da gesta o as suas escolhas por esse tipo de parto viam o discurso caminhar para a inviabiliza o desse desejo com a proximidade do nascimento e um direcionamento para a cesariana Isso confirma os relatos das outras participantes dos Grupos que passaram pela mesma situa o
73. maioria das entrevistadas informou que os planos atenderam suas expectativas tanto na gravidez como no parto no que concerne realiza o de exames consultas maternidade etc A despeito disso n o poder amos deixar de trazer para a discuss o as quest es que afetam a assist ncia ao parto no sistema privado de sa de na medida em que as mulheres atendidas nesse sistema est o sendo submetidas a cesarianas em larga escala Apesar das iniciativas com objetivo diminuir esses ndices para 15 nos pr ximos tr s anos observamos que essa quest o est perpassada por poderosos interesses econ micos A complexidade desses mecanismos corporativos nos leva a crer que as usu rias desse sistema t m pouco a fazer no plano individual de a o para garantirem suas op es quanto ao tipo de parto que desejam tornando se ref ns da pol tica neoliberal e dos interesses desse mercado 116 Nos depoimentos a mercantiliza o do parto ia surgindo entrela ada s outras quest es relacionadas assist ncia prestada n o s pelos profissionais mas tamb m vinculada ao servi o privado de sa de e pr pria economia capitalista Vale ressaltar que uma de nossas informantes comentou que quando pensou em engravidar resolveu se vincular a um plano de sa de com melhores op es em substitui o ao que tinha Percebeu que um parto particular estaria fora de seu alcance financeiro Como registrado no seu depoimento enfim
74. ncia ao parto pressup e portanto a discuss o sobre as rela es de poder entre a mulher e seu obstetra dimensionando a dialeticamente em um campo maior do que ao restrito campo biol gico e ou do conhecimento t cnico A seguir abordaremos as quest es que envolvem a manuten o da escolha pelo PV 4 3 3 2 O parto vaginal as dificuldades para manter a escolha Neste tema procuramos investigar os caminhos que permearam a escolha do obstetra pela mulher a intera o que se desenvolveu entre eles durante o pr natal e a import ncia dessa rela o na manuten o da escolha pelo parto vaginal al m de entrela la a outras interfaces desse processo e sua trajet ria rumo concretiza o do desejo da mulher Para melhor apresenta o organizamos os temas captados nos discursos de nossas entrevistadas abordando os na seguinte perspectiva o obstetra e o pr natal a mercantiliza o do parto aproxima o do parto e as press es m dicas e familiares vividas pelas mulheres 4 3 3 2 1 O obstetra e o pr natal Reconhecidamente o pr natal deveria ser o espa o de intera o onde a mulher constr i seu v nculo de confian a e seguran a com o profissional que ir assisti la Portanto a escolha do obstetra configura se numa etapa singular na caminhada para a realiza o do desejo de nossas entrevistadas Procuramos atrav s de seus relatos retratar essas experi ncias durante o pr natal tentando compreender nesse
75. num pr ximo parto o problema da falta de vagas nas maternidades privadas e poss veis problemas com o beb Todas essas situa es de alguma forma foram respons veis por suas preocupa es A viol ncia no Rio de Janeiro RJ foi uma quest o sugerida pela banca de qualifica o como um poss vel fator relevante a ser investigado j que esse parto n o program vel e pode acontecer a qualquer hora Como transitar no RJ noite ou de madrugada notoriamente 80 perigoso pode ser um argumento forte para evitar os riscos de um parto n o agendado e n o programado Acatando a sugest o da banca inserimos essa quest o em nosso roteiro de entrevista Apresentaremos a seguir essas quest es sobre os mitos e medos que foram pano de fundo do cen rio de nosso estudo e as mais significativamente abordadas por nossas entrevistadas A dor do parto A dor relacionada ao parto n o foi uma pergunta diretamente formulada as nossas entrevistadas A inten o era exatamente deixar que o assunto aflorasse livremente Se o medo relacionado dor existisse a sim problematiza lo amos junto s nossas informantes Essa quest o emergiu espontaneamente dos depoimentos quando elas relataram as expectativas de vivenciar o momento do nascimento A partir da introdu o do tema buscamos ent o provoc las para que nos informassem o quanto e como a dor estava relacionada ao processo de escolha pelo PV As pou
76. o percebida apenas objetivamente mas tamb m subjetivamente atrav s de envolvimento conceitualiza o e a o Harnecker 1983 Berman 1997 Nesta pesquisa este referencial utilizado para abordar e compreender um fen meno humano o processo de gesta o e nascimento que se encontra enredado em complexas teias de determina es s cio hist ricas que perpassam desde os interesses econ micos e pol ticos at a subjetividade que envolve tanto a viv ncia deste processo pelas mulheres considerando se as diferen as de classe social entre elas at as sutis rela es de poder que se instalam na rela o de gestantes e profissionais de sa de que as assistem particularmente os m dicos Nesse sentindo nossa pesquisa alicer ou na abordagem do materialismo hist rico e dial tico matriz epist mica utilizada desde o in cio da trajet ria para qualifica o do mestrado a perspectiva cr tica que revela a historicidade do fen meno estudado e suas rela es em n vel mais amplo 38 Assim sendo a concep o dial tica nos norteia nos di logos com os diversos referenciais te ricos que buscamos para situar onde se encontra o problema dentro desse contexto complexo que o universo da assist ncia ao parto no sistema privado de sa de e o alto ndice de cesarianas entre as mulheres das camadas m dias no Rio de Janeiro Dentro do contexto que abarcam as quest es relacionadas escolha da mulher sobre o ti
77. o hipertens o diabetes ou outra patologia que poderia aumentar a chance da indica o de uma 4 Aus 16 x ZI na l7 18 x ces rea pr via gemelaridade apresenta o p lvica ou risco de parto prematuro n o poderiam participar da entrevista 15 k HE intervalo entre os partos No caso se refere ao tempo entre o per odo da cesariana e a realiza o da entrevista 16 A presen a de dois ou mais fetos no tero ou fora dele constitui gesta o m ltipla S o considerados g meos os beb s de qualquer gesta o m ltipla 66 Por esses motivos restritivos recorremos solidariedade das pr prias mulheres que se interessaram em colaborar com o andamento do estudo Todas que sabiam de alguma amiga com perfil para participar se prontificavam a fazer contato pessoalmente com elas com objetivo de esclarecer a proposta da pesquisa Se concordassem em participar autorizavam meu contato telef nico e ou eletr nico para agendar a entrevista Dessa forma pode se ampliar o campo de capta o aumentando a possibilidade de buscar um n mero significativo de participantes Ent o atrav s dessas indica es conseguimos recrutar mais seis informantes Uma das mulheres indicadas n o se inseria totalmente no perfil pois seu filho j estava com tr s anos Sua participa o veio de maneira transversal uma das entrevistadas comentou com essa amiga que havia participado da pesquisa relatando lhe o tema tratado Ela fico
78. o ltimo minuto Dr B e o meu parto normal E ele S se estiver desenrolado a circular de cord o A entrevistada Mas Dr B por qu O obstetra _Eu j te falei que pode acontecer alguma complica o A entrevistada Eu sei Dr B mas deixa eu fazer outra ultra sonografia Ele respondeu melhor n o fazer outra n o E eu acabei n o fazendo Nat lia No final quando a gente conversava ela falava Flora se voc quer parto normal tudo bem mas eu n o vou for ar a barra para parto normal seu eu chegar l na hora eu estiver vendo que o beb t entrando em sofrimento eu vou fazer uma cesariana voc querendo ou n o querendo certo Flora Na ltima semana com 39 semanas minha m dica disse que a cabe a do beb tava flutuante que n o tinha encaixado totalmente que ia ser dif cil o parto normal Ela mandou eu parar de trabalhar disse que era pra eu ficar em casa descansando pra ver se eu entrava mesmo em trabalho de parto j que eu estava tendo umas contra es Fiz justamente ao contr rio Como eu queria parto normal eu ia para a piscina nadar e trabalhei at quando pude T nia 2 despropor o c falo p lvica quando a cabe a do beb maior do que a passagem da m e hemorragias no final da gesta o ocorr ncia de doen as hipertensivas na m e espec ficas da gravidez beb transverso atravessado e sofrimento fetal MS
79. o a ci ncia a sociedade e a cultura emergente S o Paulo Cultrix 1982 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 174 CARDOSO R Aventuras de antrop logos ou como escapar das armadilhas do m todo In CARDOSO org Aventura antropol gica teoria e pesquisa Rio de Janeiro Paz e Terra 1986 CARRANZA M De ces reas mulheres e m dicos uma aproxima o m dico antropol gica ao parto ces reo no Brasil 1994 Disserta o de Mestrado Bras lia Departamento de P s gradua o em Antropologia Social Universidade de Bras lia CASTRO M G Alquiminia de Categorias Sociais na Produ o de Sujeitos Pol ticos Revista Estudos Feministas vol 0 n 0 1992 CECATTI G et al Ces rea no Brasil um direito de op o In GALV O L D AZ J Sa de Sexual e Reprodutiva no Brasil S o Paulo 1999 p 237 59 CHACHAN A S M dicos mulheres e ces reas a constru o do parto normal como risco e a medicaliza o do parto no Brasil Simp sio Internacional Fazendo G nero 7 Universidade Federal e Estadual de Santa Catarina Florian polis Santa Catarina agosto 2006 CHARTIER R A vis o do historiador modernista In Ferreira M e Amado J orgs Usos amp Abusos da Hist ria Oral Rio de Janeiro Editora da Funda o Get lio Vargas 1996 CHIZZOTTI A Pesquisa em ci ncias humanas e sociais 2 ed S o Paulo Cortez 1995 C
80. o falava mais sobre o parto normal com ela Regina Como podemos apreender nesta fala esta informante parecia perceber que a ces rea era uma possibilidade que rondava sempre suas consultas de pr natal pela presen a constante de condicionantes para a realiza o do PV A instigamos novamente perguntando lhe se em vista de suas constantes d vidas havia pensado em mudar de obstetra ao que respondeu afirmativamente Por m como nos mostrou essa mudan a n o f cil de ser realizada em meio gesta o Ao lhe perguntarmos porque apesar da desconfian a permaneceu com esta m dica sua resposta indicou acomoda o e aceita o da situa o Como colocou J na primeira consulta eu tive minhas d vidas mas todo mundo dizia que era s impress o minha ligava para as pessoas e elas me diziam que ia ser 109 trangiiilo que ela a obstetra fazia partos normais A eu fui ficando meio que com pregui a de procurar outra obstetra Regina A maioria dos depoimentos revelou que mesmo quando existe um discurso afirmativo sobre o PV sempre permanece uma relativiza o uma d vida que deixa uma porta entreaberta para a ces rea Nesse cen rio fica claro que n o simples as mulheres desejarem e escolherem o tipo de parto que querem ter Ap s termos conhecido como se deu o processo de escolha do obstetra para as entrevistadas passamos no pr ximo t pico para a abordagem da r
81. obstetra mais t cnica do que humana Flora Na outra ponta dessa quest o os partos domiciliares que s o em menor escala artesanais t m um valor de mercado alto para a maioria das mulheres mesmo as das camadas m dias Mas sem d vida eles tornaram se uma sa da para a garantia do direito de escolha ser respeitado Apesar disso s o ainda uma possibilidade para poucas que desejam parir fora do ambiente hospitalar e que teriam que arcar com os custos n o cobertos pelos planos de sa de Como demonstra uma informante Quando eu tava com seis meses pelas incertezas que tinha da minha m dica fazer realmente o parto normal eu decidi que eu iria ter o beb em casa a eu fui procurar saber de pre o Pra gente n o dava naquele momento mas de uma forma ou de outra seria uma possibilidade mais garantida de ter a escolha respeitada Regina No entanto a maioria das entrevistadas revelou que mesmo j tendo ouvido falar do parto domiciliar n o estariam ainda preparadas para parir fora do ambiente hospitalar como expomos a seguir E tinha tamb m uma expectativa desse novo modelo agora na minha gera o tem muita mulher tendo filho em casa e eu tenho sentido muitas amigas minhas t o tendo filho assim e que tamb m um modismo mas eu acho que ainda uma coisa um pouco hoje em dia eu ainda n o estou segura pra fazer um parto em casa Marta Apesar da informante ter s
82. obstetras durante o processo de gesta o e parto A maternidade aqui visualizada como uma experi ncia fundamental na vida das mulheres Por m sua hist rica ideologiza o ou seja a idealiza o do papel materno est presente e persiste no imagin rio social Portanto entendemos que as considera es que envolvem essa experi ncia devem considerar sobretudo a escuta das mulheres tomadas enquanto sujeitos social pol tico e de g nero ancoradas em suas pr prias viv ncias enquanto mulheres e m es o que inclui considerar as contradi es e conflitos entre idealiza o ideologiza o e as reais condi es de vida das mulheres Sim es Barbosa 2001 O conceito de g nero postula que a posi o subalterna das mulheres na maioria das sociedades tem causas sociais econ micas e pol ticas confrontando assim as explica es que atribuem ao seu papel biol gico na reprodu o as causas desta inferioridade Assim posto a subalternidade pode ser transformada atrav s da a o pol tica Scott 1995 define o g nero como elemento constitutivo de rela es sociais baseado nas experi ncias percebidas entre os sexos implicando em quatro elementos S mbolos culturalmente dispon veis com representa es m ltiplas contradit ria Conceitos normativos que colocam em evid ncia interpreta es do sentido dos s mbolos e que assumem a forma bin ria Dimens o pol tica com refer ncia s institui es e organiz
83. partejar e assistir aos partos Vieira 2002 O corpo feminino e o processo de medicaliza o no Brasil passam a serem discutidos como objeto m dico e as condutas adotadas passam a gerar a medicaliza o excessiva O discurso m dico j com car ter higienista transmite mulher novas responsabilidades dentro da fam lia Esse novo papel passa a valorizar a mulher como esposa e m e e lhe confere a responsabilidade de dar assist ncia aos filhos A mudan a reorganiza a mulher dentro do espa o dom stico proporcionando mais autoridade e aumentando suas obriga es idem Nesse processo pol tico e social estava inserida a condi o feminina a qual era necess rio controlar O poder m dico e suas decis es a respeito do corpo da mulher passam a ser soberanos e indiscut veis Como aponta Vieira 2002 19 Apesar dos conflitos internos no meio m dico e da resist ncia das mulheres o parto transformou se em ato m dico e as mulheres puderam voltar tradi o de partejar agora com novo status o de m dicas O saber que havia sido expropriado das parteiras resguarda se agora na legitimidade de uma ci ncia e de sua suposta neutralidade que atrav s do poder m dico pode exercer o controle social sobre o g nero feminino em que pese o fato de at recentemente ser essa profiss o eminentemente masculina em nossa sociedade p 58 Ap s a Segunda Guerra Mundial o parto no Brasil foi sendo
84. parto faz parte das transforma es necess rias que possam garantir mulher seus direitos e benef cios sua sa de e o resgate de sua participa o central e ativa no evento do nascimento Na hist ria da medicina ocidental a conquista do poder por uma elite profissional masculina envolveu uma longa luta que acompanhou o surgimento da abordagem racional e cient fica da sa de e da cura O resultado desta luta foi o estabelecimento de uma elite m dica quase que exclusivamente masculina e a intrus o da medicina em setores que eram tradicionalmente atendidos por mulheres como o parto Essa tend ncia est sendo agora invertida pelos movimentos das mulheres elas reconhecem nos aspectos patriarcais da medicina mais uma das manifesta es do controle do corpo das mulheres pelos homens e estabeleceram como um dos objetivos centrais a plena participa o das mulheres na assist ncia sua pr pria sa de Capra 1982 p 119 Contrapondo se ao modelo biom dico de abordar a gesta o e o parto surgem novas pr ticas de assist ncia mulher no processo do nascimento resultando em uma tentativa de mudan a do paradigma obst trico O parto n o mais apenas um evento fisiol gico mas tamb m um processo social Klaus 1993 A partir da d cada de 80 ocorreu um movimento mundial em prol da humaniza o do parto e nascimento no qual o movimento feminista tamb m se envolveu A proposta era o reconhecimento dos direitos
85. poderia deixar de agradecer a Miriam Torres M rcia Soares Leila Solange Luciene Tereza Vit ria Verinha T nia Bete Irene Ivete e tantos outros amigos e profissionais N o haveria espa o para citar todos aqueles que contribu ram nem para t o ricas experi ncias ali vividas pelos ensinamentos no caminho da humaniza o Dra Cristina Boaretto e Dra K tia Ratto minha eterna admira o pelo que constru ram nessa trajet ria para uma melhor aten o s mulheres em especial na assist ncia ao parto e nascimento Por todas as oportunidades concedidas para desenvolver o meu trabalho Por terem me integrado aos quadros da SMS possibilitaram infinitos desdobramentos das minhas a es profissionais As meninas do Espa o Mulher T nia Monique Louise Ana Regina Lu sa territ rio onde iniciei minhas primeiras incurs es na capacita o e treinamento para os profissionais da SMS RJ sempre incentivadoras do meu trabalho com as mulheres A todos da equipe da Assessoria de Promo o de Sa de SMS RJ pelo carinho com que me receberam nesse novo caminhar na SMS pela compreens o e apoio nos dif ceis e desafiadores momentos para a conclus o do mestrado Para duas mulheres em especial Viviane Castelo Branco pela conviv ncia prazerosa e enriquecedora a cada dia e T nia Vianna amizade recente mas eternamente gratificante pelo seu companheirismo incondicional durante toda a trajet ria desse mestrado A tod
86. pp 299 317 1999 Rio de Janeiro Editora Fiocruz 130 SIM ES BARBOSA R H Mulheres Reprodu o e AIDS As tramas da ideologia na assist ncia sa de de gestantes Hiv Rio de Janeiro RJ 2001 Doutorado em Sa de P blica Escola Nacional de Sa de P blica Funda o Oswaldo Cruz 131 SIM ES BARBOSA R H Humaniza o da assist ncia sa de das mulheres uma abordagem de g nero In Deslandes S F org Humaniza o dos Cuidados em Sa de conceitos dilemas e pr ticas Rio de Janeiro Editora Fiocruz 2006 132 SIM ES BARBOSA R H Educa o e Sa de Reprodutiva an lise preliminar de uma experi ncia numa comunidade favelada do Rio de Janeiro In Silva Dayse de Paula Marques org Sexualidade em Diferentes Enfoques Uma Experi ncia de Capacita o no Campo da Sa de Reprodutiva Niter i RJ Muiraquit PEGGE UERJ 2001 pp 122 131 133 SOUZA C M C Sections as ideal births The cultural constructions of beneficience and patients Rights in Brazil Cambridge Quarterly of healthcare Ethics 1994 3 358 366 134 SOUZA M R Parto entre o desejo e a realiza o Trabalho apresentado no XIII Encontro da Associa o Brasileira de Estudos Populacionais realizado em Ouro Preto Minas Gerais Brasil de 04 a 08 de novembro de 2002 180 135 TANAKA A C A Maternidade dilema entre nascimento e morte S o Paulo Hucitec 1995 136 TEDESCO R P MAIA FILHO N L MATHIAS L BENEZ A L CASTRO V C
87. quando tiveram seus filhos Muitas gestantes disseram perceber que existe uma manipula o dos obstetras pela prefer ncia da cesariana sinto que sutilmente agora com 35 semanas ele vem falando da possibilidade da cesariana que pode ser que n o seja normal que o beb t grande fala que a ces rea segura tou desconfiada que ele n o vai respeitar a minha vontade e vai fazer uma ces rea Grupo Catete gestante com 35 semanas 16 03 2007 Essa mesma gestante colocou ainda que mesmo sentindo que o m dico estava manipulando o seu desejo deixando a insegura n o teve coragem de procurar outro m dico O marido a apoiava para ter o beb de parto normal no entanto n o para mudar de m dico Reclamou que sofreu press es tamb m da fam lia para aderir ces rea Ao comentar com os familiares sobre o que estava pensando sobre seu obstetra criticada por n o confiar nele j que ele quem o m dico e sabe o que tem que fazer 51 muito ruim quando se cria uma expectativa que vamos poder ter parto normal e depois sem motivo em cima da hora pertinho do parto na hora do parto muda tudo e fazem ces rea uma tremenda frustra o parece que tem alguma coisa errada com a gente como tiv ssemos algum defeito Grupo Tijuca 10 07 2007 As gestantes dos grupos mostravam se sempre cheias de d vidas e medos quanto ao parto mesmo convictas da escolha pelo parto vaginal O comportamento e o rela
88. que a proposta deste grupo corresponde preferencialmente s necessidades e anseios simb licos e concretos de mulheres das camadas m dias Nesse sentido as AP se mostraram um campo prop cio para a capta o daquelas que seriam os sujeitos de nosso estudo composto por m es com acesso a bens de consumo e informa o brancas em sua maioria e que vivem com seus companheiros legalmente possuindo n vel superior de escolaridade e trabalho formal remunerado al m de situa o econ mica est vel apresentadas adiante O Grupo de M es AP surgiu em 1980 por iniciativa da atriz B bi Vogel que se uniu a outras mulheres com objetivo de apoiar o aleitamento materno www amigasdopeito org br 2007 Trata se de uma ONG sem fins lucrativos formada predominantemente por mulheres de classe m dia de profiss es distintas e que acreditam na import ncia da amamenta o Os 28 anos de sua hist ria v em sendo poss vel gra as ao trabalho volunt rio de m es pais familiares e amigos A ONG busca recuperar a pr tica da amamenta o que sofreu um consider vel decl nio no Brasil e no mundo a partir da d cada de 1970 como um dado cultural feminino perdido em decorr ncia da diminui o do incentivo a esta pr tica da inser o da mulher em um mercado de trabalho voraz e da propaganda de alimenta o infantil artificial Portanto o objetivo das AP promover apoiar incentivar e proteger a 43 amamenta o junto s gestantes
89. s que temos planos de sa de n o estamos conseguindo mais ter nossos beb s de parto normal mesmo querendo n o conseguimos os m dicos prometem mas n o cumprem enganam a gente e acabam 49 fazendo uma ces rea nem esperando a data do parto Grupo Catete 16 02 2007 Esse sentimento emergia frequentemente nos relatos quando o assunto parto era abordado nos grupos Mesmo para aquelas que tiveram complica es obst tricas na gravidez e ou no parto ou seja uma indica o evidentemente clara para o parto cir rgico Essas mesmas mulheres afirmaram que se tivessem outros filhos gostariam muito de ter parto normal Pelo que vivenciamos nesses meses de trabalho nos grupos e pelos seus depoimentos pudemos constatar que para as mulheres hoje est muito dif cil exercer o direito maternidade de uma maneira prazerosa Assistimos muitas vezes atrav s da livre express o dessas mulheres durante os encontros o quanto muitos m dicos citados foram respons veis pela implanta o dos medos maternos n o s no parto como na gravidez e p s parto indo at o per odo da amamenta o quando falavam por exemplo que o leite materno fraco Essa manipula o pode certamente induzir as mulheres a julgarem se culpadas e incompetentes para parir e amamentar Vulnerabilidade da escolha da gestante Depois de muito dialogarem sobre o parto os depoimentos sobre as experi ncias vividas foram dando visibilidade s
90. ser m e te deixa em alguma desvantagem sim Porque voc acaba dedicando menos tempo pra crescer profissionalmente Acaba voc n o tendo muito tempo extra para progredir na carreira a n o ser que voc priorize o trabalho e deixe o ser m e em segundo plano Conciliar os dois pap is dific limo A gente acha que est sempre perdendo pro seu concorrente Voc tem que voltar se voc n o est aqui no trabalho voc est perdendo deixa de produzir entendeu Karina Segundo Laurell 2000 os reflexos da competi o capitalista atingem visivelmente as mulheres que n o conseguem vivenciar a maternidade como gostariam Assim existiu para a maioria das entrevistadas uma preocupa o com a transfer ncia a terceiros mesmo que familiares de todo o acompanhamento das etapas de desenvolvimento do beb quando da necessidade da volta ao trabalho Esse afastamento de certa forma priva a mulher desses momentos de conv vio com os filhos Merece destacar dentro dessa perspectiva de conciliar os pap is de m e e profissional como se sentiram aquelas que desejavam apenas curtir o momento da maternidade muitas vezes tentando adiar a volta ao mercado de trabalho As falas ilustram a percep o de n o estarem no rol das mulheres produtivas Por um lado eu tenho vantagem de n o estar trabalhando de n o me preocupar com a volta ao trabalho Eu estou feliz por cuidar da minha filha eu tenho prazer nisso
91. tem que escolher bem o m dico tem que ter confian a Vit ria 157 Segundo Grassi Raggio e Montes 1996 o desenvolvimento de uma rela o de confian a com o m dico favorece a aceita o da mudan a sem questionamentos Assim sendo fica a imagem de que poss vel escolher mas a palavra final proferida pelo poder m dico Nessa caminhada pudemos conhecer melhor as experi ncias vividas por nossas informantes at o momento do parto e constatar que existe entre elas a consci ncia cr tica de que nem sempre escolher ter a garantia de conseguir realizar seu desejo pelo PV Est o imbricados nessa quest o n o apenas a vontade da mulher mas todas as interfaces entrela adas a esse processo que envolve a conduta conveni ncia m dica a medicaliza o excessiva e as interven es desnecess rias a mercantiliza o da sa de e os valores s cio culturais associados ao parto A seguir abordaremos quais as expectativas em rela o perman ncia ou n o do mesmo obstetra em um pr ximo parto 4 3 3 3 4 A escolha do obstetra em um pr ximo parto Depois de conhecermos os processos relacionais que envolveram e influenciaram as informantes do in cio da gesta o at o momento do parto buscamos saber se desejariam manter os mesmos profissionais numa pr xima gravidez caso viessem a ter outros filhos Diante dos relatos feitos at aqui e da an lise de todos os discursos emergiu como respost
92. tema como se constr i essa rela o e como se d o as escolhas das gestantes considerando se os limites impostos pelos planos de sa de A escolha do obstetra pela mulher Ao optarem pelo PV como o tipo de parto pelo qual desejavam ter seus filhos nossas informantes sabiam que a escolha do obstetra era fundamental para a consecu o deste objetivo Essa escolha portanto devia estar em sintonia com o seu desejo Como relataram elas imaginavam desde o in cio que encontrariam dificuldades entre as quais as restri es que os planos de sa de fazem para a escolha do profissional Algumas entrevistadas demonstraram estarem conscientes de que muitos m dicos que atuam no setor privado s o declaradamente cesaristas ele tinha meu plano sabia que ele era uma das pessoas que fazia parto normal na cidade voc tem que achar um obstetra que fa a parto 102 normal porque n o existe porque raro encontrar me alertaram sobre uma arapuca mas eu n o sabia muito bem que arapuca era essa eu era meio inexperiente a eu falei t dif cil achar gente que faz parto normal Marta Indagamos o que seria agora para ela o entendimento dessa arapuca qual se referiu E ela respondeu Tenho certeza agora que essa arapuca era porque muitos m dicos falam que v o fazer o parto normal te enrolam e no fim por qualquer coisinha n o querem esperar e
93. tudo e todos fossem movidos propulsivamente e exclusivamente pela competi o existindo como foi sinalizado por algumas uma persegui o s mulheres que s o m es o 59 que gerava para elas uma press o al m do suport vel e que interferia na vida pessoal conjugal e maternal Algumas mulheres declararam sentirem se diferentes como se fossem uns ETs por pensarem em se afastar do trabalho para cuidarem integralmente dos beb s at eles estarem um pouco mais crescidos Esta parece ser uma decis o igualmente dif cil tanto quanto o retorno precoce ao trabalho E como se esse desejo representasse um retrocesso para as mulheres j que no mundo de hoje disputam tanto quanto os homens uma vaga no mercado de trabalho Essa quest o envolve as press es financeira e social sobre as mulheres e se torna uma avalanche de demandas levando as muitas vezes a retornarem precocemente ao trabalho n o tem jeito vou ter que voltar j meio expediente n o estou preparada n o quero ter que coloc la numa creche t o pequenininha gostaria de poder ficar mais um pouco com ela Grupo G vea 27 02 2007 Elas demonstraram em muitos momentos das discuss es de grupo que t m consci ncia de serem m o de obra explorada com sal rios baixos sendo que para muitas delas nem vale a pena trabalhar deixando seus filhos em creches caras ou com pessoas que nem conhecem bem e que acabam ficando mais pr xi
94. um direito seu A ansiedade diante de toda a problem tica de reorganizar a vida pessoal e profissional gerava uma s rie de problemas na amamenta o onde transparecia o sentimento de culpa por n o estarem conseguindo amamentar satisfatoriamente o beb Uma das coordenadoras do grupo do Catete em um dos encontros em que fervilhavam nos di logos as quest es da volta ao trabalho e da licen a maternidade sinalizou criticamente o quanto no mundo de hoje existe uma cultura de n o se vincular a nada na medida em ee Z 2 2 39 que v nculos s o uma amea a aos padr es atuais capitalistas onde tudo descart vel Hoje as pessoas valorizam mais o que material do que os sentimentos onde ser descart vel representa consumir mais estando associado a mais status poder e sucesso como prega o capitalismo Essa percep o surgiu claramente em muitos depoimentos onde as rela es de trabalho no setor privado mostram que hoje tudo fr gil ef mero e descart vel e que as empresas n o valorizam o a trabalhador a n o posso vacilar e perder o emprego vai que ela arranje outra pessoa e coloque no meu lugar tudo pode acontecer n o tenho estabilidade n o tenho garantia que esse lugar meu pra sempre Ela uma pessoa legal mas v o lado dela a necessidade dela primeiro Grupo Catete 16 03 2007 Durante os encontros essa quest o transpareceu nas falas parecendo que para elas era como se
95. vel pra amamentar dependia da minha m e e meu marido pra quase tudo Regina Al m dos inc modos p s cir rgicos observamos nas duas ltimas falas acima o quanto as mulheres ficaram incomodadas com a depend ncia tempor ria em que se encontravam o que foi uma situa o recorrente em outras entrevistas Elas demonstraram o quanto n o gostaram da sensa o de ter que contar com a ajuda de outros mesmo do marido e das m es sogras para realiza o das tarefas dom sticas e dos cuidados iniciais com o beb Essa situa o nos parece n o s um reflexo do comportamento das mulheres de hoje 85 independentes que s o capazes de dar conta de tudo como tamb m de quererem assumir integralmente seus pap is maternos como boas m es que pretendem ser Enfim os dados mostraram que o medo da dor est sempre presente A dor sofrida principalmente na hora do trabalho de parto real e muito temida pela imensa maioria das mulheres Portanto o medo de vivenci la pode se tornar ferramenta til na manipula o m dica Por isso que se faz necess rio incentivar as gestantes buscando desmistificar a insuportabilidade da dor no sentido de resgatar o entendimento do processo de parturi o Interfer ncias na sexualidade Um dos mitos mencionados envolve os danos causados pelo PV integridade das estruturas do per neo da mulher A cren a nesse tabu pode sem d vida atemorizar as mulheres que quere
96. 2001 argumentos importantes a favor do marxismo e que fortalecem os subs dios que norteiam o percurso metodol gico proposto Esse sistema filos fico epistemol gico ontol gico e pol tico que pretende conhecer para transformar e que transforma conhecendo confronta e questiona radicalmente a vis o dominante de ci ncia e de conhecimento oriundas do idealismo do mecanicismo e do positivismo n o existem id ias em si conhecimento puro verdades universais objetivas neutras atemporais Essas representa es da verdade s o ideol gicas ou seja pretendem legitimar e manter sistemas sociais que se ap iam na explora o da maior parte da humanidade para assegurar o privil gio de uma elite dominante p 43 As mulheres que foram sujeitos desta pesquisa embora perten am s camadas m dias e como decorr ncia desfrutem de certas vantagens materiais tamb m vivem suas contradi es de g nero Os paradoxos entre as esferas reprodutiva e produtiva implicam entre outros na necessidade de gerar renda para a subsist ncia familiar no ac mulo de trabalho na inseguran a relativa ao emprego na exig ncia de constante qualifica o profissional etc o que pode se conflitar com suas auto exig ncias de um bom desempenho enquanto m es ou por exemplo determinar seu retorno precoce ao trabalho pelo receio de perder o emprego Estas quest es foram consideradas para contextualizar o processo de gesta o e parto
97. 9 fator de risco eles optam pela ces rea N o sei porque eles n o querem arriscar Talvez esse tipo de parto parto vaginal d mais trabalho por ter que ficar acompanhando Eu penso que eles n o querem arriscar nada Para eles a ces rea mais segura porque eles sabem que naquele momento o nen m t bem uma coisa r pida a ces rea Eles abrem a barriga e em dez minutos o nen m t fora na m o do pediatra do respiradouro do que precisar Elis Esse relato nos permite visualizar o quanto a cesariana est introjetada culturalmente como um parto seguro e institucionalizado obscurecendo os questionamentos sobre a sua real indica o como bem Cecatti 1999 e Fa ndes 2004 j revelaram Poder amos supor que os obstetras acostumaram se a decidir suas interven es sob a tica do menor risco para si ou seja n o se expondo s imprevisibilidades do PV ao inv s do menor risco para a parturiente e seu filho quando submetidas a uma cirurgia desnecess ria A permissividade de recorr ncias do procedimento cir rgico como via normal de nascimento ancora se em um risco iminente de que o beb supostamente possa vir a se expor Existe uma descaracteriza o do natural normal e uma valoriza o da preven o do risco Ent o o PV condenado bode expiat rio por ser potencialmente perigoso pois fora de controle Eu n o me senti com poderes de tomar outra
98. E A ESCOLHA DA VIA DO PARTO PELAS MULHERES DE CAMADAS M DIAS NO RIO DE JANEIRO JUNIA ESPINHA CARDOSO Disserta o submetida ao Programa de P s gradua o em Sa de Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ aprovada pela Banca Examinadora composta pelos seguintes membros Banca Examinadora Prof Dr Regina Helena Sim es Barbosa IESC UFRJ Prf Dr Elaine Reis Brand o IESC UFRJ Prof Dr Marcos Augusto Bastos Dias IFF FIOCRUZ Rio de Janeiro 2008 s minhas filhas Izabela e Maithe que iluminam os caminhos que tenho a percorrer Ao meu companheiro Jos Augusto respons vel pelo despertar de novas descobertas pelo incentivo e apoio indispens veis em minhas conquistas e em minha vida AGRADECIMENTOS Aos meus pais pelos ensinamentos preciosos em especial minha m e pequena grande mulher que sempre me contou a hist ria dos seus partos de forma natural sem saber que estava construindo o caminho para que eu vivesse t o enriquecedoramente as pr prias experi ncias dos meus partos minha irm Angeli Espinha Cardoso por ter sempre acreditado e incentivado me a prosseguir na minha escolha profissional de trabalhar com gestantes ajudando a superar as dificuldades que encontrei para realiz la s minhas filhas pela colabora o afetivas e efetivas durante as etapas finais desse trabalho nas revis es nos palpites e principalmente no apoio para con
99. ER S M es um estudo antropol gico da maternidade 220p S o Paulo Presen a 1978 KLAUS M KLAUS F Apoio parturiente durante o parto In Encontro brasileiro para o estudo do psiquismo pr e perinatal 1 Anais S o Paulo Associa o Brasileira para o Estudo do Psiquismo Pr e Perinatal ABREP 1993 LAKATOS E M e MARCONI M A Fundamentos de metodologia cient fica S o Paulo Atlas 1991 LAURELL A C Globalizaci n y reforma Del Estado In Costa A M Merch n Hamann E E Tajer D orgs Sa de e Equidade de G nero Desafio para as pol ticas p blicas Bras lia D F ABRASCO ALAMES Unb 2000 LOURO G L G nero Sexualidade e Educa o Petr polis Rj Vozes 1997 LOYOLA M A Uni o dos sexos e estrat gias reprodutivas no Brasil Revista Brasileira de Estudos da Popula o S o Paulo v 1 n 1 2 1984 MACHADO E G C Gesta o parto e maternidade uma vis o hol stica 2 ed Belo Horizonte Aurora 1998 MARQUES R R Desigualdades sociais no parto fatores associados ao atendimento p blico e privado em Joa aba SC Joa aba SC 2005 Mestrado em Sa de Coletiva Universidade do Oeste de Santa Catarina MARTIN E A mulher no corpo uma an lise cultural da reprodu o Rio de Janeiro Garamond 2006 MARTINS COSTA S RAMOS J G L A quest o das cesarianas Rev de Ginecol E Obst Vol 27 n 10 Rio de Janeiro 2005 MASON J Qualitative Researching London England
100. L BOURROUL G M REIS F I Fatores determinantes para as expectativas de primigestas acerca da via de parto Revista Brasileiro de Ginecologia e Obstetr cia 26 10 791 798 2004 137 THIOLLENT M Jean Marie Aspectos qualitativos da metodologia de pesquisa com objetivos de descri o avalia o e reconstru o Cadernos de Pesquisa S o Paulo Funda o Carlos Chagas 49 45 50 maio 1984 138 TORNQUIST C S Armadilhas da Nova Era natureza e maternidade no ide rio da humaniza o do parto Rev Estud Fem vol 10 no 2 Florian polis Jul Dec 2002 139 UNICAMP Cesariana incid ncia fatores que a determinam e consegii ncias maternas e perinatais Relat rio do Simp sio Campinas S o Paulo 1982 Revista Femina v 11 n 11 nov 1983 140 VELHO G Subjetividade e sociedade uma experi ncia de gera o Rio de Janeiro Zahar 1978 141 VEN NCIO S L MONTEIRO C A A tend ncia da pr tica da amamenta o no Brasil nas d cadas de 70 e 80 Rev Bras Epidemiologia vol 1 no 1 S o Paulo Apr 1998 142 VIEIRA E M A medicaliza o do corpo feminino Rio de Janeiro Ed FioCruz 2002 143 VILLAR J Tasas de Ces reas y resultados perinatales estudio global Who 2005 sobre salud materna y perinatal em Am rica Latina The Lancet vol 367 issue 9525 03 june 2006 p 1819 1829 144 VOLOSHKO A Apresenta o na mesa redonda Situa o do Parto e do Nascimento em S o Paulo Semin rio sobre Nasciment
101. M nimo Vigente R 380 00 As entrevistadas se encontravam em uma fase de vida em que j estavam estabelecidas profissional e conjugalmente A maioria era branca e vivia em uni es est veis juridicamente casadas ou n o A renda familiar m dia ficou em torno de 14 85 SM configurando um grupo com um padr o de vida relativamente confort vel Apenas 5 entrevistadas tinham uma renda familiar abaixo de 10 SM Apenas 3 informantes no momento da entrevista estavam sem emprego O que reafirma que as mulheres atualmente s o parte importante na composi o da renda familiar j que todas que estavam atuantes no mercado de trabalho declararam que a renda individual era importante para proporcionar bem estar e melhor condi o social e econ mica para a fam lia Os bairros de moradia t picos da classe m dia variaram entre as zonas sul e norte da cidade com preval ncia da primeira Quadro II Caracteriza o das Mulheres Entrevistadas Dados s cio econ micos Escolaridade Forma o Profissional e Ocupa o N vel de Forma o Ocupa o profissional NOME escolaridade Profissional na entrevista 1 Alice P s gradua o direito advogada 2 Flora 3 grau completo administra o do lar por op o no momento 3 Marta 3 grau completo designer gr fico editora de v deos 4 C lia 3 grau incompleto Pedagogia do lar por op o no momento 5 Regina
102. ONNEL R El imperialismo y el cuerpo de los hombres In V ldes T amp Olavarr a J orgs Masculinidaes Y Equidad de g nero en America Latina Santiago Chile FLACSO 1998 76 89 COSTA AM AQUINO E JL Sa de da Mulher na Reforma Sanit ria Brasileira In Costa A M Merch n Hamann E e Tajer D orgs Sa de e Eqiiidade de G nero um desafio para as pol ticas p blicas Bras lia D F ABRASCO ALAMES Editora Universidade de Bras lia 2000 pp 181 202 CUNHARY Informa n 56 Abril Junho 2004 Rede mulher de Educa o acesso 14 10 2006 Dispon vel em URL http www redemulher org br encarte56 CURY A F MENEZES P R Fatores associados prefer ncia por cesareana Rev Sa de P blica v 40 n 2 S o Paulo abr 2006 p 227 CURY A F TEDESCO J J A Aspectos pol micos na indica o de cesariana Femina 2003 31 9 809 12 DAVIS FLOYD R E Birth as an american rite of passage 315p Berkeley Los Angeles California London England The Regents of the University of California 1992 DAUSTER T Construindo pontes a pr tica etnogr fica e o campo da educa o In Dayrell J Org M ltiplos olhares sobre educa o e cultura Belo Horizonte EDUFMG 1999 p 65 72 DIAS M A B Cesariana Epidemia Desnecess ria A constru o da indica o da cesariana em uma maternidade p blica do munic pio do Rio de Janeiro 2001 Disserta o de Mestrado Rio de Janeiro P s gradua o em Sa d
103. Universidade Federal do Rio de Janeiro Instituto de Estudos em Sa de Coletiva A DISSON NCIA ENTRE DESEJO E REALIDADE A ESCOLHA DA VIA DO PARTO PELAS MULHERES DE CAMADAS M DIAS NO RIO DE JANEIRO Junia Espinha Cardoso Rio de Janeiro 2008 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO CENTRO DE CI NCIAS DA SA DE DEPARTAMENTO DE MEDICINA PREVENTIVA INSTITUTO DE ESTUDOS EM SA DE COLETIVA Mestrado em Sa de Coletiva Ci ncias Humanas e Sa de Linha de Pesquisa G nero Sexualidade e Sa de Reprodutiva A DISSON NCIA ENTRE DESEJO E REALIDADE A ESCOLHA DA VIA DO PARTO PELAS MULHERES DE CAMADAS M DIAS NO RIO DE JANEIRO Junia Espinha Cardoso Disserta o apresentada ao Instituto de Estudos em Sa de Coletiva e ao Departamento de Medicina Preventiva da UFRJ como requisito para obten o do grau de mestre em Sa de Coletiva ORIENTADORA Profa Dra Regina Helena Sim es Barbosa Rio de Janeiro 2008 CARDOSO Junia Espinha A disson ncia entre desejo e realidade a escolha da via do parto pelas mulheres de camadas m dias no Rio de Janeiro 2008 UFRJ TESC 2008 Xi 181 p Incl tabelas Disserta o Mestrado em Sa de Coletiva Universidade Federal do Rio de Janeiro UFRJ Programa de P s Gradua o em Sa de Coletiva TESC 2008 Orientadora Regina Helena Sim es Barbosa 1 Sa de da Mulher 2 Gravidez e Parto 3 G nero 4 Pesquisa Qualitativa Tese A DISSON NCIA ENTRE DESEJO E REALIDAD
104. a E falavam acontece isso e aquilo E na verdade aquilo era muito chocante porque eu tinha essa clareza na minha cabe a de que o parto normal o melhor para todas as mulheres Eu achava que n o existia no mundo alguma mulher que preferisse fazer cesariana Meter uma faca na barriga Eu achava isso sim muito louco Carla Para ampliar o olhar sobre as poss veis influ ncias parentais na escolha do tipo de parto buscamos junto s entrevistadas informa es quanto s experi ncias de parto maternas Encontramos que a maioria das m es 11 das entrevistadas havia realizado cesarianas Nesse grupo foram inclu das as m es que tiveram as duas experi ncias s a cirurgia oito e ces rea e PV tr s Esse fato nos revela que essas m es j pertencem a uma gera o de partos cir rgicos Possivelmente pela faixa et ria das nossas entrevistadas e pelo per odo que 135 come ou a ascender o parto cir rgico no Brasil d cada de 70 podemos supor que esse grupo representa uma segunda gera o de ces reas Como colocou nossa entrevistada Na poca da minha m e acho que era muito mais natural ter uma ces rea As mulheres com poder aquisitivo tinham ces rea O nen m nascia mais bonito n o se fazia for a n o do a era uma coisa mais f cil Hoje o contr rio Quem tem mais poder aquisitivo anda querendo um parto mais natural Na poca da minha m e era natural ter ces rea Elis Apesar da alta
105. a apenas transit ria pois a confiabilidade no profissional ou tenta ser maior Para outras ainda fica o desejo de esquecer o que houve como se esses questionamentos e d vidas fossem por demais dolorosos para serem cultivados Esta aceita o e absor o do discurso m dico segundo Chachan 2006 podem explicar porque muitas mulheres que desejavam parto normal aceitam a ces rea Esta autora por m destaca que esse fato n o ocorreu em seu estudo de forma linear completa e a cr tica comprovando o quanto a dial tica da acomoda o e da resist ncia perpassa esses processos que s o concomitantemente subjetivos e sociais de aceita o e rejei o de uma situa o de opress o e domina o Anyon 1990 Uma entrevistada relatou uma viv ncia familiar que retrata a subordina o feminina que desapropria a mulher do seu corpo e do seu direito como vemos a seguir Porque a irm dele a cunhada teve parto de ces rea marcada no dia com aquela barriga enorme ela disse Bom gente agora eu vou ter nen m Sabe a abriram a barriga dela para tirar o nen m Aquilo pra mim foi horr vel sabe eu acho aquilo horroroso uma coisa assim uma ansiedade ela com aquela barriga fechada sem motivo de abrir Ela n o tava ainda em trabalho ela tava com 39 semanas Porque eles n o queriam deixar entrar em trabalho de parto por causa do cord o Marta 101 A transforma o da assist
106. a es sociais Identidade subjetiva como reflex o sobre a constru o de identidade de g nero cr tica psican lise pela pretens o universal a hist rica Segundo a autora o g nero seria a primeira forma de rela o de poder o campo onde o poder vai se entrela ando e articulando Certamente o g nero n o o nico campo mas constitui um meio persistente e recorrente que na verdade tem essa significa o do poder 28 O feminismo surge como um movimento social e pol tico Louro 1997 Sim es Barbosa 2001 no in cio dos anos 60 Contribuiu junto a outros movimentos libert rios da poca para a emerg ncia hist rica das mulheres enquanto atores pol ticos rompendo com o isolamento dom stico em que estas viviam O conceito de g nero emerge ent o da reflex o coletiva das mulheres sobre seus corpos viv ncias e emo es enquanto mulheres e da recusa ao determinismo biol gico que se caracteriza pela diferen a sexual Sim es Barbosa 2001 O movimento feminista alavancou atrav s da discuss o da opress o das mulheres questionamentos que iam al m do corpo e da sexualidade Essa percep o descortinou outras formas de opress o e explora o articuladas de g nero tais como as de classe social e de ra a etnia Sim es Barbosa 2001 Scott 1995 sinalizando para as diferen as entre as mulheres Neste contexto de lutas sociais o movimento feminista empreendeu teoriza es com o intuito de e
107. a o de construir uma aproxima o com ela Como reproduzimos aqui eu falei que queria ter parto normal e ele o obstetra falou acho que n o vai ter problema nenhum de voc ter parto normal voc uma pessoa normal Ele o obstetra uma pessoa monossil bica no mesmo 110 tom ele o obstetra n o se altera muito ent o ele o obstetra achava que era normal eu achava que era descaso depois eu comecei a achar bom que bom que ele o obstetra acha que normal que eu t tima se n o levanto a sobrancelha dele o obstetra ent o bom eu vou ter normal Marta O relato de Marta mostrou que n o houve uma sincronia at o momento do parto como expressou a seguir Entre o Alan obstetra e eu n o rolou nenhuma constru o nem identifica o durante o pr natal N o tinha espa o pra d vida pra fofoca pra frufruzinho pra colinho sabe ele n o era uma pessoa acolhedora nem um pouco e no dia do parto que eu virei prioridade porque at ent o eu era tipo mais uma na lista das que v o ter parto tudo indicava normal Marta Em v rios relatos pudemos captar a sutil inger ncia m dica sobre o tipo de parto eleito pela mulher sem que no entanto a maioria delas percebesse desde os primeiros momentos do acompanhamento pr natal As informantes compreendiam como raz es t cnicas as alega es dos obstetras sobre poss veis dificuld
108. a o de que est o sendo manipuladas ou induzidas para a mudan a da escolha do parto Mesmo aquelas que percebem acabam aceitando as decis es impostas A sutileza muitas vezes utilizada para introduzir no discurso m dico a mudan a para a cesariana Ela falou a obstetra Olha j est com 39 semanas voc quer esperar mais Ele o beb est grande e pesado e a vai ser complicado para o parto normal A eu fiquei preocupada com isso Me senti muito pressionada nesse momento Joana Perguntamos ent o se ela antes de chegar a esse momento t o pr ximo ao parto chegou a pensar em mudar a sua escolha Ela seguiu no seu depoimento N o n o o tempo todo eu queria ter normal mas a eu tentei relaxar j estava feito ia ser ces rea mesmo porque nada dele querer vir ao mundo eu tive que tir lo A minha m dica disse depois que n o daria pra nascer normal porque o cord o umbilical era curto Joana A justificativa usada para realiza o da ces rea de certa forma pareceu ter confortado nossa informante no sentido dela pensar ter evitado possivelmente um problema maior 142 Observamos que para a maioria das entrevistadas na hora do parto o entendimento constru do no pr natal com seus obstetras surgiu como referencial para infundir medo na mulher Esse mecanismo de aparente confian a e franqueza entre o m dico e a mulher parece ter sido utilizado para favorecer
109. a tentativa de induzir as mulheres a decidirem pela cesariana A pegadinha do cord o umbilical Durante os depoimentos algumas entrevistadas relataram que no percurso da gesta o surgiu a preocupa o de o beb estar enrolado no cord o umbilical e que esse fato poderia representar um poss vel risco para o PV na medida em que o beb poderia entrar em sofrimento Como demonstrado nas falas seguintes S que no meio da gesta o ele ficou enrolado deu duas voltas no cord o a n o que fosse um empecilho mas pode ser perigoso na hora do parto Ele um m dico muito cauteloso Ele falou assim Voc pode ter um parto normal mas s que pode faltar oxigena o pro beb na hora do parto ele 94 pode ficar preso pelo pesco o Ele me deu as op es os motivos n todos os riscos que tem o parto normal quando o nen m t enrolado Eu fiquei at o ltimo minuto rezando pra que ele virasse que ele se soltasse Nat lia Eu tinha medo que ele sofresse alguma coisa que ele ficasse com falta de ar que o cord o umbilical enrolasse no pesco inho dele que dizem que isso ruim Dizem porque o parto normal pode dar falta de ar no beb que pode ser perigoso Alice Outras informantes fizeram refer ncias a hist rias de mulheres pr ximas demonstrando que esse poderia ser um motivo para mudarem de plano sobre ao tipo de parto Como apresentamos nesse relato a segu
110. a a cesariana em mulheres de camadas m dias 4 1 3 Objetivos e Justificativas 9 CAP TULO II CONTEXTUALIZA O 2 O preocupante cen rio da cesariana 10 2 1 Uma revis o bibliogr fica sobre a quest o da cesariana 10 2 2 A assist ncia ao parto 16 2 2 1 Pegadas hist ricas das parteiras obstetr cia 16 22 2 O parto no Brasil 18 2 2 3 As mudan as no Brasil 19 2 2 4 A proposta de um novo modelo de assist ncia o parto humanizado 21 2 25 Situa o atual da assist ncia ao parto 22 CAP TULO III DISCUSS O TE RICO METODOL GICA 3 Conceito de G nero 27 3 1 O conceito de G nero na an lise da cesariana 31 3 2 O desejo materno e suas vari veis 33 3 3 O caminho metodol gico 34 3 3 1 A pesquisa qualitativa 34 3 3 2 Pela tica do materialismo hist rico e dial tico 36 3 3 3 Considera es sobre as t cnicas de pesquisa 40 CAP TULO IV OS DADOS DA PESQUISA 4 Apresenta o do campo 42 4 1 A entrada no campo 43 4 2 A observa o participante 44 4 2 1 Explorando o campo 44 4 2 2 A rica experi ncia dos encontros 45 4 2 3 Observando as hist rias dos partos nos grupos 48 Desejos frustrados culpabiliza o da mulher 48 Vulnerabilidade da escolha das gestantes 49 Poss veis justificativas para o desfecho 52 A recompensa do desejo realizado outras alternativas 55 4 2 4 Observando outras interfaces na experi ncia do parto 56
111. a certeza de que a ces rea foi necess ria 153 puderam se conformar com a impossibilidade do PV Assim o momento de frustra o p de ser melhor superado Nas falas a seguir expomos o relato dessas experi ncias Eu na hora nem pensei mais no parto normal n o pensei Voc fica t o emocionada assim quando o nen m nasce eu sou muito pr tica nas coisas Se realmente teve um problema informado pelo obstetra para fazer a ces rea que foi detectado vamos resolver da forma que poss vel confiei nele no obstetra N o ultrapasso isso n o fico pensando nisso N o tenho esse pensamento de ter deixado algo pra tr s J fechei isso Mas sei que tem gente muito agredida com isso muito frustrada eu vejo isso no orkut p gina de relacionamento da internet n o se sente m e Tem muita gente assim Alice Olha eu n o fiquei decepcionada frustrada por ter sido uma cesariana O que pesou mais era que eu queria que meu filho nascesse bem Eu tinha consci ncia de que se n o desse se tivesse riscos para a sa de dele do beb teria que fazer uma ces rea at pela minha profiss o enfermeira Ent o em momento nenhum eu me senti triste Minha m dica j tinha colocado que pela minha estrutura tinha bacia estreita e o tamanho da crian a talvez n o fosse poss vel o parto normal mas eu deletava a informa o e dizia Eu posso ter meu filho de parto normal sim O fato de
112. a cr tica sobre o mundo Desse pensamento compartilhava 4 23 tamb m o professor Paulo Freire Ent o o PV passa a ser o referencial atual do que social e politicamente correto para um grupo de mulheres principalmente nesse segmento social O PV recupera o status de melhor parto para o beb que instiga o instinto materno de fazer o melhor para seu filho Tornquist 2002 postula que o corpo capaz de gerar gestar e parir e que apesar da medicaliza o ainda percebido e valorizado como um espa o de poder e saber das mulheres Isso acontece mesmo que as mulheres que optam por esse tipo de parto sejam preconceituosamente tratadas como desviantes do caminho naturalizado da ces rea Ou mesmo como retr gradas desviantes da modernidade tecnol gica sendo por isso muitas vezes criticadas por sua radicalidade em querer expressar as proscritas manifesta es corporais e emocionais do parto como parir na posi o de c coras em casa na gua sem analgesia etc Alguns elementos presentes nas falas de outras entrevistadas revelaram que a rela o entre elas e os obstetras foi fundamentada na aceita o da legitimidade da interven o m dica sobre o parto e tamb m pelo conhecimento m dico introjetado sobre a ces rea A minha m dica sempre dizia que tem gesta o que n o d pra fazer normal que tinha que esperar pra ver como era a minha se desse ela faria o parto normal Depois ela foi
113. a da constru o do conhecimento ela uma dimens o constitutiva do conhecimento Portanto o PV uma experi ncia emocional importante de ser vivida para o desenvolvimento humano E devemos assumi la enquanto emo o proscrita e n o permitir elimin la reprimi la ou escond la Nesse sentido a autora aponta que 83 As emo es proscritas t m uma rela o dial tica com a teoria cr tica social algumas delas s o necess rias para desenvolver uma perspectiva cr tica p 175 As mulheres desejam o PV mas acabam se submetendo a uma cesariana sem a certeza de sua real indica o Mesmo assim as mulheres particularmente as que hoje s o mais atingidas por esse uso indiscriminado ainda n o conseguiram se articular suficientemente para transformar coletivamente essa situa o Como aponta Jaggar 1997 sobre o papel da emo o na transforma o das situa es de opress o Somente quando refletimos sobre nossa inicialmente confusa irritabilidade revolta raiva ou medo podemos trazer consci ncia nossa percep o mais profunda de que estamos numa situa o de coer o injusti a e perigo p 175 Dessa forma as mulheres vivem sua opress o de g nero individual e privada tamb m no mbito da assist ncia ao parto S quando come arem a compartilhar coletivamente suas experi ncias vividas expressando o desejo pelo PV e a disson ncia desaguada numa ces rea desnecess ria
114. a em todo mundo transformando se numa verdadeira epidemia Sakala 1993 Dias 2001 Marqu s 2005 O procedimento cir rgico para viabilizar o nascimento nas complica es obst tricas que colocassem em risco a vida da m e e do concepto foi banalizado e utilizado como procedimento seguro indolor moderno e potencialmente ideal para toda mulher gr vida Souza 1994 No Brasil a assist ncia ao parto tamb m a partir de 1970 come ou a sofrer uma mudan a dr stica Essa mudan a gerou um estudo realizado por antrop logos denominado A Cultura dos Partos Ces reos no Brasil Berqu 1999 Fachel 1991 e Souza 1994 O trabalho mostrou que a soma de diversos fatores n o m dicos que envolvem o nascimento s o determinantes no resultado do parto Esses fatores n o biol gicos conduzem a um risco aumentado da cesariana Isso se confirma no estudo de Cury et al 2003 onde essas evid ncias est o envolvidas na ascens o dos ndices de cesariana e s o ainda mais marcantes nos pa ses em desenvolvimento onde a cultura da cesariana se perpetua como forma de nascer mais segura Segundo os autores os aspectos s cio econ micos preocupa es tico legais e as caracter sticas psicol gicas tanto do profissional quanto das mulheres est o fortemente associados quest o da escolha do tipo de parto 11 A Organiza o Mundial de Sa de OMS sinaliza desde 1985 que apenas 15 dos nascimentos necessitam da realiza
115. a indu o da cesariana Caso houvesse uma tentativa de insistir ou negociar uma espera maior de tempo para tentar o PV era imputada mulher a responsabilidade por qualquer acontecimento negativo como revela a fala abaixo Ele o m dico muito atencioso qualquer d vida sempre estava pronto pra responder ele perguntou como eu gostaria de ter meu filho e eu falei gostaria muito que fosse normal A ele falou tudo bem ent o vamos fazer por onde voc tenha parto normal S que no meio da gesta o o beb ficou enrolado no cord o se n o fosse esse empecilho ele um m dico muito cauteloso ele falou se voc quiser podemos ainda tentar o parto normal que voc queria mas arriscado voc quer insistir Eu s resolvi que deveria ser ces rea pela press o da culpa que eu teria depois caso acontecesse alguma coisa N o sabia se estava sendo ego sta em querer o parto normal de qualquer jeito E se acontecesse alguma coisa com o beb eu me sentiria culpada Teve uma press o Nat lia No relato acima pudemos observar como a forma de press o utilizada para induzir a aceita o da cesariana que aparece como solu o para o problema apresentado oprime a mulher A decis o transferida para ela que termina por ceder ao saber poder de algu m em quem confia e desistindo assim de sua escolha Esse mecanismo instaura nas mulheres uma sensa o de inseguran a ansiedade
116. a maioria das mulheres vivencia esses momentos de dificuldades nos primeiros meses ap s o parto Ando muito cansada n o estou com vontade de fazer sexo mas ao mesmo tempo sinto falta estamos em crise A maternidade um momento muito delicado Grupo Botafogo 05 03 2007 A coordenadora desse grupo ponderou sobre a n o participa o masculina no processo da maternidade observando o quanto tudo que envolve a situa o da maternidade faz parte do universo feminino se as mulheres n o solicitam eles t m dificuldades de participar Por m ap s alguns momentos de reflex o coletiva a maioria das participantes discordou da coloca o feita pela coordenadora como ilustra o depoimento abaixo n o precisamos solicitar j que evidente que precisamos de ajuda alguns homens j compreenderam seus pap is no mundo atual e conseguem participar mais ativamente ajudando suas mulheres os dois fazem parte desse processo que n o exclusivamente feminino Grupo Botafogo 05 03 2007 62 Segundo Mitjavila e Echeveste 1994 dentro da constru o ideol gica da maternidade existe uma tend ncia de se perceber que as obriga es maternas s o naturais e as responsabilidades paternas eletivas com a evoca o de sacrif cios inerentes condi o feminina Por m como as participantes demonstraram essa ideologia parece estar sendo contextada e desnaturalizada Nesse campo f rtil de exper
117. a majorit ria que a maioria nove manteria seus obstetras Apenas uma entrevistada tinha certeza absoluta que mudaria de m dico afirmando que n o ficaria com ela nem como ginecologista As outras cinco demonstraram d vidas e algumas insatisfa es na conduta do obstetra tanto no pr natal como no parto principalmente em rela o indica o da ces rea mas mesmo assim demonstravam incerteza quanto a uma mudan a Uma das principais alega es era a compet ncia t cnica desses profissionais N o sei ainda se vou mudar de m dico Eu continuo confiando no Alan o obstetra antes de ele ser conhecido como uma pessoa que aguarda o parto normal ele era conhecido como um timo cirurgi o de ces rea o que eu achei bom Porque se eu precisasse no dia se eu precisasse eu vou ta n o s na m o de uma pessoa que gosta de fazer parto normal como se precisar de uma ces rea ele vai saber fazer bem Marta Eu ainda tenho d vida Eu acho que ela um pouquinho intervencionista Mas o fato dela ser muito t cnica que na hora ela opera bem faz uma 158 ces rea muito bem Isso saber operar bem acaba dando confian a na gente se tiver que ser ces rea como aconteceu comigo Flora Apesar de terem por diversas vezes relatado conflitos e d vidas instalados durante a assist ncia pr natal e no parto e das desconfian as sobre a indica o da cesariana esses m dicos seriam eleitos novamente caso
118. a muito n o sendo est vel Na empresa privada todo ano um desespero a gente sempre fica com medo de perder o emprego Flora A volta ao trabalho para aquelas que j estavam na ativa representou um grande sacrif cio por terem que abandonar seus beb s Mesmo sentindo falta da atividade profissional o momento da separa o era sempre doloroso Como a fala a seguir nos mostra Consegui ficar os quatro meses de licen a maternidade mas estava sentindo saudades do trabalho Ficar o tempo todo com o beb por mais que seja prazeroso e eu tenha curtido muito chega uma hora que a gente fica pensando em voltar S que quando chega a hora d um vazio voc chega no trabalho e fica dando uma vontade louca de sair correndo e abra ar seu filho N o est sendo f cil me adaptar ter que ficar tanto tempo longe dele Seria bom poder conciliar trabalhando s meio expediente mas isso imposs vel Luisa Certamente n o tarefa simples enfrentar as contradi es entre querer voltar a produzir mas tamb m exercer o seu prazer como m e estar mais tempo com os filhos Mesmo com todos os conflitos a maioria n o pensava em se afastar do trabalho para se dedicar exclusivamente a cuidar dos filhos Procuravam estrat gias para organizar suas 161 vidas para que tivessem mais tempo dispon vel para a maternidade sem prejudicar o trabalho remunerado Aquelas que estavam pr ximas do t rmino da licen a come
119. ades no momento do parto e que demandariam uma interven o cir rgica Os depoimentos abaixo ilustram essa quest o Eu me lembro muito bem que a minha m dica falou que ia tentar ia fazer o que fosse poss vel para o parto normal agora a ela falou n o vou dizer que n o falou ela falou aquelas frases cl ssicas tem que ver se voc vai ter isso se vai ter aquilo n o sei qu se tiver todas as condi es voc vai ter normal Dora Eu falei para ela o tempo todo que eu queria um parto normal at por saber das vantagens para a mulher e para a crian a tamb m e ela falou N o tem o menor problema mas eu quero que voc tamb m esteja preparada porque se houver alguma complica o se voc n o tiver dilata o se n o tiver contra o n s teremos que partir pra uma ces rea para a crian a n o ter problema Eu estava ciente disso o tempo todo T nia Percebe se aqui o quanto as ideologias que circundam tanto o parto vaginal como a cesariana refletem e se utilizam da l gica dualista que refor a as dicotomias conceituais perigoso seguro bom ruim corpo m quina natural mecanicista que permeiam as rela es sociais e cient ficas na assist ncia sa de A naturaliza o do ato cir rgico como via de 111 nascimento parece servir para confundir e gerar conflitos para as mulheres tanto quanto o terrorismo que se proclama sobre o parto vaginal Como aponta B
120. ador passivo Este pode ter uma variedade de pap is dentro de uma situa o em um estudo de caso e pode inclusive participar dos eventos que est o sendo estudados Thiollent 1984 A inser o da observa o participante veio ent o complementar os dados colhidos atrav s das entrevistas evidenciando a riqueza que as diversas ferramentas de abordagem do m todo qualitativo oferecem e que facilitam o processo de an lise 42 A concilia o dessas t cnicas possibilitou internalizar os pontos de ancoragem necess rios para entrela ar as falas das mulheres nesses dois diferentes momentos nos grupos durante as reuni es das AP e nas entrevistas individuais As duas t cnicas de coleta de dados foram aliadas essenciais a todo o processo metodol gico Essa alian a permitiu focalizar o objeto de estudo sob v rios ngulos ampliando o enfoque te rico e construindo a produ o do conhecimento CAP TULO 4 OS DADOS DA PESQUISA 4 Apresenta o do campo As Amigas do Peito O campo escolhido para o desenvolvimento de nosso estudo foi o grupo de apoio amamenta o denominado Amigas do Peito AP Essa escolha se deu ancorada no interesse em estudar os segmentos m dios da popula o feminina que a despeito da escolha pelo parto vaginal realizou uma cesariana como desfecho da gesta o Levamos em considera o que as mulheres que frequentam as AP em sua maioria pertencem a esse segmento social Portanto presume se
121. ados pelo presente projeto de pesquisa e os sujeitos desta pesquisa ser o mulheres prim paras maiores de 18 anos que mesmo tendo optado durante a gravidez pelo parto vaginal tiveram seus filhos atrav s de cesarianas ser o eleitas mulheres usu rias de servi os privados de sa de tendo o parto ocorrido em maternidade particular e com o mesmo obstetra que a acompanhou no pr natal S o portanto potencialmente indiv duos com autonomia plena para decidirem sua participa o na pesquisa e a metodologia de pesquisa proposta o m todo qualitativo pretende estabelecer um contato intersubjetivo entre pesquisador e pesquisado sobre temas pertinentes ao universo pessoal e ntimo dos sujeitos de pesquisa o que pressup e um v nculo de confian a e cumplicidade na rela o estabelecida Esta confian a s poss vel na medida em que os sujeitos de pesquisa sejam plenamente esclarecidos sobre seus procedimentos os temas que ser o abordados sua finalidade e a garantia de sigilo e anonimato sobre os depoimentos prestados e ser o plenamente respeitados os valores culturais morais sociais religiosos e ticos das participantes da pesquisa Esses valores vale lembrar s o componentes intr nsecos dos referenciais te rico metodol gicos propostos e ap s explicita o do projeto de pesquisa em todos seus aspectos a ades o dos sujeitos de pesquisa ser necessariamente volunt ria j que a metodologia proposta pressup e
122. agora e depois que terminar a licen a maternidade 3 Como pensa no retorno ao trabalho Com quem o beb vai ficar 4 Como v agora na vida real a concilia o da maternidade e da vida pessoal conjugal profissional familiar
123. amente e acompanhar o seu desenvolvimento O ltimo relato mencionado merece tamb m um aparte porque n o s revela a problem tica do adiamento da volta ao trabalho remunerado mas tamb m de um conflito geracional A filha que quando beb viveu o afastamento da m e pela volta desta ao trabalho mostra que n o quer repetir a mesma hist ria com seu filho A m e que fez parte de um momento no qual as lutas femininas pela afirma o pessoal e profissional das mulheres eram mais intensa valoriza a independ ncia econ mica e talvez por isso considere retr grado o papel apenas materno que sua filha deseja nesse momento Esse conflito parece ainda n o estar resolvido pois a entrevistada cobra da m e esse distanciamento e parece se incomodar com uma postura feminista excessiva em detrimento do conv vio que considera importante para a forma o de v nculos entre m e e filho como reflete a continua o do relato A minha m e trabalhava porque queria e a tem essa coisa meio do elo da pessoa porque a carreira n o deixa de ser uma coisa de realiza o pessoal Ela me botou na creche a minha m e sempre falou que eu e meu irm o mamamos at os seis meses A um dia comentando com ela falei Voc me botou na creche com uns tr s meses u mas a ent o eu n o mamei at os 6 meses Ela disse N o voc mamava leite normal na creche mamava em casa comigo de manh e noite a
124. amento de uma decis o m dica no momento do parto N o parecem existir argumenta es suficientes que resolvam esse distanciamento de saberes As falas de nossas informantes ilustram o cen rio que as mulheres enfrentam no processo de constru o de suas escolhas que se soma a uma tend ncia cultural e social de aceitar a cesariana como um modo normal de dar luz Minha chefe que m dica foi uma que disse Ah parto normal s da Bahia pra cima aqui no Rio de Janeiro j n o se faz parto normal Parto normal uma coisa anormal absurda Ela falou que parto normal tinha que ser proibido s cesariana T nia at meu chefe falou a mulher do chefe m dica contra o parto normal Voc n o vai ter parto normal nenhum m dico quer enfim um transtorno pro m dico e tal ces rea muito mais moderna voc marca a hora chega l e faz e pronto entendeu A eu falei At parece deixa essa boca de sapo fechada Dora nas consultas de pr natal eu ficava perguntando para as mulheres que aguardavam na sala de espera E a voc fez normal ou ces rea e uma mulher respondeu sim ces rea marcada Eu perguntei Como assim voc quis ces rea E ela falou muito melhor imagine Aquela dor toda do parto normal ficar fazendo for a Ces rea timo voc corta e acabou Isso foi uma coisa que me chamou aten o Imagine tem mulher que p
125. an amento da campanha neste ano Um procedimento que deveria ser a via de nascimento alternativa impossibilidade do acontecimento natural apresenta hoje uma ocorr ncia absurdamente superior ao ndice de 15 recomendado pela OMS baseado nas evid ncias cient ficas que respaldam esta posi o Notzon et al 1987 Zheng et al 1996 Belizan et al 1999 Nesse contexto da alta incid ncia de cesarianas nas mulheres de camadas m dias e luz das pesquisas j realizadas que muitas perguntas surgem mas ainda est o sem respostas E neste campo insuficientemente explorado segundo diversos autores Curry e Menezes 2006 Zorzetto 2006 Giffin 2003 Souza 2002 Gamble 2000 Granham 1999 Carranza 1994 Fa ndes e Cecatti 1991 que esta pesquisa de car ter explorat rio pretende contribuir 3 Lei 9 961 2000 criou a Ag ncia Nacional de Sa de Suplementar ANS e definiu a sua finalidade estrutura atribui es receita a vincula o ao Minist rio da Sa de Tem por finalidade institucional promover a defesa do interesse p blico na assist ncia suplementar sa de regular as operadoras setoriais inclusive quanto s suas rela es com prestadores e consumidores e contribuir para o desenvolvimento das a es de sa de no Pa s Uma cirurgia com todos os riscos de um procedimento invasivo passou a ser significada como normal ao passo que o parto normal passou a ser o diferente e anormal Souza
126. ando com as mulheres a posi o dos seus m dicos Como apresentamos a seguir Ah ela falou Lu sa n o assim d tempo de voc chegar se n o puder pegar o carro pegue um t xi eu vou ao seu encontro At eu chegar da Barra at a maternidade d tempo De maneira nenhuma ela me pressionou Lu sa E algumas maternidades ficam em lugares que s o mais perigosos citou algumas ainda mais noite As vezes a minha m dica falava n o 92 diretamente mas falava sim _ O Joana se acontecer de ser de madrugada o W o mais acess vel Mas isso n o me fez mudar a escolha Joana Isso influenciaria a quest o dos m dicos mesmo Logo que ele falou de normal ele comentou isso Imagine acontecer de madrugada dependendo da onde o m dico e a equipe morarem ter que sair no meio da madrugada Elis Perguntamos a esta ltima informante como se sentia quando o m dico demonstrava essa preocupa o Ela nos respondeu N o mudei minha opini o sobre o parto n o porque me informei que n o precisava sair de madrugada correndo E tamb m tem os t xis que com eles tem menos assaltos e eu moro perto Ent o a quest o da viol ncia n o me influenciou mesmo quando ele o obstetra falou sobre isso Depois vendo na TV TV a cabo e me informando vi que n o nasce t o r pido assim d tempo ele mesmo me explicou Elis Vimos que o assunto era introduzido nas c
127. ar e aprofundar a compreens o dos complexos processos de escolha do parto vaginal PV que foram emergindo nos depoimentos das mulheres integrantes do nosso estudo Para favorecer a discuss o que integra o cen rio desse come o de caminhada subdividimo lo em tr s subtemas O processo de escolha Certezas e d vidas Ideologiza o do parto 4 3 3 1 1 O processo de escolha Mesmo abrigando pontos comuns no processo de escolha do parto o querer dessas mulheres tamb m muito particular Assim cada uma das entrevistadas verbalizou as especificidades de suas viv ncias explicitando diferentes olhares sobre a expectativa do parto e a elabora o da escolha no transcorrer da gravidez Nesse sentido as vontades dos sujeitos s o perpassadas por uma s rie de combina es entre os t o diferentes momentos da hist ria de vida de cada um onde se mesclam as 13 experi ncias individuais e coletivas marcadas pelos valores de classe g nero e ra a Essas viv ncias t m um importante significado na dimens o social dos comportamentos femininos relacionados ao momento do parto e se entrela am manifesta o do desejo da mulher sobre a forma de parir Esse processo n o foi diferente para nossas informantes Por essas raz es procuramos distanciar as entrevistas do puerp rio mas sem afast las muito do parto optando pelo recorte entre o terceiro e o nono m s ap s a realiza o da cesariana Percebemos que a maioria das e
128. arturientes por uma vaga e pelo atendimento em maternidades superlotadas no setor p blico e que tem sido denunciada atrav s de diversos estudos assim como pelos rg os de comunica o Jornal O Globo 09 p 16 e 10 p 25 de maio de 2006 Essa peregrina o das gestantes pobres gera estresse e 14 ang stia com reflexos irrepar veis na rela o dessas mulheres com o momento do nascimento aumentando a possibilidade de agravo nas condi es materno fetais pela demora na assist ncia o que muitas vezes resulta numa ces rea de emerg ncia Barros 1986 Rattner 1996 Marqu s 2005 Outra quest o que tamb m est associada indica o do parto cir rgico a laqueadura tub ria A utiliza o da cesariana como via de se obter a laqueadura foi descrita em muitos relat rios como um fator importante para o aumento das taxas de ces rea no Brasil Janowitz et al 1982 Braga 1988 Alencar e Andrade 1993 No Brasil esses estudos mostram que as mulheres de classe popular atendidas pelo Sistema nico de Sa de SUS s o submetidas cesariana em fun o da realiza o da laqueadura tub ria imediatamente ap s o parto A discrimina o social caracterizada pela falta de escolha dessas mulheres nas quais a interven o cir rgica feita para legitimar uma segunda interven o Janowitz et al 1984 conduziram um estudo em S o Paulo que indica que a ces rea era uma condi o necess ria para a esteriliza
129. as mulheres que constitu am o mundo social que desej vamos investigar Durante a explora o do campo me dei conta de como a minha posi o nos grupos em busca de minhas informantes me colocava em uma situa o privilegiada como observadora Nesse per odo em que frequentei os encontros produzi relat rios verdadeiros di rios de campo que reproduziam as viv ncias e as trocas de experi ncias entre as mulheres participantes e seus acompanhantes Integrei me aos grupos e compartilhei esses momentos para melhor conhecer a realidade de vida das mulheres das camadas m dias no momento de seu p s parto N o estava prevista a utiliza o dessa t cnica observa o participante na trajet ria inicial do mestrado e no processo da qualifica o Mas como os relatos resultaram em um material importante para o entendimento das quest es relacionadas ao foco e ao objeto da pesquisa decidimos ent o incorpor la enquanto um dos m todos de abordagem do mesmo Dessa maneira uma grande quantidade de informa es foi gerada resultando em um enorme desafio Foi dif cil simplificar as situa es vivenciadas e relatadas pelas mulheres sem perder a complexidade dos contextos onde foram constru das e principalmente sem esquecer o papel pol tico que a pesquisa tem sobre os sujeitos investigados Diversos temas al m da amamenta o eram discutidos nos grupos tais como a gesta o o parto e a rela o com os obstetras duran
130. assou a representar um interesse mercantil do sistema capitalista na sa de que afere lucro atrav s da sua pr tica Como estrat gia para sua expans o passou a ser ideologicamente significada como normal promovida e valorizada pelo pr prio sistema social e de sa de que abrandou os riscos inerentes de sua pr tica indiscriminada Esse entrela amento entre a ideologia de g nero e a ideologia capitalista mostra como uma se alimenta da outra Apesar disso a literatura espec fica e o movimento em favor do PV entre as mulheres de camadas m dias passam a ser uma refer ncia de socializa o consciente para recuperar o espa o feminino nesse processo do parto indo contra as ces reas abusivas tal como o movimento capitaneado pela ONG Parto do Princ pio uma entre tantas outras manifesta es que v m acontecendo em prol dessa transforma o 98 Como aponta Jaggar 1997 Quando certas emo es s o compartilhadas ou validadas pelos outros existe a base para uma subcultura definida por percep es normas e valores que se op em s percep es normas e valores predominantes Ao fornecer as bases para essa subcultura as emo es proscritas podem se tornar subversivas tanto pol tica como epistemologiamente p 174 Esta autora ainda acrescenta que essas emo es proscritas se inter relacionam dialeticamente com a teoria cr tica social sendo algumas delas necess rias para o desenvolvimento de uma perspectiv
131. ata a sa de como bem de consumo Almeida 2000 apud Sim es Barbosa 2006 Portanto para alcan ar ou alavancar as metas de programas como o de Humaniza o no Pr natal e Nascimento PHPN e do pr prio PAISM ser necess rio muito mais que propostas que n o sendo postas em pr ticas re atualizam as desigualdades que vitimizam a popula o feminina nos seus direitos b sicos sa de dignidade e cidadania O que estamos assistindo hoje a forma contradit ria que a sociedade trata as quest es sobre a maternidade Ao mesmo tempo em que se evoca ideologicamente esse momento como um direito a uma experi ncia enriquecedora humanizada e valorizada onde se celebra a gera o da vida podemos ver o outro lado da moeda onde a maternidade padece da falta de prote o e negligenciada nessa mesma sociedade 7 Cf Sim es Barbosa 2006 27 Essa neglig ncia n o atinge apenas o ciclo gr vidico puerperal ela tem sua interface nos aspectos assistenciais econ micos e psicol gicos dentre tantos outros que agravam a vunerabilidade social da maioria das mulheres brasileiras que n o encontram sequer facilidade de acesso a um servi o de sa de de qualidade inclusive no pr natal CAP TULO III DISCUSS O TE RICO METODOL GICA 3 O conceito de g nero Nosso estudo adotar o conceito de g nero para a compreens o das rela es ideol gicas que se constroem entre as mulheres de camadas m dias e os seus
132. avam um processo de sofrimento antevendo o que passariam com o afastamento dos filhos depois de um per odo de conviv ncia di ria mesmo que exclusiva e exaustiva Muitas informantes durante a entrevista n o contiveram a emo o ao falarem do assunto e choraram Se pudessem diziam esticariam mais esse tempo at que os beb s estivessem mais crescidos Daqui a duas semanas eu vou ter que voltar n o sei como vai ser ainda n o estou preparada para estar longe dele tanto tempo o dia inteiro n o sei como vou agiientar Eu quero voltar ao trabalho sim acho importante n o quero parar de trabalhar mas ele ainda t t o pequenininho uma maldade Alice Essa contradi o entre voltar ao mercado de trabalho e cuidar do filho apareceu de forma relevante em todos os discursos O que nos pareceu ser uma condi o inerente ao processo atual de exig ncia social e econ mica que as mulheres desse segmento social est o vivendo Percebemos que maioria busca no trabalho a auto afirma o feminina como uma necessidade de valoriza o Todas referiram que a independ ncia econ mica era a grande vantagem trazida pelo trabalho proporcionando lhes autonomia Como apresentado nos relatos abaixo Eu acho muito importante pra mulher que ela tenha esse espa o do trabalho essa independ ncia at pela quest o financeira Isso ter mais autonomia e n o depender de ningu m Joana Ter condi o de ter
133. blema grande de vaga se referindo a falta de e que dif cil conseguir ainda mais pra quem quer normal Mas a minha m dica disse que n o era pra ficar me preocupando com isso n o tava na hora E ai eu deixei pra me preocupar mais perto do parto Rita Inclusive quando eu decidi pela X maternidade e ela disse Olha vaga l muito dif cil Vamos fazer em outra Eu disse pra ela N o a gente vai conseguir Eu queria muito ter meu beb na X Regina A press o come a no pr natal onde os obstetras alertam sobre o problema A falta de vaga pelo que percebemos nos relatos j assunto conhecido entre as mulheres das camadas m dias Essa informa o passada entre os seus c rculos de relacionamento Certamente elas est o diante de uma situa o pela qual n o esperariam passar tendo um plano de sa de Mas o fato real Existe hoje essa dificuldade no setor privado sobretudo para quem deseja ter PV Ela a obstetra ficou o tempo todo me falando que n o ia ter vaga se eu quisesse fazer normal que de repente eu n o teria onde parir Eu acabei pensando na ces rea somente receando n o ter vaga na maternidade eu tenho uma amiga que passou pela mesma situa o Ela foi parar na Tijuca porque n o tinha mesmo outra op o de maternidade e ela me contou que 90 2 mulheres tiveram na pr pria sala de pr parto Ela chegou na X e n o internou n o ficou porque n o tinha vaga
134. bre a escolha do PV eu sempre tive certeza do PV alguns momentos bate uma inseguran a Tanta gente fala coisas horr veis sobre o parto normal colocam tanto medo que voc acaba mesmo sem querer pensando nisso no medo nas coisas ruins associadas ao PV Ainda bem que isso d e passa risos A vontade maior do PV Rita Nesse contexto a dial tica postula que cada fen meno deve ser compreendido em sua particularidade por m vinculado sua universalidade pois est ligado sendo influenciado e influenciando uma s rie de outras quest es da advindo sua complexidade No caso em an lise existe uma corrente naturalista que a favor do PV e o exalta em sua plenitude em respeito ao processo fisiol gico em conex o com a natureza na valoriza o da mulher como protagonista do evento Em contrapartida o discurso m dico contra ataca enaltecendo a cesariana como parto seguro que preserva a anatomia feminina previne poss veis riscos para o beb e centralizado na figura do m dico Isso representa uma fonte de conflitos e inseguran as para as mulheres que n o dominam o saber cient fico e n o t m informa es suficientes sobre o processo do parto e nascimento Como teoriza Berman 1997 Isso significa que as condi es f sicas particulares da vida de uma pessoa e sua maneira de construir a vida s o os reguladores prim rios das rela es pol ticas e sociais dela e de seu ponto de v
135. bre a quase nexorabilidade da ces rea O cen rio desvelado nessa discuss o potencializa as preocupa es quanto exposi o das mulheres de camadas m dias aos riscos f sicos e emocionais quando submetidas cirurgia sem indica o criteriosa e precisa Somam se a essas preocupa es a excessiva medicaliza o e o excesso de interven es que algumas mulheres sofreram no transcorrer do trabalho de parto e que possivelmente resultaram em iatrogenias que as levaram cesariana A pesquisa tamb m evidenciou que na realidade as mulheres das camadas m dias que procuram o sistema privado de sa de para terem seus filhos tamb m padecem da falta de poder de escolha Por mais que declarem o seu desejo pelo PV e busquem caminhos para alcan lo no final nossas entrevistadas viram sua escolha ser desviada para uma cesariana Outra quest o bastante relevante que a pesquisa detectou foram sutis s vezes nem t o sutis estrat gias para justificar o parto cir rgico Como identificado por uma 170 entrevistada a pegadinha da circular do cord o a mais frequentemente utilizada mas n o a nica a falta de vagas o perigo das madrugadas cariocas entre outras tamb m s o raz es alegadas pelos obstetras para justificarem a necessidade da ces rea As observa es tanto das entrevistas como da observa o participante revelaram que a maioria das mulheres deste segmento social sabe que existem po
136. c m nascido mostra que 41 8 dos partos realizados no pa s em 2004 foram cir rgicos O estado de S o Paulo apresentou o maior ndice 52 6 seguido de Rond nia 51 5 e do Rio de Janeiro 51 0 MS Secretaria de Vigil ncia em Sa de 2004 No Brasil as taxas de cesariana do setor privado est o entre as mais elevadas do mundo Dentre os nascimentos ocorridos no setor de sa de suplementar 79 70 foram por ces reas Este dado evidencia o impacto negativo que a elevada taxa de cesarianas encontrada neste segmento provoca nos indicadores nacionais MS Ag ncia Nacional de Sa de Suplementar ANS 2004 Segundo o Minist rio da Sa de MS ANS 2004 a ces rea apresenta maior risco de morte que o parto normal Al m disso tamb m h maiores possibilidades de les es acidentais rea es anestesia infec es e hemorragias das usu rias e de prematuridade e desconforto respirat rio do beb Portanto a cesariana feita de forma indiscriminada pode trazer s rios danos sa de da m e e do beb Diante desse cen rio o MS programou lan ar no dia 30 de maio de 2006 uma Campanha Nacional de Incentivo ao Parto Normal e Redu o da Ces rea Desnecess ria para conscientizar a popula o sobre a import ncia do parto normal O objetivo ajudar a desfazer a id ia j cristalizada na sociedade de que o parto cir rgico melhor e mais seguro Infelizmente por ser um per odo eleitoral 2006 n o foi aprovado o l
137. cas vezes que a quest o da dor apareceu surgia enviesada Por exemplo quando pergunt vamos sobre as consultas de pr natal e se conversavam com outras mulheres na sala de espera como exemplificado na fala a seguir Conversava com todo mundo E uma loucura A ante sala muito louca Voc tem mil experi ncias escuta tudo ent o eu escutava coisas boas e ruins de um e de outro muito relativo as ruins eram aquelas dores n que falavam Lu sa Perguntada se a dor era uma preocupa o a informante continuou N o isso eu acho que nem ruim isso normal E se remeteu s boas experi ncias de sua m e com partos normais mostrando uma refer ncia parental positiva Diferentemente do que observamos em nossa pesquisa a dor tem sido apontada como o principal fator que interfere na escolha do parto como j relatado em diversos estudos Zorzetto 2006 Moraes e Goldenberg 2001 Souza 1994 Fa ndes 1991 Esse fator pode ser considerado coadjuvante na imposi o da ces rea principalmente no setor privado de sa de onde as mulheres s o muitas vezes induzidas a crer que n o suportar o as dores do trabalho de parto 81 Em muitas situa es poss vel que a decis o m dica para realiza o da cirurgia aproveite se do momento de fragilidade da mulher e a dor seria um deles Isso as levaria a ceder sem questionamentos e sem se oporem decis o m dica Em nosso estudo excepcio
138. ciais Castro 1992 Brito 2000 apud Sim es Barbosa 2001 ao articular as esferas da produ o e da reprodu o para explicar as desigualdades de g nero chama a aten o para a explora o da for a de trabalho feminina atrav s dos baixos sal rios pagos s mulheres sal rios menores para as mesmas ocupa es que os homens para o emprego feminino preferencialmente em segmentos produtivos que exigem baixa qualifica o profissional e ou com v nculos precarizados a falta de legisla o trabalhista que garanta s trabalhadoras alguns direitos principalmente no terceiro mundo No presente momento hist rico podemos perceber o quanto os mecanismos de explora o do trabalho feminino s o partes do fen meno da globaliza o e da imposi o da l gica do mercado Brito 2000 Laurell 2000 Em termos da subsist ncia familiar esse efeito sentido na perda da fun o do homem como principal sustento econ mico como decorr ncia principalmente do desemprego estrutural o que provoca a desvaloriza o da figura masculina do provedor for ando a crescente e cada vez mais precoce entrada das mulheres no mercado de trabalho para garantir a sobreviv ncia familiar O resultado deste processo vis vel no aumento das fam lias chefiadas por mulheres na feminiza o da pobreza e consegiientemente na fragmenta o das rela es familiares causadas pelo afastamento da mulher dos cuidados com os filhos menores pelo ac m
139. cidade do fen meno e suas rela es em n vel mais amplo al m de fomentar a reflex o sobre a gravidez o parto e a maternidade para este segmento social Os pr testes permitiram a avalia o do roteiro e sua posterior adequa o Ao aplic lo no pr teste constatamos que apesar do roteiro ser relativamente extenso essas entrevistas transcorreram sem nenhuma dificuldade sem que o tempo extrapolasse o ideal previsto e com isso n o desmotivasse ou cansasse a informante As entrevistas em sua maioria foram realizadas nos domic lios das entrevistadas com data e hora previamente agendadas por elas e duraram em m dia 2 horas sendo o tempo de maior dura o 2 horas e quarenta minutos Com esses bons resultados pudemos prosseguir com as entrevistas e inclusive considerar v lidas as duas do pr teste A finaliza o do trabalho de campo se deu quando as recorr ncias atingiram o que se convencionou chamar de ponto de satura o Neste momento p de se apreender no material coletado as redes de significados a partir do ponto de vista do outro 4 3 2 Com o p na estrada As situa es nas quais se verificam os contatos entre o pesquisador e os sujeitos da pesquisa configuram se como parte integrante do material de an lise Registrar o modo como s o estabelecidos esses contatos a forma como o entrevistador recebido pelo entrevistado o grau de disponibilidade para a concess o do depoimento o local e
140. cidir o que melhor para a mulher e o beb Tem m dico que n o gosta de ser questionado que se metam em suas decis es porque acham que v o decidir sempre para o que melhor pro beb e pra m e N o gostam de trabalhar sobre press o para poder tomar as decis es certas Elis Os relatos de nossas informantes corroboram com o estudo de Chachan 2006 em que as mulheres das camadas m dias reconheciam o obstetra como nico expert em gravidez e parto A autora revelou ainda que elas ap iam suas decis es integralmente e mesmo considerando parcial a troca de informa es entre eles a confian a foi tida como irrestrita A aceita o da interven o m dica existe pela legitimidade alcan ada pelo modelo biom dico Diferentes resultados foram encontrados pela autora no mesmo estudo com as 127 camadas populares que consideraram parcial o reconhecimento e a confian a no m dico mostrando se geralmente mais relutantes s decis es impostas e classificando como m nimas as informa es prestadas por eles Uma de nossas informantes mesmo sendo da rea de sa de n o escapou da press o de ter que tomar uma decis o a respeito do seu parto Estando com 39 semanas e dois dias e iniciando seu trabalho de parto com contra es e com muita disposi o de ter um parto normal recebeu um prazo limite para que o beb nascesse Minha m dica disse na sexta Se n o nascer at s
141. cionamento do obstetra com as gestantes na maioria dos relatos evidenciava distanciamento entre ambos A maioria delas percebia que eles n o gostavam de responder s suas perguntas e por isso se sentia mal informada o que levava manuten o das incertezas Pude observar em todos os grupos esse mesmo sentimento entre as mulheres e seus m dicos o que gerava para elas muita inseguran a tal como o depoimento abaixo ilustra Quando vou a consulta e fico perguntando sobre as coisas percebo que ele n o gosta parece que est com pressa Acabo n o me sentindo a vontade de falar com ele de novo na pr xima consulta Grupo Tijuca 23 01 2007 Segundo Fa ndes et al 2004 esse abismo entre os obstetras e as mulheres pode estar associado falta de tempo que dedicam para a escuta durante as consultas de pr natal que certamente oportunizaria as trocas de informa es e a cria o de v nculos No entanto o fator mercantil provavelmente determina essa diminui o do tempo de consulta reduzindo a qualidade da assist ncia gestante As dificuldades de se confiar nos obstetras atualmente foi sinalizada por algumas das participantes Declararam perceber que existe uma manipula o para que as mulheres acreditem que n o s o capazes ou ent o s o submetidas cultura do medo materno ficando inseguras quanto a poss veis riscos que o beb possa correr caso insistam no parto normal Como destacamos nessa fala
142. cnologias para manipular e corrigir os defeitos dos processos perigosos e anormais do nascimento 18 Ao analisar a transfer ncia da assist ncia ao parto para os m dicos Machado 1998 pontua Desabituados do acompanhamento de fen menos fisiol gicos foram formados para intervir resolver casos complicados O parto passou ent o a ser visto como um ato cir rgico como outro qualquer O normal confundido com o patol gico a pressa e ansiedade tomam o lugar da calma e da serenidade A observa o atenta d lugar interven o sistem tica e desnecess ria na maior parte dos casos p 143 Essa trajet ria desvela como o parto foi apropriado e legitimado pelo saber cient fico medicalizado e dominado pelo poder m dico Na continua o dessa jornada vamos percorrer brevemente seu caminho no Brasil 2 2 2 O parto no Brasil At o s culo XIX a assist ncia ao parto no Brasil era realizada por parteiras apesar da obstetr cia j ser praticada por m dicos ela se restringia ent o a partos complicados e cir rgicos Magalh es 1922 apud Vieira 2002 Apesar da oficializa o do ensino da obstetr cia nas faculdades de medicina neste mesmo per odo esse n o era um campo onde os homens atuavam ficando restrito s parteiras principalmente na assist ncia aos partos domiciliares Com isso os m dicos parteiros se formavam sem a familiariza o e sem a experi ncia pr tica necess ria para
143. da principalmente no setor de sa de suplementar Continuando o percurso para o entendimento da motiva o dessas mulheres em vivenciarem o PV encontramos entre as entrevistadas os seguintes argumentos A recupera o mais r pida ap s o parto porque melhor para o beb porque o normal o mais natural mais saud vel associado naturalidade do processo do nascimento A maioria das mulheres citou mais de um motivo para justificar sua escolha pelo PV sendo que as respostas mais frequentes nove vezes cada uma foram a recupera o mais r pida melhor para o beb e simplesmente porque era o normal Como exemplificamos a seguir Na minha fam lia todos foram de parto normal ent o eu sabia que a recupera o de parto normal era mais r pida ent o eu tive vontade de ter normal C lia Por causa da minha forma o de enfermeira eu vejo o p s operat rio dos partos normais e cesarianas Eu vejo as mulheres das ces reas para se reabilitarem mais dif cil mais prolongado O parto normal ali acabou voc teve na hora teve contra es nasceu levantou dali j avan a em uma escola de samba s ali T nia Escolhi o parto normal porque eu acho que a recupera o mais f cil melhor pra mulher pra crian a eu queria esperar o tempo dele do beb Vit ria Como visto nossas entrevistadas rea
144. da do beb no momento do parto ocitocina um horm nio produzido no hipot lamo e armazenado na neurohip fise que potencializa as contra es uterinas tornando as fortes e coordenadas at completar se o parto No caso relatado a administra o foi de ocitocina sint tica 53 normal sem que os m dicos apresentassem justificativa convincente em rela o a algum problema transcorrido na gravidez ou no parto A fala a seguir explicita uma poss vel interpreta o para o fato de n o enfrentarem a quest o Sempre a mesma coisa n o tem dilata o t passando da hora beb grande beb vai sofrer e quando nascem t o maravilhosos t tudo bem sem nenhum problema acho que por isso que a gente acaba esquecendo que fomos enganadas nessa hora Grupo Catete 20 04 2007 Segundo Souza 2002 essa press o utilizada por muitos m dicos baseada nos medos maternos e nos parece um instrumento que na maioria das vezes consegue frustrar as mulheres na realiza o do parto normal Essas mulheres parecem saber que muito dif cil lutar contra esse poder ainda mais por sofrerem press es de todos os lados para fazerem ces reas tanto do companheiro quanto da fam lia Como a fala a seguir exemplifica Fiquei muito chateada tenho certeza que o m dico n o quis esperar mas o meu marido disse que a ces rea mais segura Grupo Botafogo 05 03 2007 Outra quest o que emergiu nos grupos du
145. de da data prov vel do parto ou mesmo na hora do parto onde come aram a ser pressionadas a mudarem seus planos mesmo aquelas que j estavam no in cio do trabalho de parto Poucas tiveram a oportunidade de entrar e evoluir seu trabalho de parto Muito poucas duas chegaram pr ximo a realizarem seu desejo Essa invers o do desejo da mulher pelo poder do obstetra nos mostra que muitas mulheres est o parindo sem que sua escolha seja efetivamente respeitada A seguir estaremos abordando como o processo de medicaliza o do parto pode ter interferido ou n o para a concretiza o do desejo das entrevistadas 4 3 3 3 2 A medicaliza o e as interven es no parto Segundo Barros 1995 Rizzotto 1999 Nascimento e Sayd 2005 a sociedade est demasiadamente medicalizada No Brasil n o diferente e portanto aceita naturalmente a excessiva medicaliza o do parto Nesse sentido muito dif cil para as mulheres avaliarem se as condutas e indica es m dicas s o realmente necess rias ou n o Principalmente se levarmos em considera o que elas s o respaldas cientificamente e portanto justific veis Por essa raz o o discurso m dico pode converter se numa estrutura te rica e metodologicamente f rtil altamente eficaz com bases materiais e simb licas que sustentam a complexidade do problema da medicaliza o Como aponta Grassi et al 1994 Da a necessidade de uma an lise cr tica da pr tica
146. de solicit lo quando da proximidade do nascimento V rios fatores estariam relacionados a esta escolha como veremos adiante Barros 1986 Fa ndes e Cecatti 1991 Souza 1994 Rattner 1996 Voloshko 1996 Marqu s 2005 No Rio de Janeiro Souza 1994 realizou um estudo no per odo de 1990 a 1992 no qual entrevistou m dicos e mulheres que haviam parido recentemente com n veis sociais e econ micos diversos faixa et ria entre 22 e 32 anos como parte segundo a autora de um grande projeto de moraliza o p blica Para essa autora as mulheres brasileiras conhecem os potenciais riscos envolvidos no ato cir rgico da ces rea tanto para a sa de do seu filho como para a sua pr pria sa de Mesmo assim acreditam que o parto normal doloroso e insuport vel e como via de parto ultrapassado A cesariana ent o seria a norma Um movimento que poderia ser denominado de medicaliza o dos medos maternos foi evidenciado na pesquisa de Souza Os valores culturais e ou n o cient ficos s o incorporados nos discursos m dicos tornando os dessa forma leg timos A compreens o do processo de legitima o social da cesariana passa pela cultura preconcebida sobre esse tipo de parto tanto na vis o dos m dicos quanto na das mulheres Souza 1994 Souza 1994 buscou desvelar a forma pela quais valores culturais referentes dor do parto vaginal imagem corporal feminina e ao fasc nio pela tecnologia foram man
147. decis o que n o fosse a que o m dico tava propondo n o eu hein claro que n o N o queria que meu filho entrasse em sofrimento dif cil pra mulher nessa hora sem conhecimento saber o que fazer se t certo ou t errado Simplesmente concordei Vit ria Na hora quem escolheu a ces rea foi ela a obstetra por op o pr pria eu s escutei ela falando ela n o chegou ao meu ouvido e balbuciou que seria ces rea Ela decidiu entre ela o anestesista e meu esposo que estava ali participando A decis o foi dela eu escutei ela dizendo Vamos abrir se n o ela o beb vai entrar em sofrimento Eu s chorei e pensei Pronto acabou minha chance Eu s chorei C lia A concretiza o do desejo se transforma num hiato entre o processo de escolha da mulher no ciclo grav dico e o poder decis rio do obstetra na hora do parto Vale destacar IA sin Jok E PA O significado da express o a acusa o de uma pessoa fato inocente O sujeito fato leva a culpa por algo que n o aconteceu geralmente encobrindo o verdadeiro respons vel 150 ainda a fala de Marta em que o poder m dico fica expl cito nessa rela o desigual com a mulher ainda n o tinha me dado por vencida mas o M companheiro achava que eu ia querer sim tomar o neg cio pra dor analgesia porque tava muito forte mas n o era isso Eu queria calma pra falar n o era assim quando voc t sentindo a co
148. delo de assist ncia biologicista tecnocr tico que mant m sua hegemonia Por conta dessa situa o a OMS prop s outro modelo de assist ncia onde deveria existir raz o v lida realmente obst trica para interferir no processo natural do parto Essa proposta ancorou se nas avalia es cient ficas que reprovavam a forma excessiva de utiliza o dessas pr ticas intervencionistas WHO 1998 5 sa ae pi nais E M i Da a A Cochrane Collaboration uma organiza o internacional independente e sem fins lucrativos dedicada a produzir informa o exata e atualizada sobre os efeitos da aten o sa de dispon vel em todo o mundo 23 Segundo Illich e Barros 1976 e 1991 apud Silver 1999 preocupante quando se reduz a sa de a um objeto de consumo que atrav s da medicaliza o transforma a vida e a sexualidade em produtos comercializ veis Essa mercantiliza o da sa de exp e os usu rios a riscos desnecess rios e diminui n o s a autonomia como a integridade das pessoas Para Silver 1999 a produ o e consumo tanto dos servi os quanto das tecnologias sofrem influ ncia dos interesses e das regras do mercado muito mais do que pelos interesses de uma pol tica de sa de Como aponta a autora o caso mais flagrante citado no Brasil h mais de 25 anos Mello 1971 o uso excessivo do parto cesariana Este procedimento t o necess rio nas verdadeiras emerg ncias obst tricas tornou se obje
149. der esperar o trabalho de parto deixar o meu corpo trabalhar chegar a hora certa pra nascer Dora Vou tentar numa pr xima vez o parto normal e j at pensei em uma casa da parto pelo que tenho lido atualmente o nico lugar que acredito s vai ser ces rea se realmente n o for poss vel o normal Regina Tentaria sim gostaria de viver essa experi ncia at o final mas tentaria da mesma forma se n o der n o vou ficar frustrada nem nada Vit ria Embora as circunst ncias vividas no parto tenham sido para a maioria muito emblem ticas a motiva o para tentar novamente o PV nos parece maior do que as dificuldades e vulnerabilidades passadas nesse percurso Vale ressaltar que apenas uma 155 informante demonstrou interesse em buscar uma alternativa ao modelo biom dico referindo se casa de parto como uma garantia de uma assist ncia humanizada e que respeite a decis o da mulher Essa percep o cr tica ao modelo hegem nico n o esteve presente nas falas das demais entrevistadas sendo que a maioria nem se pronunciou sobre essa quest o Esse fato nos sugere que a grande maioria dessas mulheres n o tem informa o e ou desconhecem outras possibilidades de parirem com autonomia Querer poder O direito de escolha das mulheres A linha que separa uma cesariana e n o ter a pr pria escolha respeitada t nue e sutil Poder se ia argumentar que existe uma estrutura que ma
150. desde a gesta o e mesmo antes de engravidarem queriam ter parto normal Uma das participantes que teve seu filho em casa com uma parteira conta sua hist ria orgulhosa por t la vivido com a participa o do marido e da m e no momento do parto Uma outra teve o parto em maternidade privada e tamb m estava feliz com a experi ncia de parto normal que viveu Essa mulher elogiou a aten o da m dica inclusive durante o pr natal 4 2 4 Observando outras interfaces na experi ncia do parto Ao participar dos encontros pudemos perceber que as conversas e as trocas de experi ncias eram permeadas por outras quest es que n o s o parto e ou a amamenta o Dentre os muitos assuntos discutidos selecionamos quatro que consideramos relevantes para alicer ar a apresenta o desse t pico S o eles as rela es de trabalho a boa m e divis o sexual de trabalho as quest es de g nero e as rela es conjugais e os conflitos parentais e geracionais As rela es de trabalho A press o pela volta ao trabalho estava sempre circundando as conversas nos encontros Nos di logos as maiores ang stias e preocupa es eram para as que trabalhavam no setor privado Transparecia nas falas das mulheres um sentimento de culpa em rela o 57 concilia o da vida pessoal e profissional com a maternidade dentre tantas coloca es que come avam a fluir na conversa n o estou preparada para me separar do meu
151. dificuldade da sele o e contra o tempo escasso para cumprir essa etapa do Mestrado contei com a ajuda de uma rede de apoio formada pelas pr prias mulheres frequentadoras das AP que passaram a indicar amigas que se encaixavam no perfil eleg vel para a entrevista Decorreram seis meses entre a primeira inser o nas reuni es e a realiza o de todas as entrevistas 4 2 2 A rica experi ncia dos encontros A grande maioria das participantes dos grupos que freq entei em 4 diferentes bairros da cidade Botafogo Tijuca Catete e G vea era integrante das camadas m dias dos segmentos m dio e alto como j citado e tinha acesso a bens culturais materiais e de consumo condi es sociais equivalentes n vel superior de escolaridade e plano privado de sa de As mulheres que chegavam aos grupos geralmente estavam experimentando pela primeira vez a maternidade As dificuldades iniciais com a amamenta o eram o motivo principal pela procura das AP Quando apresentava minha proposi o de estar no grupo as m es ficavam motivadas pelo tema muitas se identificavam imediatamente com o objeto da pesquisa e prontamente se colocavam disposi o para participar Estiveram sempre dispon veis mostrando grande interesse pelo assunto acreditando que a pesquisa traria tona uma quest o t o real hoje para as mulheres das camadas m dias como a cesariana e que sem d vida era importante provocar o debate sobre esse assunto amp
152. discutido na agenda da sociedade e do Estado brasileiro A Constitui o Federal de 1988 que considera a prote o maternidade um direito social n o consegue evitar que estas taxas sejam elevadas principalmente nas regi es mais pobres do pa s Isto refor a que os riscos de morte materna incidem de forma desigual sobre as mulheres Eles aumentam quando existem diferen as entre os diferentes estratos s cio econ micos e tamb m quando relacionados a fatores tnicos e culturais desvelando se indicador de iniquidades Mais uma tentativa de reverter esses ndices vem atrav s do Pacto Nacional pela Redu o da Mortalidade Materna e Neonatal lan ado no dia 8 de mar o de 2004 Dia Internacional da Mulher Esse pacto teve como meta reduzir em 15 os atuais ndices de mortalidade materna e neonatal de rec m nascidos at o fim de 2006 e em 75 at 2015 O que observamos em rela o a essa problem tica que envolve assist ncia sa de da mulher o quanto os sistemas de sa de est o sucateados e deteriorados deixando as usu rias distantes dos seus direitos equidade integralidade e universalidade O PAISM transformou se num fragmento das pol ticas p blicas e ainda segundo Sim es Barbosa 2006 um ideal a ser conquistado Como aponta a autora 26 O PAISM como todo o Sistema nico de Sa de vem sofrendo com os problemas decorrentes de falta de financiamento que inviabiliza entre outras quest es
153. divis o sexual do trabalho dom stico As situa es reveladas nos depoimentos nos parecem reafirmar que o trabalho materno dom stico apesar de ainda ser cobrado socialmente permanece desvalorizado e pouco reconhecido Em contrapartida s demandas do trabalho privado existe uma grande valoriza o do trabalho produtivo O que expressa uma contradi o ou seja para as mulheres a valoriza o pessoal est na produ o E se n o est o produzindo se sentem fora do eixo social o que n o faria mais parte da realidade da mulher de hoje como apresentado no subtema anterior Segundo Laurell 2000 e Giffin 1994 em rela o s representa es de g nero existe uma sobrecarga feminina com o desempenho dos pap is p blicos e privados que abarcam a participa o n o s no mercado de trabalho remunerado mas no trabalho dom stico e materno Essa situa o gera as tens es e conflitos que se refletem nas contradi es vividas pelas mulheres no exerc cio da maternidade Como demonstra o depoimento a seguir Voc tem que realmente se desdobrar Voc cobrada no trabalho como profissional cobrada em casa como mulher voc cobrada em casa como m e pelo filho e no meio social mesmo voc cobrada o tempo inteiro muita press o muita sobrecarga depois voc acaba estressada n o tem a quem recorrer Eu t iniciando agora a minha carreira de m e Eu ainda t por conta do meu filho que me exige
154. dizendo que beb tava muito alto com 36 semanas de gesta o n o tinha encaixado na pelve porque era grande No final teve que ser ces rea mesmo porque ela disse que n o dava mais pra esperar ces rea realizada com 39 semanas Joana Ela a obstetra fez tudo para ajudar a acelerar o parto ruptura da bolsa amni tica ocitocina Disse que ia deslocar minha placenta para ajudar a Cf Sim es Barbosa Educa o e Sa de Reprodutiva an lise preliminar de uma experi ncia numa comunidade favelada do Rio de Janeiro 2001 99 nascer Eu cheguei s 14 30h e a ces rea foi as 17 17h Eu acho que ela tomou as decis es que coube a ela tomar naquele momento e ela decidiu pela ces rea porque era o melhor pra minha filha C lia As formas sutis de manipula o opress o que s o frequentemente utilizadas pelos obstetras n o s o muitas vezes percebidas claramente pela mulher nesse contexto desigual A desinforma o das pr prias mulheres colabora com essa situa o de domina o mas como visto mesmo as que est o bem informadas sucumbem s press es e aos argumentos m dicos no momento do parto Fica evidenciado o quanto este delicado momento torna as mulheres fr geis para enfrentarem o poder m dico Mesmo que parte dessas mulheres n o se conven a dessa manipula o acaba sempre restando para algumas um momento de d vida em rela o necessidade da realiza o da cirurgia Como manifestado
155. do tempo de nascer Ai acabou marcando Voc n o quer o qu Voc n o quer correr riscos Flora 39 semanas no momento da ces rea Ao ser perguntada sobre o peso do beb e se ele nasceu bem nos respondeu og toque vaginal realizado para fornecer dados que indiquem a posi o do feto e a dimens o da dilata o do colo uterino 124 Ela nasceu com 3 275g acho que daria pra fazer normal mas acabou marcando a ces rea n Ela a m dica at falou s n o vou marcar antes de 38 semanas N o entrei em trabalho de parto mas ela passou do tempo mesmo n o tava querendo nascer no final das contas ia ser cesariana mesmo Flora Insistimos na pergunta se o beb tinha nascido bem ao que ela respondeu Nasceu bem teve o Apgar 8 e 9 acho que 8 assim que nasceu e 9 depois no 5 minuto foi tudo bem tudo bem Nossa entrevistada demonstrou estar informada ao aludir sobre o teste de Apgar que uma refer ncia do rec m nato estar sem problemas Vale ressaltar que durante a entrevista esta mulher verbalizou que gostava de ler e visitar sites espec ficos sobre parto e ver na TV a cabo programas a esse respeito sendo estas suas poss veis fontes de conhecimento Como se pode ver o acesso informa o nem sempre fornece o olhar cr tico necess rio para a percep o de poss veis rituais coercitivos que poderiam levar as mulheres a alguma contesta o frente decis o m d
156. dos direitos da mulher incorporados como diretrizes institucionais Seu enfoque principal era concentrar esfor os buscando reduzir as taxas inaceit veis de mortalidade materna e perinatal A estrat gia compreendia reorganizar a assist ncia e vincular formalmente o pr natal ao parto e puerp rio ampliar o acesso das mulheres aos servi os de sa de e garantir a qualidade do atendimento com a realiza o de um conjunto m nimo de procedimentos MS 2000 O MS usou como refer ncia para o PHPN o documento organizado e publicado pela OMS em 1996 com as recomenda es baseadas nas evid ncias cient ficas sobre a assist ncia ao parto distribuindo esse documento a todos os profissionais atuantes no campo da sa de da mulher WHO 1996 Essas medidas visam sintonia entre a assist ncia praticada em uma medicina baseada em evid ncias mas com o olhar de reconhecimento da mulher como condutora do processo adotando a tica como pressuposto b sico na pr tica profissional 4 O PHPN foi institu do pelo Minist rio da Sa de atrav s da Portaria GM n 569 de 1 6 2000 subsidiado nas an lises das necessidades de aten o espec fica gestante ao rec m nascido e m e no per odo p s parto MS 2000 http www saude gov br biblioteca publicacoes ProgramaHumanizacaodoParto2000 21 2 2 4 A proposta de um novo modelo de assist ncia o parto humanizado O estabelecimento de novas propostas para a melhoria da assist ncia ao
157. e Me botaram no soro j tinha ouvido que a ocitocina bagun ava as contra es E da come ou tudo e a n o tinha mais um parto normal Eu comecei a vomitar de repente aquele soro de repente me deu um neg cio me deu um enj o fort ssimo um mal estar muito grande A come aram umas contra es com muita dor muita dor e eu comecei a sentir muita dor de repente n o foi uma coisa gradual Aquele mal estar virou uma doen a O meu parto que eu estava me sentindo t o bem t o feliz virou uma patologia e de repente virou uma coisa horr vel Marta grifo nosso Como podemos perceber esse parto gerou uma situa o traum tica para esta mulher que se sentiu tratada como doente e sem direito a encontrar sua forma particular de vivenciar esse momento t o esperado Dessa forma intervencionista entendemos que poss vel ter em m os uma mulher fragilizada debilitada f sica e emocionalmente possivelmente mais apta a aceitar sem discutir a mudan a de rumo do seu parto Frente iniquidade a mulher cede ao dom nio m dico que a partir desse momento impregnado de iatrogenia o nico capaz de controlar a situa o resolvendo a atrav s da seguran a t cnica do ato cir rgico Ao analisarmos todos os relatos verificamos quanto os trabalhos de partos mencionados foram assistidos no moldes do modelo biom dico baseado no uso abusivo de tecnologia e que ao intervir nesse processo desconsidera a fisiolog
158. e a natureza da pesquisa de forma detalhada informadas de que teriam garantida a preserva o do anonimato e do sigilo sobre as informa es coletadas o direito a qualquer informa o relacionada ao tema da pesquisa a confidencialidade do encontro e por fim a apresenta o do termo de consentimento livre e esclarecido em que dariam sua autoriza o caso concordassem em participar do estudo A partir da apresenta o o convite s mulheres para participarem da pesquisa era feito Durante o per odo das entrevistas a pesquisadora ao t rmino de um grupo de entrevistas foi transcrevendo na ntegra todo material obtido A transcri o um importante momento de reflex o para a estrutura o dos primeiros arcabou os dos n cleos tem ticos Apesar das entrevistas serem gravadas tinha sempre comigo um di rio de campo para as anota es de fatos importantes que pudessem escapar grava o Consideramos relevantes esses registros que tinham como objetivo a percep o dos gestos express es corporais faciais e relacionais que poderiam colaborar para a interpreta o dial tica dos dados a serem posteriormente analisados 19 A Casa localizada no bairro de Botafogo Rio de Janeiro o n cleo original do que hoje a Funda o Casa de Rui Barbosa onde se desenvolvem atividades de pesquisa conserva o e educa o al m de promover projetos de integra o com a comunidade www casaruibarbosa gov br 12 4 3 3
159. e buscaram informa es e se prepararam durante a gravidez atrav s de palestras e cursos espec ficos n o demonstraram estarem fortalecidas o suficiente para fazerem frente a um poder m dico legitimado e ancorado nas estruturas empresariais mercantis dos planos de sa de Nesse sentido entendemos que a experi ncia vivenciada pelas mulheres no pr natal pode constituir uma oportunidade mpar para que avaliem e reflitam sobre as potenciais possibilidades de uma experi ncia satisfat ria e enriquecedora do parto Concluindo esse t pico deixamos para reflex o as palavras de uma entrevistada Ent o eu acho que voc tem que trabalhar muito assim no pr natal o pr natal fundamental e esse di logo mas at mesmo antes de engravidar voc j come ar a saber qual o tipo de profissional que voc t lidando pra ver se voc n o vai precisar no meio do caminho mudar A escolha do profissional essencial Dora A seguir apresentaremos a cesariana no cen rio da mercantiliza o do parto e os interesses econ micos que podem estar permeando esse contexto 4 3 3 2 2 Mercantiliza o do parto A ind stria da ces rea No roteiro inclu mos uma pergunta sobre a quest o do plano de sa de O questionamento tinha como objetivo analisar a rela o das entrevistadas com o sistema privado de sa de e as dificuldades ou n o que poderiam ter ocorrido no pr natal e no momento do parto Cabe ressaltar que a
160. e da Crian a e da Mulher Instituto Fernandes Figueira Funda o Oswaldo Cruz DIAS M A B DOMINGUES R M S M Desafios na implanta o de uma pol tica de humaniza o da assist ncia ao parto Ci ncia e Sa de Coletiva V 10 n 3 p 699 705 2005 DIAS M A B DOMINGUES R M S M PEREIRA A P E FONSECA S C F GAMA S G N THEME FILHA M M BITTENCOURT S D A ROCHA P M M SCHILITHZ A 0 C LEAL M C Trajet ria das mulheres na defini o pelo parto ces reo estudo de caso em duas unidades do Sistema de Sa de Suplementar do Estado do Rio de Janeiro Escola Nacional de Sa de P blica Ci ncia e Sa de Coletiva 0324 ISSN 1413 8123 2007 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 175 DINIZ C S G Assist ncia ao parto e rela es de g nero elementos para uma releitura m dico social S o Paulo Disserta o de Mestrado Faculdade de Medicina USP 1996 DINIZ C S G Entre a t cnica e os direitos humanos possibilidades e limites da humaniza o da assist ncia ao parto S o Paulo Tese de Doutorado Faculdade de Medicina USP 2001 DOMINGUES R M S M SANTOS E M LEAL M C Aspectos da satisfa o das mulheres com a assist ncia ao parto contribui o para o debate Cad Sa de P blica v 20 supl 1 Rio de Janeiro 2004 DONATI S GRANDOLFO ME ANDREOZZI S Do italian mothers prefer cesarean delive
161. e e dialeticamente alimentando esse crescente processo de medicaliza o e interven o na sa de da mulher simplificadamente etiquetado como tecnologia segura indolor e moderna Nessa perspectiva podemos perceber que as formas inadequadas na assist ncia ao parto vulnerabilizaram a escolha das entrevistadas na medida em que mudaram suas expectativa em rela o ao parto almejado interferindo no exerc cio da livre escolha No pr ximo subtema vamos atrav s das m ltiplas vozes desse estudo evidenciar como foi vivido o desencontro entre o PV e a cesariana 4 3 3 3 3 O desencontro entre o desejo e o realizado a concretiza o da cesariana Como observamos em v rios estudos citados anteriormente Barros 1986 1991 Rattner 1996 e Marques 2005 fato que quanto maior o n vel s cio econ mico maiores as chances das mulheres serem submetidas cesariana independentemente da sua vontade e ou escolha Mesmo as mulheres das camadas m dias que segundo esses mesmos autores t m menor probabilidade de risco obst trico est o mais vulner veis a terem seus filhos atrav s de um procedimento de risco a cirurgia mesmo quando a sua op o pelo PV Como demonstrado na fala abaixo Aqui na rede privada muito dif cil voc ter parto normal eu acho assim se tivesse dado tudo certo no tempo exato chegasse nas 40 semanas contraiu entrou em trabalho de parto pariu ok Mas qualquer pequeno 14
162. e ela a obstetra n o iria fazer parto normal mas acabei me acomodando com medo de trocar de m dico e n o adiantar nada trocar seis por meia d zia Na verdade as mulheres pensam que escolhem o que querem se referindo ao tipo de parto mas n o bem assim Eles os m dicos prometem mas n o cumprem Voc fica crente que vai ter seu partinho normal e tal e eles 156 v m com uma desculpa qualquer qualquer motivo e metem uma ces rea e s vezes voc ainda d gra as a Deus porque ele decidiu pela ces rea para n o ter problemas pro beb Acredito que hoje muito dif cil voc dizer que vai conseguir ter um parto normal S parto em casa com parteiras ou com m dicos que respeitam as mulheres que tamb m s o raros e caros Mas direito escolha a gente as mulheres n o tem n o ilus o Regina A lucidez exposta pela informante nem sempre implica em uma alternativa para que elas procurem outro modelo de assist ncia Como mostrou a fala acima os custos para tal podem representar um aumento no or amento dom stico que nem todas podem arcar na medida em que j t m uma despesa alta com os planos de sa de Outra quest o que realizar um parto em casa ainda n o se tornou uma op o confi vel para grande parte das mulheres A maioria ainda refrat ria id ia de parir longe do ambiente hospitalar e dos aparatos tecnol gicos o que parece indicar que os conceitos cristalizados sobre o mode
163. e ele o obstetra n o me dava muito papo e ele o obstetra dizia que eu acho que voc uma menina normal tem 28 anos saud vel claro que vai ter um parto normal e a aquelas minhas perguntas todas acabavam como uma besteira minha bobagem eu n o vou perguntar nada e acabei entrando naquele molde de 113 mais uma na multid o que vai ter um filho de parto normal Eu me sentia meio tolinha sabe tudo o que eu perguntava ao obstetra era bvio que n o bvio que sim bvio que n o sei que eu acabei ficando quieta me contentei assim em ser mais uma ali no consult rio de n o ficar perguntando demais e tamb m sabe de n o ficar enchendo o saco dele o obstetra demais porque ele o obstetra tinha 500 pessoas pra atender s vezes eu ficava duas horas e meia esperando pra ser atendida Marta Portanto nesse espa o de inter rela o que o pr natal prop cia encontramos nos depoimentos diferentes formas de intera o entre as mulheres e seus obstetras Navegamos nos conflitos e contradi es de suas falas permeadas pelas d vidas que as levavam aos questionamentos que nem sempre eram resolvidos e ou respondidos claramente at a disponibilidade total de alguns desses profissionais o que propiciava a essas gestantes sentirem se totalmente apoiadas e confiantes Vimos tamb m que essa disponibilidade nem sempre correspondia certeza para a mulher de que o seu d
164. e feminina As parteiras curiosas matronas comadres aparadeiras eram mulheres que em geral adquiriram seus conhecimentos a partir da experi ncia pessoal de seus partos e da pr tica na assist ncia e nos cuidados s parturientes Melo 1983 A sabedoria e experi ncia alcan ada eram transmitidas a outras mulheres Esse acervo de conhecimento do corpo feminino e da reprodu o era um saber dominado pelas mulheres Giffin 1991 A origem da obstetr cia ocidental moderna aconteceu com a apropria o dos conhecimentos acumulados pelas parteiras Nas complica es do parto os m dicos ou cirurgi es barbeiros eram chamados para ajudar com o objetivo de salvar as vidas das m es Quando isso n o era mais poss vel tentavam salvar o feto realizando uma ces rea Por m a participa o do homem no parto foi pouco freq ente at o in cio da Era Moderna Osava e Mamede 1995 A entrada dos homens que dominavam o saber cient fico neste campo de conhecimento e o dom nio de novas t cnicas desconhecidas pelas parteiras instaurou o conceito de que poss vel controlar o nascimento e a id ia de que o parto era perigoso justificando a presen a imprescind vel de um m dico Desde ent o esta no o come ou a se firmar no imagin rio popular Alguns autores consideram que a inven o do f rceps alterou o modelo de assist ncia obst trica Este fato influenciou na aceita o da obstetr cia como disc
165. e o tipo de parto mais prevalente E natural que por isso elas tivessem mais contato com essas experi ncias Expomos abaixo algumas dessas falas A minha m e teve duas ces reas ela falou Eu n o sei como o normal porque eu n o passei por isso n o tenho essa experi ncia n que todo mundo fala que d i Ela n o teve dores ela n o teve nada assim ent o ela n o sabia nada do parto normal pra ela a ces rea foi um parto bom mas ela nunca falou nada pra eu ter ces rea nunca me pressionou Vit ria Minha m e teve cesariana nos dois partos mas nunca aprofundamos uma conversa sobre os partos Ela teve a mesma situa o que eu tive n o teve dilata o nem contra o nas duas vezes Pra ela a ces rea foi o que resolveu o caso dela n o nascia ent o teve que tirar Acho que foi trangiiilo nunca reclamou sobre esse parto deve ter tido uma experi ncia boa T nia Percebemos que as ces reas eram comentadas nesses depoimentos sem que no entanto representassem um instrumento de press o ou influ ncia familiar para nossas entrevistadas mudarem sua escolha As hist rias ruins Nem sempre as hist rias traum ticas v m dos partos normais Encontramos tamb m esse tipo de relato que na vis o de nossas informantes foram problemas para quem teve que fazer uma ces rea na fam lia Como apresentamos a seguir A minha m e teve problemas com a ces rea acho que ela tem prob
166. e que acaba por reverberar no seu comportamento frente ao desejo pelo PV podendo fragilizar em diversos momentos a sua escolha at uma mudan a definitiva Pressupomos que nenhuma mulher colocar em risco a vida de seu filho apenas para concretizar um desejo de t lo por PV poss vel que alguns m dicos possam utilizar esses argumentos para trabalharem o que Souza 1994 chamou de medicaliza o dos medos maternos e que Hopkins 2000 corroborou com seus estudos para justificarem as ces reas desnecess rias com o consentimento das mulheres Um relato merece destaque pela situa o discrepante que viveu uma das informantes Ela relatou que pr ximo ao parto n o resistiu s press es que a obstetra estava fazendo desde o in cio da gesta o relacionadas impossibilidade de vaga se quisesse insistir no PV A m dica afirmou que n o ia ficar com uma mulher em trabalho de parto sem ter onde parir 143 podendo correr o risco de uma complica o Acabou dando um ultimato que a deixou sem op o quando chegou a 39 semanas de gesta o Ela a obstetra ficava me pressionando Veja l o que voc vai fazer Voc est entrando em trabalho de parto e n o vai ter lugar para ter o seu filho Vamos marcar logo essa cesariana N o tinha sa da como ia mudar de m dico naquele momento come ando a sentir contra o Ela acabou me convencendo e eu fiquei com medo de n o ter vaga mesmo N
167. e referido a esse tipo de parto como um modismo n o podemos olh lo apenas como uma moda do momento Existe tamb m uma interface do parto domiciliar que parece estar vinculada aspira o leg tima das mulheres das camadas m dias mais conscientes que t m mais acesso informa o sobre um parto mais idealizado mais natural com menos interven o Esse aumento na procura pelo parto realizado em casa gerou uma movimenta o nesse novo mercado de consumo que acabou se transformando no que poderia ser considerado um modismo para as mulheres parirem Existem press es de ambos os lados tanto para aquelas que fazem ces rea quanto para as que optam pelo parto em casa 120 As mulheres que n o se encaixam num determinado grupo se sentem exclu das e pouco valorizadas pela experi ncia que passaram Nossa entrevistada complementa E eu sinto hoje em dia porque tenho duas amigas gr vidas e eu tive ces rea e outra amiga teve em casa claro que elas as amigas gr vidas n o querem saber da ces rea de ouvir nada que eu tenha pra contar Ces rea uma coisa assim eu sou mais uma que pariu naquela porcentagem das cesarianas entendeu E elas n o querem saber porque ent o eu t fora do grupinho Marta Evidencia se o quanto hoje existe uma ind stria do parto e que a ces rea pode ser considerada e entendida como um bem de mercado um bem a ser consumido e com muitos interesses perpassando quest
168. ean sections among public and private patients in Brazil prospective study BMJ 2001 323 1155 1158 121 RANGEL O E SORRENTINO S G nero conceito hist rico PRINC PIOS maio junho 1994 122 RATTNER D et al O parto como eu vejo ou como eu o desejo Expectativas de gestantes usu rias do SUS acerca do parto e da assist ncia obst trica Caderno de Sa de P blica Rio de janeiro set out 2002 18 5 1303 1311 123 RATTNER D Sobre a hip tese de estabiliza o das taxas de ces rea do Estado de S o Paulo Revista de Sa de P blica 1996 30 19 33 124 RIZZOTTO M L Hist ria da Enfermagem e sua rela o com a sa de p blica S o Paulo Cortez 1999 125 SAKALA C Evidence based Maternity Care Initiating a Dialogue Within the Public Health Community 1993 Dispon vel em URL http apha confex com apha 126 SCAVONE L O impacto das tecnologias m dicas na fam lia In XVI Encontro anual da Associa o Nacional de P s gradua o em Ci ncias Sociais ANPOCS Anais pp 20 23 Caxambu 1992 127 SCOTT J G nero Uma categoria til de an lise hist rica EDUCA O E REALIDADE V 20 2 71 99 1995 128 SHEARER EL Cesaran section medical benefits and costs Soc Sci Med 1993 37 10 1223 31 129 SILVER L D Direito sa de ou medicaliza o da mulher Implica es para avalia o dos servi os de sa de para as mulheres In Quest es de Sa de Reprodutiva K Giffin amp S H Costa org
169. edade que incorpora o 8 uma rede formada essencialmente por mulheres que re ne mais de 200 ativistas do parto normal em 16 estados do pa s e o Distrito Federal O objetivo principal a retomada pela mulher do protagonismo de seus processos de gesta o parto e p s parto e buscar resgatar seu direito e sua capacidade de tomar para si as decis es a respeito de seus corpos de sua sa de de suas viv ncias 33 modelo hegem nico de um grupo minoria privilegiada As mudan as sociais s ocorrem a partir da a o pol tica dos movimentos sociais organizados Berman 1997 A ci ncia reflete as contradi es de uma sociedade portanto pensar numa ci ncia a servi o do bem estar humano exige um outro paradigma onde o conhecimento n o seja manipulado ou apropriado pelos interesses dominantes Esta pesquisa pretende contribuir para isso Tendo em vista que esta pesquisa trata do corpo gr vido discutiremos a seguir a concep o de corpo em sua dimens o social utilizando para tal o referencial de g nero 3 2 O desejo materno e suas vari veis As formas como a maternidade representada variam em fun o da poca e contexto respondendo a interesses econ micos demogr ficos pol ticos etc Portanto cada mulher vive a gravidez e o parto impregnada por concep es hist ricas cient ficas e sociais relacionadas ao corpo feminino e ao papel social da mulher que internalizadas se expressam no even
170. edo de dor tinha muito medo de sentir dor mas n o sei eu achava que era uma coisa que eu ia conseguir lidar com isso com a dor do parto Marta Sentir dor era o meu problema inicial eu sempre tive medo de sentir dor mas mesmo assim eu tava querendo parto normal Flora Vale ressaltar ainda que em nossas observa es encontramos nas falas de nossas informantes a representa o da dor do parto enquanto algo inerente experi ncia de ser m e como j mencionado por Paim 1998 As falas a seguir apontam para certa valoriza o da dor como se fosse uma prova necess ria para se tornar m e 82 Eu preferia o parto natural sem anestesia do que uma ces rea Eu acho que iria segurar a barra e eu acho que o parto normal natural queria muito sentir as dores do parto eu poderia ter um parto normal eu tinha sa de foi o que eu visualizei durante toda a minha gravidez eu tinha certeza que meu parto seria normal Eu queria que fosse normal Elis Eu queria ter alguma sensa o de que realmente eu estava tendo um filho ent o pelo menos a dor do parto eu vou ter que ter se essas mulheres tivessem a dor do parto talvez elas dessem mais valor s pequenas coisas da vida entendeu N o que eu diga que o nascimento seria uma coisa pequena mas de repente se elas sentissem esse baque elas pensariam diferente Nat lia Essa quest o da viv ncia do parto tal como pontuada pela
171. egunda feira a gente vai ter que fazer uma ces rea porque n o d mais para esperar Voc est feliz da vida quer parto normal mas tem que pensar na crian a para ele o beb n o ter nenhum problema Ent o eu falei ent o t meu prazo e esse O quanto eu pude eu fiz andei na praia nade pra ver se melhorava as contra es A n o deu e fizemos a ces rea na segunda mesmo T nia Cabe aqui deixar registrado que a ces rea desta mulher foi marcada para um dia de feriado estando a entrevistada com 39 semanas e cinco dias de gesta o muito bem de sa de sem nenhuma complica o desejando muito um parto normal e se esfor ando para isso Resistindo at onde suas for as permitiram sem que ao menos fosse tentado uma indu o E o beb nasceu muito bem com apgar nove no primeiro minuto e dez no quinto Como visto o princ pio do direito da mulher o poder e controle sobre seu corpo foram apropriados pelo poder m dico para justificar a pr tica desnecess ria da cesariana A desinforma o uma barreira que dificulta o enfrentamento para a concretiza o da escolha da mulher A ela a obstetra foi fazer o toque com 36 semanas e n o conseguiu fazer porque eu senti muita dor A ela a obstetra falou Acabei de decidir por voc vai ser cesariana porque voc n o est agiientando o meu dedo imagine uma crian a inteira passando assim voc n o vai conseguir E voc ta
172. el que me proporcionou ampliar e consolidar meus conhecimentos e minha atua o profissional reconduzindo o meu trabalho para as quest es n o s de g nero como da sa de coletiva Como atuo no setor privado com gestantes de camadas m dias h 26 anos acompanhei as mudan as relacionadas forma de assist ncia ao pr natal e ao parto dessas mulheres e pude perceber o quanto significativa a trajet ria ascendente das cesarianas como o tipo de parto prevalente As mulheres estariam escolhendo a cesariana ou estariam sendo levadas a escolh la Seria uma imposi o m dica e ou cultural ou uma op o A motiva o para esta pesquisa surgiu por continuar vivenciando com essas mulheres muito proximamente a n o concretiza o do desejo manifestado durante a gravidez de terem seus filhos por parto vaginal A grande maioria acaba realizando uma cesariana como via de parto sem ter certeza da necessidade de sua indica o 1 2 O problema da pesquisa cesariana em mulheres de camadas m dias 5 x E pi Este estudo tem como quest o norteadora a compreens o da diferen a entre o desejo das mulheres de classe m dia em vivenciar o parto vaginal em contraposi o preval ncia da cesariana como tipo de parto mais frequente nas camadas m dias Barros 1991 Souza 1994 Potter et al 2001 Rattner et al 2002 Souza 2002 MS ANS 2004 Marqu s 2005 As lacunas existentes na investiga o sobre a assist
173. ela o m dico gestante no percurso da gravidez A intera o entre a mulher e seu obstetra durante o pr natal A rela o das entrevistadas com os obstetras durante o pr natal se mostrou bastante diferenciada nas quest es que circundavam o parto de acordo com as diversas posturas profissionais encontradas Observamos que alguns profissionais se mostraram dispon veis e atenciosos em responder perguntas apresentadas pelas mulheres Para uma pequena parte das entrevistadas mesmo quando sol citos isso n o se traduziu necessariamente em acolhimento Esses cuidados nessa situa o eram percebidos por elas mais como parte de uma compet ncia m dica do que propriamente a forma o de um v nculo afetivo pelo qual esperavam nesse momento ela esteve sempre muito atenciosa muito competente mesmo n o deixou passar nada sempre me examinava atenciosa com tudo tirava todas as minhas d vidas ela era bem atenciosa mas n o era carinhosa e eu n o esperava isso em uma m dica Regina grifo nosso Diferentemente do que a grande maioria relatou sobre a rela o com seus m dicos merece registro um depoimento que demonstrou uma atitude de distanciamento do profissional onde o espa o para a fala escuta da mulher n o era considerado Nossa informante expressou a dificuldade de intera o com seu obstetra afirmando que as respostas dele s suas perguntas eram feitas de forma objetiva seca e sem a preocup
174. ele tava na expectativa de f rias tamb m mas eu acho que ele n o seria t o leviano ele falou que o beb tava alto a nica coisa que quando penso me d uma pontadinha de dor no peito Elis No entanto esta n o foi uma regra absoluta Uma das entrevistadas tr s meses e meio ap s o parto se mostrou bastante consciente sobre a experi ncia do desencontro entre sua escolha original e a realiza o da ces rea como observamos no seu depoimento 14 eu acho que voc leva um tempo pra concretizar at porque t naquele momento de emo o acho que demora sim demora isso me incomodou muito depois estou falando do que aconteceu h uma ou duas semanas atr s entendeu N o depois que ela nasceu nem logo na maternidade s agora a ficha vai caindo Dora tr s meses e meio ap s a ces rea Ao perguntarmos como se deu a escolha do tipo de parto nossas informantes manifestaram as motiva es que as levaram ao parto vaginal como apresentamos a seguir Porque normal n risos Porque eu acho que se a coisa feita pra ser dessa forma nem questiono n o vou contra assim deixa a natureza se encarregar mas n o foi isso que foi decisivo fundamental foi porque era normal Karina Sempre foi uma escolha minha Quando eu engravidei pensei vou fazer parto normal Sempre tive muita vontade de querer ter parto normal n o tinha d vida Alice Par
175. em esse momento A quest o do resultado positivo da cirurgia j foi sinalizado pela WHO 1996 como fator preocupante pois pode transformar a cesariana que n o se complica em refer ncia de seguran a na medida em que evitaria alguma poss vel complica o do PV No pr ximo subtema abordaremos a expectativa que as entrevistadas t m sobre um futuro parto em uma pr xima gravidez Tentar de novo A trajet ria para entendermos os processos que levam disson ncia entre o parto desejado e a cesariana revelou o quanto foi significativamente negativa e marcante para a maioria das entrevistadas n o terem vivenciado a experi ncia da parturi o Ap s as revela es dos sentimentos vividos procuramos identificar se haveria numa futura gesta o alguma inten o de tentar novamente o PV Encontramos entre todas as entrevistadas uma forte motiva o para uma nova tentativa caso tivessem outro filho Apesar disso algumas demonstraram d vidas sobre poderem realizar um PV p s ces rea como j discutido no subtema uma vez ces rea sempre ces rea Mas mesmo assim afirmaram que escolheriam o PV novamente Sobre esse assunto as falas abaixo expressam suas convic es Vou tentar novamente o parto normal eu quero muito E uma experi ncia que considero importante viver e acredito que a maioria das mulheres deseja passar Rita Sim eu vou querer outra vez tentar o parto normal quero po
176. em interesses mercantis que visando aferir lucros promovem uma mistifica o ideol gica do nascimento atrav s da naturaliza o da ces rea encobrindo assim mecanismos de domina o e explora o que s o reproduzidos pelo saber dominante e legitimado pela ci ncia m dica em rela o ao corpo feminino Berman 1997 aponta como a ci ncia objetiva baseada na ideologia dualista amplamente defendida pelos homens da ci ncia se sustenta dentro do poderoso sistema capitalista atual onde a tecnologia desenfreada intensifica as rela es de poder e explora o Os avan os tecnol gicos norteiam os ideais ticos da sociedade modelando a pr pria vida m quina de produzir lucros A ces rea pode ser tomada como um s mbolo desse momento Observamos atualmente que as maternidades privadas com a coniv ncia de muitos obstetras transformaram o nascimento em uma linha de produ o de ces reas como revelam os alarmantes ndices de 79 70 partos cir rgicos recentemente divulgados pela ANS MS ANS 2004 A ces rea como t cnica segura e conveniente para o discurso m dico assim apresentada s mulheres como a melhor op o para todos m dico gestante e beb independente das consequ ncias que possa ter seu uso indiscriminado A cirurgia como via de parto um evento mais lucrativo sendo um produto oferecido e valorizado no mercado da sa de A ci ncia apresenta se como fonte inesgot vel de con
177. em um sistema de atendimento telef nico disque amamenta o que pode esclarecer d vidas em todo o Brasil al m do servi o pela Internet www amigasdopeito org br Os bairros onde acontecem os encontros s o Botafogo Tijuca Catete G vea e Niter i em locais fixos e p blicos O n mero de participantes vari vel e independente do quantitativo de presentes aos encontros estes sempre se concretizam 4 1 A entrada no Campo Procurei duas coordenadoras das AP conhecidas militantes dos movimentos pelo parto e nascimento para solicitar a permiss o para participar dos encontros e captar minhas informantes Obtive autoriza o e total apoio para fregiientar as reuni es do Grupo e realizar minha pesquisa Todas as coordenadoras de todos os Grupos me acolheram e me incentivaram no come o desse caminhar no campo a ser explorado Ficaram tamb m muito interessadas no objeto da pesquisa e baseadas em suas experi ncias me informaram que muitas mulheres que participam dos encontros reverberam suas viv ncias negativas do parto e que certamente eu 44 teria muitas hist rias para ouvir Comecei a participar ent o das reuni es com objetivo de conhecer melhor o campo e recrutar as poss veis informantes 4 2 A observa o participante 4 2 1 Explorando o campo Nos desafios da pesquisa j no campo onde pretend amos encontrar nossas poss veis entrevistadas tentamos apreender a realidade complexa e as v rias vozes dess
178. em uma ces rea Karina Esse fato pode de certa forma ampliar a frustra o da primeira experi ncia de parto das mulheres pela certeza da inviabilidade de concretizar esse desejo novamente Esse ide rio sustenta entre outros fatores o crescimento das taxas de cesarianas visto que cada vez mais mulheres principalmente a dos segmentos m dios s o submetidas cirurgia na primeira gravidez Com j estudado por Martin et al 2002 apud Cury e Menezes 2006 se a cesariana foi bem introjetada como uma experi ncia positiva para a mulher aumenta a probabilidade da ado o e aceita o passiva desse tipo de parto Gostaria muito de ter outro parto normal mas parece que quando voc faz ces rea eu j andei lendo sobre isso voc tem que fazer outra ces rea s ces rea Alice eu n o sei mais se eu gostaria que fosse normal ou ces rea j que fiz uma ces rea se mais f cil ter outra ces rea em cima N o sei como que isso Acho que j pode Eu acho que eu iria ter um beb de novo para ser normal para nascer quando ele quisesse Joana 87 O que absorvemos desse momento de reflex o que as mulheres das camadas m dias ainda t m d vidas quanto problem tica da repeti o da cirurgia mesmo tendo supostamente mais acesso a informa es Cury e Menezes 2006 apontaram em seu estudo que a ces rea pr via um fator importante na escolha do tipo de parto subseqiiente por
179. ente nos depoimentos acima Quando dizem ser parto normal se os m dicos nos parecem deixar sempre um espa o para introduzirem a possibilidade do parto se transformar em uma cesariana Durante o desenrolar da entrevista desta ltima informante pudemos perceber claramente que apesar da boa rela o com sua obstetra ela sempre mencionava ficar com d vidas e inseguran as quanto a conseguir realmente o PV A instigamos ent o perguntando lhe se conversava sobre o seu desejo durante as consultas e se colocava suas incertezas para a m dica Sua resposta nos mostrou o quanto a conversa nas consultas n o era suficiente para dirimir sua desconfian a nas reais inten es da m dica Era como se ela ntu sse que nessa quest o existe uma enorme dist ncia entre discurso e pr tica Em suas palavras Sempre conversamos mas eu acho que nunca senti seguran a total nela sabia que ela era uma tima profissional mas n o tinha certeza se ela era parteira quantas vezes eu fiquei uma hora uma hora e dez minutos em consulta com ela consult rio cheio e ela tirando todas as d vidas Mas eu tinha inseguran a Regina Indagamos ent o o que dava a ela essa sensa o de inseguran a e ela prosseguiu eu conversava muito com ela mas ela sempre frisava que ia depender do final da gravidez e no final da gravidez estava tudo bem ent o ela falava sempre assim Por isso eu desisti eu j n
180. entou alegou 16 Pretende ter mais filhos Gostaria de tentar numa pr xima gravidez o parto vaginal Permanecer com o mesmo obstetra Se mudar como vai ser a escolha D Perspectivas da maternidade e momento atual Viv ncias e expectativas na gravidez em rela o maternidade 1 Qual foi sua perspectiva quando soube que estava gr vida em rela o a conciliar esse momento com o seu trabalho Gravidez x trabalho 2 Durante a gravidez voc se preocupou em como seria conciliar seu trabalho com a maternidade Como foi para voc ter que pensar nesse assunto e o que sentiu maternidade x trabalho aten o para o concreto e o subjetivo 3 Como foi no seu trabalho o fato de voc estar gr vida A rela o com seu s chefe s e colegas Sentiu se apoiada no que precisasse 4 Como a maternidade est influenciando na sua vida profissional Teve que adiar algum ns planos na carreira Como pretende conciliar 5 Seu companheiro ajuda nas tarefas com o beb trocar fraldas banho e dom sticas Espontaneamente ou voc solicita Caso n o como voc reage a pouca participa o 6 Voc conta com algu m da fam lia sua e ou de seu companheiro para ajudar na casa e com o beb E de outras pessoas vizinhos amigos 7 Voc tem empregada dom stica J tinha antes da gravidez Essa decis o de contratar uma pessoa para ajudar pesa no or amento dom stico E Futuro projetos de vida 1 Quais s o seus planos
181. entrevistada Ah at os seis meses voc me amamentou tipo meio 164 expediente depois eu nunca mais mamei isso Ent o uma vis o totalmente diferente assim a minha m e muito feminista sabe Marta Nossas informantes alavancadas pelas press es sociais e econ micas que as impulsionam a serem produtivas se v em tendo que dar conta tamb m das fun es reprodutivas no seu papel de esposa e m e Demonstraram sentirem a necessidade de corresponder s expectativas do mercado e da sociedade Mesmo entre contradi es e conflitos todas demonstraram a necessidade de buscarem seu espa o profissional e de realiza o pessoal Nesse sentido abordaremos no subtema seguinte abordando as adequa es decorrentes nova vida como m e 4 3 3 4 2 Ser m e para as mulheres de camadas m dias padecer no para so As entrevistas nos revelaram e confirmaram o que na observa o participante j hav amos captado A forma com que as mulheres enfrentam o momento da maternidade parece ser muito complexa A superposi o de tarefas e as responsabilidades aumentadas na rela o conjugal no que se refere participa o econ mica exercem uma press o que somada ao exerc cio da maternidade instaura certamente momentos de crise d vidas e conflitos que s o contradit rios completude que sentem enquanto m es Eu t com minha filha eu t feliz da vida eu t num momento de ple
182. eri ncia vivida pelas mulheres na desconstru o da escolha pelo PV e a concretiza o da cesariana como desfecho do parto 4 3 3 3 A disson ncia entre a escolha e o desfecho do parto Nesse tema abordaremos as quest es que permearam o processo de mudan a pr ximo ao parto e os descompassos que se entrela aram a essa experi ncia assim como a dimens o emocional que a envolveu Para compreender melhor esse processo vamos analis lo em tr s 139 etapas o caminho desviante a medicaliza o e as interven es no parto o desencontro entre o desejo e a realidade e a escolha do obstetra em um pr ximo parto 4 3 3 3 1 O caminho desviante o processo de mudan a Como vimos at aqui todas as entrevistadas mantiveram o desejo pelo PV desde o in cio do pr natal at o final da gesta o Superaram as incertezas inerentes ao processo gestacional j que nessa caminhada enfrentaram situa es que contribu ram para que muitas pudessem desistir de seu prop sito Apresentamos a seguir o cen rio do parto das 15 entrevistadas No grupo algumas mulheres tiveram a indica o da cirurgia antes de completar 40 semanas sem apresentarem contra es do trabalho de parto e com quadro obst trico e avalia o fetal normais sem nenhuma intercorr ncia Para oito mulheres a ces rea ocorreu entre 38 e 39 semanas e cinco dias de gesta o sendo que nesse grupo apenas duas entraram em trabalho de parto espont neo com dila
183. erman 1997 quando a ci ncia de uma sociedade reconhecida como uma express o da sua ideologia o repetido ressurgimento em nossa m dia de hip teses biol gicas deterministas n o constitui mais um fen meno misterioso ou aberrante Representa a maneira de pensar necess ria preserva o de uma sociedade baseada na hegemonia de uma elite p 248 Em nossa pesquisa buscamos problematizar essa quest o da escolha com as pr prias mulheres E elas mesmas durante as entrevistas iam se dando conta das contradi es sutilezas e ambigiiidades que envolvem esse processo de escolha que na verdade n o escolha e as press es que resultam em inseguran a para elas Nos depoimentos a seguir podemos observar as diversas formas de percep o cr tica das mulheres sobre a atitude velada do m dico Eu senti que ela a obstetra estava escorregando me deixava insegura Na verdade pensando depois ela a obstetra n o me incentivou para o parto normal Ela a obstetra queria ela a obstetra tinha na verdade uma tend ncia para a ces rea Regina Olha pra falar a verdade eu senti no dia que eu levei a minha ultra sonografia que o beb estava enrolado ele o obstetra deu um sorriso de orelha a orelha tipo assim Oba vai ser mais uma ces rea Talvez devido ao meu desejo louco de ter parto normal ser muito evidente eu senti isso nele o obstetra Ele o obste
184. ermitir errar e desci a exig ncia vou ser menos ah eu fui melhor eu sou mulher eu sou humana Grupo Tijuca 12 06 2007 Essa quest o presente nos v rios grupos refor a a auto cobran a do papel materno das boas m es que a fam lia e a sociedade esperam que elas representem inclusive quando trabalham e tamb m s o cobradas de todas as maneiras para serem eficientes tanto no p blico como no privado Temos que dar conta de estarmos lindas e maravilhosas tudo no lar funcionando e sem levar os problemas maternos pro trabalho Grupo G vea 27 02 2007 Divis o sexual de trabalho Com rela o divis o do sexual de trabalho no mbito dom stico algumas participantes relatavam obter uma colabora o discreta do companheiro Outras por m n o contavam com a ajuda do parceiro para nada nem com o beb nem com a casa apesar de muitas terem empregadas e ou m es e sogras que as ajudavam nessas tarefas dom sticas sentiam falta de companheirismo do parceiro o que gerava para algumas delas uma crise em seus relacionamentos Estas mulheres chegavam ao grupo bastante fragilizadas ansiosas pelo ac mulo de afazeres e novas responsabilidades os homens t m suas estrat gias para n o dividir as obriga es maternas n o sabem fazer n o aprenderam acham que vamos dar conta de tudo e mais alguma coisa pois esse o papel materno as mulheres podem Grupo Botafogo 05 03 2007 No e
185. esariana Talvez por ele ganhar mais dinheiro uma coisa de financeiro Carla 118 fato que vivemos numa economia que visa ao lucro que tem interesses num mercado produtivo E o parto seria um mercado tamb m onde as ces reas fariam parte desse contexto lucrativo todo um processo econ mico pol tico e ideol gico que parece preparar a cabe a e a subjetividade das mulheres deste segmento social Os m dicos parecem ver as mulheres de camadas m dias apenas como consumidoras das novas tecnologias do parto O sagrado compromisso tico da medicina com a sa de do paciente acima de tudo parece estar se tornando obsoleto Nessa abordagem ideol gica incluem se ainda os companheiros e a fam lia que participam juntos desse processo acreditando que essa forma de nascer mais segura sem riscos de complica es frente imprevisibilidade associada ao PV A classe m dia parece ter se afastado dos processos normais da parturi o e portanto est ficando desconectada dessa experi ncia Por tudo j exposto percebe se que seus medos est o alicer ados naquilo que n o conhecem mais no que deveria ser o processo natural Em contrapartida demonstram estarem muito bem familiarizados com a ces rea e as novas tecnologias na assist ncia ao parto e parecem aprov las O tempo todo ele o companheiro queria ces rea que pra ele melhor mais r pido n o tem sofrimento uma coi
186. esejo pelo parto vaginal PV e a realiza o da cesariana como desfecho do parto Partindo se do pressuposto que essas mulheres s o mais bem esclarecidas e t m mais poder de escolha e negocia o e geralmente manifestam prefer ncia pelo parto vaginal no in cio da gravidez colocamos a seguinte quest o por que est o elas se submetendo a cesarianas com tanta fregii ncia Que fatores subjetivos e objetivos est o influenciando este desfecho Para melhor entendimento do objeto da pesquisa consideramos importante situ lo em minha trajet ria profissional que pode ser entendida como um microcosmo do universo da assist ncia ao parto e das rela es sociais que o perpassam Graduei me em Educa o F sica em 1979 pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ Na faculdade a disciplina de fisioterapia apresentou me um novo universo de trabalho corporal o trabalho desenvolvido com gestantes Assim que me formei procurei colocar em pr tica meus aprendizados com as gestantes em uma cl nica particular e j naquela poca direcionava o meu trabalho para a quest o da sa de e n o com a preocupa o est tica Essas mulheres pertenciam s camadas m dias e tinham oportunidade de fregiientar um espa o que oferecia atividade espec fica e diferenciada durante a gravidez Nas aulas al m dos exerc cios espec ficos eu orientava tamb m para o trabalho de parto Como retorno dos obstetras ouvi coment rios do tipo as gestan
187. ess o de suas d vidas e perguntas sobre o parto Alguns depoimentos deixaram bem claro que elas sabem que a maioria dos m dicos apesar de declararem se favor do parto normal acabavam sempre induzindo as parturientes cesariana A maioria das ces reas hoje s o marcadas e muito mais por conveni ncia m dica N o somos incentivadas ao parto normal Os m dicos n o querem mais saber de fazer parto normal Grupo Tijuca 13 02 2007 A maior parte das participantes expressou durante as reuni es sua escolha pelo parto vaginal apesar da maioria ter vivenciado a cesariana como desfecho da gravidez Muitas demonstravam ainda certa frustra o por n o terem conseguido realizar seu desejo uma eterna d vida onde buscam saber se poderiam ter esperado um pouco mais para conseguirem o parto normal se perguntam se n o foram corajosas o suficiente para bancar suportar o parto ou at mesmo para questionar o m dico assumindo assim a responsabilidade pelo desfecho Esta quest o mostra o quanto a ideologiza o da maternidade de certa forma bem sucedida Mas como veremos as mulheres resistem e questionam algumas raz es que perpassam esses processos tal como sua inseguran a em rela o ao corpo e a pr pria mercantiliza o da assist ncia sa de como os depoimentos abaixo ilustram Por que a gente n o confia mais na gente O que que isso o que est acontecendo Grupo Tijuca 12 06 2007 n
188. est o da falta de vagas nas maternidades particulares sendo esta uma quest o referida em diversos momentos das entrevistas Existe uma grande procura especificamente por duas maternidades privadas no munic pio do Rio de Janeiro Isso parece acontecer porque esses locais segundo nossas informantes eram reconhecidos pelos m dicos e pelas pr prias mulheres como os que disponibilizam melhores recursos para o parto e por causa disso est o sempre lotados Essas superlota es frequentes supomos poderiam refletir tamb m num comprometimento da qualidade desses servi os junto clientela Curiosamente esse fato fez com que as nossas entrevistadas sentissem no momento do parto mais medo por n o terem onde parir do que propriamente da dor do parto A preocupa o aumentava principalmente pela possibilidade de n o parirem na maternidade que escolheram Como exposto nas falas a seguir Tem essa quest o das vagas tamb m porque as mais procuradas aqui na zona sul s o a X e Y e isso mais dif cil ainda se voc vai ter parto normal e n o tem vaga nessas duas ai voc ter que optar pela Z que n o tem UTI neo natal n o Sempre se corre o risco de n o encontrar vaga Elis Eu resolvi ter mesmo no Z porque eu tinha ouvido casos e mais casos que a X estava hiper lotada e que voc n o encontra nunca vaga a minha m dica falou que est todo mundo indo pra X e que n o est l mais assim com
189. esta o Agora quando eu estava com seis meses de gesta o mudar de obstetra complicado Joana 114 Em contrapartida queles depoimentos permeados de d vidas e inseguran as com seus tomada por ele sobre o parto Os depoimentos a seguir ilustram esta situa o N o ele o obstetra n o em nenhum momento N o do feitio dele o obstetra assim acho que a gente pode nem bem perceber que a pessoa est te enganando e no final voc perceber n o do feitio n o combina e em nenhum momento ele o obstetra me desencorajou Nunca Pelo contr rio nos ltimos dias tinha um feriado no meio eu j estava com 40 semanas e tr s dias nosso maior pavor dela e do marido que ela o beb nascesse no dia de finados Grande besteira n Depois at nos culpamos por esse sentimento ela o beb tinha que nascer no dia que ela quisesse n Fosse finados ou n o Quando eu conversei com ele o obstetra ele me perguntou Voc queria marcar a ces rea para dia primeiro Olha n o posso te garantir que n o v nascer amanh mas as chances s o grandes de voc passar o dia dois e passar at mais pra frente Entendeu Em nenhum momento ele me induziu para ser cesariana Nunca Mesmo porque dia dois era uma quinta feira uma coisa assim o pessoal emenda mas em momento nenhum ele o obstetra sugeriu Ele o obstetra falou que a equipe toda j estava ali todo mundo esperando de sobreaviso
190. etor privado de sa de teriam condi es mais favor veis de construir um v nculo de confian a com o seu obstetra durante o percurso da gravidez Isso deveria ser facilitado pelo n mero elevado de consultas de pr natal que as entrevistas revelaram em m dia 12 consultas e o que se confirma em outros in meros estudos muito acima do m nimo de seis consultas recomendadas pelo protocolo do American College of Obstetricians and Gynecologists ACOG 2002 e pelo MS 2006 Al m disso essas mulheres t m garantias de que ser o mesmo profissional que as acompanhou durante a gravidez que realizar o parto Idealmente segundo Souza 2002 Balan 1996 Fa ndes 1991 e UNICAMP 1983 as consultas de pr natal deveriam ser um espa o para o interc mbio de id ias onde a mulher pudesse expressar suas d vidas ansiedades e escolhas Infelizmente seja pelas consultas apressadas em consult rios cheios seja pela necessidade de manter a mulher desinformada essa oportunidade de fala escuta pode ficar aqu m das expectativas das mulheres Um depoimento sobre essa dificuldade de intera o merece registro pois retrata bem essa situa o como apresentamos a seguir Nunca o obstetra falou sobre o parto e eu senti falta disso Eu n o sabia muito bem o que perguntar sabe eu n o era uma pessoa eu n o tinha no o do que era como eu tenho hoje em dia eu tinha muitas d vidas e eu queria muito perguntar v rias coisas
191. eu de ter parto normal e tiveram que fazer o outro tipo de parto ces rea Elas me apoiaram para ter normal e diziam que seria o melhor parto A maioria das minhas amigas do trabalho que ainda n o tiveram filhos quer como eu queria ter parto normal Dora Essas contradi es parecem expressar os conflitos que as mulheres vivenciam hoje quanto expectativa de seus partos Por um lado um grupo parece desejar muito a experi ncia do que consideram o processo natural de parturi o mas n o conseguem realiz lo Por outro um grupo que elege a ces rea como a forma melhor e segura de parir e tratam com naturalidade uma cirurgia como a via mais adequada para terem seus filhos E como pano de fundo temos uma l gica mercantil que incentiva a cultura da ces rea para possivelmente garantir seus interesses econ micos e financeiros mesmo em detrimento da vontade das mulheres que n o a escolhem como o tipo de parto que gostariam ter S o os antagonismos entre o mundo produtivo e reprodutivo como j visto no t pico sobre a mercantiliza o do parto Um dos depoimentos configura bem a situa o de conflito e contradi es entre as mulheres As pessoas pr ximas a mim todas s o super convencidas e conscientes que o parto normal natural a tend ncia natural do corpo Mas em c rculos que eu fregiientava de outras pessoas gr vidas eu ouvia Ah voc vai ter parto normal A Parto normal Voc est louc
192. eval ncia da cesariana como tipo de parto mais frequente neste segmento da popula o feminina O objetivo principal desta pesquisa contribuir para transforma es na assist ncia sa de reprodutiva das mulheres de camadas m dias para que elas possam reencontrar novos caminhos mais satisfat rios na experi ncia do parto onde suas escolhas sejam respeitadas e acolhidas inclusive na escolha do tipo de parto que desejam ter De acordo com os esclarecimentos prestados pela pesquisadora o estudo ser feito atrav s de entrevistas individuais onde responderei livremente s perguntas por ela colocada em ambiente adequado que garanta minha privacidade Estou ciente de que tenho total liberdade para interromper minha participa o na pesquisa a qualquer momento sem preju zo a minha pessoa e que minha participa o no estudo n o envolve nenhum gasto desconforto ou altera o em minha rotina Al m disso estou ciente de que a pesquisa an nima de forma a garantir minha privacidade em rela o aos dados fornecidos Data Assinatura da entrevistada Nome da Pesquisadora Junia Espinha Cardoso Institui o Instituto de Estudos em Sa de Coletiva UFRJ Endere o Avenida Brigadeiro Trompowsky s n Pra a Prefeitura Universit ria Fund o Ilha do Governador Rio de Janeiro Telefones 21 2598 9274 Email juniaWiesc ufrj br 183 ROTEIRO DA ENTREVISTA A 1 2 3 B Representa e
193. exagera Participou de todas as consultas ultras sonografias todos os exames Esteve sempre comigo No momento que eu entrei em trabalho de parto ele o companheiro ficou marcando as contra es o intervalo de casa at no quarto da maternidade Ele o companheiro me ajudou me apoiou Quando eu entrei pra sala de parto ele n o p de entrar foi botar a roupa esterilizada e teve que ficar esperando esperando o momento do m dico chamar autorizar a entrada dele que ia ser s no momento que o beb tava nascendo o m dico ia ver quando come ava a sair nascer pra chamar Disse que era pra ele o companheiro n o ficar nervoso que geralmente os homens querem mas que eles n o agiientam S que a quer dizer depois chamaram ele j quando tava n pra ces rea Acho que um ato muito r pido foi tudo muito r pido Vit ria Ele o companheiro sempre me apoiou ele sempre dizia pra fazermos o que achasse que era melhor Ele da rea da sa de enfermeiro ele queria muito acompanhar o parto Ele me deu muita for a ia sempre na m dica fazia quest o que marcasse nos dias que ele podia ir tamb m Em nenhum momento ele deu pra tr s no meu parto normal ele sabia que eu queria muito ent o sempre me apoiou Ele acompanhou o parto todo eu ficava na sala com meu marido ele ficava conversando comigo e quando vinham as dores eu batia nele beliscava ele at a dor ir embora e
194. fala abaixo um direito mudar procurar outro mas ruim que voc perde tempo n voc vai em um n o gosta vai em outro n o gosta fica procurando at achar um que voc confie e tenha alguma coisa a ver contigo Enquanto isso a barriga cresce Flora Nossa entrevistada quando aludiu barriga cresce estava mostrando que a gravidez n o espera e que muitas vezes uma decis o dif cil principalmente quando se percebe no meio da gesta o que o m dico n o est realmente prop cio a fazer o PV Percorrido esse caminho de busca todas as informantes relataram que os m dicos escolhidos garantiram que eram a favor do parto vaginal e nas primeiras consultas deixaram claro que respeitariam a escolha a n o ser que houvesse uma contra indica o Como nos mostra os depoimentos Falei logo que queria normal e ela disse Vamos devagar de acordo com o processo se der para fazer normal vai ser normal Joana O m dico sempre disse que queria fazer o parto normal se tudo corresse bem ele falou que se poss vel faria o parto normal e ele uma pessoa que faz parto normal Alice apesar de saber que ela fazia partos normais ela me disse _ Olhe tudo vai depender da evolu o da sua gesta o ela falava sobre o parto mas sempre frisava que ia depender do final da gravidez Regina 108 Como observarmos h uma condicionalidade recorr
195. ficiar do desenvolvimento da ci ncia moderna para melhorar os indicadores da sa de reprodutiva mas isso n o precisa acontecer s custas do processo natural Segundo os autores h mais na experi ncia do nascimento do que um parto tecnologicamente perfeito A avalia o cient fica das pr ticas de assist ncia evidenciou a efetividade e a seguran a de uma aten o ao parto com um m nimo de interven o sobre a fisiologia Os procedimentos devem ser centrados nas necessidades das parturientes ao inv s de organizados em fun o dos protocolos das institui es que n o consideram a individualidade de cada mulher A sistematiza o de evid ncias sobre a efic cia e seguran a na assist ncia mulher foi realizada atrav s da coopera o internacional do grupo de pesquisadores da Cochrane Collaboration e se traduziram em recomenda es baseadas em evid ncias cient ficas WHO 1996 2 2 5 Situa o atual da assist ncia ao parto Apesar dos avan os cient ficos e da moderna tecnologia utilizada na assist ncia ao ciclo grav dico puerperal ainda vivemos uma realidade alarmante no que diz respeito assist ncia ao parto A prolifera o do uso dessas tecnologias com a finalidade de melhorar as condi es do parto e preservar a sa de do bin mio m e filho teve seu pre o A constru o de um campo de saber que valoriza mais a ci ncia e a interven o t cnica do que o ser humano se cristaliza no mo
196. firmaram suas escolhas com a expectativa de que fosse alcan ada a realiza o do seu desejo mesmo que parte delas tenham tido seus momentos de incertezas Essas afirma es confirmam dados de outras pesquisas sobre a 11 escolha do parto e que apontam tamb m a prefer ncia da maioria das mulheres brasileiras pelo parto vaginal Carranza 1994 Hopkins 2000 Potter et al 2001 Rattner 2002 Giffin 2003 Tedesco 2004 Orsi 2005 Dias 2007 Esses dados conseq entemente n o corroboram com a ideologia da exist ncia de uma cultura da cesariana introjetada como real predile o feminina Vimos atrav s das falas de algumas de nossas informantes que a escolha pelo parto vaginal estava ligada tamb m a uma satisfa o emocional para elas postulada no constructo do parto idealizado para a mulher e seu beb Algumas delas deixaram transparecer certa realiza o pessoal relacionada ao empoderamento da condi o feminina como parte constituinte do cen rio do parto que desejavam quando eu engravidei quando eu peguei o resultado do exame no laborat rio eu tive uma sensa o t o incr vel Caramba Eu fiquei t o feliz com aquela sensa o de ser mulher de ser capaz de gerar outra vida senti uma for a foi t o legal pensei logo no parto Carla se tinha algum momento que a gente teria contato com esse lado primitivo do ser humano seria na poca do parto seria o momento ideal p
197. fregiiente Apesar do parto dessa mulher ter sido normal durante seu relato mencionou que fez epsiotomia e uso de ocitocina mostrando o quanto este ainda realizado dentro do modelo biom dico intervencionista Mesmo assim ela estava feliz pelo m dico ter oportunizado a ela essa experi ncia A posi o desta mulher parece fortalecer o conceito de que a permiss o para que se realize o desejo pelo parto normal dada pelo obstetra Isso revela que o poder de decis o est nas m os daqueles que representam o saber cient fico os m dicos e n o mais nas m os das mulheres que representam o saber feminino popular quando n o h evid ncia de risco para que a ces rea seja indicada Notamos pelos movimentos que est o surgindo Amigas do Parto rede Feminista de Sa de Parto do Princ pio REHUNA contra o uso abusivo da cesariana como via de parto que existe uma insufla o contra a falta de direito das mulheres de escolherem o tipo de parto que querem ter se rebelando contra esses m dicos que nunca querem esperar segundo declarou uma das participantes do grupo da Tijuca em um dos encontros Poss veis justificativas para o desfecho A quest o das cesarianas sempre provoca uma intensa discuss o nos grupos Todas conhecem hist rias ou elas mesmas j vivenciaram a cesariana apesar do desejo pelo parto 12 epsiotomia o corte realizado no per neo da mulher para facilitar a sa
198. fundamentais da m e e da crian a a garantia da qualidade na assist ncia prestada e como resultado a satisfa o da experi ncia do parto para as mulheres e sua fam lia Havia uma preocupa o crescente em dar lugar a novos paradigmas que considerassem e valorizassem o ser humano em sua totalidade A proposta tamb m era a sensibiliza o e estimula o dos profissionais de sa de a repensarem suas pr ticas buscando a transforma o da realidade no cotidiano do cuidado Dossi Humaniza o 2002 Segundo Davis Floyd 1992 essa proposta de assist ncia mulher na gravidez e no parto deve considerar os processos fisiol gicos do corpo feminino como saud veis e seguros Sa de e doen a s o reflexos manifesta es do pr prio indiv duo da sua vida cotidiana sua fam lia e sociedade em que vive A assist ncia humanizada portanto deve ser centrada nas necessidades da parturiente Os sentidos e experi ncias s o importantes e devem ser considerados e respeitados frente s 22 rotinas tanto da institui o como dos profissionais A ci ncia e a tecnologia devem estar dispon veis para o benef cio da mulher sendo o papel do profissional que assiste ao parto acolher e fortalecer os futuros pais Os conhecimentos e habilidades desse profissional devem suprir e apoiar as a es e os desejos da mulher e de seu parceiro Davis Floyd 1992 Dossi de Humaniza o 2002 Para Burch e Sachs 1999 podemos nos bene
199. hecimento que postula e respalda as a es que servem a um sistema produtivo e a um mercado lucrativo para se manter e se justificar re significa a ces rea como forma natural de nascer abusando do uso da tecnologia sobre os corpos femininos mesmo que sem justificativas consistentes o que segundo Berman 1997 serve para justificar o dom nio de uma elite de poder naturalmente superior e da ci ncia que est a seu servi o p 271 Dentro da l gica mercantil existe uma coer ncia que a sustenta o ato cir rgico representa menor tempo gasto quando comparado ao acompanhamento do trabalho de parto 32 que pode levar muitas horas O que significa a possibilidade de mais produtividade do que os partos vaginais com melhor resultado financeiro menor desgaste f sico e emocional para o obstetra na medida em que a ces rea elimina inclusive as surpresas que podem ocorrer durante a evolu o do parto vaginal Por m importante destacar que os oprimidos em geral n o s o passivos Se as mulheres est o se submetendo s cesarianas importante compreender suas raz es e tamb m captar suas estrat gias de resist ncia a esta interven o Como postula Anyon 1990 os grupos dominados s o capazes de conquistar espa os e oferecer resist ncia mesmo que n o expl cita opress o e ao poder de domina o Foi atrav s de um movimento de resist ncia coletivo organizado pela Rede Parto do Princ
200. ho que n o bem assim acho que tem uma rela o de poder sim Dora 125 Boltanski 1989 e Martin 2006 ressaltam que o discurso m dico nas camadas m dias ganha for a e determina uma rela o de confiabilidade e poder junto s mulheres Essa confian a vem n o s por pertencerem mesma classe social e portanto se identificarem enquanto classe mas tamb m da intelectualiza o diferenciada advinda dos conhecimentos espec ficos que dominam Esse referencial por si confere poder ao m dico Sendo assim suas condutas estariam respaldadas no valor social adquirido pelo saber e com isso ampliando suas possibilidades de manipula o Como ilustrado nas falas abaixo Embora eu tivesse essa inseguran a nesse dia da indica o da ces rea eu tenho muita confian a no meu m dico e ent o isso foi um fator positivo pra mim Ele muito competente est sempre indo a congressos se atualizando n o tinha porque n o confiar nele claro que ele sabia o que estava fazendo Alice A ela uma boa m dica ela uma pessoa respons vel ela pesquisadora trabalha com pesquisa o que j conquistou mais a minha confian a por causa disso Flora Era bvio que o trabalho dele obstetra botar uma crian a no mundo de maneira mais com o menor risco poss vel entendeu Se ele o obstetra chegar perto de um risco ele desvia pela ces rea ele tem compromisso de tirar a crian a da melho
201. i ncias encontrei contrapontos onde os homens re significavam a sua participa o nesse processo do parto e nascimento Em um dos encontros onde estava um casal de Campinas que naquele momento trabalhava no Rio pude observar como a cumplicidade entre eles era importante na espera pelo momento do parto A responsabilidade n o s da mulher O marido tem tamb m a fun o de esteio deve estar junto com ela para entender que processo esse que estamos vivendo estar junto o m ximo poss vel Grupo Botafogo 02 04 2007 Como se pode constatar as trocas de experi ncias entre as mulheres nos grupos ajudam na supera o da ansiedade e das d vidas e fortalece as rela es de g nero S o mulheres falando com mulheres que est o passando por viv ncias semelhantes e certamente existe uma identifica o entre elas Conflitos parentais e geracionais Nos relatos dos grupos apareceram o quanto os familiares podem ajudar mas em contrapartida tamb m gerar conflitos que angustiam mais as mulheres tornando ainda mais dif cil o momento de adapta o maternidade As m es e as sogras assim como outros parentes e tamb m as amigas e amigos querem colaborar mas podem interferir negativamente principalmente no processo de aleitamento materno Muitas vezes essas redes familiares baseadas nas suas experi ncias passadas fazem press es para a introdu o da mamadeira j nas primeiras dificuldades da amamenta
202. ia do parto transformando a parturiente em paciente e sujeitando seu corpo a interven es m dicas criando o chamado efeito cascata Isso acontece quando os m dicos submetem as mulheres a interven es que podem levar a complica es gerando mais interven es que quase sempre finalizam em uma cesariana Diniz 2001 Essas pr ticas ocitocina ruptura de bolsa amni tica kristeler etc consideradas prejudiciais podem levar a um manejo inadequado do trabalho de parto 148 resultando na iatrog nia Diniz 2001 Al m do que para a mulher fica sempre a id ia distorcida e dolorosa de que seu corpo n o funcionou que necessitou da interven o m dica para corrigir seus defeitos Segundo Dias e Domingues 2005 Embora haja evid ncias cient ficas suficientes para que se realizem modifica es no modelo m dico tradicional de assist ncia ao parto desmedicaliz lo implica perda de poder Abandonar rotinas que adequam o trabalho de parto ao modo de funcionamento do hospital e adotar outras que privilegiem o acompanhamento de sua fisiologia seria perder o controle do processo de parturi o e modificar as refer ncias do papel m dico nesse contexto de assist ncia p 700 Precisamos pois refletir sobre as responsabilidades da profiss o m dica dos cart is de sa de incluindo se a os poderosos interesses das ind strias farmac uticas todos alimentados pelo sistema vigent
203. ia n 888 GM de 12 de julho de 1999 Institui o Projeto Casas de Parto e Maternidades Modelo Bras lia 1999 Dispon vel em URL http portal saude gov br acesso em 18 11 2006 MINIST RIO DA SA DE Portaria n 985 GM de 05 de agosto de 1999 Estabelece crit rios para criar o Centro de Parto Normal CPN no mbito do SUS Bras lia 1999 Dispon vel em URL http portal saude gov br acesso em 18 11 2006 MINIST RIO DA SA DE biblioteca Dispon vel em URL http www saude gov br biblioteca publicacoes ProgramaHumanizacaodoParto2000 acesso em 19 10 2006 178 97 MINIST RIO DA SA DE Assist ncia Integral a Sa de da Mulher bases de a o program tica Bras lia 1984 98 MINIST RIO DA SA DE Datasus Sistema de Informa es Hospitalares SIH SUS Dispon vel em URL http tabnet datasus gov acesso em 28 08 2006 99 MINIST RIO DA SA DE CEBRAP Estudo multicentrico para avalia o de ces reas no pa s ap s as Portarias n 2816 e 867 do MS Relat rio de pesquisa Bras lia MS 2001 100 MITJAVILA M amp ECHEVESTE L Sobre a Constru o Social do Discurso M dico em torno da Maternidade In Costa A O e Amado T org Alternativas Escassas sa de sexualidade e reprodu o na Am rica Latina S o Paulo PRODIR FCC Ed 34 1994 101 MORAES MS GOLDENBERG P Ces reas um perfil epid mico Cad Sa de P blica Rio de Janeiro 17 3 509 519 2001 102 MORGAN D L Focus group as qualitat
204. ibilita visibilidade s poss veis interfer ncias e interven es vividas pelas mulheres que buscam no setor privado melhor atendimento e mais seguran a na realiza o do parto Consegiientemente mais tranquilidade para vivenciarem plenamente o momento do nascimento de seus filhos Nesse sentido entrela ando todas as interfaces que alicer am a completude do tema buscar se compreender atrav s dessa pesquisa o processo de intera o entre as mulheres e seus obstetras constru do durante o pr natal e a poss vel interfer ncia do profissional no momento do parto Enfocar as liga es entre as ideologias de g nero e a ideologia m dica onde o poder m dico atua na naturaliza o e na medicaliza o do corpo feminino sufocando muitas vezes o desejo da mulher Souza 1994 Bernhardt 2001 MS ANS 2004 Marqu s 2005 Dessa forma o estudo tentar identificar como a constru o social ideol gica dessa cultura da cesariana ancorou se e subjetivou se em mulheres que utilizam o sistema privado de sa de para terem seus filhos atrav s da perspectiva das pr prias mulheres No campo das ideologias parte se do pressuposto que o sistema m dico atualiza estrat gias controladoras do corpo e da sexualidade feminina e da conduta medicalizante que tem como objetivo ltimo o controle sobre a reprodu o Apesar da participa o feminina na esfera produtiva a ideologia de g nero ainda refor a o papel da mulher com
205. ica respaldada num discurso legitimado Segundo Boltanski 1989 o saber cient fico gera ansiedade tens o e inseguran a para as mulheres no enfrentamento desse universo desconhecido de linguagem e regras pr prias Esse fato reitera a ignor ncia da mulher frente a um saber reconhecidamente leg timo mantido pela barreira ling stica e pela desinforma o diminuindo assim a interlocu o que supostamente deveriam ter com seus obstetras A falta referencial desse conhecimento constitui um impedimento para que submetam cr tica o discurso m dico Como vemos a seguir o que eu acredito que ela a obstetra fa a partos normais quando t com todas as condi es e absolutamente 100 das condi es o que eu acho n o precisa ser entendeu Acho que s vezes voc pode trabalhar um pouco as condi es tamb m as condi es podem ser um pouco adversas mas voc pode tentar trabalhar Acho tamb m que n o d pra voc tentar discutir com um profissional da sa de porque sem d vida essa rela o de poder desigual uma quest o de confian a o sujeito estudou dez anos praticamente uma resid ncia m dica e pra trabalhar com isso ou voc se entrega ou n o eu li at isso que algumas vezes o casal que manda naquilo ali no parto mas n o bem assim a verdade n o essa voc n o vai discutir na hora na sala de parto com a m dica n o vai fazer isso n o ac
206. ificativa das taxas de morbimortalidade materna e fetal Dossi Humaniza o do Parto 2002 A imprevisibilidade aparente do parto e de outros processos fisiol gicos geraram cren as e costumes para explic los e control los Todas as melhorias alcan adas pela ci ncia formaram um conjunto de pr ticas obst tricas padronizadas e intervencionistas sustentadas pelo modelo biol gico tecnicista que considera o parto um evento m dico e patol gico que precisa ser tratado Parir nas sociedades modernas distanciou se de um processo natural e normal da vida das transforma es e crises que ocorrem naturalmente durante a exist ncia da maioria das mulheres A parturi o tornou se uma situa o cl nica um acontecimento patol gico onde as interven es passaram a serem necess rias Kitzinger 1978 Capra 1982 analisou a origem do modelo biom dico de assist ncia sa de a partir das mudan as da f sica e da astronomia Segundo ele o pensamento cient fico ocidental sofreu forte influ ncia da vis o de mundo cartesiana e dos princ pios da f sica newtoniana A moderna medicina cient fica constituiu a suas bases conceituais Segundo Davis Floyd 1992 o desenvolvimento da obstetr cia ocidental foi fortemente influenciado n o s pela vis o do corpo como m quina mas tamb m pela aceita o da met fora do corpo feminino como m quina defeituosa Os obstetras foram levados a desenvolver ferramentas e te
207. indica es das ces reas podem estar fundamentadas na inseguran a dos obstetras em conduzirem e assistirem o parto vaginal O que justificaria essa postura de agir defensivamente antecipando se a um poss vel problema ou imprevisto no desenrolar do PV Essa postura m dica foi chamada por Wagner 2000 de obstetr cia defensiva Levando em considera o esse fato poder amos supor que caso ocorra alguma complica o na cirurgia possivelmente ser visto que o profissional usou a melhor tecnologia dispon vel na assist ncia ao parto Contrariamente a esse fato no acompanhamento do PV que complica sempre pode existir o questionamento da n o utiliza o da ces rea como recurso para resolver aquela situa o Ent o a exposi o dos m dicos que realizam as ces reas desnecess rias estaria supostamente respaldada por essa tica preventiva Dando prosseguimento an lise observamos que nem todas as entrevistadas tiveram sucesso na primeira tentativa de encontrar um obstetra que correspondesse suas expectativas Muitos m dicos j na primeira consulta informam sobre a sua linha de atua o produ o na assist ncia ao parto foi o que aconteceu com aquele primeiro m dico que na primeira consulta falava que n o fazia parto normal s fazia ces rea ele chegou falando mal do parto normal e a favor da ces rea fazendo propaganda contra o normal Joana Nossa informante
208. ionado ao parto vaginal Fa ndes e Cecatti 1991 Villar 2006 Existe uma tend ncia no crescimento das taxas de cesarianas entre as mulheres com maior grau de instru o e esses n meros crescem progressivamente conforme aumentam os anos de estudo BEMFAM 1996 MS ANS 2004 As chances de interven o obst trica como a cesariana eletiva s o muito maiores em mulheres com melhores condi es s cio econ micas Barros et al 1991 Freitas 2000 Segundo BEMFAM 1996 os partos cir rgicos s o mais freq entes nas mulheres com idade superior a 20 anos do que nas adolescentes Ou seja na medida em que a idade materna aumenta o risco potencialmente maior Esse tipo de parto tamb m mais presente entre as mulheres de cor branca Jonas et al 1992 z Os resultados desses estudos demonstraram que a ocorr ncia da cesariana maior entre mulheres de baixo risco de complica es obst tricas Isto reflete o que outros estudos j sugeriram que os altos ndices de ces rea no Brasil est o relacionados aos fatores s cio culturais institucionais econ micos e legais da assist ncia ao parto Barros 1986 Pinotti e Fa ndes 1988 World Development Report 1993 Souza 1994 Rattner 1996 Marques 2005 A cesariana neste contexto social tida como uma forma moderna e segura de se ter filhos principalmente porque para muitas mulheres existe a cren a de que o parto normal potencialmente mais perigoso
209. iplina t cnica cient fica e dominada pelo homem A possibilidade de interven o tirou o car ter expectante presente na assist ncia ao parto que permitia visualizar a luta do homem contra a natureza Anteriormente utiliza o de instrumentos nas complica es do parto pouco ou nada se podia fazer Osava e Mamede 1995 At o s culo XVIII os m dicos cirurgi es se envolvem cada vez mais com a pr tica obst trica e com a problem tica do parto Ocorrem importantes estudos avan os t cnicos e a opera o cesariana em mulheres com vida 17 A medicina marcada pela evolu o do conhecimento cient fico e o aprimoramento da cirurgia se aproxima definitivamente do parto O saber popular sistematizado a partir da acumula o do conhecimento emp rico das parteiras dom nio exclusivo das mulheres Vieira 2002 O que ocorreu com a medicaliza o foi a redefini o do parto na biomedicina como inerente e problem tico exigindo a presen a do m dico e sua ativa interven o para garantir um bom desfecho A partir da introdu o da obstetr cia como campo da medicina o parto deixou de ser um processo natural Essa no o conduziu progressivamente marginaliza o das parteiras afastando as do pertencimento a esse campo tradicionalmente feminino de atua o O progresso da ci ncia inegavelmente foi respons vel pelos avan os da obstetr cia moderna pelo menos no que se refere redu o sign
210. ipulados pela biomedicina a fim de consolidar essa pr tica dentro da orienta o geral da medicina ocidental em rela o benefic ncia de poupar a mulher da dor dental l benefi de lher da dor A cesariana ent o utilizada com duas justificativas o medo da dor e como prote o perineal Existe uma associa o da falta de preparo psicol gico das parturientes para o enfrentamento das dores relacionadas contra o uterina durante o trabalho de parto A preven o aos danos do per neo causados pelo parto vaginal estaria resguardando valores lt Pq relacionados ao potencial sexual feminino imagem e est tica do corpo e pr pria 13 identidade feminina principalmente entre as mulheres brasileiras de classes m dias Marqu s 2005 Existe uma tend ncia a acreditar que a cesariana seja o tipo de parto idealizado pelas mulheres brasileiras de extrato social superior com plano de sa de e atendidas no sistema privado MS ANS 2004 A imagem da cesariana como uma via de parto segura eficiente e desej vel vai se tornando gradativamente uma rotina e passa a fazer parte do universo de todas as mulheres gr vidas como o meio ideal para o nascimento de seus filhos A ascens o dessa pr tica surgida dentro de uma classe economicamente privilegiada foi associada a uma representa o cultural positiva da classe dominante tornando se s mbolo de qualidade e bom atendimento Souza 1994
211. ir A minha chefe teve filho h pouco tempo e teve essa coisa do cord o Ela entrou em trabalho de parto ela queria esperar o parto normal e o m dico dela um famoso a desses de parto normal n e ela j tinha 39 semanas e a maioria dos m dicos n o quer esperar n o quer ele deu maior apoio e tal estourou a bolsa teve a dilata o s que enrolou no cord o umbilical a eles foram controlando os batimentos do nen m e a chegou uma hora que ele falou o obstetra N o vai melhor abrir e tal a fez ces rea e ela falou que ele nasceu bem roxinho mesmo a n o teve jeito mas ela tamb m queria o normal o primeiro filho dela Vit ria Uma parte do grupo entrevistado se mostrava melhor informada sobre esse mito da f a27 3 3 circular de cord o colocando que este fato na verdade poderia n o ser impedimento para a realiza o do PV Algumas informantes expressam essa quest o Eu tenho uma amiga que falou que o beb dela tava na posi o e tal mas que n o vai ser parto normal porque o m dico falou que ia fazer uma ces rea porque nas ltimas ultras sonografias o beb tava com o cord o enrolado Quando ela falou isso e at ent o a minha filha tava n o aparecia nada de cord o n Pensei ent o n o vai ter pegadinha do cord o porque eu j tinha essa informa o que mesmo com o cord o enrolado perfeitamente poss vel fazer o parto normal Dora
212. ireito estava realmente garantido por fim algumas mulheres tiveram a certeza de que tudo foi feito para que a sua vontade prevalecesse O depoimento a seguir demonstra essas contradi es Ela a obstetra apoiava a minha decis o sobre o parto sempre respondia as minhas perguntas Eu acho assim que no final eu fiquei na d vida mas a o que eu falei voc tem que confiar porque chega uma hora que eu acho tipo assim se voc come a a entrar numa de tudo desconfiar n o uma rela o bacana entendeu Eu acho que o ideal voc escolher um m dico que voc tenha muita confian a e eu j tinha constru do uma rela o de confian a muito grande com ela a obstetra ent o assim n o teria vontade de mudar n o senti vontade de mudar tamb m tem isso e eu cheguei conclus o e falei Bom se ela a obstetra chegar uma hora e falar que tem que ser ces rea eu vou ter que acreditar e paci ncia entendeu Dora Sobre uma poss vel mudan a de obstetra no transcorrer da gesta o uma de nossas informantes expressou sua angustia acerca dessa dif cil decis o No seu relato percebemos que mudar nessa hora n o uma decis o f cil de ser tomada No in cio da gravidez eu at mudei quando n o gostei do primeiro m dico que n o queria fazer o parto normal mas eu estava no in cio mas de repente uma dificuldade no meio de um processo mudar Voc est no meio de uma g
213. ireito inalien vel das mulheres do companheiro e da fam lia Palavras chaves sa de da mulher g nero direitos reprodutivos gravidez parto ces rea CARDOSO Junia Espinha The dissonance between desire and reality the childbirth s choice by women from the middle classes of Rio de Janeiro Disserta o Mestrado em Sa de Coletiva Instituto de Estudos de Sa de Coletiva e Faculdade de Medicina Universidade Federal do Rio de Janeiro Rio de Janeiro 2008 Orientadora Regina Helena Sim es Barbosa Abstract The aim of this study was to investigate through the perception of women from the middle class the dissonance between the desire for the vaginal delivery and the consummation of a caesarean section instead The qualitative approach was accepted as methodology through a script of open questions The investigation gave voice to this women s group so that they could tell their experiences and perceptions about this moment in which they didn t have their wishes considered This work intend to review the women s right of choice about the kind of birth they want to have whereas the number of caesarean sections is increasing in this social segment nowadays By the analysis of the interviews we have tried to understand the reasons and meanings of the preference for the vaginal birth the influence of the obstetrician pregnant woman relationship during pregnancy the birth s results and the feelings left because their choice was not
214. ista As percep es dos fen menos s o determinadas n o apenas pelas coisas em si mas tamb m por nossa disposi o mental nossa consci ncia individual e nossa compreens o O que por sua vez depende de nossa intera o social com os fen menos e da hist ria nica de nosso corpo c rebro e psiquismo p 261 Como visto essas contradi es acabam por influenciar as mulheres em suas decis es S o as for as de oposi o ou contradi o que movem as concep es Os opostos dial ticos est o em constantes conflitos n o sendo diferente nesse processo de escolha do parto para as mulheres de camadas m dias A supera o dos conflitos iniciais a tentativa de ruptura primeira com a press o social e a press o m dica para a naturaliza o da ces rea como o 79 parto mais adequado para esse segmento social Novamente Berman teoriza essa quest o quando afirma que A din mica da mudan a deriva da atua o rec proca ou luta de for as agindo em oposi o entre si Nas tens es inerentes ao crescimento e ao desenvolvimento de um fen meno s o criadas as condi es para seu pr prio deslocamento ou nega o em suas contradi es est a fonte a origem daquilo que o suceder p 263 Esse conflito entre o ritual feminino e os ritos m dicos de parto acaba num determinado momento suplantando um ao outro Essa ruptura tem como pano de fundo um novo processo de re constru o ancorado dialeticame
215. ito fil sofo grego considerado pai da dial tica a conversa existe somente entre os diferentes N o a conc rdia que conduz ao di logo mas sim a diverg ncia Desta forma Her clito insiste na luta dos contr rios no mundo da natureza luta essencial para o surgimento da harmonia Novelli e Pires 1996 Engels 1976 Marx utilizou o m todo dial tico para explicar as mudan as importantes ocorridas na hist ria da humanidade atrav s dos tempos Ao estudar determinado acontecimento hist rico ele procurava seus elementos contradit rios buscando encontrar aqueles respons veis pela sua transforma o num novo fato dando continuidade ao processo hist rico Harnecker 1983 A l gica dial tica se contrap e l gica dualista da ci ncia A dial tica sempre foi combatida pela l gica formal dualista que v o mundo est tico e as coisas e fatos se opondo mecanicamente umas s outras Essa dualidade foi constitutiva da cosmovis o da ci ncia moderna Berman 1997 A dial tica nos mostra que transformamos o mundo atrav s de nossas a es e simultaneamente somos por ele transformados O materialismo dial tico postula que nossa consci ncia o resultado de uma intera o que envolve conhecimento e a o N o somos passivamente impressionados n s estamos agindo e interagindo sempre como seres ativos Assim o conhecimento resulta da intera o sujeito objeto que se influenciam mutuamente A realidade n
216. ive research Qualitative Research Methods Series 2 ed London Sage Publications 1997 103 NASCIMENTO AC SAYD JD Ao persistirem os sintomas o m dico dever ser consultado Isto regula o Physis vol 15 no 2 Rio de Janeiro 2005 104 NOTZON F C PLACEK P J TAFFE L S M Comparisons of national cesarean section rates New England Journal of Medicine 1987 316 386 9 105 NOTZON F C International differences in the use of obstetric interventions Jama v 263 n 24 p 3286 91 1999 106 NOVELLI P G A PIRES M F C A dial tica na sala de aula Botucatu UNESP 1996 107 N CLEOS DE ESTUDOS DE POPULA O Pesquisa sobre Sa de Reprodutiva e Pr ticas Obst tricas no Brasil Campinas N cleo de Estudos de Popula o Universidade estadual de campinas 1996 108 OLIVEIRA F A Morte Materna possui respons veis Jornal da Rede Feminista de Sa de n mero 28 julho de 2006 4 6 109 OLIVEIRA I V Epidemia do parto ces reo Dispon vel em URL htpp br not cias yahoo com s sa de epidemia parto cesareo html amp printe acessado 28 01 2008 110 OPAS OMS Redu o da mortalidade e da morbidade maternas Consenso Estrat gico Interagencial para Am rica Latina e Caribe Washington DC OPAS 2003 111 ORGANIZA O PAN AMERICANA DE SA DE Relat rio Sa de Mundial 2005 Fa a valer cada mulher e crian a Dispon vel em URL http www opas org br acesso 19 10 2006 112 ORSI
217. lem ticas essas que dificilmente est o permitindo essas mulheres tenham seu desejo realizado 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 173 REFER NCIAS BIBLIOGR FICAS ALENCAR J A ANDRADE E C The use of contraceptives in Brazil an analysis of the prevalence of female sterilization Dados 1993 36 419 39 American College Obstetricians and Gynecologists 2002 Dispon vel em URL http www icsi org knowledge AMIGAS DO PEITO Dispon vel em URL http www amigasdopeito org br acesso em 08 03 2007 ANYON J Intersec es de g nero e classe acomoda o e resist ncia de mulheres e meninas s ideologias de pap is sociais Cadernos de Pesquisa 73 13 25 1990 BALAN M AJ amp SERAFIM D Assist ncia Pr Natal Realizada Por Enfermeiras s Gestantes de Baixo Risco do Hospital Universit rio de Maring In 48 Congresso Brasileiro de Enfermagem S o Paulo 1996 Anais S o Paulo 1996 M47 BARROS F C VAUGHAN J P VICTORA C G Why so many caesarean sections The need for a further policy change in Brazil Health Policy and Planning 1986 1 19 29 BARROS F C et al Epidemic of caesarean sections in Brazil Lancet 1991 338 167 9 BARROS J A C Propaganda de medicamentos atentado sa de S o Paulo Hucitec 1995 BECKER H S M todos de Pesquisa em Ci ncias Sociais 3 ed S o Paulo Hucitec 1997 BELIZAN J M et al Rates and implications of caesarean
218. lemas at hoje por causa disso A cesariana foi mal feita e isso repercutiu durante a vida dela toda Sempre passou que a experi ncia do parto da cesariana n o era boa Isso influenciou bastante a minha adolesc ncia e realmente por isso eu relutei muito a ter um filho Alice Dos partos normais minha m e sempre falou muito bem j da ces rea Ela sempre falou que o parto ces reo era ruim por causa da anestesia porque podia acontecer alguma coisa Inclusive a minha av perdeu o que seria o meu tio em parto ces reo Ent o aqui a gente assiste esses problemas a ces rea uma lembran a ruim aqui na fam lia Nat lia 138 Como pudemos perceber os relatos descortinaram os problemas vividos por um grupo de mulheres que teve essa experi ncia que contrariamente ao que se propaga tem os riscos de qualquer procedimento operat rio e portanto n o deve ser utilizado de forma abusiva e sem crit rios bem definidos Com isso n o estamos querendo entrar no m rito da quest o sobre as indica es para as cesarianas relatadas Apenas estamos corroborando estudos j realizados sobre esse tema apresentados ao longo deste trabalho Na elabora o da escolha do parto nossas entrevistadas puderam escutar muitas hist rias que para algumas podem ter servido como refer ncia para as suas decis es Mas a maioria delas afirmou inconscientemente ou n o que as boas ou m s lembran as familiares n o fora
219. lexidade do qu e porque houve a disson ncia Se elas n o t m acesso s fontes de informa es fidedignas n o podem perceber os fios invis veis que est o atuando e conectando se a essa situa o N o conseguem explicar e ent o tudo pode parecer apenas um imprevisto no processo natural e biol gico A seguir apresentaremos como as entrevistadas constru ram e verbalizaram o momento da disson ncia entre o desejo e a realidade Os sentimentos relacionados experi ncia do parto Pelo que j foi exposto e tendo como suporte a diversidade de dados encontrados nos v rios estudos j apresentados poder amos dizer que para a maioria das mulheres dos 151 segmentos m dios da popula o que elegem o PV a escolha parece estar efetivamente eliminada Seja por uma promessa n o cumprida dos m dicos pelas poss veis iatrogenias causadas por um parto excessivamente medicalizado ou ainda pela concep o do PV como um evento imprevis vel estressante e arriscado tal como considerado e divulgado pela m dia e mesmo por grande parte dos obstetras Chachan 2006 Para a maioria das entrevistadas nove n o ter vivido a experi ncia do PV representou uma grande frustra o Procuramos problematizar com elas como foi essa viv ncia e como internalizaram o fato de n o protagonizarem o parto A maioria expressou uma grande decep o verbalizada atrav s de discursos marcantes como os apresentados a seguir
220. lo biom dico de assist ncia ainda s o refer ncia incontest vel de seguran a tal como expressado pela fala abaixo A escolha do parto tamb m depende de voc encontrar uma pessoa obstetra que tenha vontade de fazer n o s de fazer um parto normal mas de respeitar o processo do parto todo sen o a escolha vai pro espa o n o tem escolha nenhuma e hoje em dia eu ainda n o entro numa de fazer parto em casa eu n o entraria nessa de parto sem anestesia analgesia longe da maternidade vai que o beb precise Ainda n o t segura e preparada para ter filho em casa n o Marta No entanto a grande maioria das informantes mesmo n o tendo uma posi o cr tica sobre o direito de escolha das mulheres demonstra saber que o problema existe que essa escolha mais imagin ria do que real e que n o est em suas m os decidir pois dependem do obstetra Portanto quando decidem pelo PV t m que escolher o m dico que realmente se comprometa a respeitar o seu desejo Voc pode escolher quando engravida o parto mas na verdade na hora quem decide o que voc vai ter o m dico n o tem jeito E voc tem que ter confian a nele confiar que ele vai respeitar sua vontade saber que ele vai deixar voc ter parto normal e que vai fazer ces rea s se for preciso Mas a gente sabe que os m dicos dos planos de sa de a maioria que escolhe o seu parto eles n o andam querendo fazer parto normal
221. lpa da m e Acontecendo algo errado a culpa sempre da m e Tudo culpa da m e por isso a press o maior Com certeza as mulheres s o culpadas por essas falhas nas responsabilidades A responsabilidade com os filhos ainda muito centrada na mulher Acho que vai ser sempre assim C lia Nesse mundo hoje em que a mulher assume tamb m o papel de proteger a fam lia de prover de contribuir nessa estrutura o familiar ela continua com os pap is anteriores e isso um conflito com certeza a gente as mulheres n o tem op o n o O meu primeiro ano de m e foi uma loucura Sem ajuda imposs vel temos que contar com apoio Est o impondo mecanismos que turbilham a nossa vida sem necessidade de turbilhar exemplo tem que ter um corpinho lindo tem que se alimentar 166 tem que gente calma N o d pra se fazer tudo ao mesmo tempo Tem que procurar sair da avalanche Carol vis vel que as exig ncias iniciais da maternidade s o uma grande demanda para as mulheres pela necessidade da presen a f sica principalmente para a amamenta o mas como observamos as cobran as continuam independentemente da faixa et ria em que se encontram os beb s Nossas entrevistadas como todas as mulheres atualmente ocupam um lugar importante na economia como for a de trabalho S que essas sobreposi es de tarefas se tornam injustas quando assumem tantas responsabilidades e sem a justa re
222. m es e tamb m a suas fam lias Ven ncio 1998 SMS RJ 2001 www amigasdopeito org br O grupo cumpre sua fun o por meio de reuni es que se caracterizam pela informalidade onde as experi ncias vividas s o o ponto principal dos encontros Atrav s da coopera o m tua entre as mulheres o espa o propicia o surgimento natural das necessidades das m es e gestantes para que assim possam ser trabalhadas A din mica ocorre em grupos cada um possui uma ou duas coordenadoras que tiveram uma experi ncia bem sucedida na amamenta o ou m es que procuraram apoio nas AP durante o aleitamento e mais tarde tornaram se volunt rias As participantes s o estimuladas a falar pelas coordenadoras que atrav s do relato de suas pr prias experi ncias as ajudam e ap iam n o s na quest o do aleitamento materno como em todos os aspectos que permeiam o ajuste ao in cio da maternidade Esse espa o de escuta respeitado e as interfer ncias s o feitas de acordo com a necessidade de acrescentar ou esclarecer alguma informa o importante Outros familiares podem compartilhar essas experimenta es e se fortalecerem com o envolvimento no Grupo das AP onde atuam aproximadamente 30 volunt rias que se dividem e revezam nas tarefas de coordena o assessoria de imprensa secretaria da sede e no atendimento do disque amamenta o www portaldovoluntario org br 2005 As reuni es acontecem somente no Rio de Janeiro mas as AP possu
223. m valores diferenciados pelos servi os prestados Ou seja por fora do plano de sa de como relatamos a seguir Ela a obstetra me passou o telefone da anestesista para entrar em contato para ver valores De madrugada mais caro mas isso valores diferenciados por causa do hor rio n o influenciou n o Joana O pediatra disse que ia cobrar uma quantia que era o dobro que normalmente se cobra se tivesse que atender de madrugada Cobraria por fora pelo risco que correria e o plano j n o pagava esse pediatra porque ele era da equipe m dica mas n o do plano Alice Estamos diante do mecanismo l gica mercantilista que se aproveita dos reflexos da viol ncia sobre as pessoas para aumentar seus lucros As mulheres para garantirem seu PV acabam se sujeitando a pagarem mais por isso sem discutir Segundo Anyon 1990 essa acomoda o faz parte de um processo de sobreviv ncia emocional e social que defende psiquicamente o sujeito contra os abusos Por m na contraposi o as mulheres resistem mantendo seu desejo e buscando estrat gias para concretiz lo Por fim supomos que o fator medo tamb m pode ter sido utilizado como forma de press o por alguns obstetras que n o desejariam realizar o PV das nossas informantes pressionando as a mudarem suas op es N o desconhecendo a exist ncia real do medo da viol ncia na cidade parece nos que esse fato pode representar mais uma vulnerabilidade n
224. m os fatores determinantes para as suas escolhas E contrariamente ao que se esperava para algumas as experi ncias negativas serviram mais para fortalec las na vontade de viverem hist rias diferentes e re contar suas pr prias hist rias possivelmente para desconstruir a mem ria negativa que tinham dos seus nascimentos Faz las passear por suas mem rias familiares n o teve como objetivo como dito anteriormente de aprofundamento deste tema mas apenas re significar os la os afetivos femininos da maternidade entre essas mulheres visto que muitas das entrevistadas verbalizaram que a partir da entrevista iriam resgatar as conversas sobre a experi ncia dos partos n o s de suas m es como da fam lia Finalizando esse t pico deixamos um momento de reflex o feito durante uma das entrevistas Minha m e muito minha amiga mas eu queria que a minha m e fosse mais m e Eu contei pra minha madrasta sobre o meu parto e n o conversei ainda com minha m e Acho que vai ser um bom come o abrir o ba e falarmos dos partos da fam lia sabe contar sobre o meu parto da minha experi ncia das minhas emo es quando meu filho nasceu Acho que est em tempo ainda de falar dessas hist rias n o importa se s o boas ou ruins s o nossas experi ncias e isso muito importante Vou querer saber mais como eu nasci agora que sou m e estou valorizando muito isso Rita No pr ximo t pico iremos aprofundar a exp
225. m que concedido a postura adotada durante a coleta do depoimento assim como sinais corporais gestos e ou mudan as de tom de voz e outras situa es importantes de serem observadas pelo 71 pesquisador fornecem elementos significativos para a leitura e interpreta o posterior daquele depoimento A partir do estudo mais aprofundado dos dados podemos assim compreender de forma mais ampla o universo investigado Dauster 1999 As entrevistas em sua maioria foram realizadas nos domic lios das entrevistadas com data e hora previamente agendadas por elas e duraram em m dia 2 horas sendo o tempo de maior dura o 2 horas e quarenta minutos Foi solicitado por cinco das informantes freq entadoras do grupo Botafogo que a entrevista ocorresse na Casa de Rui Barbosa de forma a facilitar suas participa es Foi inclusive nesse local que uma das informantes quando prestava seu depoimento promoveu uma rede solid ria entre outras m es frequentadoras conseguindo com isso a ades o de mais tr s volunt rias que se encaixavam no perfil eleg vel e que se dispuseram a participar da pesquisa Por solicita o de duas entrevistadas que j haviam retornado s suas atividades profissionais as entrevistas foram realizadas em seus locais de trabalho Estes apresentavam condi es adequadas para realizar a entrevista sem interfer ncias que comprometessem o livre fluxo de id ias As entrevistadas foram esclarecidas sobr
226. m viv lo Como j observaram Tedesco et al 2004 e Giffin 2003 para a popula o feminina essa problem tica pode se refletir tanto na inadequa o para o ato sexual ap s o parto repercutindo na vida sexual com o parceiro como na preocupa o com a est tica da conserva o da anatomia da vagina Segundo Fa ndes 1991 existe um conceito de que a ces rea permite mulher manter intactas a anatomia e a fisiologia da vagina e do per neo enquanto que o parto vaginal produz perda acentuada da fun o do coito normal p 155 Constatamos que a preocupa o com a preserva o do per neo ou com os efeitos negativos para a vida sexual surgiu para apenas uma entrevistada desse estudo Essa mulher revelou ser esta uma preocupa o tamb m manifestada por seu companheiro Eu tenho medo de um tabu e tenho medo ainda mas sei que realmente um tabu o medo de ficar maior da vagina ficar maior e meu marido tem at hoje Ele sempre brincou P xa vida vai estragar o brinquedo eu absorvi isso de alguma maneira Regina Apesar de ter consci ncia de que esse medo era um tabu ela se deixou impressionar pela forma com que o companheiro abordava essa quest o Essa inquieta o n o perpassou os relatos das demais entrevistadas Apenas mais uma de nossas informantes fez um breve coment rio sobre esse assunto trazido por uma amiga quando foi visit la na maternidade que lhe disse que se fosse parto n
227. mas crian a do que as pr prias m es Hoje a maioria das av s que poderia ajudar tamb m trabalha Todas essas quest es representam um dilema para elas expressando as contradi es que as mulheres inclusive as de segmentos m dios est o submetidas A boa m e o papel materno Segundo os depoimentos colhidos nos grupos a amamenta o e as dificuldades dessa nova etapa de vida faziam com que essas mulheres procurassem ajuda pois desejavam fortemente amamentar Como caracter stico deste segmento social que possui um grau de exig ncia e expectativas mais rigorosas acerca da maternagem as participantes consideravam muito importante o aleitamento materno por este propiciar o estabelecimento de v nculo com o filho criar la os afetivos e fortalecer o contato m e filho atrav s do ato de amamentar A gente s suficientemente boa m e se tiver leite esparramando s ai que ta bom Grupo Tijuca 05 03 2007 60 Por m parecia haver uma dist ncia entre desejo e realidade pois geralmente muito cansadas n o conseguiam dormir recuperar o cansa o de noites e madrugadas em claro com o beb chorando muito al m das dificuldades nos ajustes dom sticos mesmo contando com uma rede de apoio familiar muitas relatavam estresse e muita ansiedade por n o se sentirem boas m es por n o estarem dando conta do recado Como voc vai alisar pezinho se voc ta do avesso Vou me p
228. mb m n o tem dilata o nenhuma a um m s do parto Flora Essa rela o de poder desigual e de domina o sobre as mulheres constitui o alicerce para a indica o de uma cesariana utilizando ideologicamente argumenta es sobre a sua seguran a como via de parto legitimando a socialmente 128 As press es do companheiro conflitos entre apoiar e proteger Nessa trajet ria do parto buscamos saber das entrevistadas como seus companheiros participaram da escolha do parto seus conhecimentos sobre o PV e como as expectativas do parto os mobilizava Por ltimo se de alguma forma eles as influenciaram em algum momento para uma mudan a do tipo de parto Primeiro vamos apresentar os companheiros que apoiaram as escolhas das mulheres e num segundo momento aqueles que discordaram desde o in cio da gravidez da op o feita por elas A maioria dos companheiros oito apoiou a escolha de suas mulheres Cabe ressaltar que dois companheiros deixaram a decis o por conta das mulheres e a partir da decis o tomada as apoiaram totalmente Alguns dos companheiros entendiam tamb m que o PV era o melhor parto para a mulher e para o beb Estavam dispostos a participar do parto junto de suas companheiras considerando o um momento especial e nico para o casal Percebemos que pr ximo ao parto as press es vividas come aram a interferir no comportamento da maioria deles e foram suficientemente significativas para que m
229. mento feminista comprometidos com a luta social contra a explora o capitalista Sim es Barbosa 2001 Por que caiu em desgra a o referencial te rico marxista se persistem e se aprofundam dentro da sociedade tantas desigualdades provocadas pela onda capitalista neoliberal O avan o das pol ticas neoliberais enfraqueceu ideologicamente as lutas sociais refletindo se na desmobiliza o desses movimentos inclusive o feminista Paralelamente o poder dominante est cada vez mais concentrado nas m os de pequenos grupos que perpetuam seus lucros s custas da explora o da maioria da humanidade Hennessy e Ingraham 1997 apud Sim es Barbosa 2001 Laurell 2000 Poder amos dizer que os efeitos da globaliza o influenciam a m quina governos ind strias mercados m dia que mant m e aumenta as desigualdades em todos os segmentos sociais particularmente nos pa ses dependentes onde s o maiores e mais dr sticas as consequ ncias sociais e econ micas Berman 1997 Assim para o referencial do feminismo marxista a desigualdade de g nero na sociedade est intimamente entrela ada ao capitalismo o que se afasta de uma vis o que 30 tende a tomar o g nero enquanto uma quest o absoluta Portanto a opress o das mulheres n o est associada somente s desigualdades de sexo mas tamb m resultam da interse o com as desigualdades de classe e de ra a etnia numa alquimia de categorias so
230. mentos discursos densos intensos dolorosos e repletos de emo o verdadeiras catarses que parecem provocar um certo al vio ao informante Segundo Bourdieu 1999 o al vio vem por poder falar e ao mesmo tempo poder refletir sobre o assunto que talvez os oprimisse Assim a entrevista pode ser considerada uma auto an lise provocada e acompanhada A entrevista semi estruturada enquanto t cnica de pesquisa pretende apreender principalmente os dados subjetivos ou seja aqueles que se referem s atitudes valores opini es e viv ncias dos atores sociais Este tipo de entrevista focaliza um ou mais temas que orientam o entrevistado embora o deixem livre para se expressar Minayo 1996 Sim es Barbosa 2001 Ao solicitarmos s mulheres entrevistadas que relatassem suas hist rias e seus atuais contextos de vida pretend amos captar sua experi ncia vivida trazendo tona suas trajet rias sociais e de g nero entrela adas Segundo Minayo 1992 a fala pode ser capaz de z Aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa parecer 82 2007 processo 01 2007 41 transmitir as representa es de um grupo em determinado contexto cultural e s cio econ mico Atrav s da utiliza o desse instrumento buscamos desvendar os poss veis significados da cesariana na experi ncia das mulheres de camadas m dias que expressaram durante a gesta o desejo pelo parto vaginal assim como compreender o reflexo e os i
231. motivos e significados da prefer ncia pelo parto vaginal a influ ncia da rela o obstetra gestante durante a gravidez e o resultado do parto e os sentimentos vividos pela n o concretiza o da escolha Na an lise dos dados emergiram possibilidades para observar como as rela es de g nero est o entrela adas assist ncia pr natal ao parto e ao desfecho em uma cesariana Os resultados apontam para uma preocupante aceita o da medicaliza o e das interven es no processo de parturi o pelas usu rias dos planos de sa de privados para a exist ncia de uma interfer ncia por parte do obstetra sobre as mulheres que implicaria na mudan a do tipo de parto para um descompasso entre o que as mulheres realmente desejam e o efetivamente realizado a cesariana Numa perspectiva cr tica nos parece que para muitas mulheres n o foi poss vel escapar das armadilhas deste modelo biom dico institucionalizado e legitimado pela sociedade A pesquisa se prop e com seus achados construir de forma mais consciente uma reflex o sobre a import ncia de se rediscutir a busca pela autonomia e pelo protagonismo das mulheres no evento do parto Este estudo problematizou um campo at o momento pouco explorado e por isso pretende ainda colaborar para a es que estimulem o exerc cio da cidadania feminina nos processos decis rios que envolvem as quest es da sa de reprodutiva al m de preservar e garantir a experi ncia do parto como um d
232. mpactos que essa interven o teve na viv ncia da maternidade A observa o participante Historicamente as investiga es de natureza qualitativa t m privilegiado a observa o participante ou a entrevista individual como principais op es metodol gicas Por m como ilustra Morgan 1997 h sempre a possibilidade de concilia o entre alternativas metodol gicas sendo que uma pode suprir a defici ncia da outra e se beneficiar de suas virtudes Segundo Mason 1998 a observa o participante um m todo de gera o de dados que pressup e a imers o do pesquisador em um quadro ou cena da pesquisa e onde sistematicamente observa se dimens es intera es rela es a es e eventos dessa cena Tal posi o baseia se na premissa de que esse tipo de situa o que envolve intera es revela dados e possibilita ao pesquisador ser n o s um observador mas tamb m um experienciador um participante e um int rprete desses dados Isso pode propiciar a ele uma posi o de conhecedor das particularidades da situa o Mason 1998 Lakatos e Marconi 1991 afirmam que a observa o participante est diretamente relacionada com a participa o real do investigador na comunidade ou grupo A observa o participativa um processo espec fico que equivale a algo mais do que simplesmente olhar Essa t cnica ent o um modo especial de observa o no qual o pesquisador n o meramente um observ
233. mpanheiro e toda a fam lia numa dimens o mais ampla que abarca as quest es sociais e culturais que o circundam Para finalizar deixamos para reflex o um relato de nossa informante que mostra com agudeza e profundidade no que se transformou a ind stria de partos que ao que parece tende a descartar inclusive conceitos ticos Eu me lembro que uma amiga falou que a m dica na hora de preencher os pap is na maternidade perguntou pra outro m dico O que eu poderia colocar para justificar que ser ces rea E um absurdo Elis Apesar de todas as contradi es e conflitos em que vivem nessa trajet ria entre a escolha do parto que desejam e a sua concretiza o encontramos mulheres que n o perderam o senso cr tico sobre essa quest o uma demonstra o de resist ncia que potencializa a luta para transformar o cen rio que encontramos na assist ncia ao parto nas camadas m dias que nos escandaliza com ndices inaceit veis de cesarianas Essas sinaliza es de resist ncia s o uma luz uma esperan a para que as mulheres resgatem novamente o controle sobre o seu corpo sua gravidez e o processo do parto e nascimento Assim em um paradigma diferente do atual deve se focar o parto em sua normalidade e n o na sua patologiza o No subtema seguinte nos dedicaremos a abordar as experi ncias vividas por nossas entrevistadas para manter a escolha do PV com a aproxima o do momento do nascimento de
234. nal que seja de sua confian a n o adiante escolher outro porque esse o obstetra atual n o gosta de parto normal e de repente o outro que eu escolher n o atenda a todas as minhas expectativas as minhas necessidades n o me diga os riscos que podem causar durante o PV Acho que eu correria riscos com a mudan a de m dico Tem que ser um m dico que voc tenha plena confian a Nat lia A incerteza de mudar parece estar relacionada certeza de que outros profissionais agem da mesma forma e como com o atual obstetra j estaria estabelecida uma rela o de confiabilidade n o valeria correr o risco Essa inseguran a manifestada n o s por esta mas 159 tamb m por outras entrevistadas nos remete a uma rela o de acomoda o e resist ncia manifestada s situa es contradit rias que se apresentaram Essa rela o determina a sobreviv ncia emocional e social da mulher numa situa o de domina o e submiss o onde se criou uma identifica o do oprimido com o opressor Segundo Anyon 1990 as mulheres estabelecem estrat gias para enfrentar os conflitos provenientes de situa es de opress o para assim resistir a elas mesmo adotando posturas de aceita o e ou acomoda o A dial tica da acomoda o e resist ncia segundo a autora faz parte do processo que protege os sujeitos contra os abusos e agress es A atitude de manuten o do obstetra mostra as contradi es que permeiam essa rela
235. nalmente a maioria das mulheres fez pouca referencia preocupa o com a dor do PV Essa quest o apareceu de forma menos emblem tica do que era por n s esperado Esses resultados corroboram os encontrados em outros estudos Dias 2007 Fa ndes 2004 Potter et al 2001 e Hopkins 2000 Em tr s dos depoimentos foi mencionada inclusive a resist ncia pessoal dor Eu n o tive nada entrei em trabalho de parto sem saber talvez por eu ser muito resistente dor eu sou muito suport vel dor Nat lia At a contra o era forte mas n o era regular eu que n o sentia tanta dor Eles a equipe m dica me diziam que eu tinha resist ncia alta dor E eu sou mesmo resistente dor Karina Pois eu achei que foi sem gra a durante o trabalho de parto eu achei que fosse sentir mais dor aqui embaixo uma dor totalmente suport vel nada de absurdo Vit ria Mesmo sendo a dor pouco mencionada nossas informantes mostraram se conscientes de que o PV que desejavam n o era isento dessa sensa o e que as mulheres geralmente passam por dores durante as contra es Apesar disso afirmaram ser capazes de superar essa barreira para n o desistirem da escolha que tinham feito As falas demonstraram que viver a experi ncia do parto era mais importante fazendo as transpor esse dilema entre o medo da dor e o desejo pelo PV como as falas abaixo explicitam tinha tinha m
236. nas efetivas antes do in cio espont neo com o objetivo de promover a dilata o cervical e a descida da apresenta o fetal em casos selecionados A indu o do trabalho de parto considerada somente quando a m e apresenta um problema obst trico ou quando ela ou o feto apresenta algum problema m dico 140 Mesmo sem ter a pretens o de enveredar pelo dom nio t cnico das situa es que poderiam indicar uma ces rea algumas nos chamaram a aten o Nesse sentido baseando nos nos relatos dos fatos estamos apenas deduzindo que eles n o constituiriam uma indica o absoluta para a cirurgia Como estudos anteriores j apontaram muito m dicos utilizam justificativas duvidosas para a indica o das cesarianas Fa ndes e Silva 1998 Em alguns relatos pareceu existir uma predisposi o m dica para a realiza o da ces rea mesmo antes do final da gesta o o que tamb m foi verificado no estudo realizado por Dias 2007 Uma vez feita essa apresenta o vamos descortinar as cenas expostas pelas informantes para entendermos os processos que conduziram do parto almejado para a realiza o da cesariana De acordo com as falas at o final da gesta o existia entre elas uma forte expectativa pelo momento do parto Algumas durante as consultas se preocupavam em obter dos obstetras a garantia de que eles iriam esperar o trabalho de parto acontecer Como exposto nos relatos a seguir Eu falei isso at
237. ncia ao parto neste segmento social foi o ponto de partida para buscar o entendimento do que acontece entre o desejo e a realidade no processo da maternidade dessas mulheres Curry e Menezes 2006 Zorzetto 2006 Giffin 2003 Souza 2002 Gamble 2000 Granham 1999 Carranza 1994 Fa ndes e Cecatti 1991 E desejo entendido como vontade motiva o Portanto nessa pesquisa buscaremos elementos que ajudem a compreender essa contradi o visto que essas mulheres pertencem a uma popula o com menor risco gestacional maior escolaridade e supostamente com mais poder de decis o Barros 1986 Rattner 1996 Marqu s 2005 Para tal proposi o o nosso objetivo ser compreender as diferen as entre o discurso das mulheres em rela o ao tipo de parto desejado a poss vel influ ncia do discurso m dico na sua escolha e a representa o que elas constroem ao longo da gravidez sobre a experi ncia do parto Dentre todas essas quest es estaremos levando em conta a l gica mercantil que orienta a assist ncia obst trica no setor privado e que pode estar afetando essas decis es De acordo com o referencial conceitual que aqui ser adotado est o associados a esta quest o e relacionados entre si o processo da medicaliza o da sociedade principalmente na rea da sa de reprodutiva e a sua interface com a obstetr cia as desigualdades sociais e de g nero e os fatores s cio econ micos e culturais que interv m nos proce
238. necologista pelo menos h uns cinco anos uma rela o de confian a eu gosto muito dela Quantos parto normais voc fez esse m s e tal pra se ter id ia se realmente era verdade que ela fazia Por mais que eu confiasse n ela falou Dora se voc tiver 24 nt Pa e Optamos por usar nomes fict cios a fim de resguardar a identidade dos m dicos mencionados no estudo 103 as condi es eu n o tenho porque n o fazer e tal Ela apoiava a minha decis o sobre o parto sempre respondia as minhas perguntas Dora Ele j era meu ginecologista mas j tinha feito parto dois partos normais parto de uma colega e de outra pessoa que trabalha comigo Ent o era uma pessoa super recomendada j era meu ginecologista assim ele era uma pessoa assim realmente especial Karina Ele era meu ginecologista h 20 anos Achei ele timo tenho muita confian a nele Escolhi por ter uma rela o anterior com ele Ele faz partos normais mais do que cesarianas e isso foi muito importante para eu continuar com ele Se ele n o fosse vaginalista acho que eu pensaria em mudar Eu queria fazer parto normal Alice Por sua vez para encontrar o obstetra ideal dentro das possibilidades que o plano de sa de oferecia as demais informantes foram busc lo nas refer ncias familiares e nos seus c rculos de amizade Esse c rculo de rela es colocado em cena teve como objetivo minimizar os percal
239. nitude eu t super contente com ela mas voc fica dividida existem conflitos claro normal ter mas ao mesmo tempo voc se sente culpada porque assim n o posso sentir os sentimentos conflitivos porque a minha filha t o fofa mas acho que normal sentir acho que faz parte mesmo Porque pro homem por mais que ele participe muito muito diferente Ele t indo trabalhar a vida profissional dele n o vai parar por conta disso ao contr rio acho que ele vai buscar batalhar mais pra fam lia mas pera eu adorei ser m e mas preciso voltar a trabalhar preciso me recolocar e da caminhar um pouco pra frente Voc realmente acaba deixando sua vida profissional um pouco estagnada No in cio da licen a maternidade eu sentia falta da minha rotina de trabalho agora eu j criei uma nova rotina de m e Mas eu acho dif cil realmente um conflito realmente um conflito Dora E muito dif cil ter muitos pap is sociais ter que dar conta das coisas N o sei como vai ser futuramente tudo quando ele crescer escola leva e busca vai se desdobrar mais ainda as responsabilidades Mesmo assim 165 sendo dif cil eu n o conseguiria n o trabalhar Ser s dona de casa eu n o me vejo A gente precisa sair ver gente ter nossa vida Sen o voc fica at muito bitolada muito chata Eu n o gosto n o Agora com as coisas de casa pode at eu me acostumar com essa nova vida de m
240. nos depoimentos a seguir Eu tava vendo outro dia naquele canal 55 TV a cabo que mostra partos ai eu falei com ele o marido ser que eu deveria ter esperado mais devia ter indagado mais questionado mais a minha m dica Eu acredito nela isso mesmo vamos l entendeu a eu me questiono ser que eu devia ter buscado maiores informa es N o sei at hoje e tamb m n o vou procurar mais saber j aconteceu j fato consumado Dora ele o m dico colocou Olha vamos fazer logo porque tem isso tem aquilo Ent o eu fiquei estressada quando eu soube que tinha que fazer uma ces rea eu fiquei na d vida tive essa inseguran a em rela o a Ser que realmente esse o procedimento Eu tive uma inseguran a nesse momento Perguntei Voc acha que vai ter mesmo algum problema Ele disse Tem problema n o t passando alimento Foi isso que ele me respondeu Ent o vamos fazer o qu Eu acho que houve uma rela o de confian a na mudan a eu acho que ele n o ia interromper na 38 semana por algum capricho para fazer alguma ces rea Eu tenho muita confian a no m dico Alice Na seqii ncia dos depoimentos pudemos constatar que estes beb s nasceram muito bem com Apgar 8 e 9 no 1 e 5 minutos respectivamente As cirurgias foram realizadas dois dias depois de serem comunicadas aos casais sendo os motivos das indica es relacionados possibilidade
241. nt m esse ciclo cesariano em movimento porque ao que parece essa engrenagem atende a um grande n mero de interesses e interessados Portanto em conson ncia com as viv ncias dessas mulheres procuramos trazer tona neste subtema como o direito de escolha era percebido e significado por essas mulheres Esta quest o n o foi diretamente formulada e al m disso poucas abordaram na espontaneamente Ela foi problematizada e surgiu em meio s perguntas referentes ao significado de ter escolhido um parto e realizado outro Desse modo durante o processo de an lise dos dados pudemos observar que foi facultado a elas durante o pr natal o direito de escolherem a forma pela qual desejavam parir No entanto os relatos tamb m revelaram o quanto as condicionalidades caminhavam juntas com a possibilidade de terem um PV Muitas vezes os depoimentos nos permitiram detectar que supostamente existiria uma livre escolha sem que no entanto elas se sentissem seguras com as promessas feitas pelos m dicos como temos exaustivamente revelado A percep o de que tiveram o direito de escolha cassado n o perpassou claramente as falas de todas as entrevistadas Algumas com olhar mais cr tico e consciente manifestaram se sobre essa quest o demonstrando conhecer que as op es para as mulheres s o restritas e pouco alcan veis como ressaltado na fala abaixo dif cil n o me perd o por isso estava pressentindo qu
242. ntanto outros companheiros se mostravam bastante colaborativos ajudando n o s nos cuidados com o filho mas nos afazeres dom sticos quando estavam em casa compreendendo a import ncia da divis o sexual de trabalho e amparando a mulher nesse momento mais desgastante do in cio da maternidade 61 Ajudo no que posso e n o me incomodo procuro estar presente quando tou em casa para ela descansar s n o dou o peito porque n o tenho tem hora que s a m e n o tem jeito depoimento de um pai no Grupo Tijuca 02 04 2007 Muitas se ressentiam de n o terem mais tempo para si mesmas e ao exporem esses sentimentos choravam muito Essa fragilidade geralmente encarada como normal ap s o parto evidencia o quanto essa adapta o s mudan as que ocorrem a partir da maternidade dif cil para a maioria das participantes Todas as mulheres sobrevivem assim mesmo isso que elas diziam mais ouvir nesse momento Mesmo para aquelas que tinham apoio familiar uma boa estrutura social e econ mica parecia muito dif cil cumprir as fun es maternais As quest es de g nero e rela es conjugais Os grupos tamb m acolhiam as quest es de g nero apesar de n o ser um assunto tratado com muita frequ ncia assim como as dificuldades das rela es sexuais na maternidade Mas quando surgiam eram amplamente debatidas e as mulheres demonstravam se sentir aliviadas pelo desabafo e por perceberem que
243. nte no movimento coletivo que se modifica num determinado momento rumo mudan a de paradigma No caso do parto assistimos hoje emerg ncia de variados movimentos coletivos de mulheres questionando os processos que est o alterando as formas naturais e saud veis de nascimento Voltamos a pensar em respeitar e valorizar o ritmo natural e o simbolismo transformador do nascimento o que desmistifica a id ia ideologia de uma suposta aceita o passiva e incondicional dos ritmos e processos mercantilizados e tecnificados da chamada modernidade capitalista Os mitos e os medos maternos O imagin rio coletivo abarca muitos mitos e medos historicamente difundidos sobre as desvantagens do PV que se perpetuam no inconsciente feminino Segundo Souza 1994 e Hopkins 2000 isso poderia ser uma ferramenta til para a manipula o e a coer o das mulheres e que possivelmente estaria influenciando fortemente suas decis es Observamos que durante os depoimentos nossas entrevistadas expressaram alguns fatos que geraram preocupa es e promoveram um sentimento de apreens o tanto no transcorrer da gesta o como no momento do parto Encontramos em suas falas os motivos que provocaram esses medos relacionados ao PV e s poss veis interfaces com a indica o de uma cesariana Em seus relatos evidenciamos as seguintes quest es o medo da dor do parto a interfer ncia na sexualidade a incerteza de uma nova ces rea
244. nto ao pensarem em ter um filho sabiam que necessitariam reorganizar suas vidas para incluir esse novo papel social o de m e Como mulheres atuantes no mercado de trabalho com boa forma o acad mica sabiam que enfrentariam as dificuldades atuais de conciliar a maternidade com as exig ncias do sistema capitalista altamente competitivo e que 160 espera da mulher um bom desempenho profissional materno e dom stico Para melhor compreender a experi ncia da maternidade contextualizada na vida dessas mulheres abordaremos essas quest es divididas em subtemas assim organizados novas responsabilidades e a volta ao trabalho e ser m e para as mulheres de camadas m dias 4 3 3 4 1 Novas responsabilidades e a volta ao trabalho conflitos Quando realizamos as entrevistas apenas cinco informantes j haviam retornado s atividades profissionais A maioria delas nove trabalhava na iniciativa privada e como profissionais liberais tr s informantes estavam vinculadas ao servi o p blico e apenas tr s estavam sem trabalho remunerado naquele momento A despeito do v nculo de trabalho alguns depoimentos sinalizaram o quanto o servi o p blico possibilitava uma estabilidade compensadora especialmente com a chegada dos filhos Como exemplificamos a seguir Quero entrar para o servi o p blico pra ser servidora assim voc consegue organizar melhor sua vida Estou me preparando para os concursos p blicos Voc se estress
245. ntra o tipo me apaga agora mas depois voc quase esquece da dor Continuando com 1 cm de dilata o significava que o parto n o tava andando Uma dor insuport vel e eu cada vez me sentindo pior A uma hora ele voltou e eu falei se n o podia fazer anestesia Ele o obstetra disse que com 1 cm n o podia fazer analgesia O M estava desesperado e falou assim Eu acho ela t achando que ela vai querer uma ces rea E eu falei N o M calma a n o assim E o A o obstetra falou N o estou considerando o que ela quer eu fa o uma cesariana se precisar A ele virou pra mim e perguntou se eu agiientava mais 15 minutos e eu respondi que agiientava e ele falou Sabia todo mundo sempre agiienta os 15 minutos que as mulheres ficam tentando Eu falei n o eu agiiento Ele voltou depois de 15 minutos me examinou n o tinha andado nada conversou com a equipe e a eles decidiram pela ces rea Marta grifo nosso Infelizmente alguns profissionais num momento t o delicado para a mulher e seu companheiro demonstram e exibem arrogantemente a sua capacidade de poder sobre o outro que est em clara desvantagem Poder amos ressaltar ainda a falta de sensibilidade e humaniza o na assist ncia desse parto N o podemos esquecer que n o f cil compreender essa contradi o pela qual passaram essas mulheres Nesse conflito que se instala elas mesmas t m dificuldades de entender a comp
246. ntrevistas realizadas at os quatro meses ap s o parto estava mais impregnada pelo resultado positivo do parto cir rgico ou seja correspondiam satisfa o por tudo ter finalizado bem apesar da ces rea Os relatos portanto estariam mais suscet veis a essa influ ncia As mulheres entrevistadas ap s esse per odo mostraram estarem mais capazes de fazer an lises cr ticas sobre suas experi ncias Como expresso por algumas entrevistadas com 5 e 6 meses depois da cesariana respectivamente A minha ficha caiu depois inclusive quando fui colocar o DIU foi que eu perguntei para o m dico porque a gente n o esperou um pouquinho j que eu estava com quatro de dilata o de repente eu poderia ter feito parto normal ele tocou novamente no problema do cord o umbilical Nat lia Ent o quando a ficha caiu me dei conta que ela n o tinha nem me examinado ela n o me examinou e decidiu foi um absurdo o que aconteceu um absurdo eu ter aceitado eu que estava gr vida eu sou dona do meu corpo ent o eu que teria de escolher ela nem argumentou apenas anunciou que iria fazer uma ces rea P xa Eu passei nove meses esperando como eu pude aceitar al m do absurdo dela n o ter me examinado Regina naquela hora eu poderia ter questionado se era verdade ou n o como saber se o m dico poderia ter esperado mais um pouco para fazer a ces rea 40 semanas foi o prazo dele
247. o O beb chora o tempo todo dizem que fome que est magrinha porque o meu leite fraco querem que eu desista e d mamadeira porque o pediatra mandou minha m e minha sogra a fam lia inteira Grupo Botafogo 02 04 2007 A problem tica envolvendo as gera es m es e sogras principalmente relacionadas maternidade muitas vezes um campo onde parecem aflorar as culpas passadas no 63 momento do nascimento dos netos seja porque as av s n o conseguiram amamentar n o tiveram boas experi ncias do parto ou mesmo n o exerceram como queriam a fun o materna 4 2 5 As conclus es finalizando a experi ncia nos Grupos Como pode ser observado o motivo principal para procurar o grupo era sempre os problemas com a amamenta o mas na verdade esse momento de encontro se tornava um espa o para o compartilhamento de muitas outras quest es relacionadas direta ou indiretamente ao processo da maternidade tais como relacionamentos conjugais e familiares os mitos e cren as que envolvem culturalmente a gesta o o parto e o aleitamento materno a cultura popular o cansa o f sico e emocional inerentes a esse novo papel a volta ao trabalho entre outras Eram nessas trocas que ocorriam as transforma es os saltos qualitativos no plano individual e no coletivo para as participantes dos Grupos Trago novamente Paulo Freire para consolidar o quanto as experi ncias em grupo s o significa
248. o Rev Sa de P blica vol 39 no 4 S o Paulo Aug 2005 GRANHAM W J et al An investigation of women s involvement in decision to delivery by cesarean section Brit J Obstet Gynaecol 1999 106 3 213 20 GRASSI E RAGGIO L MONTES AG Normatiza o dos comportamentos reprodutivos e paradigmas m dicos estudo de caso em institui es de sa de para camadas m dias In Costa AO e Amado T org Alternativas Escassas sa de sexualidade e reprodu o na Am rica Latina S o Paulo PRODIR FCC Ed 34 1994 pp 208 248 HAGUETE T M F Metodologias Qualitativas na Sociologia Petr polis Vozes 1987 HARNECKER Marta Os Conceitos Elementares do Materialismo Hist rico S o Paulo Global 2 ed 1983 HOPKINS K Are brazilian women really choosing to delivery by cesarean Soc Sci Med 2000 51 5 725 40 JAGGAR A Amor e conhecimento a emo o na epistemologia feminista In Jaggar A e Bordo S orgs G nero Corpo Conhecimento Rio de Janeiro Rosa dos Tempos 1997 JANOWITZ B et al Caesarean section in Brazil Social Science and Medicine 1982 16 19 25 JANOWITZ B et al Method of payment and cesarean birth rate in northeast Brazil J Health Polit Policy Law 1984 9 515 26 JONAS O CHAN A RODER D The association of maternal and socioeconomic characteristics in metropolitan Adelaide with medical obstetric and labour complications and pregnancy outcomes Aust N Z J Obstet Gynaecol 1992 321 1 5 KITZING
249. o biom dico cristalizado e sua rela o hierarquizada com as mulheres O meu interesse pela assist ncia mulher que resultou nessa primeira aproxima o com o Programa de Parto Alternativo redimensionou minha atua o profissional As observa es e a produ o cient fica ao final do per odo nesse programa reafirmaram a import ncia de olhar a mulher como sujeito inteiro corpo e emo o pol tico e social e n o apenas no campo reprodutivo como a ideologia de g nero postula mulher esposa m e O entrela amento entre essas quest es possibilitou me a cr tica e a desconstru o do modelo biom dico e correlatamente da mercantiliza o do corpo sa de constitu do atrav s desse poder O confronto da cultura feminina saber popular versus ci ncia motivou me a discutir os paradigmas dessa medicina medicalizada e as reais necessidades de sua pr tica excessiva e normativa Ao retornar ao Rio procurei a SMS propondo implantar um projeto de pesquisa no programa de pr natal voltado para a prepara o corporal na gravidez Escolhi a Maternidade Leila Diniz MLD pois sabia que ali um trabalho de humaniza o assist ncia ao parto j estava sendo realizado Houve uma perfeita integra o com a equipe interdisciplinar da maternidade Tamb m em 1998 implantei um projeto de atividade f sica para gestantes na Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ Esse trabalho foi coordenado por mim de at 2002 e se estendia
250. o chegar at aqui Muito obrigada Agrade o enfim a todas as mulheres com quem tive o privil gio de compartilhar momentos t o especiais como o da gesta o e do parto que oportunizaram e contribu ram n o s para o meu crescimento profissional mas principalmente para o meu fortalecimento pessoal como um ser humano melhor que deseja uma vida mais plena CARDOSO Junia Espinha A disson ncia entre o desejo e a realidade a escolha da via do parto pelas mulheres de camadas m dias no Rio de Janeiro Disserta o Mestrado em Sa de Coletiva Instituto de Estudos de Sa de Coletiva e Faculdade de Medicina Universidade Federal do Rio de Janeiro Rio de Janeiro 2008 Orientadora Regina Helena Sim es Barbosa RESUMO Este estudo teve como prop sito investigar atrav s da percep o das mulheres de camadas m dias a disson ncia entre o desejo pelo parto vaginal e a realiza o da cesariana como desfecho da gesta o Para alcan ar esses objetivos adotamos a abordagem qualitativa de car ter explorat rio a partir de um roteiro de perguntas abertas A pesquisa oportunizou dar voz a esse grupo de mulheres para que elas contassem as experi ncias e percep es desse momento em que n o tiveram o seu desejo atendido Esse trabalho pretendeu redimensionar o direito de escolha da mulher pelo parto frente ao n mero excessivo de cesarianas verificado atualmente neste segmento social Ao analisarmos os discursos tentamos compreender os
251. o desejo realizado outras alternativas Um dos fatos marcantes durante a observa o veio do grupo do Catete onde o n mero de partos vaginais era bem superior aos grupos dos outros bairros Nesse grupo que contava com a coordena o de uma parteira apareciam mulheres que optaram pelo parto domiciliar assim como algumas gestantes que estavam fazendo pr natal com enfermeiras obst tricas e tamb m desejavam realizar o parto em casa Assim teriam certeza que sua vontade seria respeitada e que a ces rea s ocorreria caso realmente necess ria Essa decis o parecia estar associada total falta de confiabilidade nos m dicos para terem seu desejo pelo parto normal respeitado Pelas coloca es feitas durante as conversas no grupo pude observar que essas mulheres tinham informa es sobre o n mero elevado de cesarianas no setor privado de sa de Percebiam que no setor privado aumentavam as chances do parto cir rgico O conhecimento sobre essa quest o as fazia procurar outros caminhos para garantir a realiza o do seu desejo ou seja ter o beb de parto normal optando pelo parto domiciliar assistido por parn P E 14 5 PARERS parteiras ou por m dicos reconhecidamente vaginalistas Segundo depoimentos das pr prias mulheres os m dicos costumam prometer mas n o cumprir quando elas manifestam o desejo de ter seu filho por parto normal Sempre inventam uma desculpa que deixa d vida na mulher para sempre Grupo
252. o e Parto da SES junho de 1996 145 WAGNER M Pursuing the Birth Machine the Search for Appropriate Birth Technology Austr lia Ace Graphics 1994 146 WORLD DEVELOPMENT REPORT Investing in Health World Development Indicators Oxford University Press 1993 p 150 147 WORLD HEALTH ORGANIZATION Appropriate technology for birth Lancet 1985 2 436 7 148 WORLD HEALTH ORGANIZATION Consensus Conference on Appropriate technology for following birth 3 Conference 1986 149 WORLD HEALTH ORGANIZATION Care in normal birth a pratical guide report of a technical working group WHO FRH MSM 1996 150 WORLD HEALTH ORGANIZATION World health day safe motherhood Genebra WHO 1998 151 XAVIERD VILA MB CORREA S Quest es Feministas para a Ordem M dica o feminismo e o conceito de sa de integral In Labra Maria Eliane org Mulher Sa de e Sociedade no Brasil Petr polis Rio de Janeiro Vozes ABRASCO 1989 pp 203 222 152 ZHENG P HUANG X WANG S The changing trend of cesarean section rates in 35 years Journal of Obstetrics and Gynecoly 1996 31 142 153 ZORZETTO R Escolha Errada Revista Pesquisa FAPESP ed 124 2006 p 39 44 181 ANEXOS Par metros Eticos da Pesquisa Tendo em conta a Resolu o N 196 de 10 de outubro de 1996 do Minist rio da Sa de que define diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisa envolvendo seres humanos os seguintes par metros ticos ser o adot
253. o m e na constru o da identidade social das mulheres o que deve influenciar sua falta de autonomia na decis o sobre o tipo de parto que deseja Sim es Barbosa 2001 2006 A pesquisa em ltima an lise pretende contribuir para reatualizar o debate sobre os direitos reprodutivos onde as mulheres possam fazer reflex es cr ticas que as impulsionem na luta por melhores condi es de sa de para que tenham esses direitos respeitados e para se assumirem enquanto sujeitos de suas vidas inclusive na escolha do tipo de parto que desejam ter 1 3 OBJETIVOS 1 3 1 Objetivo Geral Identificar mecanismos subjetivos e objetivos que perpassam o processo de gesta o e parto de um grupo de mulheres das camadas m dias que influenciam o desfecho da gesta o em cesariana 1 3 2 Objetivos Espec ficos 1 Compreender os significados subjetivos simb licos do parto para as mulheres de camadas m dias 2 Identificar atrav s da tica das mulheres de camadas m dias quais situa es que influenciaram a mudan a do tipo de parto 3 Compreender a experi ncia da maternidade para as mulheres de camadas m dias tendo em conta seus atuais contextos de vida 1 3 3 Justificativa Atrav s da compreens o dos mecanismos relacionados escolha da mulher pelo parto por via vaginal e os limites para a sua concretiza o contribuir para o estabelecimento de estrat gias que busquem transmutar o panorama atual dos altos ndices
254. o tinha mais d vidas ia fazer uma ces rea desnecess ria Fui pra casa arrasada Regina Como se pode claramente perceber essa mulher realmente ficou sem op o Como encontrar outro m dico que assumisse fazer o parto normal nessa situa o e nesse momento No desfecho desse caso a vaga na maternidade foi reservada e a ces rea ocorreu dois dias depois N o parecia haver portanto nenhum motivo obst trico para essa indica o pois essa mulher estava bem de sa de e entrou em trabalho de parto espont neo O relato a seguir demonstra a situa o desrespeitosa vivida por ela cheguei na maternidade X e fui examinada por uma m dica de plant o que disse que eu estava entrando em trabalho de parto e que estava tudo bem Perguntou se eu queria normal ou ces rea e quando eu falei que queria normal ela disse que eu poderia at ir pra casa e depois voltar que eu tinha tudo pra fazer parto normal A a minha m dica chegou dizendo Olha a gente vai fazer uma cesariana Eu falei pro meu marido Ela nem me examinou como pode fazer isso dizer que tem que ser ces rea Cai numa armadilha Ela tinha acabado de sair de um plant o sem d vida estava visivelmente exausta J tinha marcado a ces rea ent o ela pensou Vamos cortar e pronto Regina Essa cena nos remete ao que pode estar acontecendo com a assist ncia ao parto no setor privado Como visto essa entrevistada teve seu trabalho de parto
255. oimento t o emblem tico e repleto de emo o revela o quanto n o viver essas experi ncias do processo de parturi o ficou internalizado para essa mulher O dia jogado fora a que se referiu significava o parto ter terminado numa cesariana bem diferente do que esperava Sem entrar no m rito da indica o da cesariana podemos perceber que deixar de viver esses momentos t o esperados tanto para ela como para muitas outras mulheres ainda representa uma subtra o ou usurpa o na realiza o feminina Prosseguindo com a an lise problematizamos com as entrevistadas a quest o das rela es de poder entre as mulheres e os obstetras Pudemos perceber que de certa maneira algumas pareciam compreender o grau dessa rela o desigual baseada no dom nio do saber legitimado ao m dico e a desvaloriza o do saber feminino Num trecho do depoimento de uma das informantes observamos essa intera o de domina o e submiss o Eu estava sentindo pequenas c licas minha barriga ficava muito dura e a soltava diversas vezes mas a dor mesmo era uma leve c lica ele disse 97 que eu tava com quatro cent metros de dilata o examinada no consult rio eu lhe perguntei nervosa meu filho vai nascer hoje n o vai E ele falou Vai vamos correndo agora pra maternidade fazer uma ces rea antes que seu filho nas a de parto normal pois ele t enrolado no cord o umbilical Eu fui praticamente obrigada a
256. omo melhor e mais segura para as mulheres e seus beb s Dias 2001 Este modelo de parto ganha identidade e banaliza o na sua indica o e realiza o Ganha espa o no cotidiano da assist ncia obst trica e na vida das mulheres que sem informa o adequada se exp em interven o Desta forma a cesariana caminha para se transformar num procedimento em via de institucionalizar se Sua indica o al m da alternativa nas situa es de risco gestacional est associada informa o inadequada fornecida s gestantes no comodismo do m dico no despreparo da equipe de sa de e principalmente no medo da dor relacionada ao parto normal Souza 2002 A associa o entre maior n vel s cio econ mico e cesariana tem sido observada por diversos autores Quanto maior a renda familiar maiores as taxas de cesarianas Barros 1991 Marqu s 2005 Este fato nos revela uma contradi o visto que as mulheres com essas 12 condi es pertencem a uma popula o com menor risco gestacional maior escolaridade e supostamente com mais poder de decis o Os ndices de cesariana nas maternidades privadas no Brasil s o muito elevados atualmente principalmente nas regi es de maior renda Existe uma tend ncia principalmente dos profissionais m dicos em relacionar esses n meros ao desejo das mulheres de classe s cio econ mica mais privilegiada de optarem por este tipo de parto desde a confirma o da gravidez ou
257. ondi es concretas para exerc la est o portanto em estreita rela o com esse contexto s cio pol tico mais amplo A associa o de toda essa problem tica traz cena as contradi es que envolvem os sujeitos desse estudo na quest o da assist ncia ao parto no sistema privado A sobrecarga de trabalho gerada pela press o econ mica do capitalismo tem reflexos nas suas vidas mesmo quando em melhor situa o s cio econ mica se comparada a das mulheres das classes populares Apesar de contarem com infra estrutura de vida mais favor vel e terem profiss es que d o mais autonomia e poder de decis o a popula o feminina aqui representada pela classe m dia vem acumulando um processo de desgaste acarretado pelo somat rio das responsabilidades na esfera p blica e familiar Al m disso muitas convivem com a realidade do trabalho precarizado e sem garantias legais As mulheres continuam submetidas e subjugadas pelas m ltiplas desigualdades que comp em o cen rio de suas vidas onde a experi ncia do parto est ancorada diretamente dimens o da cidadania Toda essa situa o vai estar associada quest o da gesta o e consegiientemente na escolha do tipo de parto e na viv ncia da maternidade 3 3 O caminho metodol gico 3 3 1 A pesquisa qualitativa A pesquisa qualitativa de alguma forma um relato de uma longa viagem que ancora o olhar do pesquisador em lugares a serem desvendados Essa jornada ao interio
258. ontra o uso abusivo das cesarianas no setor privado e que pretende devolver s mulheres o protagonismo no parto Podemos dizer que essas mem rias nos corpos registro corporal est o adormecidas mas vivas e num determinado momento elas se manifestam primeiramente no plano individual e posteriormente enquanto consci ncia coletiva Na dial tica segundo Berman 1997 tens es contr rias se desenvolvem se intensificam alcan ando um est gio de crise em que esse novo estado ele pr prio negado A natureza de estados sucessivos n o acidental derivada de lutas passadas Isso no nosso ponto de vista exatamente o que est ocorrendo hoje com a cesariana H uma crise tica e ou moral que desvelada e fundamentada nas taxas elevad ssimas de ces reas 39 ocorridas nas camadas m dias e contestando esta quest o grupos de mulheres est o se indignando e protestando a ponto de se unirem num manifesto sobre a ind stria de partos entregue pela Rede Parto do Princ pio ao Minist rio P blico em 2006 Assim as experi ncias individuais das mulheres se transformam em coletivas e dialeticamente a partir desse encontro elas compartilham seus dilemas rompem o sil ncio e a privacidade e atrav s de m ltiplas vozes questionam as contradi es contidas neste processo e se organizam num movimento coletivo que busca transformar essa situa o Portanto encontramos nas palavras de Sim es Barbosa
259. onversas durante o pr natal e que de alguma forma alguns m dicos transmitiam sua preocupa o para as mulheres possivelmente esperando que mudassem a escolha para a cesariana com hora marcada Nossas entrevistadas apesar de demonstrarem certa apreens o com as condi es da viol ncia na cidade afirmaram que esta quest o n o as fizeram mudar a decis o Como observamos nos depoimentos Nem sei mais quem tocou nesse assunto de que a ces rea melhor porque n o tem esse problema do tr nsito e da viol ncia mas eu nunca tinha pensado nisso isso n o foi uma quest o para n o fazer parto normal Dora N o me influenciou a mudar mas cheguei sim a pensar nisso em ter o beb de madrugada Apesar de escutar v rios relatos no curso de gestantes da X que pessoas tinham sido assaltadas em trabalho de parto n o pensei em mudar Alice N o passou pela minha cabe a porque quanto a isso tamb m me explicaram conversei muito com ele o obstetra que n o assim de repente t entendendo Voc vai sentindo e tal Ent o era uma coisa que eu nunca pensei eu moro perto das duas maternidades nunca pensei nisso n o Karina 93 Merece registro a quest o da viol ncia relacionada ao comportamento m dico tal como trazido por duas entrevistadas Elas relataram que foram informadas por seus obstetras que caso o parto acontecesse de madrugada alguns profissionais da equipe m dica cobraria
260. orar crit rio de escolha do obstetra cesarista ou vaginalista Como foi seu pr natal Como se deu a escolha do tipo de parto Explorar d vidas conflitos medos conhecimentos m dicos Seu companheiro participou desta escolha E a fam lia sua e dele Como Voc conversou com o obstetra sobre o tipo de parto durante o pr natal Qual foi sua posi o Houve por parte dele incentivo ao parto vaginal Alguma vez voc chegou a pensar em mudar essa escolha Por que A influencia da viol ncia da cidade do RJ nessa escolha j que o parto vaginal pode ocorrer de madrugada O seu plano de sa de atendeu suas expectativas durante a gravidez e no parto Teve algum tipo de problema exames interna o 10 A maternidade foi a que voc escolheu Voc foi conhecer a maternidade antes do parto 184 11 Voc entrou em trabalho de parto Teve contra es Como aconteceu seu parto Seu companheiro estava presente Teve apoio da equipe m dica 12 O que sentiu em rela o ao parto quando seu filho nasceu Seu beb foi colocado perto de voc logo ap s o nascimento contato pele a pele Amamentou na sala de parto 13 Como se sentiu no p s parto 14 Quanto tempo ficou internada Teve algum problema no p s parto 15 O que significou escolher o parto vaginal e ter feito uma cesariana Como analisa a situa o do seu parto agora Explorar as quest es da entrevistada medos inseguran a e do m dico sugeriu imp s argum
261. ormal mais tarde teria que fazer uma cirurgia para recuperar o per neo Nossa informante por m em momento nenhum da entrevista manifestou preocupa o com problemas com a sexualidade n o 86 compartilhando com a opini o de sua amiga Pelo que declarou tamb m acredita que isso faz parte de um mito para desmotivar as mulheres a tentarem o PV Assim nossos relatos corroboram com os encontrados por outros autores como Hopkins 2000 e Potter et al 2001 Uma vez ces rea sempre ces rea Outra situa o que encontramos em algumas entrevistas foi a impregna o da cultura m dica de que uma vez ces rea sempre ces rea Essa quest o fortalece o mito instalado no imagin rio feminino de que uma cesariana anterior impossibilitaria a tentativa de um PV numa pr xima gravidez A fala de uma entrevistada mostra o estranhamento e o questionamento dessa l gica mas eu j vi que tem um mito at ele o obstetra mesmo j me falou e isso eu acho estranho achei muito estranho que quando voc tem uma ces rea a indica o pra voc ter outra ces rea de novo Eu n o sei se voc j ouviu falar isso Eu achei que isso pra mim n o por minha causa porque a minha amiga fez um parto com ele o obstetra teve o beb quando eu estava com seis meses ela teve o beb dela o segundo Eu comentei isso com ele o obstetra e a ele falou N o ela vai ter que ser ces rea porque ela j t
262. os e todas enfermeiras os obstetras por terem compartilhado tantas experi ncias nesses anos de lutas por uma assist ncia melhor s mulheres num momento t o especial em suas vidas o parto Leila Azevedo pela determina o e coragem pela simplicidade e dedica o pelo exemplo e pela persist ncia em transformar a Casa de Parto David Capistrano Filho SMS RJ em um sonho poss vel minha eterna admira o e amizade A todos da equipe da Casa de Parto David Capistrano Filho por poder compartilhar de momentos inesquec veis junto a profissionais t o dedicados e competentes Meu reconhecimento a todos voc s n o s por transformarem o momento do nascimento em uma experi ncia enriquecedora mas por oportunizarem a transforma o das mulheres resgatando as como sujeitos inteiros e de direito no processo de parturi o s adolescentes da Casa de Parto pelos ensinamentos e pelos momentos de alegria e prazer que me oportunizaram com o Grupo de Dan a Agrade o em especial a Iara Dourado e Telma Garrido profissionais excepcionais pela integra o valiosa no trabalho que desenvolvemos Eliane Brand o e Marcos Dias pelas sugest es t o valiosas quando da participa o na banca de qualifica o Pelo carinho e incentivo para chegar a essa etapa do trabalho Maria Cl udia Vater e Bet nia Maria Fernandes que gentilmente acolheram a participa o como suplentes da banca examinadora Ao Hospital Universit rio Pedro Erne
263. os que possivelmente encontrariam al m de tentar garantir a indica o de uma pessoa competente O conhecimento dessas dificuldades em encontrar um profissional que realmente fizesse o PV era baseado nas informa es relatadas por mulheres de suas redes sociais Como foi colocado por esta entrevistada o Tiago o obstetra tinha meu plano de sa de e a minha amiga disse que ele aceitava e que fazia parto pelo plano e tudo mais conversei com ele que queria um parto normal e ele disse _ eu fa o n o tem problema n o Claro que n o assim n o aquele m dico famoso por parto normal que faz parto normal mas desde o primeiro momento ele perguntou se eu queria normal ou ces rea e eu falei que ia esperar o parto normal Tando tudo bem eu vou esperar o parto normal Vit ria Minha tia foi quem recomendou A m dica era obstetra da homeopata dela e pelo que me informei ela fazia partos normais era de total confian a Fui na primeira consulta e gostei dela Conversamos sobre o parto nesse dia mesmo Regina Sabemos que essa escolha pode ser decisiva para a realiza o do parto vaginal e nossas entrevistadas demonstraram saber disso Nos seus relatos revelaram j terem a informa o de que os m dicos considerados vaginalistas geralmente n o est o conveniados com os planos de sa de Isso sem d vida representa um obst culo para as mulheres clientes de planos de sa de Algumas informan
264. ostraram bem informadas buscando conhecer melhor sobre os assuntos referentes tanto gravidez como ao parto percebemos que esse fato n o foi suficiente para conseguirem fazer valer seus desejos e escolhas 4 3 3 1 3 Ideologia de g nero e o parto Como vimos no in cio deste cap tulo algumas mulheres associaram a viv ncia do PV manifesta o do lado instintivo da mulher onde os pontos centrais do seu ide rio est o inter relacionados naturalidade do parto e ao empoderamento das mulheres Segundo Tornquist 2002 o resgate dos poderes e dos saberes femininos que alicer am esse empoderamento seria o caminho para frear os estragos que o processo civilizat rio teria causado no cen rio do parto e nascimento Mas como observa Kitzinger 1978 o parto semelhan a de muitos outros processos fisiol gicos nunca totalmente natural tamb m o parto reflete valores sociais e varia de acordo com a sociedade p 86 Esse tema revela portanto importantes e hist ricas interse es entre natureza e sociedade onde os limites de cada uma das esferas da vida humana nunca ficam muito bem definidos Durante as entrevistas observamos que as informantes estavam conscientes de que a cesariana n o era o caminho normal para o nascimento Demonstraram n o encarar uma 96 cirurgia com naturalidade reafirmando que o PV era um processo importante a ser vivido pela mulher que englobava mui
265. peitada para as mulheres inseridas no setor privado Muitas participantes independente de terem contratos de trabalho formais ou n o sofriam igualmente press o pelo retorno ao trabalho antes de acabar a licen a Para algumas mulheres era marcante o medo de perder o emprego ou mesmo a posi o que ocupavam Preciso voltar logo ao trabalho me sinto pressionada n o quero que percebam que sou substitu vel volto antes de acabar a licen a Grupo G vea 30 01 2007 Para as aut nomas a perda financeira era a grande preocupa o j que tinham que ficar sem trabalhar no per odo do p s parto Muitas delas mencionaram necessidades financeiras que as obrigava a voltarem logo para o mercado 58 tenho que aprender a fazer a ordenha manual para deixar o meu leite pra ele volto ao trabalho no in cio da pr xima semana e vou tentar conciliar meus hor rios no escrit rio e as audi ncias no f rum para n o deixar de amamentar Grupo Botafogo 05 02 2007 Observamos que algumas participantes mesmo tendo direito licen a m dica por problemas durante a gesta o manifestaram sentimentos de culpa por esse afastamento As falas deixaram bem claro que essa preocupa o passava pela necessidade de mostrar coopera o com a chefia e com a estrutura do trabalho Segundo elas era importante a demonstra o de interesse e zelo pelo trabalho e compensar o tempo em que ficaram afastadas mesmo sabendo que era
266. pensava que ia ser uma coisa mais dif cil do que o parto normal para poder estar melhor para estar com o nen m porque eu achava que naquele momento eu precisava dar mais aten o do que receber Lu sa Eu queria justamente por saber que a recupera o era mais r pida do que por cesariana E eu gosto muito de ser independente n o gosto de pedir ajuda a ningu m C lia Segundo os depoimentos essa realidade foi enfrentada por elas no puerp rio imediato onde a maioria relatou sentir muitas dores enfrentando dificuldades e limita es para atenderem a demanda inicial necess ria para cuidar do beb Os relatos abaixo demonstram os apuros ap s a ces rea pelos quais passaram nossas informantes No p s operat rio muito dif cil ter que levantar pra amamentar uma coisa horrorosa muito ruim mesmo Alice sofri muito com a recupera o da ces rea ningu m me deixava fazer nada e eu n o tava em condi es mesmo de fazer Eu vendo as coisas por fazer e minha m e que trabalhava mesmo assim ia me ajudar minha sogra tem a casa dela no entanto ia me ajudar Mesmo assim n o a mesma coisa Quando voc est acostumada a fazer suas pr prias coisas e v outras pessoas fazendo n o fica satisfeita n o a mesma coisa C lia Senti uma dor horrorosa muito mais forte do que as contra es total limita o s fui dar banho nela no beb com 10 dias Foi terr
267. pesar de todos os esfor os e a es para alcan armos uma mudan a no paradigma da assist ncia ao parto buscando humanizar o nascimento o que se observa a preserva o de condutas e procedimentos ineficazes que p em em risco a integridade f sica e emocional das 24 mulheres e de seus filhos O pre o da melhoria das condi es do parto foi a desumaniza o e a transforma o do papel da mulher de sujeito para objeto no processo do parto e nascimento importante ainda ressaltar que os servi os de sa de para as mulheres s o tradicionalmente voltados para o ciclo grav dico puerperal ou seja principalmente para a reprodu o Se essa abordagem de certa forma favoreceu aumentar o acesso aos servi os essenciais acabou fragmentando o atendimento mulher As mulheres sofrem com a falta de integralidade dos sistemas de sa de haja visto que as doen as cardiovasculares acidentes e viol ncia matam mais que a gravidez e o parto embora as taxas de mortalidade materna no pa s continuem excessivamente altas Silver 1999 Tanto no Brasil como em outros pa ses as recomenda es da OMS v m sendo desconsideradas e as condutas que deveriam ser eliminadas continuam fazendo parte da atua o dos profissionais em grande parte dos servi os de sa de Dossi de Humaniza o 2002 Outra discuss o relevante que denuncia a situa o atual da assist ncia ao parto relaciona se ao alarmante ndice de mortalidade materna
268. po de parto e a atual situa o da cesariana evidenciam se v rios fatores que interagem para que uma interven o cir rgica venha se perpetuando ou se modificando como um processo naturalizado ou ideologizado O medo a inseguran a o desconhecimento a press o social e familiar a conveni ncia ou a coniv ncia m dica relacionada aos interesses do mercado s o situa es que em conjunto colaboram para a subordina o e sujei o das mulheres muitas vezes interferindo na experi ncia do parto Ou seja a maioria das mulheres que deseja um parto vaginal n o consegue esse objetivo particularmente no setor privado Fa ndes e Cecatti 1991 Hopkins 2000 Potter 2001 Cury e Menezes 2006 Desse modo podemos entender como a forma de parir que historicamente pertencia ao universo feminino e ao ambiente familiar foi se transformando numa assist ncia restrita ao hospital Essa forma tecnicista de assistir ao parto fortemente influenciada pela medicina cada vez mais intervencionista e medicalizada conserva mesmo assim resqu cios das formas naturais de nascer Isso mostra como mesmo os modelos que est o se esgotando buscam resgatar elementos de modelos anteriores n o casualmente assiste se nos pa ses centrais a uma retomada do parto domiciliar com a presen a da parteira etc Isso percebido pelo movimento de mulheres Amigas do Parto REHUNA Parto do Princ pio Amigas do Peito etc que lutam c
269. pois al m do s rio problema do uso abusivo e iatrog nico de cesarianas este segmento usualmente tomado como privilegiado e seus problemas e contradi es minimizados Assim esta pesquisa pode mostrar como a transi o de g nero tamb m atinge e afeta as mulheres de classe m dia tornando o exerc cio da maternidade um verdadeiro malabarismo em que tentam conciliar o auto exigente cuidado dos filhos com as crescentes demandas do mundo produtivo em um contexto cada vez mais competitivo e seletivo Sendo esta uma pesquisa explorat ria importante ressaltar que a partir de novas leituras outras considera es poder o emergir visto que o mesmo objeto quando observado em outro momento estar sujeito a novas interpreta es Essa perspectiva dial tica postula que cada fen meno que se procura compreender na sua singularidade n o pode ser desconectado de sua universalidade possibilitando re leituras de acordo com o seu tempo hist rico Ao analisarmos as representa es id ias e concep es que est o associadas ao contexto da escolha e a motiva o pelo PV alguns aspectos destacaram se Nossa pesquisa mostrou que o PV desejado por todas nossas entrevistadas durante a gravidez at o momento do parto possivelmente poderia ter se realizado na maioria dos casos visto que os sujeitos desse estudo eram gestantes de baixo risco 168 Os relatos revelaram que os motivos da escolha pelo PV variaram
270. que muitos obstetras desaconselham o PV p s ces rea Embora reconhecendo que existe geralmente essa desinforma o das mulheres acerca dessa quest o observamos que algumas de nossas entrevistadas foram buscar ap s o nascimento de seus filhos algum conhecimento que lhes garantisse um ponto de equil brio para uma futura argumenta o com seus obstetras num pr ximo parto Mesmo que essas informa es n o lhes dessem certezas absolutas e que n o fossem t o esclarecedoras eram suas armas para desconstru rem o mito ancorado na ideologia da ces rea Como demonstraram em suas falas e a eu pensei tamb m assim que todo mundo fala se voc j tem uma ces rea voc depois pra ter um parto normal dizem reza a lenda que mais dif cil A eu j li em alguns livros que n o bem assim alguns anos depois n o tem problema nenhum se o tero j regrediu enfim ent o eu fiquei um pouco assim pensando nisso mas n o assim ah eu fiquei frustrada sim eu vou querer outra vez tentar o parto normal eu sei que tem essa lenda da ces rea mas eu sei que lenda ent o assim eu acho que j estou informada sobre isso e j sei que poss vel ent o vou tentar sim o parto normal apesar de ter tido uma ces rea no primeiro parto Dora Vou querer ter parto normal novamente mas como tem essa hist ria pra ter parto normal tem que esperar agora j ouvi assim dois anos quatro tr
271. que o movimento de transforma o do processo atual do cen rio das cesarianas poder mudar Como contraponto dessa discuss o da rela o gestante obstetra no quesito dor apresentamos um depoimento que sugeriu uma preocupa o do obstetra em desmistificar os medos dessa informante diferentemente do que se tem encontrado nas pesquisas e que revela a perman ncia de outras posturas profissionais mais comprometidas com a sa de e o desejo das mulheres e crian as As vezes eu pensava nas dores na hora do parto mas a m dica dizia pra mim N o escute ningu m C lia porque as pessoas criam id ias nem sempre corretas para m es de primeira viagem Realmente se voc escuta conversas de um e de outro sua cabe a come a a borbulhar C lia No percurso da entrevista as respostas eram sempre afirmativas quanto a saberem que a dor do parto passa depois que o beb nasce Percebemos nos depoimentos que nossas entrevistadas ao compararem a dor entre os dois tipos de parto temiam mais a dor p s ces rea referida como muito mais dolorosa do que propriamente as do PV Mencionaram tamb m o fator limitante p s cirurgia nos cuidados com o beb principalmente na amamenta o j que o aleitamento materno dependeria exclusivamente delas Portanto 84 estarem bem fisicamente e recuperadas logo ap s o parto era importante para essas mulheres como as falas abaixo ilustram Com a cesariana eu sempre
272. que passar seguran a pra gente Ele o obstetra tem que ser incentivado tamb m tem que se ter um trabalho com os m dicos para a conscientiza o deles na import ncia em incentivarem suas pacientes a ter parto normal porque se ele incentiva ele passa seguran a Elis Indagamos com ela qual o tipo de trabalho a ser feito com os m dicos e como incentiv los E ela continuou na sua argumenta o Porque isso a assist ncia ao parto normal feito na Europa L s se faz ces rea quando preciso Se voc chegar e disser que quer uma ces rea o m dico vai te perguntar _ Por que voc quer fazer parto ces reo qual o seu problema Porque s faz ces rea se tiver um problema Agora aqui n o T falando porque tenho duas amigas que moram na Inglaterra e isso aconteceu fizeram parto normal Uma delas no segundo filho que tava sentado tamb m foi normal e foi tudo bem n o teve problemas A outra teve o primeiro de ces rea aqui no Brasil chegou l crente que ia fazer uma ces rea tamb m E que nada disseram que ia ser normal Ela ficou desesperada ela tem um pouco mais de um metro e meio de altura n o tava preparada mas acabou tudo bem nasceu normal e ela depois ficou at feliz por isso L os m dicos sabem que o parto normal melhor e s o trabalhados pra isso que a ces rea uma cirurgia Eu vivo em uma sociedade que quem tem filhos com m dico particular se referindo ao setor p
273. quest es obst tricas que permeavam o momento dessas mulheres Uma participante que desejava o parto normal durante o seu relato no grupo disse que teve uma indica o de sofrimento fetal diagnosticada atrav s da ultra sonografia realizada por uma cl nica e por um m dico indicados pelo seu obstetra que recomendou urg ncia na cirurgia com 38 semanas de gesta o nas v speras da semana do Natal grifo nosso No entanto o beb segundo a m e nasceu muito bem com Apgar 9 9 sem nenhum sinal aparente de sofrimento Apesar do discurso de confiar na indica o da ces rea por seu obstetra em alguns momentos ela deixava transparecer que tinha d vidas sobre a real necessidade da cirurgia Como a hist ria do seu parto n o correspondia aos crit rios de elegibilidade estabelecidos ela n o pode ser convidada para a pesquisa o que impossibilitou uma investiga o mais profunda sobre a sua experi ncia 1L O teste de Apgar o primeiro teste aplicado ao rec m nato logo ap s o nascimento na sala de parto Desenvolvido em 1952 pela anestesiologista Virginia Apgar serve para avaliar a adapta o do rec m nascido ao mundo exterior no 1 e no 5 minuto de vida atrav s de 5 par metros fregii ncia card aca movimentos respirat rios t nus muscular reflexo de irritabilidade e colora o da pele onde s o estabelecidos ndice de O a 2 para cada par metro para medir a vitalidade do beb 50 Por
274. r A com essa hist ria de n o poder fazer um parto normal eu me achava uma incapaz Eu me lembro que tinha um desconforto de me sentir menos que as outras mulheres que poderiam ter esse tipo de parto que eu acho natural normal Foi muito dif cil pra mim Carla 152 Ai eu chorei muito quando eu entrei na sala de cirurgia e falei Se vai ter que ser ces rea eu n o quero sentir nem mais uma dor Pedi pra me apagar ser anestesiada agora comecei a chorar me colocaram numa posi o de cruz uma coisa horr vel me senti muito mal chorei o tempo todo Eu n o estava emocionada eu tava muito triste muito deprimida na hora S pensava assim Ah ent o tira logo tira logo Foram sei l uns dez minutos depois da decis o que ia ser ces rea cinco minutos de abertura tira o beb e depois 20 minutos costurando e a eu fiquei o tempo todo acordada s pensando acaba logo acaba logo que agora o parto acabou o parto morreu vamos come ar outra fase porque o parto acabou pra mim Foi culpa minha o A o obstetra achava que n o tinha mais tempo de esperar o PV acontecer n o tinha mais ningu m acreditando em mim ningu m pra me dar um pouquinho de esperan a de que o parto podia acontecer Marta Como podemos perceber essas mulheres internalizaram um profundo sofrimento por n o terem como reagir contra a decis o m dica e da qual se sentiram exclu das Muitas assumiram um sentimento
275. r pria a o da pesquisa qualitativa presente em todo processo constituindo se como parte essencial no exerc cio da an lise das informa es Assim fragmentos dos discursos trechos das entrevistas express es recorrentes e significativas far o parte da constru o das hip teses e reflex es onde ser o levantadas d vidas ou a reafirma o das convic es Becker 1997 Brand o 2000 Observa se nessa etapa da pesquisa assim como em todas as outras que preciso ter olhar e sensibilidade articulados e fundamentados pela teoria interagindo com os conceitos eleitos e que ir o orientar o percurso da produ o de conhecimento Em nosso estudo apreendemos ent o esses elementos fundamentais para a compreens o da complexidade das representa es imersas num movimento din mico de rela o entre o que os sujeitos pensam e o contexto da vida social que influencia essas representa es Na vis o de Minayo 1996 medida que as representa es se reproduzem e se modificam a partir das estruturas e das rela es coletivas e dos grupos apresentam elementos tanto da domina o como da resist ncia tanto das contradi es e conflitos como do conformismo A an lise qualitativa busca apreender em profundidade os significados e as rela es sociais que conformam a pr tica dos atores atrizes sociais numa perspectiva dial tica que focaliza a rela o indiv duo e sociedade estruturas e sujeitos Haguete
276. r prias experi ncias vividas e no que cada uma aprendeu no percurso do caminho da maternidade No grupo n o s o ministradas aulas ou palestras sobre amamenta o As coordenadoras trabalham sempre acolhendo as mulheres dentro da vontade e expectativa das pr prias participantes para que elas se sintam seguras com o espa o e assim coloquem suas dificuldades sabendo que v o ser ouvidas e que elas as coordenadoras est o ali para contribuir no que for poss vel fazendo com que a experi ncia de cada uma ajude as outras Isso fortalece as mulheres como grupo que se ap ia e compartilha as experi ncias m tuas uma troca constante inter relacional parental e geracional com forte potencial positivo e enriquecedor para todas e todos que dela participam Segundo uma das coordenadoras do Grupo H o entendimento de que ser m e n o padecer no para so Apesar da persist ncia da ideologiza o da maternidade como um momento sublime est sendo muito dif cil para a maioria das mulheres conciliar esse momento com as in meras outras demandas da vida contempor nea como explicitado por algumas participantes 10 Cf Sim es Barbosa Educa o e Sa de reprodutiva an lise preliminar de uma experi ncia numa comunidade favelada do Rio de Janeiro 2001 47 Tem que ser mulher m e profissional dom stica tudo ao mesmo tempo Temos que dar conta de tudo e bem S o muitas fun es para uma pessoa s
277. r de sentirem medo e pensarem em como seria suport la no trabalho de parto a maioria entendia que sentir dor fazia parte do processo de parturi o A rela o da mulher com o obstetra durante a gravidez e no momento do parto evidenciou em alguns casos um poder tecnicamente assim trico j que o m dico considerado um especialista portanto detentor do conhecimento cient fico necess rio para a tomada de decis es Esse cen rio revela na maioria das vezes um v nculo tamb m assim trico entre ambos Essa dist ncia acontece independentemente da forma atenciosa e dispon vel dos profissionais nessa intera o mesmo que em determinados relatos isso nem sempre tenha significado uma forma acolhedora de atendimento No momento do parto essa rela o de poder domina o nos pareceu influente para submeter as mulheres autoridade m dica quanto decis o e aceita o da cesariana A maior dificuldade relatada por elas foi romper uma rela o de confian a constru da durante o pr natal mesmo quando existia d vida quanto a alguma conduta m dica Nesse sentido tornou se invi vel qualquer atitude contr ria indica o da cesariana Como as informantes argumentaram n o adiantaria mudar de obstetra durante o pr natal porque a maioria dos que atendem pelos planos de sa de mesmo que prometam geralmente n o fazem PV Este fato demonstra que j existe uma consci ncia cr tica neste segmento social so
278. r de um campo de conhecimento mesmo que j visitado torna ainda mais instigante a possibilidade de re elaborar a forma de olhar e pensar que possa ser problematizada de procurar o novo da nova experi ncia e do novo conhecimento Abre caminhos para fontes inesgot veis de constru o de novos cen rios Na abordagem qualitativa o processo da pesquisa n o objetiva apenas a interpreta o simplista da leitura dos dados e das informa es mas especialmente conduzir o pesquisador a ler nas entrelinhas ser capaz de reconhecer as estruturas invis veis do pensamento que organizam o discurso depoimento dos entrevistados Somente diante do pr prio material processado durante a pesquisa que temos a id ia da dimens o real da complexidade que teremos que dar conta Cardoso 1986 Becker 1997 35 E necess rio mergulhar profunda e analiticamente buscando os alicerces textuais onde ir o se ancorar as interpreta es e explica es que condensar o os problemas e as quest es que motivaram a aproxima o com o objeto da pesquisa e da investiga o Chizotti 1995 reconhecendo os atores sociais como sujeitos que produzem conhecimentos e pr ticas As muitas leituras do material integrante do cen rio da pesquisa se entrela am aos depoimentos coletados resultando no processo de elabora o das categorias que geram o encontro da teoria com os dados emp ricos Segundo Minayo 2002 a interpreta o em si a base da p
279. r forma poss vel esse compromisso ele cumpriu e ele cumpriu muito bem Marta As informantes em sua maioria mesmo quando durante a gesta o perceberam que estavam sendo conduzidas a aceitarem outro desfecho para o parto n o se contrapuseram indu o e ou a manipula o m dica Sequer se confrontaram com a poss vel condicionalidade da mudan a Parece haver uma incorpora o de uma ideologia de um discurso introjetado que as faz acreditar que a ces rea de fato melhor Segundo Jaggar 1997 isso se configura numa forma ideol gica que preenche certas fun es sociais e pol ticas Como podemos perceber na fala a seguir Ela a m dica falou cada um cada um o parto normal mais natural A crian a nasce com a cabe a um pouquinho deformadinha porque faz a press o voc sente as dores do parto vai chegar l na hora voc vai ter que fazer for a essas coisas todas A cesariana n o mais trangiiila voc agenda e vai l e corta e tira toma anestesia e essas coisas mas tudo normal e tal mas voc decide o que voc quer Flora 126 No relato acima contrariamente ao que seria idealmente esperado por parte dos obstetras observamos que em algumas entrevistas os discursos introduziam algum tipo de problema ou perigos poss veis associados ao PV e exaltando a cesariana como segura e r pida Esses argumentos na nossa percep o eram refrat rios escolha da mulher e
280. ra isso pra se sentir a explos o de uma for a feminina eu achava que isso era muito condizente pra mim era uma coisa normal queria ter um parto normal Marta Portanto como vimos ao longo dos relatos o processo de constru o da escolha do parto foi permeado tamb m por alguns momentos conflitivos para uma parcela de nossas entrevistadas e alicer ados nas quest es que envolvem a historicidade do PV e a naturaliza o da cesariana como via de nascimento Mas apesar desses momentos todas as mulheres demonstraram que o forte desejo pelo PV estava presente desde o in cio da gesta o 4 3 3 1 2 Certezas e d vidas os movimentos dial ticos relacionados escolha Os depoimentos revelaram que apesar do PV ser desejado por todas as entrevistadas muitos mitos que circundam esse momento permearam de d vidas a decis o de muitas delas Para estas pudemos observar que o descompasso inicial entre a vontade e a d vida estava fortemente associado imagem negativa que socialmente atribu da ao PV Mesmo assim essas mulheres mostraram que queriam superar esse dilema para realizarem seu desejo como o depoimento abaixo ilustra 78 eu tava numa d vida cruel entre o parto normal e a cesariana ficava pensando aquelas coisas todas a eu ficava pensando porque eu quero parto normal pensava isso tudo a mas o que quero o parto normal Flora Por mais que voc j tenha certeza so
281. rabalho Apenas um dos companheiros n o estava vivendo com a entrevistada no in cio da gravidez mas procurou apoi la na decis o pela escolha do PV estando com ela no momento do parto Como vimos a participa o masculina no processo da gesta o e parturi o tem grande significado para as mulheres Incentivar os companheiros a conviverem com esse momento deve ser um dos primeiros passos dos profissionais para inseri los nesse universo que percebemos ser muito mais amplo do que o restritamente feminino 28 Trg e Utilizaremos letras para n o identificarmos pelos nomes as pessoas citadas durante as entrevistas como agora do companheiro 132 Os c rculos interferentes figuras femininas no processo do parto Procuramos durante as entrevistas avaliar se o c rculo de rela es parentais e sociais de nossas informantes foi influente na escolha pelo tipo de parto e se com a aproxima o do parto exerceram algum tipo de press o para a mudan a dessa escolha Ao analisarmos os dados observamos que um n mero de mulheres pr ximas a elas e que tinham se submetido a cesarianas era muito significativo independente de ter sido por escolha ou por indica o obst trica A ces rea era sem d vida o tipo de parto mais prevalente nesse circuito s cio familiar Segundo Scavone 1992 esse fato pode estar relacionado cultura de ces rea entre as brasileiras preferencialmente as de camadas m dias onde o PV
282. rande solid o mesmo que estejam cercadas de pessoas Na maioria das vezes essa rede de apoio se preocupa mais com o beb o verdadeiro centro das aten es do que com as m es Existe uma naturaliza o do confinamento dom stico para as mulheres nesse per odo Mitjavila e Echeveste 1994 Pudemos observar que a rela o de pertencimento ao grupo criada atrav s dos v nculos estabelecidos nos encontros faz com que as mulheres retornem muitas vezes s reuni es mesmo quando o problema que as levou s AP est superado Fazem quest o de voltar para compartilhar suas experi ncias com as outras que chegam ao grupo pela primeira vez Essa corrente solid ria espa o aberto de valoriza o das rela es humanas sempre fortalece os la os afetivos entre elas 48 4 2 3 Observando as hist rias dos partos no grupo Nesse t pico abordaremos as experi ncias do parto relatadas pelas participantes dos grupos Para melhor apresent lo dividiremos em quatro subtemas desejos frustrados vulnerabilidade da escolha da gestante poss veis justificativas para o desfecho e a recompensa do desejo realizado Desejos frustrados culpabiliza o da mulher Durante os encontros as quest es que envolviam o parto principalmente a cesariana estiveram sempre muito presentes Algumas mulheres se queixaram do pr natal em que os obstetras n o aproveitavam o espa o da consulta para transmitir mais confian a e permitir a expr
283. rante as discuss es sobre o parto foi a medicaliza o e as interven es mesmo que este tenha sido normal Nesses debates perceb amos que as mulheres que se mostravam mais bem informadas colocavam esse problema da medicaliza o e a imposi o de algumas rotinas que diziam saber n o precisavam ser usadas a n o ser que houvesse uma indica o as informa es eram obtidas de v rias formas Internet literatura espec fica participa o em comunidades de parto normal orkut etc Notamos atrav s das falas que as rela es de poder entre os m dicos e as mulheres eram constatadas mais claramente apenas por algumas das participantes Em uma das reuni es no grupo da G vea uma das m es relatou que desejava ter parto normal e que chegou a entrar em trabalho de parto mas no meio do caminho por estar sentindo muitas dores desistiu Achando que n o suportaria o processo at o momento do nascimento pediu ao obstetra que fizesse uma ces rea no que foi prontamente atendida sem que em nenhum momento ele a apoiasse para continuar ou buscasse meios para aliviar suas dores como o uso de analgesia 54 A queixa da dor observada pelos m dicos durante o trabalho de parto normalmente interpretada por eles como o motivo das mulheres preferirem e solicitarem a cesariana Zorzetto 2006 Moraes e Goldenberg 2001 Souza 1994 Fa ndes 1991 Essa afirma o contr ria aos resultados j encontrados em diversas pesqui
284. refere fazer ces rea Carla pensava assim melhor doer logo do que doer depois e por isso que o parto normal melhor Alice n o porque eu nunca acreditei nisso na dor Eu tenho uma refer ncia da dor que uma coisa cultural de que desde a b blia aquela coisa de que castigo e que a mulher vai ter que sentir dor Elis Pois porque eu achava mais natural mais saud vel ele vai nascer na hora que ele quiser na hora que tiver que ser E eu n o vou entrar em cirurgia nenhuma eu n o vou ter corte nenhum Joana Vale ressaltar que as primeiras falas nos mostram o quanto o conceito m dico considera ultrapassado o PV e como a ces rea faz parte da modernidade adequada ao sistema 76 capitalista onde tempo dinheiro Nesse sentido vemos que existe por parte dos obstetras a valoriza o da cirurgia em detrimento do processo normal de parturi o favorecendo a dissemina o da cultura da cesariana A cristaliza o desse conceito desrespeita a escolha da mulher e o seu desejo n o levado em considera o Isso pode servir para ilustrar o n vel de toler ncia da sociedade ao alarmante ndice de ces reas que vem ocorrendo que aceita e enxerga o parto cir rgico como uma via normal e rotineira para o nascimento para livrar as mulheres dos sofrimentos do processo de parturi o sem que se questione a tica de sua utiliza o indiscrimina
285. rem qualquer decis o nas m os do obstetra j que o reconhecem como detentor do saber para as decis es acertadas Essa rela o de subordina o da mulher se consolida na legitima o do poder m dico frente ao saber cient fico que s ele domina Como nos fala Jaggar 1997 E verdade que as mulheres como todas as pessoas subordinadas especialmente aquelas que t m que viver em ntima proximidade com seus dominadores envolvem se muitas vezes em ilus es emocionais e at auto ilus es como pre o de sua sobreviv ncia p 179 Essa postura de auto defesa aceitando a ces rea foi observada em algumas de nossas entrevistas Ela parece ter sido assumida em decorr ncia da press o m dica exercida sobre suas responsabilidades na escolha do PV e dos prov veis riscos inerentes atribu dos a esse tipo de parto As mulheres ent o parecem ter cedido ao saber poder m dico convencidas da necessidade da realiza o da cesariana Os relatos a seguir ilustram essa quest o ela a obstetra fez o toque de novo e n o sentiu a cabecinha ela a obstetra falou O nen m n o est encaixado at agora e j deveria estar porque a primeira gesta o essas coisas todas Isso significa que vai ser um beb grande n o vou dizer que n o vai dar pra fazer parto normal mas a princ pio a melhor op o vai ser a ces rea pra voc por causa disso voc tem que ver que ela o beb t passando
286. rio lugar ou mesmo transcend lo Esse pensamento compartilhado por Chartier 1996 que refor a essa posi o quando afirma que a proximidade longe de ser um inconveniente permite um melhor entendimento da realidade estudada Essa conviv ncia oportunizou a inspira o de confian a e seriedade no trabalho Pude captar nesses meses de participa o nos grupos das AP nove mulheres que se encontravam no perfil de elegibilidade da pesquisa Os crit rios previamente definidos para a inclus o no estudo foram 1 maiores de 18 anos e at 40 anos que desejavam parto vaginal do in cio ao final da gravidez e fizeram cesarianas essa faixa et ria foi estabelecida por sua autonomia na participa o na pesquisa evitando a necessidade de autoriza o de terceiros O limite 65 at 40 anos foi por entender que acima dessa faixa et ria aumenta a possibilidade da indica o m dica de ces rea 2 prim paras de tr s a nove meses ap s a realiza o da cesariana esse crit rio foi estabelecido para que a mem ria da experi ncia do parto e da rela o com o in cio da maternidade n o ficasse distante 3 com parto ocorrido ap s 37 semanas de gesta o este crit rio foi escolhido para eliminar o risco de parto prematuro o que poderia ser uma indica o obst trica para cesariana 4 sem nenhuma intercorr ncia obst trica durante a gesta o que pudesse indicar possibilidade de cesariana essa situa o poderia
287. rivado plano de sa de geralmente tem cesariana tem essa cultura forte da cesariana e eu acho que isso acaba por influenciar eu acho Elis Essa fala nos faz supor que as mulheres de uma forma ou de outra compreendem que v rias quest es est o entrela adas nesse processo de escolha envolvendo todo um sistema social N o identificam os m dicos como os vil es da hist ria isoladamente Nos parece que conseguem entender que existe um problema que real que est acontecendo com elas mas que tamb m os envolve No entanto n o parecem saber onde realmente est o cerne da quest o as raz es para a ind stria de ces reas em nosso pa s Em nossa leitura baseada nas falas de nossas entrevistadas existe todo um contexto que envolve desde a desapropria o da mulher no processo da parturi o at a atual postura da maioria dos obstetras frente ao PV Os m dicos estariam mais voltados para os procedimentos seguros proporcionados pelo avan o 106 das tecnologias e a ces rea estaria a inclu da se desinteressando pelo acompanhamento do processo natural do parto O sistema capitalista e a mercantiliza o do parto enredeiam os interesses lucrativos da produ o de ces reas principalmente nos segmentos m dios da popula o Voltaremos a abordar a mercantiliza o do parto mais adiante quando discutiremos a cesariana pela tica dos interesses econ micos O que parece tamb m acontecer que as
288. ry Birth 2003 30 2 89 93 DOSSI HUMANIZA O DO PARTO Rede Nacional Feminista de Sa de Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos S o Paulo 2002 p 22 ENGELS F A Dial tica da Natureza Rio de Janeiro Paz e Terra 1976 2 ed FACHEL O Surgical Contraception and Delivery a study of providers in four regions of Brazil Report from the situation analysis CEDEPLAR NEPO PPGAS 1991 FARGANIS S O feminismo e a resconstru o da ci ncia social In Jaggar A e Bordo S orgs G nero Corpo Conhecimento Rio de Janeiro Rosa dos Tempos 1997 FAUNDES A E CECATTI J G A Opera o Ces ria no Brasil Incid ncia Tend ncia Causas Conseq ncia e Propostas da A o Cadernos de Sa de P blica 1991 7 150 173 FAUNDES A E SILVA J L P O equil brio entre o parto vaginal e a ces rea na assist ncia obst trica atual FEMINA S o Paulo Federa o Brasileira das Sociedades de Ginecologia e Obstetr cia v 26 n 8 1998 FAUNDES A E et al Opini o de mulheres e m dicos brasileiros sobre a prefer ncia pela via de parto Rev Sa de P blica 2004 38 4 488 94 FREITAS P F F The Epidemic of Caesarean Sections in Brazil Factors Influencing type of Delivery in Florian polis Tese de Doutorado Maternal and Child Epidemiology Unit Londo School of Higiene and Tropical Medicine Universidade de Londres Inglaterra 2000 GAMBLE J A CREEDY D K Women s request for cesarean section a critique of the
289. s anos e ai eu n o sei quanto tempo tem eu t falando de parto normal depois de uma ces rea eu vou conversar com o ele o obstetra sobre isso Marta Uma de nossas entrevistadas que m dica expressou sua certeza sobre o assunto baseada no seu conhecimento no campo da medicina apesar de n o ser obstetra Demonstrou saber que muitos colegas usam o argumento da ces rea anterior como impedimento de uma nova tentativa das mulheres para o PV N o tenho d vida que vou querer novamente tentar o parto normal um desejo que quero realizar Sei que muitos m dicos dizem que depois de uma ces rea voc n o pode mais ter parto normal Nem conversei isso com minha m dica porque sei que isso poss vel at porque sou m dica 88 tamb m e sei que n o tem nada a ver uma ces rea antes impedir um parto normal depois Rita As mulheres est o tentando assegurar o seu direito escolha de como querem parir seus filhos buscando de algum modo caminhos para evitarem uma submiss o diante de um saber que n o dominam Algumas de nossas entrevistadas como foi citado acima mostraram um olhar reflexivo cr tico sobre o mito uma vez ces rea sempre ces rea Como j mencionado apenas algumas manifestaram ter consci ncia sobre a manipula o com base nesse conceito de impedimento Falta de vagas no setor privado Durante os relatos percebemos que uma grande preocupa o para as entrevistadas era a qu
290. s de g nero Como voc v a situa o atual das mulheres vantagens desvantagens Idem para homens Como ser mulher e m e hoje Explorar contradi es conflitos criar os filhos Fam lia Casamento Conte brevemente um pouco de sua hist ria de vida at o momento atual onde nasceu como foi o parto de sua m e como foi inf ncia adolesc ncia sexualidade rela es com fam lia de origem estudos profissionaliza o trabalho emprego casamento situa o profissional do companheiro objetivo conhecer cada personagem da pesquisa em seu contexto de vida particular 1 2 3 1 2 3 4 5 6 7 8 9 Z Casamento seu primeiro casamento Quanto tempo de uni o Como foi o namoro projetos de vida Situa o do companheiro profiss o emprego atual contribui o de seu sal rio na renda familiar v nculo empregat cio est vel prec rio Profiss o escolheu Gosta Como se inseriu no mercado Est satisfeita Sal rio rela es empregat cias jornada de trabalho licen a maternidade import ncia de seu sal rio na manuten o familiar complementar Igualit rio Gesta o e parto A gravidez foi planejada Como voc s chegaram decis o de que era o momento de ter um filho Estavam adiando a decis o h muito tempo A decis o foi conjunta Como foi a escolha do seu obstetra O qu ou quem influiu plano de sa de indica o de amigo familiar Expl
291. s de risco gestacional Cabe ressaltar que uma parte expressiva de nossas entrevistadas cinco afirmou que as mulheres conhecidas preferiam a ces rea e que a maioria de suas amigas e colegas de trabalho tinham optado por esse tipo de parto ou viriam a escolh lo caso engravidassem Como observamos nas falas a seguir 133 As minhas amigas me pressionaram a maioria n o tem filho e a falaram tem certeza que voc quer parto normal Voc doida Que nada faz ces rea mais segura A minha cunhada que tamb m n o tem filho disse que eu era doida A maioria prefere ces rea Vit ria As meninas da minha idade a irm e a prima do meu marido tiveram ces rea e achavam que parto normal n o era qualquer coisa era uma coisa meio complicada tinha que ter situa es espec ficas e ideais Marta As mulheres que eu conhe o todas querem cesariana N o ouvi nenhuma ainda falando que gostaria de fazer parto normal Me chamaram de doida de hippie Nem pensam em normal acham parto normal coisa de bicho T nia Encontramos na segunda fala a invers o dos crit rios de escolha onde a ces rea deveria ser indicada para uma situa o espec fica e n o o PV Na ltima vemos os processos naturais se tornarem absurdos e inaceit veis socialmente no mundo tecnificado que promete a supress o da dor Esses relatos descortinam o quanto a cesariana est naturalizada e introjetada nos segmen
292. s entrevistadas nos mostra como as mulheres valorizam e desejam viver as emo es desse processo seja de dor do prazer de parir do corpo em movimento do sentimento da liberta o do gozo que esperam sentir Ao mesmo tempo em que expressam essa vontade s o ceifadas dessa experi ncia na medida em que t o dif cil a autonomia para viv la plenamente Percebemos que existe um processo subjetivo inserido no evento m dico que transformou o parto privando as mulheres de viver essas emo es A express o das manifesta es f sicas e emocionais no ato de parir geralmente s o censuradas no ambiente hospitalar vistas como descontrole feminino O parto em si desde que se tomou um evento m dico rodeado de interven es normatiza es regras e proibi es onde as mulheres n o s o mais as protagonistas Essas quest es t m uma dimens o ampla que envolve as esferas sexual social cultural emocional e f sica da experi ncia do parto e nascimento Poder viver essas emo es deve fazer parte dos direitos sexuais e reprodutivos de todas as mulheres que desejam experienci las Isso ficou claro para n s atrav s dos relatos anteriores que mostram o quanto era esperado por elas sentirem essa sensa o e o significado de supera o relacionado a ela Entendemos que para as informantes deixar aflorar essas emo es representava tamb m um momento nico e transformador Como postula Jaggar 1997 a emo o particip
293. sa certa Joana Ele o companheiro acha melhor esse tipo de parto porque mais seguro pro beb e ele nasce mais bonito Elis Ampliando mais o olhar sobre essa quest o percebemos que o parto hoje est sendo tratado como um grande neg cio A ces rea est sendo realizada em s rie como numa linha de produ o vide os agendamentos e lota o das maternidades privadas Num dos depoimentos a entrevistada relata a press o que sofreu Ele o obstetra me dizia sempre dando aquele sorrisinho de lado mas ele t enroladinho n o como vai ser N o podemos esperar muito melhor marcar Eu n o queria marcar e falava pra ele o obstetra Eu n o quero marcar hor rio e data Eu acho que assim o mesmo que ligar pra um sal o de beleza pra fazer as unhas Isso chato Nat lia Nossa entrevistada associou pertinentemente a forma de parir que estava sendo imposta a ela a um tipo de com rcio desvinculado dos aspectos valorativos desej veis pr tica m dica e que pressup e um agendamento para poder ser realizado A atitude do 119 m dico relega o envolvimento emocional do processo da parturi o romantizado por muitas mulheres como retratamos novamente no depoimento abaixo Acho que sei l n o sei eu ia ver se o m dico era assim mais mais rom ntico sabe sabe acho que de uma pr xima vez eu vou procurar isso Acho que ela a
294. sas que evidenciaram exatamente o inverso Dias 2007 Fa ndes 2004 Potter et al 2001 e Hopkins 2000 As mulheres temem mais a dor p s ces rea e tamb m de ter de se submeterem a uma cirurgia Essa opini o relatada inclusive por aquelas que tiveram as duas experi ncias parto vaginal e ces rea Fa ndes et al 2004 Nesse per odo de capta o das minhas informantes apenas duas mulheres em todos os grupos que participei declararam abertamente terem escolhido a cesariana como via de parto o que reflete um n mero m nimo frente ao universo de mulheres que participaram dos encontros Isso reitera as diversas pesquisas j realizadas sobre o tema em que a maioria das mulheres declara desejarem ter parto normal A op o para essas mulheres acontecia geralmente desde o in cio da gravidez Em um desses encontros uma das m es relatou que elegeu o parto cir rgico antes de engravidar Achava o parto normal um sofrimento tinha medo de sentir dor de acontecer alguma coisa com o beb principalmente pelas hist rias horr veis que ouvia sobre o parto normal e pelas experi ncias ruins vividas por sua m e no seu nascimento por via normal Seu companheiro que estava presente no grupo compartilhava da mesma opini o parecia que principalmente para poup la do sofrimento Essa situa o apenas reflete o quanto est introjetada socialmente a medicaliza o do parto na qual a ces rea vista como um caminho seg
295. sections in Latin Am rica ecological study BMJ 1999 27 319 397 BEMFAM Sociedade Civil Bem Estar Familiar no Brasil Pesquisa Nacional de Demografia e Sa de 1996 Rio de janeiro BEMFAM BERMAN R Do Dualismo de Arist teles Dial tica materialista a transforma o feminista da ci ncia e da sociedade In Jaggar A e Bordo S orgs G nero Corpo Conhecimento Rio de Janeiro Rosa dos Tempos 1997 BERNHARDT E G B Taxas de cesariana em SC Monografia do curso de Medicina Florian polis UFSC 2001 BERQU E Ainda a quest o da esteriliza o feminina In Quest es de Sa de Reprodutiva K Giffin amp S H Costa org pp 113 126 1999 Rio de Janeiro Editora Fiocruz BERQU E A esteriliza o feminina no Brasil hoje quando a paciente mulher Bras lia CNDM 1989 BOLTANSKI L As Classes Sociais e o Corpo 3 ed Rio de janeiro Edi es Graal 1989 BOURDIEU Pierre A mis ria do mundo Tradu o de Mateus S Soares 3a edi o Petr polis Vozes 1999 BRAGA L F Cesariana uso e abuso Fatos da America do Sul e do Brasil Caesarean sections use and abuse Facts from Latin America and Brazil Femina 1988 1118 22 BRAND O Z Entre question rios e entrevistas In NOGUEIRA M A ROMANELLI G ZAGO N orgs Fam lia amp escola Rio de Janeiro Vozes 2000 p 171 83 BURCH E SACHS J Sa de natural para mulheres gr vidas S o Paulo Madras 1999 CAPRA F O ponto de muta
296. seguir ultrapassar meus pr prios limites enfim por acreditarem na minha capacidade de vencer desafios Meus eternos amores pelos quais busco incondicionalmente a cada dia que sejam felizes e realizadas Ao meu companheiro que assumindo todas as tarefas poss veis e imposs veis disponibilizou me mais tempo para a dedica o a este trabalho em que n o faltaram paci ncia compreens o e amor minha orientadora Regina Helena Sim es Barbosa que ao selecionar me para o mestrado possibilitou a realiza o de um sonho Minha eterna gratid o pela forma acolhedora carinhosa e profundamente respeitosa que dedicou ao desenvolvimento do nosso trabalho pela oportunidade de compartilhar seus saberes pelos momentos de trocas pelo incentivo Tudo isso enriqueceu minha experi ncia acad mica profissional e pessoal Elaine Reis Brand o pelo incentivo e colabora o na minha busca para o mestrado e principalmente por ter me apresentado ao IESC s Amigas do Peito s queridas coordenadoras dos grupos Cl udia Orthof Anna Basevi Rose Teykal Karina Kuschnir Maria Alice Nogueira e Carol Duarte que t o gentilmente me receberam apoiaram e cederam espa o para a apresenta o do projeto de pesquisa e para que pud ssemos assim buscar nossas entrevistadas Ao Dr Hugo Sabatino que me apresentou outras alternativas na assist ncia ao parto pela oportunidade de conhecer e ingressar no Programa de Parto Alternativo na
297. seus filhos 4 3 3 2 3 Aproxima o do parto as press es vividas pela mulher na manuten o da escolha Como j visto estudos v m demonstrando que as alarmantes taxas de cesariana em nosso pa s parecem n o terem respaldo em evid ncia cient fica que as justifiquem nem respeito escolha do parto pela mulher Potter et al 2001 mostram que na maioria das vezes essas cirurgias s o realizadas contra a vontade e expectativa das mulheres principalmente no setor de sa de suplementar no qual esses ndices se aproximam de 80 Portanto nesse subtema abordaremos as diversas formas de press es que interagem com a mulher nesse momento mais pr ximo ao parto 123 Rela es de poder entre m dico e mulher Segundo Zorzetto 2006 a aceita o da cesariana pela mulher em parte consegii ncia do desequil brio de poder na rela o desigual entre o m dico e a mulher O poder que muitas mulheres sentem ao estarem gr vidas se contrap e fragilidade sentida no momento do nascimento de seus filhos Esse sentimento vivido em especial pelas prim paras que sentem medo ao enfrentarem uma situa o ainda n o experimentada cercada por muitos mitos A ado o de uma postura passiva da mulher nos levaria a supor que muitas vezes elas preferem ser conduzidas ao inv s de conduzirem suas pr prias a es no momento do parto Podemos imaginar que nesse momento entendem que mais seguro para elas e seus beb s deixa
298. so Como postulamos a valoriza o da tecnologia e os interesses de mercado n o deveriam suplantar o exerc cio da cidadania e a autonomia feminina Portanto as mulheres precisam ter garantido o livre acesso s informa es adequadas e seguras sem que sejam suprimidas e ignoradas as dimens es sociais sexuais e emocionais inseridas no percurso da gravidez e parto O parto a finaliza o de uma etapa para o recome o de outra O nascimento de um filho um dos eventos mais importantes na vida das mulheres e de suas redes s cio familiares sendo uma experi ncia humana singular profunda e at mesmo sagrada para algumas culturas mulheres O reconhecimento deste significado por parte dos obstetras dos servi os particulares e p blicos de sa de enfim da sociedade fundamental Particularmente os m dicos que ali est o partilhando este momento t o ntimo e delicado com as mulheres deveriam consider lo um privil gio que merece respeito e defer ncia Estabelecer essa intera o de cumplicidade facilitaria a elabora o a implementa o e a realiza o da escolha do parto de forma a garantir que a nova vida que chega seja saudada e recebida com carinho alegria e respeito por todos que ali est o O relacionamento que reconhece valoriza e d voz a essas mulheres fundamenta se na confian a m tua As decis es tomadas com sabedoria favorecer o a concretiza o do desejo na experi ncia do parto O conhecimento m
299. sso Quadro III Especifica es das Mulheres Entrevistadas Caracter sticas do pr natal maternidade e parto 69 N de Entrou em o Per odo gestacional Dor Limita o In cio do Maternidade escolhida l consultas de trabalho de do parto Complica o NOME Pr natal ocorr ncia do parto pr natal parto dilata o em semanas p s ces rea n o o plano n o cobria a 1 Alice 14 n o 4 semanas 38 sim D L escolhida 2 Flora 16 n o 4 semanas sim 39 sim D L C sim Icm Ed 3 Marta 12 4 semanas n o escolha foi do m dico 40 sem e 3 dias sim D L indu o sim 8 cm 4 C lia 10 8 semanas sim 40 sim D L indu o Sim sim D L 5 Regina 11 4 semanas sim 39 sem e 2 dias sem dilata o sim 8em 6 Vit ria 10 8 semanas n o falta de vaga 39 sem e 2 dias sim D L indu o 7 Dora 14 n o 5 semanas sim 38 sem e 4 dias sim C edema 8 Nat lia 10 sim 4cm 6 semanas sim 39 n o sim 5 cm 9 Rita 12 4 semanas sim 41 sem sim D L indu o sim 2cm 10 Lu sa 12 5 semanas sim 40 n o indu o sim n o mudou a 11 Karina 12 5 semanas 41 sim D L sem dilata o escolha normas sim n o mudou pelos recursos 12 T nia 12 4 semanas 39 sem e 5 dias sim D L sem dilata o oferecidos n o a escolha foi da z 13 Joana 12 n o 6 semanas 39 sim D L m dica 14 Elis 12 n o 5 semanas sim 40 sem sim D L
300. ssos de sa de e doen a dentre os quais a mercantiliza o da sa de A abordagem cr tica sobre o modelo biom dico estar portanto permeando a discuss o visando aprofundar as rela es entre as interven es obst tricas e a assist ncia prestada s mulheres no parto Muitos estudos t m revelado a situa o alarmante dos altos ndices de cesarianas no Brasil e no mundo Estas taxas apontam para quest es que v m preocupando a Sa de P blica Sakala 1993 Dias 2001 An lise dos dados internacionais mostra que os ndices de cesarianas aumentaram tamb m em diversos pa ses atingindo 26 nos Estados Unidos 21 3 na Inglaterra 23 9 na Irlanda do Norte e 19 no Canad Guise et al 2005 apud Cury e Menezes 2006 Este fen meno sugere que os processos de medicaliza o iatrog nicos s o hoje um fen meno global relacionados mercantiliza o da sa de Silver 1999 Em um estudo realizado na Am rica Latina pela Organiza o Mundial da Sa de OMS os resultados mostram que as mortes p s parto subiram em 20 com o aumento do n mero de cesarianas Dos 97 mil partos analisados um ter o foi realizado por cesariana Nos hospitais com maior n mero de ces reas foi constatado um ndice mais elevado de doen as maternas mortes e uso de antibi ticos ap s a gravidez Villar 2006 O Minist rio da Sa de MS atrav s do Sistema de Nascidos Vivos que registra as condi es do parto da gestante e do re
301. sto e ao Dr Alexandre Trajano em especial pelo apoio e incentivo nas minhas incurs es ao pr natal e maternidade e pelo reconhecimento da import ncia do trabalho ali desenvolvido A todas as minhas queridas parceiras da equipe de pr natal com quem tive oportunidade de trabalhar durante cinco anos Aos secret rios do mestrado Delvaci e Ivisson pelo apoio carinho e principalmente pela infinita paci ncia s solicita es feitas Aos meus colegas de mestrado pela conviv ncia prazerosa pelas contribui es no percurso da qualifica o e pelos momentos descontra dos e inesquec veis em salas de aula Aos professores do IESC pela dedica o e disponibilidade para com os alunos da p s gradua o Aos colegas professores e dire o do CIEP Ministro Marcos Freire que me incentivaram nesse percurso do mestrado A um querido amigo Ney de Oliveira in memoriam por ter sempre acreditado que eu conseguiria conquistar esse sonho Finalmente conquistei A todas as mulheres que gentilmente concederam as entrevistas cheias de emo o sem as quais este trabalho n o se realizaria E aos seus beb s que muitos ao balbuciarem seus primeiros sons deixaram registrados na grava o s suas participa es nas entrevistas A todas e todos mesmo aqueles que por ventura tenha deixado de citar involuntariamente agrade o e dedico este trabalho e que certamente sem as valiosas colabora es e incentivos n o teria conseguid
302. sua vida sua independ ncia ter sua vida financeira independente mais f cil hoje as mulheres est o podendo ter mais chances no mercado de trabalho de crescer de batalhar e isso pra mim muito importante Vit ria As que n o estavam empregadas se ressentiam desse fato N o se sentiam confort veis por depender financeiramente do parceiro apesar do bom relacionamento conjugal que informaram ter Eu agora estou nessa situa o n o t trabalhando e isso quando voc quer fazer as suas coisas sei l n o legal ter que ficar dependendo do marido muito chato Sempre trabalhei sempre pude dar conta das minhas necessidades por isso ainda n o me acostumei com essa situa o Flora 162 Algumas das que trabalhavam na iniciativa privada relataram sentirem se pressionadas com os compromissos e as responsabilidades deixadas durante a licen a maternidade Reconhecem que nesse setor a competi o maior e provoca nas pessoas uma compuls o para a produ o Existe por mais que desejem estar mais tempo com os filhos uma preocupa o com o distanciamento do trabalho Como expresso por uma das entrevistadas Na minha rea por exemplo muito dif cil voc tem que se desdobrar voc tem que se superar a cada dia o cansa o muito grande muita press o Consegui ficar os quatro meses de licen a mas confesso que ficava preocupada em estar afastada do trabalho Eu acho que o fato de voc
303. subvertendo assim os par metros te ricos existentes Louro 1997 Giffin 1999 apud Sim es Barbosa 2001 29 Os estudos direcionados a responder as causas de opress o subordina o das mulheres pretendiam alcan ar como resultado a transforma o social al ando a mulher como sujeito do conhecimento e sujeito pol tico As quest es feministas inicialmente tiveram muita afinidade com o marxismo enquanto refer ncia epistemol gica e pol tica para a an lise das desigualdades sociais comprometida com as transforma es almejadas As feministas introduziram neste campo te rico e pr tico as desigualdades de g nero ampliando criticamente o debate sobre as desigualdades sociais Louro 1997 Rangel e Sorrentino 1994 Sim es Barbosa 2001 Entre 1960 e 1970 o feminismo marxista exerceu grande influ ncia no processo de elabora o das teorias feministas especialmente introduzindo categorias conceituais que permitiram visibilizar a divis o sexual do trabalho as rela es entre produ o e reprodu o social e o significado econ mico do trabalho dom stico Giffin 1999 apud Sim es Barbosa 2001 A partir da d cada de 80 ocorre um processo de desvaloriza o do feminismo marxista como referencial de an lise no campo acad mico em decorr ncia entre outras causas de complexas quest es s cio pol ticas que n o cabe aqui analisar Mas mesmo assim ainda se mant m como refer ncia para alguns segmentos do movi
304. ta o Uma delas evoluiu at 8 cm e a outra teve interrompido o seu trabalho de parto com 4 cm de dilata o por indica o de circular de cord o realizando a cesariana assim que chegou na maternidade Outras duas entrevistadas afirmaram ter sentindo contra es mas sem que a dilata o fosse confirmada pelos seus obstetras e sem terem a chance de evoluir o seu trabalho de parto As outras quatro informantes desse grupo tiveram a gesta o interrompida sem entrarem em trabalho de parto antes da data prov vel estimada para o parto Percebemos uma participa o influente determinante do m dico na indica o das ces reas na medida em que a cirurgia foi justificada como preven o para evitar o surgimento de algum risco para o beb Cabe lembrar que nenhuma dessas mulheres apresentava situa o de risco iminente antes ou no momento da cesariana conforme determinado pelos crit rios de inclus o da pesquisa As outras sete informantes chegaram a 40 e 41 semanas de gesta o Os depoimentos nos mostraram que quatro delas entraram em trabalho de parto espont neo e tiveram alguma dilata o que variou entre 1 cm e 8 cm Uma afirmou que apesar de sentir contra o n o teve nenhuma dilata o mesmo tentando uma indu o do parto As outras duas n o chegaram a entrar em trabalho de parto at a realiza o da cesariana 2 In cio artificial do trabalho de parto Consiste em desencadear contra es uteri
305. ta nos sinalizou o quanto queriam falar contar suas hist rias e extravasar toda a problem tica ainda n o digerida do parto Pareceu nos que desejavam aproveitar o espa o de pesquisa para uma auto reflex o cr tica ou simplesmente se fazerem ouvir desabafar compartilhar O desabafo de grande parte das mulheres em rela o frustra o por n o terem realizado o PV significou um sentimento de perda da experi ncia do parto A expectativa frustrada de viver o PV como realiza o do ser mulher pareceu representar para elas uma fragmenta o da identidade feminina Foi dando voz a essas mulheres que conhecemos a profundidade desse universo possibilitando um auto conhecimento que possivelmente n o conseguiriam fazer sozinhas 171 num momento em que a maioria estava ainda bastante envolvida na adapta o a uma nova fase da vida a maternidade Podemos concluir que a escolha pelo tipo de parto deve ser um direito inalien vel das mulheres e n o uma condi o imposta por tantos segmentos que n o est o necessariamente interessados na promo o da sa de e nos direitos de cidadania Obstetras servi os de sa de operadoras de planos de sa de e outros segmentos empresariais deste ramo ideologias de g nero que promovem incessantemente o consumo feminino de sa de e beleza e outros interesses mercantis acabam por legitimar a ces rea como um parto seguro e institucionalizado e o PV como imprevis vel e perigo
306. te o pr natal as rela es de poder entre m dicos e mulheres as situa es inter relacionadas ao trabalho a licen a maternidade a divis o sexual do trabalho as quest es de g nero os conflitos geracionais e parentais Era muito interessante como o assunto sobre o parto surgia nas discuss es e as experi ncias eram relatadas de forma muito intensa Isso me oportunizou perceber como para muitas dessas mulheres havia marcas profundas nessas viv ncias Essas experi ncias destacadas durante as reuni es dos grupos e que motivaram a inser o da observa o 45 participante como instrumento metodol gico nessa pesquisa ser o relatadas mais adiante com especial enfoque para o interesse desse estudo No primeiro dia em que participei do grupo das AP no bairro de Botafogo todas as participantes que eram m es tiveram seus filhos por cesarianas ou seja 100 das presentes A partir dessa minha experi ncia inicial comecei a trajet ria para buscar minhas informantes em todos os outros encontros Durante a capta o esbarrava sempre com a informa o dada pelas mulheres de que a indica o da cesariana segundo seus m dicos foi por problemas obst tricos Sem condi es para avaliar se existia ou n o raz es verdadeiras para essas indica es o que tornava a mulher ineleg vel para pesquisa tive que abrir m o de muitas entrevistadas que certamente teriam muito a dizer sobre suas experi ncias Diante da
307. ter as mulheres incentivadas a fazerem cesarianas sendo que nessa l gica o desejo e a sa de da mulher e do beb o que menos importa Diante de tantos relatos parece nos que os m dicos s escutam o que eles querem ouvir o que representa uma escuta seletiva para os medos das mulheres e suas dores nesses momentos que o obstetra encontra uma forma de justificar o procedimento para si mesmo e para sociedade Por causa dessa surdez deixam muitas vezes de entender o que as mulheres realmente sentem e desejam em rela o ao parto Segundo Fa ndes 2004 o argumento desses profissionais que fazem a ces rea para ajudar para que as mulheres n o passem por sofrimentos no trabalho de parto e no parto e que n o se corra riscos grifo nosso Portanto tudo para o bem delas Hoje visualizamos a sa de reprodutiva entendida na l gica de mercado da produ o x reprodu o impulsionada pelo sistema capitalista que segundo Connel 1998 imp e um ritmo perverso competitivo que dificulta as rela es sociais e afetivas onde os sujeitos s o controlados pela for a do capital Esses interesses mercadol gicos subtraem das mulheres o exerc cio e o direito da livre escolha e as colocam na linha de produ o que assistimos nas maternidades privadas 122 O parto n o pode ser encarado como um com rcio mas sim como um ato humano enriquecedor n o s para a mulher mas para o co
308. ter feito a cesariana j n o tem tanta import ncia eu j superei isso Estar podendo amamentar como eu tamb m sempre quis ajudou a superar a frustra o por n o ter conseguido parto normal Fernanda Eu achei que no final da contas que a m dica acabou tendo que decidir pela ces rea pela necessidade de evitar complicar pra nen m se n o fosse desse jeito seria pior pra ela o beb Se fosse demorar muito seria pior pra ela ent o por isso n o fico triste acabou sendo um al vio Flora Eu tentei n o deu n o deu assim pelo menos eu queria que fosse no tempo dele se referindo a ter entrado em trabalho de parto e foi Isso ter feito a ces rea n o me incomodou eu absorvi bem at acho porque a recupera o foi boa melhor do que eu pensava ent o eu n o fiquei com trauuma entona o feita por ela n o tive problemas Vit ria Como podemos observar os relatos acima nos mostraram que de certa forma houve uma rea o positiva das mulheres quando a ces rea lhes foi comunicada Talvez porque diferentemente das outras elas tenham internalizado uma possibilidade mais concreta de mudan a no tipo de parto Ter a certeza de evitarem riscos para o beb parece ter representado uma esp cie de mecanismo de defesa para aceitarem melhor a justificativa da 154 cesariana Percebemos que o t rmino satisfat rio do parto foi importante e colaborou tamb m para que ultrapassassem e superass
309. tes desse grupo se relacionam melhor com o parto e d o menos trabalho Esses profissionais na realidade estavam percebendo os resultados finais de todo um processo de prepara o para um caminho consciente de autoconhecimento em rela o ao parto Com objetivo de ampliar o meu trabalho a um maior n mero de mulheres procurei um servi o p blico para que voluntariamente pudesse colaborar com as gestantes atendidas por este sistema Essas mulheres enfrentavam problemas como falta de vagas para o pr natal e para a realiza o do parto Al m disso o pr natalista quase nunca seria o m dico que faria seu parto fatores que as colocavam em constante estresse Mesmo oferecendo um servi o volunt rio n o consegui num primeiro momento autoriza o para realiz lo Continuei atuando no setor privado sem no entanto desistir de conseguir levar esse trabalho ao servi o p blico Em 1996 fiz as minhas primeiras aproxima es com a proposta de humaniza o que a Secretaria Municipal de Sa de do Rio de Janeiro SMS j vinha implementando na assist ncia ao parto e nascimento Neste mesmo ano participei do Programa de Parto Alternativo da Universidade Estadual de Campinas UNICAMP coordenado pelo Dr Hugo Sabatino Foram meses de muito trabalho e aprendizado Mas pude tamb m observar a resist ncia que os outros m dicos tinham em rela o ao trabalho que o Dr Sabatino desenvolvia o que j me alertava para um model
310. tes relataram ter conhecimento dos altos valores 104 cobrados para esse tipo de atendimento particular n o s para o parto como para as consultas durante o pr natal Afinal somente a parte hospitalar acaba sendo coberta pelo plano Essa quest o pode ser observada no depoimento a seguir Eu penso assim se voc quer realmente a certeza de ter o beb por parto normal voc tem que escolher uma pessoa super referenciada amiga conhecida que d garantias que fa a partos especiais mas que a gente sabe normalmente n o tem plano de sa de e eu n o tenho condi es financeiras pra ir as consultas particulares de R 250 00 300 00 todo m s e pagar um parto em torno de R 8 000 00 Elis Nossa informante refere se ao parto feito por esses profissionais como especiais como se resignificasse o PV em uma outra categoria quase inating vel para maioria das mulheres mesmo para as nossas entrevistadas que pertencem s camadas m dias Dentre elas poucas pareciam dispostas sobretudo financeiramente a arcar com as despesas desse mercado particular quando s o usu rias de planos de sa de privados que deveriam em tese oferecer melhores op es e mais qualidade em seus servi os Al m do que hoje sem d vida a manuten o desses caros planos representam um alto custo econ mico no or amento das fam lias de classe m dia Como citado algumas mulheres sinalizaram ter consci ncia de que com esses profissionais
311. tia teve em casa lembro disso sempre com naturalidade sem problemas Tenho duas tias que fizeram ces rea e diziam N o Fa a normal minha filha O tempo todo tive apoio minha m e me dando a maior for a Regina As minhas irm s tiveram partos normais se recuperam super bem Uma j teve dois e eu perguntava pra ela E a dor E ela diz bem assim N o vou 136 te dizer que n o doeu doeu mas assim foi t o r pido e t o bom depois uma dor de vida n vale a pena A outra foi pra maternidade achando que era alarme falso e tava quase tendo O parto dela foi muito legal Minha m e teve dois partos normais e eu nasci de ces rea mas ela nunca conversava sobre isso nem bom nem ruim Dora Nesse grupo a refer ncia familiar sobre o parto nos pareceu significativa Nos relatos dessas hist rias vimos que as experi ncias familiares de alguma forma contribu ram para que as entrevistadas se sentissem fortalecidas e motivadas durante a gravidez para enfrentarem o momento do parto As hist rias ruins As experi ncias mal sucedidas de partos na fam lia assim qualificadas por algumas de nossas informantes desvelaram as dificuldades que as mulheres haviam passado na hora de terem seus filhos Os depoimentos a seguir ilustram essas percep es Minha m e teve tr s filhos mas s o primeiro normal e ela sofreu muito no parto e ficou traumatizada e ela passava isso pra mim Quando e
312. tivas e t m realmente valor educativo no sentido de aprender apreender e ser transformadora As constru es compartilhadas nesses encontros passam sempre pelas viv ncias individuais e desembarcam nas experi ncias coletivas resultando na mudan a de comportamento e da consci ncia a onde as mulheres v o se fortalecendo e encontrando suas pr prias respostas Tudo o que presenciei nesses grupos redimensiona o objeto da pesquisa para a quest o dial tica desse processo da maternidade Os assuntos discutidos nos encontros foram fontes ricas que alimentaram a estrutura o do tema que o centro da nossa pesquisa O que p de ser captado na observa o participante desses grupos confirmou as hip teses que esse estudo levantou nem as mulheres de classe m dia que supostamente t m maior poder de decis o est o podendo escolher de que forma desejam que seus filhos nas am Mesmo sendo o espa o do grupo voltado para as quest es relacionadas amamenta o pode se notar que elas n o deixavam de falar dos partos dos obstetras dos estresses suas expectativas e frustra es tais como o corpo n o funcionou para que pudessem ter seus filhos de parto normal n o entraram em trabalho de parto o beb estava em sofrimento As mulheres tamb m relatavam como a cirurgia limitava a experi ncia logo 64 ap s o parto n o s para a amamenta o mas tamb m para os cuidados iniciais que seus beb s precisavam
313. to de lucro e conveni ncia para hospitais e m dicos e s mbolo de status social pela popula o feminina pese a evid ncia dos seus riscos maiores quando utilizado sem indica o obst trica p 311 A mesma autora critica exatamente a quest o m dica onde nenhum profissional ousaria fazer uma interven o cir rgica a pedido sem temer o conselho de tica O caso da ces rea no Brasil t o naturalizado que normal a mulher e ou o m dico escolherem a cirurgia como parto mesmo sem real necessidade de faz la Em resumo existe um gasto de recursos inapropriado e injustific vel tanto pelo ponto de vista econ mico como pela exposi o das mulheres a riscos e danos sua sa de Isso resulta na m utiliza o de tecnologias incorporadas pelos sistemas de sa de O interesse de grupos corporativistas e do complexo m dico industrial serve ao crescimento dos lucros na pol tica neoliberal As distor es no cen rio da sa de aparecem nas condicionalidades que o setor privado oferece e que levam ao excesso da utiliza o dessas modernidades que atendem s classes sociais mais favorecidas As condi es do servi o p blico em contrapartida expressam o acesso restrito a recursos necess rios para a popula o de baixa renda Esse pano de fundo determina as desigualdades sociais que se instalam no mbito das pol ticas de sa de que penalizam aqueles que certamente mais necessitam de aten o e cuidados A
314. to do nascimento A partir da ascens o da obstetr cia a gravidez e o parto s o cercados de regras e proibi es e a rela o com o sistema m dico faz com que o fen meno biol gico fisiol gico seja cada vez mais percebido como momento de fragilidade e risco Xavier et al 1989 O desejo pelo tipo de parto entre as mulheres das diversas classes sociais tem gerado pol mica pela sua complexidade Esse tema que envolve a exist ncia de um conceito pr vio sobre a cultura da cesariana n o conhece a verdadeira dimens o do problema o que ao longo desse estudo e atrav s de seus resultados tentaremos desvelar No Brasil as diferen as s cio econ micas geogr fico territoriais a faixa et ria e a etnia s o formas de desigualdades que representam fatores potencialmente de risco para a cesariana Barros et al 1991 BEMFAM 1996 Freitas apud Marqu s 2005 Essas diferen as tamb m est o associadas a um aumento desse risco em diversos pa ses Sakala 1993 Shearer 1993 A luta feminista pelos direitos igualit rios promoveu nas mulheres aspira es por maior independ ncia autonomia e liberdade No entanto a preserva o da fam lia continuou a requer las tanto no mercado de trabalho como em seus pap is de g nero tradicionais em suas fun es dom sticas e agregadoras permeadas pela tend ncia crescente de competi o e 34 desagrega o do mundo atual Sim es Barbosa 2001 A maternidade e as c
315. to mais que o parto em si Como revelado a seguir mas eu acho que muito mais saud vel ter parto normal eu acho que o ideal que n o s tirar um beb da tua barriga todo um processo em rela o quando voc fica gr vida voc fica muito diferente voc tem coisas que nunca pensou voc diz coisas voc fica muito sens vel ent o faz parte desse processo afinal e um processo que no meu caso n o foi finalizado direito ah eu tinha uma expectativa minha Marta A fala desta entrevistada nos mostra um sentimento de incompletude que persistia mesmo seis meses ap s o parto Solicitamos que explicasse melhor o que significava n o ter finalizado o seu parto como desejava Em suas palavras Pra mim era bvio que ia entrar em trabalho de parto e ver o que acontecia quando comecei com as contra es eu at gostei eu falei _uhn demorou ser que isso Que timo Eu tinha a maior curiosidade pra saber qual era a dor que timo pensei sou uma mulher e vou saber o que melhor na hora se eu sentir vontade de ficar sentada porque melhor pra mim de ficar em p porque melhor pra mim entendeu Queria sentir isso tava a fim de sentir isso o meu parto Eu nem tava sentindo tanta dor tava tima tava bem e era o momento que eu tinha pra trabalhar e penso muito nisso Aquele dia que eu fiquei t o feliz foi um dia jogado fora Marta Esse dep
316. to normal era tudo que eu queria Era certo pra mim eu n o tinha essa possibilidade na minha cabe a de escolher cesariana era cert ssimo ter parto normal Carla escolhi parto normal por ser mais natural eu acho mais natural pro beb tamb m Joana Cabe ressaltar que o processo de escolha do parto n o ficou isento de momentos questionadores por parte das entrevistadas Uma parcela delas verbalizou que mesmo decididas por essa escolha internalizaram os medos e mitos negativos relacionados ao PV Como foi relatado por uma informante Eu confesso que tinha minhas d vidas porque eu falei assim eu quero ter parto normal a um pouco de ignor ncia minha e eu at tinha d vidas porque todo mundo fala uma amiga me disse que depois do parto mais tarde tinha que fazer uma cirurgia do per neo porque tudo cai eu falei que nada n o bem assim Ainda tem muitos mitos sobre isso Dora Segundo os depoimentos essas quest es entrela aram se na constru o do processo da escolha mas n o foram motivos suficientes para faz las desistirem de seu desejo na medida em que estavam convictas sobre o que queriam O relato acima revela o quanto tinha 75 consci ncia sobre as muitas crendices difundidas e o quanto essas hist rias poderiam ser usadas para as mulheres desistirem de enfrentar o PV Por m entendemos que diferente ter o conhecimento que possa desmistificar as crendices e o enfrent
317. to refor a a id ia que o parto hoje mais um ato m dico do que um evento do casal da fam lia Nem todos os companheiros compartilhavam da escolha pelo PV feita por suas mulheres Demonstraram ter seus medos em rela o a esse tipo de parto acreditando que a ces rea seria a forma mais segura para seus filhos nascerem Durante os relatos das entrevistadas procuramos dados que pudessem justificar essa preocupa o a ponto de tentarem persuadi las baseada nos perigos que poderiam acontecer na tentativa de um PV Os depoimentos falam por si e como os anteriores vamos focaliz los nos dois momentos na gravidez e pr ximo ao parto Meu marido sempre quis que eu fizesse ces rea A ex esposa dele teve tr s ces reas Sempre disse que a ces rea mais garantida porque pode marcar hora e evita acontecer alguma coisa Mesmo assim eu disse que queria o parto normal e que ia tentar A princ pio na hora que soubemos que teria que ser ces rea que o m dico n o ia esperar mais ele o marido n o queria assistir a ces rea sugeriu at que minha m e entrasse e ela gostou da id ia Mas ele sentiu que eu fiquei com medo e que estava precisando dele a ele entrou comigo me dando todo apoio Elis Ele o companheiro tinha essa vontade de eu n o fazer normal E falava Eu n o vou assistir se for normal Se for ces rea eu vou entrar para assistir Minha m e falava Se ele n o entrar eu entro
318. tos m dios da popula o feminina uma vez que quando alguma mulher manifesta o desejo pelo PV considerada uma transgressora na contram o do que a norma como se pertencente a um movimento de contracultura como se remasse contra o avan o da humanidade relegando o PV ao mundo animal irracional Em contraponto a esses depoimentos a outra parte das entrevistadas relatou que muitas mulheres do seu c rculo de conhecimentos assim como elas desejavam o PV mas acabaram terminando numa cirurgia Poucas tinham conseguido ter parto normal confirmando o que os estudos j citados revelaram Essas mesmas depoentes comentaram que as mulheres que ainda n o tinham tido filhos nesse c rculo de rela es demonstravam tamb m inclina o para o PV Minha irm teve dois filhos de cesariana queria muito ter normal Meu sobrinho mais velho estava com duas circulares de cord o e a pequenininha nem sei por que n o foi normal A minha irm queria tanto ter normal que quando engravidei projetou em mim a sua vontade ela dizia Voc vai ter que ter normal Minha cunhada teve ces rea tamb m mas todas queriam normal Elis 134 As minhas amigas que s o m es e tiveram normal falam que esse tipo de parto era timo As que n o tiveram tamb m gostariam de ter dessa maneira Essas que ainda n o s o m es tamb m me apoiavam Nat lia Minhas cunhadas e outras amigas tamb m tinham a mesma vontade que
319. tra deu um sorriso e disse Olha est enrolado hein E duas voltas Ent o eu senti que ele o obstetra ficou feliz com isso pois Com certeza isso facilitou muito para ele o obstetra justificar a ces rea senti que ele o obstetra queria muito que fosse ces rea Foio que percebi Nat lia Eu queria muito o parto normal Gostei muito dele do obstetra achei uma pessoa s ria uma pessoa atenciosa comigo gastou tempo comigo e a ele o obstetra come ou a me cozinhar falou Olha vamos ver o que acontece mas acho muito dif cil ser parto normal porque isso porque aquilo ele o obstetra sabia que eu queria um parto normal A eu fui 112 refletir ser que se eu tivesse procurado outro m dico a gente teria encarado o parto normal Carla Esses depoimentos sugerem que durante o acompanhamento pr natal aconteceram possibilidades de manipula o volunt ria ou n o consciente ou n o entre o que era realmente desejado pela mulher e o desfecho do parto em cirurgia j que nenhuma de nossas entrevistadas fez ces rea a pedido Essa manipula o pode representar uma interfer ncia obst trica pr ximo e ou no momento do parto refor ando os resultados j encontrados em outras pesquisas Souza 2002 Voltaremos a essa quest o mais adiante quando abordaremos o desfecho do parto Como j mencionado supomos que as mulheres das camadas m dias que utilizam o s
320. u disse que queria normal ela disse N o fa a parto normal porque muito ruim Ela falou e eu j sabia dessa hist ria v rias vezes ela contou quando eu morava com ela At que ela me disse minha experi ncia de parto normal n o boa Mas voc quer ter n o v sofrer muito se voc perceber ela falou que sofreu muito que n o queria que eu sofresse o quanto ela sofreu Joana Eu tenho uma prima que nasceu de parto normal com f rceps e ela doente ela ficou doente com paralisia cerebral ela entrevada e tem a mesma idade que eu Eu tamb m tenho esses casos na minha vida A minha tia ficou muito machucada com o f rceps A minha m e tentou o parto normal e n o conseguiu a bolsa estourou e ela ficou 18 horas em trabalho de parto e disse que eu nasci com achatamento da cabe a n vel dois Ela n o conseguiu o normal e teve que fazer ces rea Marta Essas experi ncias negativas de parto normal na fam lia segundo nossas entrevistadas n o as influenciaram Todas disseram que n o se deixaram impregnar e seguiram em frente com sua decis o de ter PV dif cil saber se realmente as hist rias relatas teriam pesado no transcurso da gesta o Mas o fato que durante as entrevistas essas informantes reafirmaram que nunca mudariam a escolha 137 Cesariana As boas hist rias Com o crescimento da ces rea no Brasil n o foi surpresa que entre as m es das entrevistadas esse foss
321. u falei Ah faz eu falei faz nesse momento eu n o vou ficar insistindo tamb m n o sei o que t acontecendo Viviane Ainda persiste por parte dos obstetras a incorpora o de muitas interven es que podem ser segundo a OMS e o MS prejudiciais quando utilizadas de maneira inadequada Fa ndes 2004 aponta que a falta de preparo de muitos m dicos em conduzir adequadamente o PV e a falta de seguran a na pr pria habilidade em enfrentar uma distocia m nima seja ela real ou mesmo imagin ria resultaria automaticamente numa decis o pela cesariana Essa conduta m dica teria uma grande parcela de responsabilidade sobre o desfecho do parto em ces rea Diversos autores Gilbert et al 2006 Moraes e Goldenberg 2001 Fa ndes et al 2004 e Fa ndes e Cecatti 1991 j apontaram para a responsabilidade do ensino m dico na forma o dos futuros obstetras A defici ncia nas escolas m dicas que n o preparam adequadamente os alunos e a falta de treinamento e motiva o dos m dicos no acompanhamento do PV poderia ser um fator determinante para a dissemina o da pr tica da cesariana Dessa forma pudemos perceber como esses trabalhos de parto estavam se desenvolvendo naturalmente at o momento em que um turbilh o de interven es come ou a alterar o processo fisiol gico em andamento Parece nos que a excessiva medicaliza o dos partos acima relatados pode ter interferido profundamente no seu resultado
322. u muito motivada com o assunto e manifestou desejo em participar pois queria contar tamb m a sua hist ria Consultei minha orientadora sobre essa possibilidade e como o nosso desejo tamb m era dar voz a essas mulheres entendemos que o nico crit rio que n o seria observado para esta informante seria o per odo at nove meses ap s o parto estabelecido no sentido de manter preservada a mem ria dessa experi ncia e do in cio da maternidade mais pr xima poss vel do momento vivido Mas pelo interesse manifestado em participar pressupomos que a experi ncia dessa mulher ainda era marcante e emblem tica Nesse contexto entrevistamos 15 mulheres prim paras pertencentes s camadas m dias dentro do conceito de classe que engloba diferentes inst ncias que comp em o pertencimento de classe a mesma condi o social numa dada sociedade a mesma inser o no sistema de produ o renda familiar ou pessoal com n vel superior de escolaridade plano privado de sa de e capital cultural caracter stico desse segmento social determinado por acesso a bens culturais tais como internet teatro cinema literatura etc e por fim mais especificamente que desejavam o parto vaginal e tiveram como desfecho do nascimento uma cesariana realizado com obstetras e em maternidades do setor privado de sa de Para melhor situar o grupo das mulheres entrevistadas organizamos em categorias emp ricas os dados individuais sistematizados nos q
323. uadros a seguir Va apresenta o p lvica ocorre quando o feto disposto longitudinalmente dentro do tero est com o p lo p lvico situado na rea do estreito superior ou seja na posi o sentado ou de n degas 18 Parto ocorrido com menos de 37 semanas de gesta o Quadro I Caracteriza o das Mulheres Entrevistadas Caracter sticas Pessoais 67 NOME Idade Cor Situa o Bairro onde Renda Individual Renda familiar conjugal mora em sal rio m nimo 1 Alice 38 anos branca casada Botafogo 3 SM 10 SM 2 Flora 28 anos branca casada Tijuca sem renda 13 SM 3 Marta sem renda no 29 anos branca uni o est vel Ipanema 10 SM momento 4 C lia 32 anos parda casada Coelho Neto sem renda 4 SM 5 Regina 30 anos branca casada Santa Tereza sem renda 10 SM 6 Vit ria 32 anos branca uni o est vel Botafogo 10 SM 21 SM 7 Dora 28 anos branca casada Botafogo 4 SM 9 SM 8 Nat lia 30 anos branca uni o est vel Botafogo 4 SM 7 SM 9 Rita 32 anos branca casada Botafogo 26 SM 52 SM 10 Lu sa 35 anos negra casada Olaria 13 SM 26 SM e 33 anos branca uni o est vel Ipanema N o quis definir NAO qiy definir 12 T nia 36 anos branca casada Tijuca 8 SM 18 SM 13 Joana 25 anos branca casada Tijuca 3 SM 18 SM 14 Elis 37 anos branca uni o est vel Botafogo 2 SM 4 SM 15 Carla 28 anos branca solteira Botafogo 5 SM 6 SM nomes fict cios SM Sal rio
324. ucas chances de encontrarem obstetras que realmente sejam adeptos do PV e estejam credenciados nos planos de sa de Ou seja o rol de escolhas de profissionais com o perfil adequado limitado e para garantirem a realiza o deste desejo teriam que buscar outras possibilidades como o parto particular e ou domiciliar sem cobertura dos planos de sa de e com custos mais elevados Essas sa das se revelaram ainda distantes para elas j que representariam mesmo para esse segmento social uma despesa extra e principalmente por ainda sentirem inseguran a em experimentar um parto em casa longe do ambiente hospitalar A pesquisa buscou problematizar as situa es vividas pelas informantes levando as a refletirem criticamente sobre as experi ncias pelas quais passaram Essa condi o favorece que as quest es sejam explicitadas e re pensadas pelo pr prio grupo pesquisado Desta forma a vis o cr tica pretendeu ir al m das apar ncias buscando a ess ncia dos sentimentos que se entrela aram n o realiza o do parto almejado Nesse contexto foi possibilitado a essas mulheres descortinarem as quest es do parto de uma maneira mais profunda A ideologia introjetada da ces rea parece ter o poder de obscurecer os fatos e criar ilus es de forma que as mulheres se conven am de sua seguran a e consegiientemente a aceitem O fato de algumas mulheres ao saberem do tema da pesquisa espontaneamente se candidatarem para a entrevis
325. uitos nesse momento resolvessem convencer as mulheres a desistir do desejo do PV Para ilustrar apresentaremos algumas das falas referentes ao in cio e ao final da gravidez que expressaram a percep o das mulheres sobre o apoio recebido dos companheiros Meu marido me apoiava na decis o sempre falou que eu tinha que ter parto normal porque era muito melhor que no dia seguinte eu ia t tima mais pela recupera o mesmo Ent o ele o companheiro sempre falou muito sempre me apoiou ia a todas as consultas At o dia que a m dica falou da ces rea ele nunca falou em outro parto que n o fosse o normal quando a m dica disse que ia ter que ser ces rea na verdade ela n o explicou muito apenas disse que n o era bom esperar mais 38 semanas e meia e marcou para o dia seguinte Ele o companheiro ficou muito ansioso disse que n o queria que n s duas corr ssemos nenhum risco Ele disse pra mim que n o pod amos nesse momento criar nenhum clima de desconfian a com a m dica que era melhor aceitar pois seria melhor pra nossa filha Ele ficou do meu lado o tempo todo assistiu ces rea Eu acho que a gente na hora que recebe a not cia da ces rea fica t o confuso que n o questionamos voc j t num momento num clich tipo assim ent o vamos resolver Dora 129 Ele o companheiro me apoiou ele queria at que eu fizesse parto na gua eu que falei A tamb m n o
326. ulo do trabalho dom stico com o da esfera p blica gerando um c rculo vicioso que exp e as mulheres a uma situa o social de risco e viol ncia doen as f sicas e emocionais e a todo tipo de desigualdades Scott 1995 Louro 1997 Giffin 1994 Essas transforma es reverberam nas condi es nos pap is e identidades femininas e masculinas e atrav s das conex es dial ticas entre produ o e reprodu o social apontam para uma transi o de g nero Giffin 1994 2002 onde a inser o da mulher na esfera produtiva e sua participa o no mercado de trabalho tornou se fundamental para garantir a sobreviv ncia e a manuten o da fam lia Como aponta esta autora A ideologia da nova mulher que atua no mercado de trabalho remunerado normaliza e legitima a transforma o encobrindo n o somente a reprodu o da desigualdade de g nero mas tamb m a das classes sociais 1994 38 31 Sim es Barbosa 2001 reitera que esta situa o evid ncia a dist ncia entre um discurso que idealiza ideologiza a conquista de independ ncia feminina e a realidade concreta de vida da maioria da popula o p 85 3 1 O conceito de g nero na an lise das altas taxas de cesariana O conceito de g nero tomado pela tica marxista ao focalizar o objeto desta pesquisa encampar a discuss o cr tica sobre o uso abusivo das cesarianas entendendo que este procedimento cir rgico est implicado
327. uro para evitar o sofrimento e poupar a mulher das dores relacionadas ao processo fisiol gico da parturi o Outro fato observado num desses momentos das reuni es foi trazido por uma gestante que j tinha decidido ter o beb por cesariana e que nem pensava em ter parto normal Disse ela que al m do medo da dor acreditava que ter um filho hoje de parto normal era coisa do passado Os atuais avan os da medicina segundo ela garantiam mais seguran a mulher nesse momento Essa suposta seguran a proveniente do aprimoramento das t cnicas cir rgicas e das novas t cnicas de anestesia o anteparo tecnol gico em prol das interven es Todas essas alega es comp em o elenco de justificativas que os obstetras utilizam para as interven es cir rgicas e para atender as ces reas a pedido Na percep o m dica seriam essas as raz es que levariam as mulheres a escolherem a cesariana como via de parto 55 sendo a dor o principal motivo Zorzetto 2006 Moraes e Goldenberg 2001 Souza 1994 Fa ndes 1991 No entanto pesquisas anteriores mostraram que apesar da medicaliza o e dos avan os tecnol gicos a maioria das mulheres ainda prefere o parto normal Cury 2006 Fa ndes 2004 Osis 2001 Potter 2001 Moraes 2001 Hopkins 2000 o que parece sinalizar que embora as ideologias de g nero sejam incorporadas de forma muito eficiente as resist ncias persistem A recompensa d
328. va com meu esposo Eu j havia colocado a peridural ent o ela a obstetra aumentou tr s vezes o soro e n o passava de 8 cm Eu n o queria a cesariana de jeito nenhum eu fazia for a mas a crian a n o vinha ent o ela falou Olhe para ela n o entrar em sofrimento vamos abrir Aquilo a ces rea foi meu desespero C lia me botaram no soro e a come ou a apertar as dores come ou a apertar at ent o eu tava bem suportando bem mas depois eu cheguei na maternidade acho que com uns 5 cm de dilata o cheguei bem depois fui pra 8 cm j tava na sala de parto romperam minha bolsa amni tica j tava com anestesia peridural ai eles falaram J t vindo t vindo Ai eu tava mesmo achando que ia nascer eu cheguei a 8 cm Outro m dico chegou disse que tava correndo tudo bem e tal falou que dava pra esperar um pouquinho Mandavam eu fazer for a foi ajudando botava a m o assim kristeler e falava Agora faz for a E eu fazia for a e tal A 31 manobra que imprime for a sobre o fundo uterino no per odo expulsivo expondo a mulher ao risco de rotura uterina al m de poder causar danos ao per neo e ou feto 146 chegou um momento que eu n o sei quanto tempo durou eu tava t o cansada tamb m eu fazia for a e n o saia nada A ele falou T dando um edema aqui o beb n o t saindo eu acho que a gente vai ter que fazer ces rea concorda E
329. xplicar as causas da opress o feminina para assim poder transformar essa situa o Sim es Barbosa 2001 As contribui es trazidas pelos estudos feministas inclu am as experi ncias pessoal e subjetiva que valorizavam as hist rias de vida a luta pela inser o social e pol tica e a correlata sa da das mulheres do mbito privado dom stico para a esfera p blica agora como atores pol ticos Esses estudos n o s pretendiam transforma es sociais como tamb m reconstruir a inser o social das mulheres em bases igualit rias Evidenciar essas quest es ampliou a cr tica te rica e pr tica que denunciava as rela es de poder e controle social sobre as mulheres Sim es Barbosa 2001 Entre outras contribui es o feminismo trouxe para a arena cient fica quest es que eram at ent o atribu das esfera da natureza feminina portanto n o valorizadas e desqualificadas enquanto objeto de conhecimento pelo campo cient fico Romito 1997 apud Sim es Barbosa 2001 As cr ticas feministas centralizaram se sobre a ci ncia hegem nica o paradigma cient fico legitimado tomado enquanto inst ncia legitimadora da opress o feminina A partir da o conceito de g nero passa a desconstruir a l gica androc ntrica dessa racionalidade fundamentada no modelo cartesiano bin rio e dicot mico apostando na constru o junto com outros segmentos oprimidos da sociedade em um novo paradigma alicer ado na dial tica

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